Oliver Stuenkel: País indica querer ser ponte entre Sul Global e Ocidente

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O discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Assembleia-Geral da ONU foi positivo por dar destaque às posições que o Brasil pode ter maior impacto, na avaliação do professor de relações internacionais da FGV-SP e colunista do Estadão Oliver Stuenkel. "Será lembrado como um discurso de normalização", disse o professor.

Como o sr. avalia o discurso do presidente?

Lula, sobretudo agora no primeiro ano de mandato, tem uma vantagem inédita porque houve uma rejeição praticamente universal contra o ex-presidente Jair Bolsonaro. Tanto no Ocidente quanto no Sul Global existe um certo alívio com o fim do governo Bolsonaro em função da imprevisibilidade, da falta de compromisso com o multilateralismo e com questões envolvendo o negacionismo climático. Lula tem um bônus que é qualquer coisa que ele disser, mesmo em questões polêmicas, será comparado com o último presidente. Por isso, seu discurso na Assembleia-Geral da ONU será lembrado como um discurso de normalização e facilita muito a mensagem de que o Brasil está de volta.

Houve uma tentativa de se evitar falar da guerra na Ucrânia? Isso é positivo?

Lula fez questão de mencionar outros conflitos antes da guerra na Ucrânia. Ele falou de Haiti, Iêmen, Burkina Faso, Gabão, Guiné, Mali, Níger e Sudão. A mensagem que o presidente quis passar foi de que a comunidade internacional, sobretudo o Ocidente, fala muito da Ucrânia e pouco dos outros conflitos. Claramente não foi coincidência. O Brasil busca preservar seus laços com a Rússia e com o Ocidente, o que é um equilíbrio difícil. O Brasil é visto pelo Ocidente como pró-Rússia. É muito complicado satisfazer os dois lados, mas houve uma tentativa de não entrar em detalhes, porque a chance de ser polêmico é grande. Outros líderes já vão enfatizar muito a questão da Ucrânia. Então, houve uma tentativa de Lula de dizer que o Brasil gostaria de se destacar no combate contra as mudanças climáticas, desigualdade e a favor da reforma das instituições. Acredito que são essas questões que o Brasil pode brilhar. Não acredito em um grande impacto do Brasil em uma possível mediação da guerra entre Rússia e Ucrânia. As declarações de Lula sobre o assunto já produziram um custo. Então, houve uma tentativa de enfatizar outras questões.

Lula criticou o embargo a Cuba sem citar que se trata de uma ditadura. Por que a insistência com Cuba?

Lula acaba de visitar Havana e esse assunto é quase consensual na América Latina. Por incrível que pareça, o presidente dos EUA, Joe Biden, e o Partido Democrata são céticos quanto a esse embargo, mas não existe muito espaço político junto ao Partido Republicano para mudanças. Não vejo esse como um assunto particularmente polêmico de Lula. É um tema importante para uma ala do PT, que se importa muito com essa questão. Infelizmente, não existe nenhuma perspectiva de que isso mude nos próximos anos. Isso é um pouco o dilema de um discurso. É preciso falar de visões e posições, mesmo que elas não estejam próximas de acontecer.

Lula enfatizou a importância da ONU e do multilateralismo. Não é um contrassenso com suas declarações recentes criticando o TPI e rechaçando outros mecanismos multilaterais?

Vários integrantes do governo e do Itamaraty discordaram em off da posição do presidente em relação ao Tribunal Penal Internacional. Os comentários destoam da posição oficial do Brasil e, por isso, ele não falou sobre o TPI em seu discurso. Os comentários tiveram um custo político, mas o fato de Lula não ter levantado o assunto é uma forma de contenção de danos e de mostrar que o Brasil está comprometido com o multilateralismo, que está em sua pior crise em décadas. A ausência de quatro dos cinco líderes dos países do Conselho de Segurança é um reflexo disso. Estamos nos aproximando de um mundo em que regras e normas valem menos e as plataformas estão enfraquecidas. Lula fez um apelo importante.

Lula tentou se colocar como líder do Sul Global?

Sem dúvida, eu diria que China, Índia e Brasil buscam se projetar como lideranças no Sul Global, mas em função das diversidades desses países, é impossível representar a todos. O Brasil, no entanto, é reconhecido como um país com um papel importante no Sul Global. Apesar do maior peso econômico de Índia e China, o País tem mais peso em certas áreas. Em suas declarações, Lula fala de direitos LGBT+, de direitos da mulher, de liberdade de imprensa, denuncia as rupturas institucionais em outros países. São assuntos caros ao Ocidente que não serão mencionados pela China, nem pela Rússia, por exemplo. É também uma forma de sinalizar que o Brasil está no Sul Global, mas também pode ser uma ponte com o Ocidente, que o País consegue dialogar sobre diversos assuntos, principalmente no âmbito da democracia.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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O Ministério Público de Contas de São Paulo (MPC-SP) recomendou a rejeição das contas da Câmara Municipal de Guarujá referentes ao exercício financeiro de 2020. Esta é a sétima vez consecutiva que o órgão se posiciona contra a aprovação das finanças do Legislativo guarujaense. Procurada pelo Estadão, a Câmara não se manifestou.

Entre as irregularidades apontadas estão o pagamento de salários acima do teto constitucional e o número excessivo de funcionários comissionados - ou seja, contratados sem concurso público.

O julgamento das contas será realizado pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) na próxima terça-feira, dia 15. O TCE já rejeitou as contas da Câmara nos exercícios de 2013 a 2019. A expectativa é de que o parecer negativo se repita.

Durante sustentação oral sobre o caso, o procurador José Mendes Neto, do MPC-SP, destacou o excesso de gastos com pessoal no primeiro ano da pandemia de Covid-19. Ele chamou atenção para a reincidência das falhas, observando que as seis reprovações anteriores foram motivadas por irregularidades semelhantes.

"Excesso de dispêndio com o pessoal, excesso na estrutura dos cargos comissionados, elevado pagamento de horas extraordinárias, falta de observância do teto remuneratório (constitucional)", enumerou o procurador.

Segundo o relatório de fiscalização, em 2020, a Câmara contava com 122 servidores: 47 efetivos e 75 comissionados.

Com exceção dos procuradores legislativos, o teto remuneratório era estabelecido pelo subsídio do prefeito, que à época era de R$ 20,8 mil. No entanto, o órgão apontou que a Câmara vinha utilizando horas extras habituais e gratificações para burlar esse limite.

Apenas com pagamentos fora do teto - como gratificações e horas extras -, o relatório aponta um total de R$ 1,8 milhão pagos de forma irregular.

Um dos servidores recebeu R$ 179 mil apenas em gratificações, outro recebeu R$ 152 mil, e uma terceira servidora teve gratificação no valor de R$ 136 mil. O relatório também aponta o pagamento de R$ 201 mil em gratificações de nível superior a uma servidora aposentada.

O procurador José Mendes Neto criticou o uso dessa verba para funções que já exigem formação superior como requisito para o cargo. "É um absurdo que se tenha despendido tamanhos recursos com essa gratificação - um somatório de R$ 2.637.000", afirmou.

Um grupo de indígenas foi contido com uso de gás de pimenta pela Polícia Legislativa depois de ocupar, na tarde desta quinta-feira, 10, o gramado em frente ao Congresso Nacional. A área costuma ser fechada a manifestações por questões de segurança.

O deputado distrital Fábio Felix (PSOL), que acompanhava a manifestação, postou um vídeo sobre a manifestação e reclamou da ação policial. É absurda a repressão policial", escreveu o político.

Em nota, a Câmara afirmou que cerca de mil indígenas romperam a linha de defesa da Polícia Federal do DF, derrubando os gradis e invadindo o gramado do Congresso.

Ainda segundo a Casa, a situação foi controlada e o policiamento da Câmara e do Senado foram reforçados.

"O acordo com o movimento indígena, que reúne lideranças de diferentes etnias do país, era que os cerca de 5 mil manifestantes chegassem apenas até a Avenida José Sarney, anterior à Avenida das Bandeiras, que fica próxima ao gramado do Congresso. Mas, parte dos indígenas resolveu avançar o limite", disse a assessoria da Câmara em nota.

Indígenas de todo o País se reuniram em Brasília ao longo da semana, no Acampamento Terra Livre (ATL), para pedir a proteção de seus direitos à terra.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva aceitou a indicação do União Brasil e escolheu o deputado federal Pedro Lucas Fernandes (MA) para assumir o Ministério das Comunicações no lugar de Juscelino Filho. Em reunião realizada nesta quinta-feira, 10, no Palácio da Alvorada, Lula elogiou Fernandes e pediu mais apoio do partido no Congresso.

Na terça-feira, 8, Juscelino foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ao Supremo Tribunal Federal (STF), acusado de corrupção por desvio de recursos de emendas parlamentares quando exercia o mandato de deputado federal. O caso foi revelado pelo Estadão em 2023.

Diante do desgaste, Lula pediu que ele entregasse o cargo para não prejudicar ainda mais o governo. A Primeira Turma do STF - a mesma que analisa as ações da trama golpista do 8 de Janeiro - deve aceitar a denúncia contra Juscelino e, nesse caso, ele se tornará réu.

Pedro Lucas é líder da bancada do União Brasil na Câmara e vem de uma família tradicional na política maranhense. É filho do também ex-deputado Pedro Fernandes, atual prefeito de Arame, cidade localizada no interior do Maranhão.

Embora ocupe três ministérios no governo Lula (Comunicações, Turismo e Integração e Desenvolvimento Regional), o União Brasil está rachado. Tanto que um setor se movimenta ali para ser oposição e apoiar outro candidato à cadeira de Lula, em 2026. O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), lançou sua pré-candidatura à Presidência, mas não empolga a cúpula do partido. Dividida, a legenda abriga uma ala que prega a adesão a um desafiante indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

O novo ministro, porém, integra o grupo que defende a aliança com o PT. Recentemente, ele fez parte da comitiva de Lula para o Japão e o Vietnã. Pedro Lucas é próximo do ministro do Supremo Tribunal Federal Flávio Dino e foi presidente da Agência Executiva Metropolitana (Agem) quando ele era governador do Maranhão. Dino é hoje o relator da investigação sobre Juscelino no STF.

A reunião convocada por Lula para definir a troca no Ministério das Comunicações contou com a presença de Pedro Lucas e também do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), e da ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann.

Agora, o União Brasil terá de se debruçar sobre outro problema: quem vai substituir Pedro Lucas na liderança do partido na Câmara. A cúpula da legenda quer que seja o próprio Juscelino, que reassume o mandato de deputado federal. Mas o grupo que se opõe ao governo resiste à ideia e quer um perfil mais combativo.