Em outra categoria

O presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), José Hiran da Silva Gallo, disse, nesta segunda-feira, 17, que há limites na "autonomia da mulher", ao comentar a resolução que trata da assistolia fetal, procedimento realizado no aborto legal em gestações com mais de 22 semanas resultantes de estupro. "A autonomia da mulher, esbarra, sem dúvida, no dever constitucional imposto a todos nós, de proteger a vida de qualquer um, mesmo ser humano formado por 22 semanas", afirmou Gallo.

O presidente do CFM definiu que já há "viabilidade fetal" com 22 semanas de gestação, em torno de cinco meses e meio, e que, já é um "ser humano formado". "Em todos esses casos, falamos de pré-maturidade. São situações onde há viabilidade de vida, e já não se trata de um feto, mas de um ser humano formado", disse.

As declarações foram dadas em uma sessão de debates no Senado Federal para discutir o procedimento de assistolia realizado nesta segunda-feira, que teve a presença de movimentos e deputados e senadores contra o aborto.

O evento foi realizado pelo senador da oposição, Eduardo Girão (Novo-CE). O senador defendeu que, há uma criança em todos os estágios da gravidez e todo aborto é um infanticídio. "Eu aboli o termo biologicamente correto, que é feto. Pois para mim todos os estágios da gravidez é, e sempre será, criança. Estamos tratando aqui de infanticídios", afirmou Girão.

A sessão teve a demonstração de como é realizada a assistolia fetal e também uma encenação dramática em que a atriz, interpretando como um feto de 22 semanas reage ao aborto.

Antes do discurso, Gallo saudou Girão, que, segundo ele, representa "o povo e as mulheres brasileiras". Ao longo da fala que durou um pouco mais de 20 minutos, o presidente do CFM concluiu que há hoje uma "banalização da vida" uma "insensibilidade em proteger a vida".

"Não posso esconder minha surpresa com a banalização da vida a que estamos sendo expostos na sociedade contemporânea de um modo sistemático", disse. "Me pergunto o que houve em nossa caminhada enquanto humanidade. Qual o desvio que tomamos em nossa rota, tornando insensíveis à necessidade suprema de proteger a dignidade e a vida?"

O relator da resolução no CFM, Raphael Câmara Medeiros Parente, também discursou e comparou a assistolia a um "método de tortura" e concluiu que não existe aborto legal. "Não existe o tema aborto legal. É aborto com excludente de punibilidade. Seria que nem falar em homicídio legal. Mas em existem situações em que se pode matar", disse. "Todo aborto é crime, mas alguma crimes não são punidos pela lei."

O CFM e o Supremo Tribunal Federal (STF) divergem sobre a realização da assistolia fetal. O ministro do STF Alexandre de Moraes suspendeu a resolução que impedia o procedimento, argumentando que o CFM "se distancia de padrões científicos pela comunidade internacional" e que a normativa ultrapassa os limites do poder regulamentar do órgão. O Conselho recorreu e pediu a redistribuição do processo.

A polêmica acendeu a discussão no Congresso Nacional. A Câmara dos Deputados aprovou, na semana passada, um projeto de lei que equipara o aborto realizado após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio. A pena aplicada passaria a ser equivalente a de homicídio simples, de seis a 20 anos de reclusão, inclusive nos casos de estupro. Atualmente, a pena média para estupradores é de 6 a 10 anos.

O dono do Malta Rock Bar, na zona sul de São Paulo, foi morto com golpes de canivete dentro do próprio estabelecimento na noite de sábado, 15. O agressor foi contido por outros clientes e preso no local. Conhecido como Nenê, o empresário Carlos Monteiro, de 58 anos, foi atacado após defender uma funcionária, que estaria sendo assediada pelo agressor.

De acordo com testemunhas, Nenê pediu que o homem se retirasse do bar. O suspeito teria então sacado a arma e golpeado a vítima, que morreu no local.

O agressor foi imediatamente contido por testemunhas, que acionaram a Polícia Militar (PM). O suspeito acabou preso em flagrante e o canivete usado no crime foi apreendido, de acordo com a Secretaria da Segurança Pública (SSP). No dia seguinte, a prisão foi convertida em preventiva após audiência de custódia.

O caso foi registrado como homicídio no 16º Distrito Policial (Vila Clementino). O corpo de Nenê será sepultado às 11h desta segunda-feira no Cemitério Gethsêmani, no Morumbi. Em redes sociais, amigos e frequentadores do bar prestaram homenagens e deixaram mensagens de apoio à sua esposa.

O deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), um dos autores do projeto que pune quem interromper uma gestação com mais de 22 semanas, mesmo nos casos permitidos em lei, admitiu que a votação da proposta na Câmara dos Deputados poderá ficar para depois das eleições municipais.

A mudança de postura do deputado da bancada evangélica, declarada ao jornal O Globo, veio após uma enxurrada de críticas, que primeiro inundou as redes sociais e depois ocupou as ruas de diversas capitais brasileiras na última semana. Enquanto a urgência do projeto foi aprovada em uma votação que durou apenas cinco segundos, a votação da matéria em plenário terá "o ano todo" para acontecer, disse Sóstenes.

Segundo o deputado em entrevista, o projeto é uma promessa feita pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), quando se candidatou à reeleição em 2023, e o cumprimento dela está vinculado agora ao apoio para a eleição de um sucessor. Lira permanece na presidência da Casa até final do ano, quando não poderá se candidatar outra vez.

"Não estou com pressa nenhuma. Votei a urgência e agora temos o ano todo para votar isso. O Lira tem compromisso conosco e ele pode cumprir até o último dia do mandato dele", disse, afirmando que sem que Lira cumpra o combinado "fica difícil de pedir apoio (para seu candidato à sucessão)".

O apoio do partido de Sóstenes, mesmo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), é visto como estratégico, já que se trata da maior bancada da Casa, com 95 deputados. A escolha do novo líder da Câmara está marcada para fevereiro de 2025.

Como mostrou a Coluna do Estadão, a Frente Parlamentar Evangélica é poderosa na Câmara e apoiou Lira em suas duas candidaturas à presidência da Casa. Até agora, porém, não definiu seu candidato à sucessão do deputado alagoano, e tem cobrado dele o apoio às pautas conservadoras. Lira prometeu à bancada, em maio, que consultaria o colégio de líderes sobre a votação do pedido de urgência do projeto do aborto.

E foi o que fez na última quarta-feira, 12, quando conduziu a votação relâmpago e simbólica da urgência, que não teve o número e a ementa do requerimento anunciados. Após a repercussão negativa, Lira viu o próprio nome vinculado à matéria, que ficou conhecida como "PL do Estuprador". Para remediar o dano na imagem, o presidente da Casa disse que pautará uma deputada mulher, de centro e moderada para ser a relatora do projeto.

Autor do projeto, Sóstenes lê a postura do governo, que demorou para se pronunciar sobre o caso, e a falta de resistência para conferir celeridade ao processo como um cenário onde está "tudo dominado". "O governo está dando corda para as feministas nesse assunto, elas estão desesperadas. Eu estou muito calmo, deixa elas sapatearem. Eu já ganhei, votamos a urgência, sem nominal, ninguém chiou, tudo caladinho, tudo dominado, dominamos 513 parlamentares. Eu sei jogar parado, eu jogo parado", afirmou.

O governo demorou, mas também se posicionou sobre o projeto após a grande repercussão contrária. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou no sábado, 15, que é uma "insanidade querer punir uma mulher vítima de estupro com uma pena maior que um criminoso que comete o estupro".

Em fala à imprensa na Itália, onde participava de reunião do G7, Lula afirmou ser pessoalmente contra o aborto, mas disse que o tema deve ser tratado como uma questão de saúde pública. Ele defendeu que a legislação sobre interrupção da gravidez permaneça como é atualmente. A primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, precedeu o marido e na sexta-feira, 14, já tinha usado as redes sociais para afirmar que o projeto é "um absurdo e retrocede em nossos direitos".