Desencanto com a política faz Salta apostar em Milei sem conhecê-lo

Internacional
Tipografia
  • Pequenina Pequena Media Grande Gigante
  • Padrão Helvetica Segoe Georgia Times
Em 12 de outubro, o libertário Javier Milei liderou uma carreata pelas ruas da cidade de Salta, capital da província de mesmo nome que fica no norte pobre da Argentina. Era sua primeira vez ali e a escolha não era despropositada. Nas eleições primárias, quase 50% de Salta votou em Milei, mesmo ele nunca tendo estado fisicamente ali. Na sua estratégia de tentar vencer em primeiro turno, ele finalmente visitou a cidade, levando um mar de gente - a maioria jovens - a segui-lo.

Nas ruas, os cartazes, panfletos e fotos de Milei são quase onipresentes. Mas ele não aparece sozinho. Seu nome está quase sempre junto com o de uma figura bastante tradicional da política saltenha: Alfredo Olmedo. Atualmente deputado e candidato a uma cadeira no Parlamento do Mercosul, Olmedo é um velho coronel da política, conhecido por andar sempre com sua jaqueta amarela, em uma estratégia de se destacar dos demais colegas de terno do Congresso local. Antes de Milei, ele era o dono do apelido "Bolsonaro Argentino", tendo conhecido o ex-presidente brasileiro.

Olmedo apadrinhou Milei na província - ou há quem diga o contrário, que Olmedo colou sua imagem no libertário que atualmente é popular entre os jovens -. Essa união tornou o amarelo a cor dos libertários de Salta, e nos dias finais da campanha, jovens desfilavam com as cores e nomes das listas de Milei pelo centro da cidade.

O libertário recebeu 49,4% votos na província, sendo seguido pela chapa peronista União pela Pátria, encabeçada por Sergio Massa, com 21,4%, e só então o Juntos pela Mudança com 17,2%. Passando uma lupa um pouco mais cuidadosa na província, se vê que a região que mais apostou no libertário foi a de Los Andes, na divisa com o Chile, com 63%. O caso mais emblemático é o da cidade de San Antonio de Los Cobres.

O nome faz jus à atividade econômica da região, além da agricultura e do turismo que movimentam toda a província andina, a mineração é a principal atividade local. É ali que a Argentina vê florescer o seu futuro com o lítio, chamado de ouro branco.

Aníbal Franco, 30, trabalha na mineração de San Antonio de Los Cobres. A princípio ele conta que se assustou com Milei e suas ideias radicais. Mas então olhou ao seu redor e via que com a realidade de pobreza ali, uma mudança drástica poderia fazer bem.

"Quando eu era muito pequeno, gostava de política porque via na TV que política ajudava as pessoas, então cresci pensando que os político eram assim, mas quando cresci e entrei no mundo da política, eu percebi que não", desabafa.

"O problema dos políticos argentinos é que às vezes fazem obras que não têm nada a ver, por exemplo, minha cidade precisaria de uma estação de tratamento de esgoto, porque os resíduos vão para o rio, mas preferem fazer centros de esportes, então aí você percebe que os políticos não estão para o povo e sim para interesses os produtivos ou para beneficiar alguém."

Sentimento de abandono

O sentimento de quem vive em San Antonio de Los Cobres é o de completo abandono do Estado. As grandes empresas mineiras que atuam na região são vistas como as grandes provedoras dos serviços que deveriam ser de responsabilidade do Estado argentino: saúde, educação e estradas. Quando, em Buenos Aires, a cúpula política decide algo relacionado à mineração em Salta, essa população se sente fora das negociações. Dizem que nunca são ouvidos, considerados ou vistos.

É nesta sensação de abandono, que as promessas de mudanças de Milei encontraram terreno fértil, principalmente em quem se pergunta: o que há para perder? "Era para o meu filho ter nascido em um hospital aqui, mas tivemos que correr para a cidade de Salta, porque aqui não há médicos. Também não há professores", desabafa Franco.

Sua reivindicação por um hospital e serviços de saúde adequados também reside no fato de o local viver da atividade mineira, em que a preocupação com a saúde dos trabalhadores deveria ser uma constante, afirma. Desse ponto de vista, lhe agrada a proposta de privatizar a saúde e oferecer vouchers aos que não podem pagá-la, já que a pública não lhe alcança.

Hoje ele é um dos jovens engajados na campanha de Milei, de forma voluntária, produzindo conteúdos para as redes sociais difundindo as ideias do libertário.

María Dionisia Rodríguez, 60, é presidente da comunidade indígena Kolla, de Santa Rosa dos Pastos Grandes, no departamento de Los Andes. Não lhe agrada falar de política, mas observa que é a ausência do Estado nas partes profundas da Argentina que motiva a população local a escolher seus presidentes.

"Do ponto de vista eleitoral, somos poucos eleitores, não alteramos em absolutamente nada os números de uma eleição", afirma. "Não decidimos quem ganha quem perde. Talvez por isso nos olhem pouco, inclusive para oferecer os serviços básicos. Nós, que vivemos nesta Argentina profunda e no departamento de Los Andes, também somos pessoas."

A explicação maior para Javier Milei ter feito tanto sucesso na província do norte - e em muitas outras da chamada "Argentina profunda" - foi a sua disseminação pelas redes sociais.

"Fizemos um estudo com grupos focais em todo o norte e os jovens menores de 30 anos já diziam no ano passado que iam votar em Milei, cerca de 80% dos que estudamos, porque ele era um fenômeno e todos o conheciam pelas redes sociais", explica Pedro Buttazzoni, analista político e diretor da Droit Consultores. "Não precisavam vê-lo para conhecê-lo, a maioria na verdade nunca o havia visto, mas confia nele pelas redes sociais, principalmente o TikTok. Um fenômeno bem parecido ao que aconteceu no Brasil".

Mas além de conhecê-lo e se engajar na campanha do A Liberdade Avança pelas redes sociais, houve uma absorção da agenda de Buenos Aires nesse eleitor, mesmo estando a 1.400 km da capital federal. "A agenda da cidade de Buenos Aires e seu subúrbio se instala como uma agenda nacional", explica a cientista política Luciana Modica. "Não é como se os problemas de Salta estivessem no centro da agenda da imprensa saltenha".

"Por exemplo, se há um ato de violência como um assalto que termina com morte em Buenos Aires, automaticamente em Salta todos os canais e meios de comunicação estão falando disso. Mesmo tendo ocorrido a mais de 1.000 km de distância, a sensação de insegurança aparece", completa.

A exemplo da interiorização das pautas de Milei, sua principal cabeça de lista em Salta para o Congresso, Maria Emília Orozco, repetiu ações midiáticas de Milei na cidade. A exemplo de quando o libertário prometeu sortear seu salário de deputado, Orozco promoveu, junto com Alfredo Olmedo, um sorteio de 100 dólares para os eleitores. A medida, porém, foi barrada pela Justiça.

Em outro episódio, ela tornou público os salários dos vereadores de Salta, cena esta que tornou a atual vereadora antes mal conhecida na candidata a deputada federal mais votada da província. Além dela, outras 4 pessoas estão na lista dos libertários disputando as 4 cadeiras em aberto em Salta, com chances de ao menos três delas serem ocupadas por eles

Segundo o deputado e ex-candidato a governador Miguel Nanni, do Juntos pela Mudança, a chegada de Milei e seus libertário forçou o partido a recalibrar a campanha. "Milei entrou nos estratos mais humildes e também nos estratos médios e setores mais altos, o que nos obrigou a fazer uma campanha muito diferente, muito artesanal, com poucos recursos, de porta em porta e distribuição de panfletos de propostas", conta.

Fonte: Financial Times

Em outra categoria

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) prorrogou, por meio de decisão liminar, o prazo para que a Câmara Municipal instale duas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) já aprovadas em plenário, mas ainda não implementadas devido a uma manobra de obstrução da base aliada do prefeito Ricardo Nunes (MDB). As CPIs seriam extintas nesta quinta-feira, 17, mas a Justiça estendeu o prazo de instalação até 30 de abril.

No início do mês, a Câmara aprovou duas CPIs: uma para investigar enchentes no Jardim Pantanal, na zona leste, e outra para apurar fraudes no programa de Habitação de Interesse Social (HIS). Ambas ainda não foram instaladas porque a base aliada não indicou seus representantes. Pelo regimento, CPIs não iniciadas em até 15 dias após a aprovação são extintas automaticamente.

Vereadores de oposição acusam a base da gestão Nunes de manobrar para substituir CPIs incômodas por comissões com menor potencial de desgaste. Nesta terça-feira, 15, a base aliada aprovou a criação de duas novas CPIs: uma para investigar os "pancadões" e outra sobre a atuação da empresa Tools for Humanity, que coletou dados de íris em troca de criptomoedas.

Diante disso, a oposição ingressou nesta quinta-feira, 17, com dois mandados de segurança no Órgão Especial do TJ-SP contra o presidente da Câmara, Ricardo Teixeira (União), aliado de Nunes. Eles pedem que o presidente seja obrigado a indicar os representantes das comissões por ofício, viabilizando a instalação das CPIs.

A desembargadora de plantão Isabel Cogan deferiu parcialmente o pedido da oposição e prorrogou o prazo de instalação das CPIs até o fim do mês. A decisão foi divulgada inicialmente pela Folha de S.Paulo e confirmada pelo Estadão.

Na decisão, a magistrada reconhece que o caso envolve procedimentos internos do Poder Legislativo, o que exige respeito ao princípio constitucional da separação dos poderes. No entanto, diante da relevância das alegações apresentadas, ela também invoca o princípio da inafastabilidade da jurisdição, que garante o acesso ao Judiciário em casos de possível lesão a direitos.

"De qualquer forma, a ação é da competência originária do Órgão Especial deste E. Tribunal de Justiça, cabendo a esta julgadora, em plantão judiciário, apenas resguardar as partes contra eventual risco de perecimento do direito alegado", escreveu.

O líder do PSOL na Câmara, vereador Toninho Vespoli, considerou importante a decisão do TJ-SP, mas ponderou que ela ainda está aquém do esperado. "Ainda não é o que queríamos, pois achamos que o presidente deveria ser obrigado a instalar imediatamente as duas CPIs já que elas foram aprovadas pelos vereadores."

"Quando o prefeito manobra para ameaçar os vereadores para barrar CPIs que vão investigar sua gestão, nossa única esperança é que a Justiça atue para garantir o direito dos vereadores", afirmou.

Ao ser questionada pelo Estadão sobre as acusações da oposição, Prefeitura afirmou em nota que respeita a independência dos Poderes e reiterou que não interfere nos trabalhos do Legislativo. "O Executivo pauta sua relação com a Câmara Municipal pelo diálogo e o interesse público", diz o texto.

Sóstenes Cavalcante (RJ), líder do PL na Câmara dos Deputados, se posicionou contra a possibilidade da construção de uma lei que atenue as penas fixadas para condenados por golpe de Estado no âmbito do 8 de Janeiro, como alternativa ao PL da Anistia,

Diante do impasse sobre se o texto proposto pelo PL entrará na pauta da Casa, uma das soluções aventadas é a criação de legislação específica para reduzir as penas de pessoas que tiveram participação considerada secundária nos ataques às sedes dos Três Poderes.

A proposta traria uma redução entre um terço e um sexto da pena para réus de menor envolvimento e diferenciaria financiadores, organizadores e líderes dos atos.

Sóstenes disse não ver com bons olhos a ideia de um projeto alternativo ao da anistia, cujo requerimento para votação com urgência foi apresentado na segunda-feira, 14. Segundo o g1, a possibilidade está sendo analisada entre a cúpula do Congresso Nacional e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

"Eu acho anti-republicano saída negociada entre Congresso e STF. São dois poderes independentes. Não é normal ver o STF querendo legislar e conversando com normalidade com membros do Congresso", disse ao portal.

O parlamentar também discorda da diferenciação entre líderes e participantes de menor envolvimento. Segundo ele, "não houve mandantes, nem financiadores" no episódio.

A estratégia do PL é continuar pressionando o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), para que coloque o "PL da Anistia" para apreciação do plenário da Casa. Sóstenes admite que mudanças no texto da proposta podem ser realizadas depois que Motta definir um relator para o projeto, mas não especificou quais.

O requerimento de urgência teve o apoio de 262 deputados para ser apresentado, mas precisa de 257 votos favoráveis para ser aprovado, se pautado. Segundo o Placar da Anistia do Estadão, 207 deputados já se mostraram favoráveis ao texto até momento. São 127 contrários, 101 que não quiseram responder e 78 que não retornaram os contatos da reportagem.

Na prática, as assinaturas coletadas garantem que o pedido de aceleração não poderá ser derrubado a partir de um requerimento de retirada de pauta ou um requerimento de adiamento de discussão.

Após o feriado da Semana Santa, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pretende se reunir com Hugo Motta e com os líderes de partidos da Câmara.

A tendência, segundo parlamentares que acompanharam a viagem do presidente à Ásia, é que Lula faça reuniões com presidentes de partidos e bancadas do Congresso.

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou nesta quinta-feira, 17, que o ex-assessor especial do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), Filipe Martins, acompanhe o próprio julgamento presencialmente.

Filipe faz parte do segundo núcleo da denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) por golpe de Estado após as eleições de 2022. O julgamento será realizado nas próximas terça e quarta-feira, 22 e 23 de abril, na Primeira Turma da Corte, em Brasília.

A decisão de Moraes atende a pedido da defesa do ex-assessor, que, por estar cumprindo medidas cautelares, precisa de autorização judicial para sair de onde reside, em Ponta Grossa (PR).

"É pacífico o entendimento de que a presença do acusado em atos centrais do processo deve ser não apenas admitida, mas estimulada, sempre que compatível com a ordem pública e com a instrução processual, especialmente quando não há qualquer histórico de risco, evasão, obstrução ou descumprimento", diz a petição assinada por seus advogados.

A defesa solicita que ele embarque em voo para Brasília na segunda-feira, 21, e retorne na quinta-feira, 24, e informa onde ele ficará hospedado. Também faz uma ressalva quanto à cobertura midiática da sessão.

Como parte das medidas cautelares, Filipe não pode participar das redes sociais. Os advogados pedem que ele não seja responsabilizado em caso de "captação ou divulgação de imagens, vídeos ou registros de outra natureza realizados por terceiros", já que se trata de um julgamento em sessão pública e com cobertura midiática.

No início do mês, Filipe Martins foi multado pelo ministro Alexandre de Moraes em R$ 20 mil por ter aparecido em vídeo publicado nas redes sociais por seu advogado, o desembargador aposentado Sebastião Coelho. A defesa recorreu.

Outro denunciado do núcleo 2, o ex-diretor geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Silvinei Vasques, também solicitou autorização para acompanhar a análise na semana que vem, mas desistiu de comparecer.

Quando o relator Moraes pediu esclarecimentos sobre onde Silvinei ficaria hospedado em Brasília, a defesa encaminhou uma desistência da solicitação. A alegação é a exposição midiática e de imagem do julgamento e a possibilidade de que o STF entenda que ele descumpriu as medidas cautelares.

"É certo que a imprensa se fará presente no local designado para ocorrência da solenidade, motivo pelo qual, objetivando-se evitar qualquer tipo de prejuízo à integridade das cautelares em vigência, chegou-se à conclusão de que seu não comparecimento é a medida mais acertada", escreveram os advogados.

Julgamento dos núcleos denunciados pela PGR por golpe de Estado:

Núcleo 1: denúncia aceita em 26 de março;

Núcleo 2: julgamento marcado para os dias 22 e 23 de abril;

Núcleo 3: julgamento marcado para os dias 20 e 21 de maio;

Núcleo 4: julgamento marcado para os dias 6 e 7 de maio.