Jornalista Ribamar Oliveira, mestre das entrelinhas, morre vítima da covid-19

Política
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A mesa de Ribamar Oliveira, o Riba, ficava no fundo da redação do Valor, em Brasília. Riba tinha uma visão privilegiada dali. Via toda a movimentação dos colegas, o entra-e-sai, as conversas. Sem aviso prévio, soltava sempre alguma piada em voz alta, ria com gosto e, assim, fazia rir. Muitas vezes, no entanto, Riba parecia não estar ali. Egresso das grandes publicações do País e do Estadão, onde venceu um Prêmio Esso de Economia em 1997, Riba entrava num mundo só dele. Com as mãos sobre a cabeça e os cotovelos sobre a mesa, metia os olhos sobre tabelas e textos indecifráveis sobre contas públicas. Passava horas assim, até que, de repente, saltava da cadeira e partia para a chefia de redação.

Com as portas abertas, travava horas de conversa em voz alta. Nós ouvíamos tudo sobre algum tema árido para a maior parte de quem acompanhava. No dia seguinte, estava lá, na capa do jornal, uma manchete que revirava o mercado financeiro, o mundo político e que mexia com a vida de cada cidadão.

Lembro de uma vez, quando Riba saiu de férias. No Banco Central, funcionários disseram que finalmente teriam um mês de alívio e que poderiam descansar. Rimos disso. Ribamar decifrava os dados como ninguém, via as notícias e os escândalos saltarem de páginas onde todos só enxergam números e letras.

O mestre também era menino. Entre as conversas infindáveis em reuniões de pauta, que muitas vezes faziam mergulhos técnicos, havia o espaço para imitações, brincadeiras, um jeito de falar quase caipira, que todos sabiam decodificar e cair na gargalhada. Riba era inteligência rara, alegria e generosidade.

Quando deixei o Valor e segui para o Estadão, lembro de entrar na sala de reunião de pauta do novo jornal com a insegurança natural de qualquer um que começa em um novo trabalho. Mas lá estava o nome de Ribamar Oliveira pendurado na parede, uma homenagem do Prêmio Esso de Economia que recebeu em 1997 pela reportagem "O escândalo dos precatórios". Me senti mais acolhido.

O grande João Domingos, lembra que foi Ribamar que descobriu o escândalo do caixa 2. "Ele começou a publicar aquelas matérias em economia, juntando informações e revelando que os governos estaduais estavam fraudando os precatórios. Então, soube que eu ia fazer uma viagem para Alagoas e pediu que eu olhasse a situação por lá. Procurei o Collor e perguntei sobre o decreto. Collor disse que nunca tinha assinado aquilo na vida. A reportagem acabou descobrindo que tinha sido falsificado um ato do presidente da República. Toda imprensa entrou no assunto", disse João.

Cético nas apurações, Riba dava espaço para a fé quando o assunto era seu time. Santista fanático, chegava a rezar quando o clube paulista ia entrar em campo. "Uma vez peguei ele rezando atrás da casa, quando o Santos ia enfrentar o meu Goiás", conta João Domingos.

Nos últimos anos, além do tempo dedicado ao jornalismo, Riba dividia o tempo que tinha com uma chácara em Pirenópolis. Passava horas na casa que mandou erguer no interior de Goiás, regando suas plantas.

Ribamar se formou em jornalismo pela Universidade de Brasília (UnB) e passou pelos principais jornais e revistas do país. Foi chefe de redação da sucursal de "O Globo" em Brasília, repórter do "Jornal do Brasil" e coordenador de economia, repórter especial e colunista do Estadão. Trabalhou ainda nas revistas "Veja" e "Isto é" e foi assessor de imprensa do Ministério do Planejamento em 1994 (ano de lançamento do Plano Real), além de assessor de imprensa do Banco Central.

Seu trabalho nas colunas do Valor foi interrompido há quase 50 dias, quando foi internado após contrair o vírus da covid-19. Não havia dúvidas de que sairia dessa. Riba ama a família e a vida como ninguém. Nestes quase dois meses, troquei muitas mensagens com Lilian, sua esposa e amiga. Generosa, mandava informações frequentes sobre o quadro de sua saúde. Riba estava na UTI, em uma série de altos e baixos. Em alguns dias, acordava melhor. Em outros, algo se agravava. Na semana passada, chegou a apresentar um quadro melhor, mas depois a situação piorou.

Aos 67 anos, vítima da covid-19, Ribamar se foi. A família, em respeito aos protocolos de segurança e de isolamento sempre defendidos por Riba durante toda a pandemia, decidiu que não haverá velório e que seu corpo será cremado, como era sua vontade. Riba deixa um legado incomensurável, fruto de seu profissionalismo e dedicação, paixão pelo jornalismo, amor pela vida, pelos amigos e, principalmente, por sua família, a esposa, Lílian, e os filhos Júlia, Valentina e Ricardo. Vai em paz, Ribão. Obrigado por tudo.

VEJA NOTAS DE PESAR:

Banco Central

O Banco Central expressa profundo pesar pelo falecimento do jornalista Ribamar Oliveira, cuja excelência e a seriedade do trabalho serviu como exemplo a todos nesta instituição em seu período como Assessor de Imprensa. Foi uma honra contar com o profissionalismo de Ribamar no trabalho de bem informar a sociedade sobre as atividades do Banco Central. No jornalismo, sua ausência será sentida por todos os colegas. Expressamos nossa solidariedade com a família e seus amigos neste momento de dor.

Henrique Meirelles, secretário de Fazenda de SP e ex-ministro da Fazenda

Ribamar foi um dos maiores jornalistas de economia do Brasil, grande conhecedor das contas públicas. É uma perda enorme para o jornalismo e para os que tiveram o privilégio de serem entrevistados por ele.

Marcelo Ramos (PL-AM), vice-presidente da Câmara dos Deputados

Quero registrar com pesar o falecimento do jornalista Ribamar Oliveira, do Valor Econômico, repórter especial de Economia e Política que em muitos momentos esteve aqui em convivência conosco, cobrindo vários momentos importantes desta Casa. Em nome do Congresso Nacional, do presidente Rodrigo Pacheco, em meu nome, quero registrar o pesar e minha solidariedade. Que Deus conforte o coração da família, amigos e de toda a equipe do Valor Econômico.

Ministério da Economia

O Ministério da Economia lamenta falecimento do jornalista Ribamar Oliveira.

O colunista do jornal Valor Econômico era conhecido pelo alto nível técnico, seriedade na apuração, ética e dedicação à cobertura econômica.

O Ministério da Economia recebeu com muita tristeza a notícia da morte do jornalista Ribamar Oliveira. O colunista do jornal Valor Econômico era conhecido pelo alto nível técnico, seriedade na apuração, ética e bom humor. A trajetória premiada e o reconhecimento dos colegas e dos técnicos da equipe econômica refletem a carreira de sucesso dedicada à cobertura econômica. O Ministério lamenta a perda e se solidariza com a família e amigos.

Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente do Senado

No trabalho como especialista em contas públicas, ler tudo que o Ribamar escrevia era mandatório. Na IFI, recebemos seu apoio desde o primeiro dia, em 2016. Lembro-me de que ele prestigiou minha sabatina no Senado e sempre estava aberto a repercutir nossos estudos e análises. Passamos a conversar muito desde então. Ribamar colaborou em episódios centrais da vida nacional ao jogar luz sobre as contas públicas e o orçamento. Sua partida é triste e deixa uma lacuna no jornalismo econômico que dificilmente será preenchida. Além de tudo, um amigo leal.

Isaac Sidney, presidente da Federação Brasileira de Bancos

Tive o privilégio de conhecer e conviver com o jornalista Ribamar Oliveira quando trabalhávamos no Banco Central do Brasil. No convívio cotidiano, o profissional sério, dedicado e sempre correto, mostrou-se ainda uma pessoa única, bem humorada e afetuosa.

Em nome da FEBRABAN, lamentamos profundamente a morte do jornalista e amigo, mais uma vítima da Covid-19. O jornalismo brasileiro, especialmente as páginas econômicas, perde uma referência e um exemplo de qualidade e excelência. Nós, leitores, deixamos de ter o conteúdo elegante, consistente, sempre de fácil leitura, de suas colunas e matérias.

Perde o país, pois profissionais da sua estatura são fundamentais para tornar menos árido e mais compreensível esse universo complexo que é a economia. Externamos aqui nossa sincera tristeza à esposa, aos filhos e aos colegas e amigos do Ribamar Oliveira, para sempre Riba.

Ministra Ana Arraes, presidente do TCU

O Tribunal de Contas da União (TCU) lamenta profundamente a morte do jornalista Ribamar Oliveira, do Valor Econômico, e se solidariza com a dor da família e dos amigos. Ribamar construiu uma carreira respeitada, balizada por altos padrões éticos e pela defesa intransigente de princípios democráticos na comunicação e na vida do país.

Como jornalista de economia, participou da moderação de eventos no tribunal, a exemplo do Seminário dos 15 anos da Lei de Responsabilidade Fiscal, e desenvolveu matérias e artigos importantes para a compreensão de fatos de repercussão nacional. A imprensa, a partir de hoje, está desfalcada de um grande profissional.

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O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou na noite deste domingo, 20, esperar que Rússia e Ucrânia farão um acordo "nesta semana". "Ambos começarão a fazer grandes negócios com os Estados Unidos, que está prosperando, e farão uma fortuna", escreveu na rede social Truth Social.

A declaração foi feita em meio a um cessar-fogo de Páscoa marcado por acusações de violação de ambos os lados.

Ainda na rede social, o republicano citou o "Dia da Libertação", como batizou 2 de abril que foi a data em que anunciou uma série de tarifas.

Segundo ele, muitos líderes mundiais e executivos de empresas pediram alívio das imposições tarifárias desde a ocasião. "É bom ver que o mundo sabe que estamos falando sério, porque ESTAMOS! Eles devem corrigir os erros de décadas de abuso, mas isso não será fácil para eles", reforçou ao chamar quem quiser "o caminho mais fácil" para "construir na América".

Ele classificou como "traição não tarifária" questões que chamou de "manipulação cambial", subsídios para exportação, padrões agrícolas protecionista citando como exemplo a proibição de milho geneticamente modificado na União Europeia, entre outros.

Trump também voltou a criticar a discussão a respeito da deportação de Kilmar Armando Abrego Garcia, que foi deportado por engano para uma prisão em El Salvador.

Embora o governo do republicano tenha admitido um "erro administrativo", o republicano disse que Garcia está sendo tratado como uma "pessoa muito doce e inocente, o que é uma mentira total, flagrante e perigosa", voltando a citar sua ligação com a gangue MS-13. Os advogados de Garcia negam.

O presidente do Chile, Gabriel Boric, condenou o ataque feito à usina hidrelétrica Rucalhue, que está sendo construída no rio Biobío, na região centro-sul do país, na madrugada deste domingo, 20, quando 52 veículos foram incendiados no local.

"Assim como fizemos em outros casos, perseguiremos e encontraremos os responsáveis que deverão responder perante a justiça. Continuaremos trabalhando sem recuar para erradicar todas as formas de violência", disse o mandatário em publicação na rede social X.

De acordo com o adido de Polícia do Chile, Renzo Miccono, indivíduos armados invadiram a localidade por volta das 2h30 da madrugada, ameaçaram quatro guardas de segurança e depois atearam fogo a máquinas.

O empreendimento terá 90 megawatts (MW) de capacidade e enfrenta resistência de povos originários locais e de ambientalistas. No último dia 03 de abril, a Corte de Apelações de Concepción negou dois recursos que pediam a paralisação das obras.

De acordo com a Associated Press, a região do Biobío já havia sido palco de outro ataque incendiário no último dia 7 de abril, quando duas residências e um galpão foram destruídos. Segundo autoridades, o ataque foi reivindicado pela Resistência Mapuche Lafkenche (RML).

A empresa responsável pelo projeto, Rucalhue Energía SpA, controlada da China International Water & Electric Corp (CWE), afirmou que está colaborando com as autoridades para encontrar os responsáveis e reforçar as medidas de segurança.

"Por sorte, não houve feridos graves. No entanto, os danos materiais são significativos. Uma avaliação completa das perdas está sendo feita", disse a companhia em comunicado, acrescentando que o projeto segue toda a regulamentação ambiental, social e técnica.

*Com informações da Associated Press.

O Exército de Israel afirmou que errou ao matar 15 socorristas na Faixa de Gaza. De acordo com relatório sobre o incidente, que ocorreu em 23 de março, foram identificadas "várias falhas profissionais, violações de ordens e uma falha em relatar completamente o incidente", informou a autoridade militar neste domingo, 20.

Na ocasião, uma ambulância em busca de pessoas feridas por um ataque aéreo israelense foi alvo de tiros em um bairro na cidade de Rafah, que fica na fronteira com o Egito. Quando outras ambulâncias chegaram para procurar a equipe desaparecida, também foram alvo de tiros.

"A investigação determinou que o fogo nos dois primeiros incidentes resultou de um mal-entendido operacional pelas tropas, que acreditavam enfrentar uma ameaça tangível por parte das forças inimigas", disse o exército israelense em referência a um possível veículo policial do Hamas.

Israel disse que demitiu o comandante adjunto do Batalhão de Reconhecimento Golani, por fornecer "um relatório incompleto e impreciso durante o debriefing" e repreendeu o oficial comandante da 14ª Brigada, citando sua responsabilidade geral.

Para Jonathan Whittall, chefe do escritório humanitário das Nações Unidas em Gaza e na Cisjordânia, a investigação militar israelense careceu de responsabilização. "Corremos o risco de continuar assistindo a atrocidades se desenrolarem, e as normas destinadas a nos proteger, se erodindo". Fonte: Dow Jones Newswires.