Aviso: Ministro da Defesa ameaça e condiciona eleições de 2022 ao voto impresso

Política
Tipografia
  • Pequenina Pequena Media Grande Gigante
  • Padrão Helvetica Segoe Georgia Times

Atenção senhor (a) editor (a):

Esta matéria foi originalmente publicada pelo Estadão no dia 22/07/2021.

No último dia 8, uma quinta-feira, o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), recebeu um duro recado do ministro da Defesa, Walter Braga Netto, por meio de um importante interlocutor político. O general pediu para comunicar, a quem interessasse, que não haveria eleições em 2022, se não houvesse voto impresso e auditável. Ao dar o aviso, o ministro estava acompanhado de chefes militares do Exército, da Marinha e da Aeronáutica.

O presidente Jair Bolsonaro repetiu publicamente a ameaça de Braga Netto no mesmo 8 de julho. "Ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições", afirmou Bolsonaro a apoiadores, naquela data, na entrada do Palácio da Alvorada.

A portas fechadas, Lira disse a um seleto grupo que via aquele momento com muita preocupação porque a situação era "gravíssima". Diante da possibilidade de o Congresso rejeitar a proposta de emenda à Constituição que prevê o voto impresso - ainda hoje em tramitação numa Comissão Especial da Câmara -, Bolsonaro subia cada vez mais o tom.

Em transmissão ao vivo nas redes sociais, no dia 6 de maio, o presidente já dizia, sem apresentar provas, que o atual sistema de urna eletrônica permite fraude. "Vai ter voto impresso em 2022 e ponto final. Não vou nem falar mais nada. (...) Se não tiver voto impresso, sinal de que não vai ter a eleição. Acho que o recado está dado", afirmou Bolsonaro. O que não se sabia, àquela altura, é que o presidente contava com o apoio da cúpula militar para suas investidas autoritárias.

Lira considerou o recado dado por Braga Netto como uma ameaça de golpe e procurou Bolsonaro. Teve uma longa conversa com ele, no Palácio da Alvorada. De acordo com relatos obtidos pelo Estadão, o presidente da Câmara disse ao chefe do Executivo que não contasse com ele para qualquer ato de ruptura institucional. Líder do Centrão, bloco que dá sustentação ao governo no Congresso, Lira assegurou que iria com Bolsonaro até o fim, com ou sem crise política, mesmo se fosse para perder a eleição, mas não admitiria golpe.

Bolsonaro respondeu que nunca havia defendido um golpe. Afirmou, ainda, que respeitava "as quatro linhas da Constituição", como sempre costuma dizer em público. Lira rebateu, observou que o emissário havia sido muito claro ao dar o alerta e avisou o presidente de que a Câmara não embarcaria em nada que significasse rompimento com a democracia.

Sigilo

O recado dos militares e a reação de Lira são de conhecimento de um restrito grupo da política e do Judiciário com quem o Estadão conversou nas últimas duas semanas. Pela delicadeza do tema, todos pediram para manter os relatos sob sigilo. Desde segunda-feira o Estadão vem procurando o Ministério da Defesa, mas não obteve respostas para os questionamentos.

"A conversa que eu soube é que o ministro da Defesa disse a um dirigente de partido: 'A quem interessar, diga que, se não tiver eleição auditável, não terá eleição'. Teve um momento de muita tensão. Não foi brincadeira, não", descreveu um dos envolvidos no assunto, sob a condição de anonimato.

Um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) a par dos diálogos avaliou que o comando militar procurou repetir agora o episódio protagonizado pelo então comandante do Exército, Eduardo Villas Bôas, que, em post com 239 caracteres publicado no Twitter no dia 3 de abril de 2018, tentou constranger a Corte para que não fosse concedido um habeas corpus ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

No dia do julgamento que poderia pôr o petista em liberdade, Villas Bôas escreveu nas redes sociais que o Exército brasileiro julgava compartilhar "o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade" e se mantinha "atento às suas missões institucionais". O Supremo manteve Lula preso. De volta à arena política, o petista é hoje o principal adversário de Bolsonaro para as eleições de 2022.

"Os militares estão tentando fazer uma ameaça, mas, no fundo, ninguém está com medo deles. O Arthur (Lira) passou um recado duro. Disse que é parceiro até para perder eleição, mas não para aventura, para ruptura", confidenciou um magistrado. Para ministros do Supremo, a ameaça de golpe não passa de um blefe para tentar evitar a investigação de militares pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid.

Comissão

Na prática, a escalada da crise política que culminou com a ameaça dos militares foi motivada por um episódio. Na última semana de junho, os ministros do Supremo Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes haviam se reunido com dirigentes de 11 partidos. As conversas reverteram a tendência de aprovação do voto impresso na Câmara.

Os encontros ocorreram após o Estadão publicar uma enquete mostrando que, ao contrário do que se imaginava, a proposta do voto impresso seria aprovada pela Comissão Especial que analisa o tema. A influência dos ministros nessa reviravolta partidária fez Bolsonaro partir para o ataque contra Barroso, atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), chamado por ele de "imbecil" e "idiota".

Além disso, ao mesmo tempo em que o principal projeto de Bolsonaro para obter o segundo mandato era desmontado, a CPI da Covid enveredou por um caminho que apura o possível envolvimento de um núcleo fardado em esquemas de corrupção nas negociações para compra de vacinas pelo Ministério da Saúde. O movimento de apontar o dedo para os militares foi reforçado pelo presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), para quem as Forças Armadas têm um "lado podre".

A resposta veio no dia 7 de julho, 24 horas antes da ameaça feita por Braga Netto. "As Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano", dizia nota assinada pelo ministro e pelos comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, em repúdio a Aziz. Foi também naquele dia que Roberto Ferreira Dias, ex-diretor do Departamento de Logística do Ministério da Saúde e ex-sargento da Aeronáutica, foi preso pela CPI. Os senadores agora querem convocar Braga Netto, após o recesso parlamentar, para explicar a nota à comissão.

Não foi à toa que Lira fez uma série de posts nas redes sociais em defesa da democracia. Sabe-se agora que foi sua forma de registrar o que havia afirmado para Bolsonaro. Foi também nesse contexto que o tema semipresidencialismo entrou de vez na agenda da Câmara. Lira conversou com o deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) e pediu que ele acelerasse a coleta de assinaturas para a emenda que pode instituir o novo sistema de governo no País. Para tramitar, a proposta precisa de 171 assinaturas. Adotado em países como França e Portugal, o modelo tira poderes do presidente.

Afinidade

Braga Netto assumiu a Defesa após Bolsonaro demitir o ministro Fernando Azevedo e Silva, e toda a cúpula militar, na esteira da tentativa de politização das Forças Armadas. À saída, Azevedo disse em nota que as Forças não compartilhavam com atitudes inconstitucionais.

Foi a afinidade entre Bolsonaro e Braga Netto que levou o general para a Defesa. Antes, ele comandava a Casa Civil. Seu sucessor e padrinho de indicação, general Luiz Eduardo Ramos - hoje de saída da pasta - tem defendido publicamente o voto auditável para dar "mais transparência à eleição e fortalecer a democracia".

O comandante da Aeronáutica também. No último dia 7, o brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior curtiu um post no qual um internauta pedia intervenção das Forças Armadas para aprovar esse sistema. "Comandante, obrigado pelo canal de comunicação. Precisamos do voto impresso auditável. Vocês precisam impor o voto auditável", dizia a mensagem.

Em outra categoria

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, reafirmou seu apoio ao secretário da Defesa, Pete Hegseth após o The New York Times reportar que ele havia compartilhado planos militares para o ataque ao Iêmen em grupo com familiares no aplicativo de mensagens Signal.

Anteriormente, a revista The Atlantic havia publicado que o seu editor-chefe Jeffrey Goldberg havia sido incluído por engano em outro grupo do Signal, em que a cúpula da Casa Branca discutia a ofensiva contra os rebeldes houthis.

As autoridades americanas negam que as informações compartilhadas por Pete Hegseth fossem confidenciais enquanto reforçam o seu apoio ao secretário de Defesa, atribuindo as notícias a ex-funcionários insatisfeitos com as mudanças no Pentágono.

Ao falar com repórteres no gramado da Casa Branca, onde participava das celebrações de Páscoa, Trump reafirmou a confiança em Hegseth e minimizou as preocupações sobre o vazamento de planos militares como "perda de tempo".

"Ele está fazendo um excelente trabalho. Perguntem aos houthis como ele está se saindo", disse o presidente, referindo-se ao grupo rebelde, que é apoiado pelo Irã e foi alvo dos ataques dos Estados Unidos.

De acordo com o NYT, o secretario de Defesa americano compartilhou detalhes sobre os ataques em 15 de março, antes que os bombardeios fossem lançados, em grupo que incluía a mulher, o irmão e o advogado pessoal de Pete Hegseth.

Os detalhes compartilhados no grupo eram essencialmente os mesmos que Hegseth enviou, no mesmo dia, em outro grupo do Signal que, por engano, incluía o editor da revista The Atlantic.

Pete Hegseth se mostrou furioso com a matéria do NYT, que atribuiu a "difamações anônimas de ex-funcionários descontentes sobre notícias antigas".

Ao chegar para as celebrações de Páscoa com a família, ele apontou para os repórteres e os chamou de "farsantes". Na sequência, se voltou para os filhos pequenos, que estavam ao fundo. "Essas crianças aqui, são o motivo pelo qual estamos lutando contra a mídia de notícias falsas", disse.

Em resposta às críticas do governo, um porta-voz disse que o NY Times tem confiança na precisão da reportagem e destacou que o Pentágono "não negou a existência do grupo de mensagens".

Embora as autoridades americanas tenham insistido que nenhuma informação confidencial foi compartilhada no grupo, o NY Times disse que isso não vem ao caso porque a sua reportagem "não caracterizou a informação como confidencial".

Trump e Hegseth conversaram por telefone na noite de domingo. Segundo uma fonte informada sobrea a ligação, o presidente disse ao seu secretário que "delatores ressentidos" seriam culpados pela reportagem e reafirmou que o apoiava.

Essa ideia de que delatores ressentidos estariam por trás da reportagem foi reforçada pela secretária de imprensa da Casa Branca Karoline Leavitt em entrevista ao Fox & Friends, programa da Fox News que era apresentado por Pete Hegseth. "É isso que acontece quando todo o Pentágono está trabalhando contra você e contra as mudanças monumentais que você está tentando implementar", disse. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)

Dos peronistas ao libertário Javier Milei, o papa Francisco teve relações tensas com presidentes da Argentina. Alvo da politização, ele acabou se distanciado do seu país de origem e morreu sem nunca ter retornado a Buenos Aires.

A disputa envolvendo o líder católico ganhou novos contornos quando Javier Milei o insultou como "imbecil" e "representante do maligno na Terra" durante as eleições. O libertário, contudo, não foi o único líder argentino a criticar o papa, que tinha relações delicadas com a política.

Embora tenha recebido todos os presidentes no Vaticano, Francisco morreu sem ter visitado a Argentina enquanto papa por temer que o seu retorno fosse usado politicamente - por um lado ou pelo outro.

Relação com presidentes argentinos

A relação espinhosa do papa com a política argentina vem de muito antes de Javier Milei.

O casal Néstor e Cristina Kirchner considerava Francisco o "líder espiritual da oposição". Os peronistas chegaram a acusá-lo de colaborar com a ditadura militar argentina entregando padres para o regime - denúncia que nunca ficou comprovada.

Depois que o arcebispo de Buenos Aires Jorge Bergoglio se tornou o papa Francisco, em 2013, a então presidente Cristina Kirchner foi aconselhada por aliados a rever sua posição e pediu desculpas. "Achei que você fosse outra coisa", teria dito Cristina em encontro com o pontífice.

Ela foi recebida pelo papa quatro vezes e foi atrás de Francisco durante as suas visitas ao Brasil, Paraguai e Cuba. Mas o uso político da aproximação por parte de Cristina Kirchner desagradou o pontífice, segundo reportou o Clarín. Depois disso, a relação voltaria a se desgastar.

Já com Mauricio Macri, o desgaste começou quando ele ainda era prefeito de Buenos Aires. O líder católico havia apoiado a candidatura do bispo Joaquín Piña que conseguiu barrar, na constituinte da província de Misiones, a reeleição indefinida do governador peronista Carlos Rovira. E esperou, em retribuição, que Macri apelasse contra a decisão que abriu caminho para o casamento entre pessoas do mesmo sexo na Argentina, o que não aconteceu.

Durante a presidência de Mauricio Macri, a Argentina deu mais um passo nas reformas progressistas: o início das discussões no Congresso sobre a legalização do aborto. Apesar do desgaste com o papa Francisco, que enfrentava a pressão dos setores mais conservadores da Igreja Católica, eles mantiveram as relações no nível institucional.

No caso de Alberto Fernández, a relação foi afetada pela legalização do aborto, concluída durante o seu período na Casa Rosada. De acordo com o Clarín, o pontífice também teria se incomodado com a estratégia de Fernández, que assim como sua vice-presidente Cristina Kirchner, tentou explorar politicamente as relações o papa.

Milei, por sua vez, atacou o líder católico antes de chegar à presidência. Depois de eleito, ele participou da missa de canonização de Mama Antula, a primeira santa da Argentina, e foi recebido pelo papa Francisco.

A relação foi apaziguada, mas eles mantiveram profundas discordâncias sobre o papel do Estado. O libertário Javier Milei promove um duro ajuste fiscal, que atinge principalmente os mais pobres na Argentina, enquanto o papa Francisco se dedicou à defesa dos vulneráveis.

"O Estado, hoje mais importante do que nunca, é chamado a exercer esse papel central de redistribuição e justiça social", disse o papa, um mês após receber Milei no Vaticano.

Francisco também criticou a repressão do governo aos protestos na Argentina. "Me mostraram as imagens da repressão, onde a polícia reprimiu os trabalhadores que exigiam os seus direitos nas ruas como se fossem desordeiros. Em vez de gastarem com justiça social, gastam na compra de gás de pimenta", disse após encontro com representantes dos movimentos sociais.

Embora na Argentina o Estado e a Igreja estejam separados, os vínculos sempre foram muito estreitos. Até a reforma constitucional de 1994, ser católico era requisito para assumir a presidência. Nesse contexto, o papa se viu no meio da polarização e das discussões em torno do peronismo.

"Nunca fui filiado, militante ou simpatizante do peronismo. Afirmar isso é uma mentira. Meus escritos sobre justiça social levaram a dizerem que sou peronista. Mas, na hipótese de ter uma concepção peronista da política, o que haveria de errado nisso?", questionou o papa sobre as acusações dos críticos de vínculos com o peronismo.

"Na Argentina, o papa era visto com um perfil de esquerda, e a direita mais liberal não gostava dele", explicou o biógrafo Sergio Rubín, coautor de O jesuíta (2013) e O Pastor (2023).

A disputa acabou afastando o papa, que nunca voltou a Buenos Aires. O papa Francisco chegou a dizer que gostaria de visitar à Argentina, mas não queria que a sua passagem pelo país fosse "usada nem para um lado, nem para o outro", expressando a preocupação com a politização de sua imagem.

Reações à morte do papa Francisco

Agora, enquanto o mundo dá adeus ao papa Francisco, os líderes políticos da Argentina deixam as desavenças com o líder católico para trás.

"Apesar das diferenças que hoje parecem pequenas, foi uma verdadeira honra para mim ter podido conhecê-lo em sua bondade e sabedoria", escreveu Javier Milei ao lamentar a morte. O presidente decretou luto oficial de sete dias e vai a Roma para a despedida do papa.

Por sua vez, Cristina Kirchner disse que ele era o "rosto de uma Igreja mais humana, com os pés na terra e o olhar fixo no céu", lembrando do primeiro encontro que teve com o papa Francisco.

O caráter humanitário do pontífice também foi destacado por Alberto Fernández. "A Igreja deveria apoiar os despossuídos, os marginalizados e os perseguidos. A Igreja deveria abraçar aqueles que foram condenados a ser minorias ou perseguidos em suas terras. A Igreja deveria levantar sua voz contra aqueles que acumulam riqueza e distribuem pobreza. No entanto, a Igreja só conseguiu fazer isso quando Francisco, o jesuíta, era o papa", escreveu nas redes sociais.

Lembrando o seu último encontro com o papa Francisco, acompanhado da mulher e das filhas, Mauricio Macri disse: "Tenho a imagem daquele dia e também de Francisco como um homem religioso de estatura inigualável, um político severo e, principalmente, um bom pastor. Sua vida foi marcada pelos ensinamentos que transmitiu com suas palavras, seu compromisso e seus gestos. Ele mesmo, com sua trajetória, é uma lição para todos nós".

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, disse nesta segunda-feira, 21, que há uma "boa chance" de que a Rússia e a Ucrânia cheguem a um acordo nesta semana para acabar com a guerra. O conflito já dura três anos.

"Há uma boa chance", declarou Trump quando perguntado se ele achava que Moscou e Kiev poderiam selar um acordo até sexta-feira, acrescentando que teve boas reunião com os dois lados.

Durante o evento anual Easter Egg Roll realizado na Casa Branca, o republicano também disse que teve "reuniões muito boas sobre o Irã" e expressou confiança de que uma solução comercial seria alcançada com a União Europeia. "No final das contas, teremos um acordo com qualquer um", afirmou ele.