Bolsonaro recua na política do orçamento secreto

Política
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Ao vetar a previsão de emendas de relator-geral do orçamento na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) do ano de 2022, o presidente Jair Bolsonaro recuou da política do orçamento secreto, denunciada em série de reportagens do Estadão desde maio. Criadas em projeto de lei de iniciativa do governo para a LDO de 2020, essas emendas, identificadas no orçamento sob o código RP-9, vêm sendo usadas pelo governo para cortejar deputados e senadores aliados com repasses do orçamento geral da União a municípios e Estados de seus redutos eleitorais, sem que seus nomes sejam divulgados, diminuindo a possibilidade de controle social. Só entre 2020 e 2021 o orçamento autorizado de RP-9 soma R$ 39 bilhões, mais do que um ano de Bolsa Família.

O governo informou, em nota à imprensa, que já havia vetado o dispositivo do RP-9 em anos anteriores. Deixou de mencionar, porém, que o presidente Jair Bolsonaro, depois de vetar a emenda de relator-geral na LDO de 2020, enviou ao Congresso um projeto de lei para criar a emenda de relator-geral do orçamento, por iniciativa do então ministro da Secretaria de Governo da Presidência da República, Luiz Eduardo Ramos, conforme revelou o Estadão.

Além do RP 9, o governo também barrou as emendas de comissão (RP 8) e, principalmente, o fundo eleitoral de R$ 5,7 bilhões - no lugar, deve propor um fundão eleitoral com valor reduzido.

Os vetos ainda podem ser derrubados pelo Congresso Nacional, em tese. O que poderia levar o Congresso a derrubar o veto do RP-9 é que o Centrão e até deputados da oposição fechados com o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), se acostumaram com as emendas extras. Procurados pela reportagem, os líderes do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO), e na Câmara, Ricardo Barros (Progressistas-PR), não responderam se vão se empenhar nas articulações para impedir a derrubada do veto.

Como o Estadão tem demonstrado, a base do governo é montada em torno do orçamento secreto, que influenciou a própria eleição das presidências da Câmara e do Senado. Além de atropelarem as leis orçamentárias, as emendas de relator-geral multiplicaram a verba que parlamentares influentes podem destinar aos locais que os elegeram.

As emendas individuais, previstas na Constituição, permitem R$ 16 milhões por ano, sendo que 50% são de destinação livre e a outra metade deve ser usada na área da saúde. Já com o orçamento secreto, a situação é outra. O Estadão mostrou que, em dezembro de 2020, o então presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), obteve o empenho de R$ 277 milhões, somente no âmbito do Ministério do Desenvolvimento Regional, para destinos que o próprio parlamentar escolheu. Existe uma dúvida agora sobre como vai ser a reação se essa fonte orçamentária secar.

Das múltiplas críticas feitas ao orçamento secreto e às suas consequências para o país, o governo Jair Bolsonaro escolheu apenas duas para justificar o veto às emendas de relator-geral. No comunicado à imprensa sobre a medida, o governo disse que elas atrapalham a política fiscal e podem "prejudicar a condução e execução efetiva de políticas públicas sob responsabilidades de cada Pasta", ao engessar a despesa dos ministérios, diminuindo os recursos que cada pasta pode escolher como executar.

Esse é um problema que foi apontado em análises da Secretaria de Macroavaliação Governamental do Tribunal de Contas da União (TCU), de renomados juristas e economistas ouvidos pelo Estadão, bem como de entidades da organização civil, como o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). Mas não é o único. Há desequilíbrio no jogo democrático, e o esquema pode configurar crime de responsabilidade do presidente Jair Bolsonaro.

As emendas de relator-geral têm servido para parlamentares enviar repasses para estados diversos daqueles que os elegeram, bem como para a contratação de empresas ligadas a políticos, em franco descumprimento a Leis Orçamentárias. A quase totalidade dos recursos é destinada a aliados do governo, no que é o maior exemplo do uso do orçamento para compra de apoio.

O orçamento secreto foi comparado aos Anões do Orçamento. Para não revelarem os privilégios obtidos, senadores alegaram até risco à segurança do Estado, ao se recusarem a prestar informações sobre as verbas que puderam indicar no orçamento secreto.

No ministério preferencial para destinação das emendas de relator-geral, o do Desenvolvimento Regional, a compra de tratores virou mania entre parlamentares e o orçamento secreto bancou a compra de máquinas com superfaturamento e a celebração de convênios com sobrepreço. O ministério admitiu que os ofícios que baseavam a destinação de recursos não eram públicos, contrariando o ministro Rogério Marinho, que também direcionou repasses dentro do orçamento secreto.

Do orçamento de 2021, o governo até agora empenhou R$ 4,4 bilhões do total de R$ 16,5 bilhões nas emendas de relator-geral e pagou R$ 2,6 bilhões - sendo R$ 2,1 bilhões na Saúde. Ainda resta a maioria dos valores, que o governo já acordou com o Congresso para dividir. Ao todo, são R$ 11 bilhões para a Câmara e R$ 5 bilhões para o Senado.

Partidos acionaram o Supremo Tribunal Federal (STF) para barrar orçamento secreto. Enquanto as ações não são julgadas no STF, o Tribunal de Contas da União já apontou que "a realidade identificada não reflete os princípios constitucionais, as regras de transparência e a noção de accountability" e recomendou ao governo transparência. Ainda estão em andamento, no TCU, diversos processos que aprofundarão a análise sobre as denúncias de ilegalidades no orçamento secreto e de sobrepreço no Ministério do Desenvolvimento Regional e na Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba (Codevasf). O governo mudou regra no Orçamento de 2021 em tentativa de impedir as ilegalidades manifestas, mas segue sem dar transparência às informações.

Ao Estadão, a professora e procuradora do Tribunal de Contas de São Paulo, Elida Graziane, disse que os vetos à expansão do fundo eleitoral e às emendas parlamentares que perfazem o orçamento secreto não trazem efetiva garantia de que a questão foi superada.

"O Congresso pode derrubar os vetos e manter a tendência de captura opaca e subjetiva na liberação dos recursos, sobretudo porque o que está em pauta é a disponibilidade paroquial de recursos para impactar as eleições de 2022. Falta-nos resgatar a aderência do orçamento ao planejamento setorial das políticas públicas, pois somente assim será possível haver qualidade do gasto público", disse Graziane.

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A comitiva de autoridades que acompanhará o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na viagem à Rússia contará com a participação do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), e do vice-presidente da Câmara Elmar Nascimento (União-BA). Além disso, também contará com os ministros das Relações Exteriores, Mauro Vieira, de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e de Ciência e Tecnologia, Luciana Santos, e o assessor-chefe da Assessoria Especial, embaixador Mauro Vieira, de acordo com lista divulgada pelo Palácio do Planalto.

Esta será a terceira viagem feita por Lula da qual Alcolumbre participará. Os dois já estiveram juntos na comitiva que viajou ao Japão, em março, e à Itália para o velório do papa Francisco, em abril.

O início da viagem está previsto para esta terça-feira, 6, à noite, quando Lula partirá de Brasília às 22h rumo a Casablanca. A chegada do chefe do Executivo brasileiro à Rússia é esperada para quarta-feira, 7.

No país, o petista participará da celebração dos 80 anos do "Dia da Vitória", quando os russos celebram a vitória da União Soviética sobre a Alemanha nazista na segunda guerra mundial. Ainda, terá encontros bilaterais com o presidente Vladimir Putin e com o primeiro-ministro da Eslováquia, Robert Fico.

Na reunião com Putin, Lula deve fazer uma menção à questão da necessidade de reequilibrar a balança comercial entre Brasil e Rússia. "Nós importamos dois produtos que são fundamentais, fertilizantes são fundamentais até para o nosso setor exportador, e diesel também, mas nós queremos ampliar as nossas exportações para a Rússia", disse o secretário de Ásia e Pacífico, embaixador Eduardo Paes Saboia.

O ministro da Defesa do Paquistão, Khawaja Asif, alertou nesta terça-feira, 6, para um possível conflito "inevitável" com a Índia, motivado pela disputa por recursos hídricos e por um ataque que matou sete soldados paquistaneses e foi atribuído por autoridades paquistanesas aos indianos. As informações são da imprensa local.

Segundo um canal de TV do país, Asif afirmou que um confronto com a Índia está próximo. "Foi dito no briefing de hoje que a agressão da Índia é esperada", declarou. Ele também teria ameaçado retaliar caso o governo indiano bloqueie o fluxo de água destinado ao Paquistão.

"Se os governantes indianos tentarem bloquear a água do Paquistão, eles vão se afogar nela", disse Asif, segundo a mídia local. O ministro ainda teria afirmado que o país está pronto para destruir qualquer estrutura construída pela Índia no rio Indo.

As declarações vieram poucas horas após um atentado no sudoeste do Paquistão. Uma bomba caseira atingiu um veículo militar no distrito de Kachhi, matando sete soldados. O Exército paquistanês responsabilizou o grupo armado Baloch Liberation Army (BLA), que, segundo o Paquistão, teria ligações com a Índia, que nega. A Al Jazeera observou que não há evidências públicas dessa conexão, e nem o BLA nem o governo indiano comentaram as acusações.

O presidente Asif Ali Zardari e o primeiro-ministro Shehbaz Sharif condenaram o ataque e elogiaram o sacrifício das forças de segurança. A tensão aumentou ainda mais depois que o premiê indiano, Narendra Modi, anunciou que a Índia passará a reter águas antes compartilhadas com o Paquistão. "Antes, a água da Índia também ia para fora. Agora, a água da Índia fluirá para sua parte... e será utilizada pela própria Índia", disse Modi, segundo a Reuters.

O Paquistão já havia advertido que qualquer interferência em seus rios seria vista como um "ato de guerra", conforme reportou a France 24. O tratado de 1960, que garantia ao Paquistão o uso de 80% da água para fins agrícolas, foi suspenso por Nova Délhi após um ataque terrorista na Caxemira indiana, atribuído a militantes ligados ao Paquistão.

*Com informações da Associated Press

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, conversou por telefone nesta terça-feira, 6, com o premiê de Israel, Benjamin Netanyahu, e os líderes discutiram aspectos da situação atual no Oriente Médio, além de "algumas questões bilaterais urgentes", de acordo com uma mensagem russa enviada via Telegram.

Hoje, o líder russo também conversou com o presidente da República Islâmica do Irã, Masoud Pezeshkian, sobre questões relativas ao desenvolvimento da cooperação entre os dois países com base no Tratado Bilateral de Parceria Estratégica Abrangente, assinado durante uma visita oficial do presidente iraniano à Rússia em 17 de janeiro.

"Foi dada especial atenção à expansão de laços mutuamente benéficos no comércio e na economia, inclusive por meio da implementação de importantes projetos conjuntos em transporte e energia", mencionou outra nota do governo russo no Telegram.

"Os líderes trocaram opiniões sobre questões internacionais e regionais urgentes, incluindo o andamento das negociações entre o Irã e os EUA sobre o programa nuclear iraniano, que estão sendo mediadas por Omã", acrescenta a nota, que menciona a disposição russa para facilitar o diálogo e alcançar o acordo "justo, baseado nos princípios do direito internacional".