Embaixadores relatam ameaça de ruptura no Brasil

Política
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Seis de agosto. O presidente Jair Bolsonaro chamou o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de "filho da p..." Seis de maio. Bolsonaro disse que sem voto impresso, não tem eleição. As investidas autoritárias do brasileiro contra as eleições de 2022, ameaças à Constituição, a tentativa de destituir ministros do Supremo Tribunal Federal e exibições bélicas mobilizaram diplomatas de grandes democracias para relatar e monitorar o risco de ruptura no Brasil.

Com foco desde o início do governo na política antiambiental de Bolsonaro e no entrave ao acordo comercial com o Mercosul, as análises e informes diários sobre o Brasil enviadas por delegações da União Europeia e dos Estados Unidos aos seus países passaram a dar espaço à agenda da "política doméstica". Telegramas enviados a suas capitais citam os ataques cada vez mais frequentes de Bolsonaro às regras do jogo democrático. Somente em julho, foram sete ameaças golpistas.

Nos últimos dias, o Estadão ouviu diplomatas das principais embaixadas estrangeiras no País. A avaliação é que, apesar das ameaças do presidente e do respaldo que ele encontra no Ministério da Defesa e da ala militar do seu governo, as instituições são sólidas e o risco de uma ruptura democrática no País é considerado zero. O que não significa desprezar os fatos.

É certo que as eleições de 2022 vão provocar o acirramento da crise política, mantido o atual cenário de polarização entre Luiz Inácio Lula da Silva e Bolsonaro. Entre embaixadores ouvidos não se descarta que se repita aqui uma "invasão do Capitólio", caso o presidente saia derrotado.

Os sinais mais claros de abalo na confiança da estabilidade no Brasil vieram de Washington. O presidente Joe Biden despachou a Brasília uma missão liderada por Jake Sullivan, assessor para Segurança Nacional da Casa Branca, tendo a defesa da democracia como tema-chave. "Em reunião com o presidente Bolsonaro, argumentamos que não temos preocupação com a realização de eleições livres e justas", declarou à imprensa Juan González, diretor sênior no Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca. "E ressaltamos a importância de não desacreditar o processo eleitoral, porque não há indícios de fraude em eleições anteriores."

Américas. A viagem do conselheiro de Biden, que também foi a Buenos Aires, na Argentina, ocorreu na esteira de turbulências e mudanças na América Latina: a repressão na Nicarágua, o assassinato do presidente no Haiti, protestos históricos contra governos de esquerda e de direita, como os registrados em Cuba e na Colômbia; alternância de poder com retorno da esquerda em países andinos como Peru e Bolívia, além de reforma constitucional no Chile.

O risco de rupturas levou a Casa Branca a convocar uma Cúpula para a Democracia, a ser realizada de forma virtual em dezembro e com uma segunda edição, presencial, em 2022. A pauta principal foca na defesa contra o autoritarismo; o combate à corrupção; e a promoção do respeito aos direitos humanos - três temas em que Bolsonaro coleciona retrocessos. Até agora, não houve convite formal ao presidente brasileiro.

Desde que Biden foi eleito, ele e Bolsonaro nunca se falaram, nem mesmo por telefone. Só trocaram cartas. Um contraponto à relação do brasileiro com Donald Trump.

A percepção de integrantes do corpo diplomático internacional em Brasília coincide com a de funcionários experientes do Itamaraty. Um diplomata brasileiro com anos de atuação na Europa e Nova York afirma que a repercussão está "negativíssima".

'República de Bananas'. Ele cita o fato de o jornal inglês The Guardian ter comparado a exibição de blindados promovida na Praça dos Três Poderes a uma parada militar de "República de Bananas". "Isso só se equipara à alegação daquele diplomata israelense que, anos atrás, chamou o Brasil de 'anão diplomático', sem razão. Agora há fatos que corroboram; o Guardian não fez isso a toa", opina o embaixador.

A reportagem ouviu considerações de um representante da Índia, país asiático que é a maior democracia do mundo e usa urnas eletrônicas em pleitos com 900 milhões de eleitores. Para ele, a escalada de embates internos não é boa. Esse diplomata, com trânsito no Planalto, pondera que países usam a pauta das ameaças à democracia como instrumento de pressão, mas se esquivam de discutir algo que ocorre em todo o globo - a ascensão da extrema-direita. O governo do primeiro-ministro indiano Narendra Modi é alinhado a Bolsonaro.

À frente de uma tentativa de reposicionar o Brasil, o chanceler Carlos França não considera haver motivo para receios, conforme disse ao Estadão. Para o embaixador, o funcionamento pleno das instituições nacionais é facilmente constatável pelos diplomatas estrangeiros.

"As coisas se mostram a si mesmas. Você olha o céu hoje e pensa 'acho que vou sair sem guarda-chuva'. Não precisa muito explicar", afirmou ele. O ministro não quis comentar o impacto das declarações do presidente, mas disse que "não acredita" que abalem a imagem democrática do País.

"O Brasil é uma democracia vibrante, que dá lição ao mundo no hemisfério sul, com as instituições funcionando, passando reformas estruturantes, Judiciário funcionando, Ministério Público livre e uma liberdade de imprensa que vejo em poucos lugares", afirmou o ministro, que aposta na participação de Bolsonaro na cúpula de Biden. "Não há por que duvidar que, numa cúpula sobre democracia, o Brasil não seja convidado."

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, reafirmou seu apoio ao secretário da Defesa, Pete Hegseth após o The New York Times reportar que ele havia compartilhado planos militares para o ataque ao Iêmen em grupo com familiares no aplicativo de mensagens Signal.

Anteriormente, a revista The Atlantic havia publicado que o seu editor-chefe Jeffrey Goldberg havia sido incluído por engano em outro grupo do Signal, em que a cúpula da Casa Branca discutia a ofensiva contra os rebeldes houthis.

As autoridades americanas negam que as informações compartilhadas por Pete Hegseth fossem confidenciais enquanto reforçam o seu apoio ao secretário de Defesa, atribuindo as notícias a ex-funcionários insatisfeitos com as mudanças no Pentágono.

Ao falar com repórteres no gramado da Casa Branca, onde participava das celebrações de Páscoa, Trump reafirmou a confiança em Hegseth e minimizou as preocupações sobre o vazamento de planos militares como "perda de tempo".

"Ele está fazendo um excelente trabalho. Perguntem aos houthis como ele está se saindo", disse o presidente, referindo-se ao grupo rebelde, que é apoiado pelo Irã e foi alvo dos ataques dos Estados Unidos.

De acordo com o NYT, o secretario de Defesa americano compartilhou detalhes sobre os ataques em 15 de março, antes que os bombardeios fossem lançados, em grupo que incluía a mulher, o irmão e o advogado pessoal de Pete Hegseth.

Os detalhes compartilhados no grupo eram essencialmente os mesmos que Hegseth enviou, no mesmo dia, em outro grupo do Signal que, por engano, incluía o editor da revista The Atlantic.

Pete Hegseth se mostrou furioso com a matéria do NYT, que atribuiu a "difamações anônimas de ex-funcionários descontentes sobre notícias antigas".

Ao chegar para as celebrações de Páscoa com a família, ele apontou para os repórteres e os chamou de "farsantes". Na sequência, se voltou para os filhos pequenos, que estavam ao fundo. "Essas crianças aqui, são o motivo pelo qual estamos lutando contra a mídia de notícias falsas", disse.

Em resposta às críticas do governo, um porta-voz disse que o NY Times tem confiança na precisão da reportagem e destacou que o Pentágono "não negou a existência do grupo de mensagens".

Embora as autoridades americanas tenham insistido que nenhuma informação confidencial foi compartilhada no grupo, o NY Times disse que isso não vem ao caso porque a sua reportagem "não caracterizou a informação como confidencial".

Trump e Hegseth conversaram por telefone na noite de domingo. Segundo uma fonte informada sobrea a ligação, o presidente disse ao seu secretário que "delatores ressentidos" seriam culpados pela reportagem e reafirmou que o apoiava.

Essa ideia de que delatores ressentidos estariam por trás da reportagem foi reforçada pela secretária de imprensa da Casa Branca Karoline Leavitt em entrevista ao Fox & Friends, programa da Fox News que era apresentado por Pete Hegseth. "É isso que acontece quando todo o Pentágono está trabalhando contra você e contra as mudanças monumentais que você está tentando implementar", disse. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)

Dos peronistas ao libertário Javier Milei, o papa Francisco teve relações tensas com presidentes da Argentina. Alvo da politização, ele acabou se distanciado do seu país de origem e morreu sem nunca ter retornado a Buenos Aires.

A disputa envolvendo o líder católico ganhou novos contornos quando Javier Milei o insultou como "imbecil" e "representante do maligno na Terra" durante as eleições. O libertário, contudo, não foi o único líder argentino a criticar o papa, que tinha relações delicadas com a política.

Embora tenha recebido todos os presidentes no Vaticano, Francisco morreu sem ter visitado a Argentina enquanto papa por temer que o seu retorno fosse usado politicamente - por um lado ou pelo outro.

Relação com presidentes argentinos

A relação espinhosa do papa com a política argentina vem de muito antes de Javier Milei.

O casal Néstor e Cristina Kirchner considerava Francisco o "líder espiritual da oposição". Os peronistas chegaram a acusá-lo de colaborar com a ditadura militar argentina entregando padres para o regime - denúncia que nunca ficou comprovada.

Depois que o arcebispo de Buenos Aires Jorge Bergoglio se tornou o papa Francisco, em 2013, a então presidente Cristina Kirchner foi aconselhada por aliados a rever sua posição e pediu desculpas. "Achei que você fosse outra coisa", teria dito Cristina em encontro com o pontífice.

Ela foi recebida pelo papa quatro vezes e foi atrás de Francisco durante as suas visitas ao Brasil, Paraguai e Cuba. Mas o uso político da aproximação por parte de Cristina Kirchner desagradou o pontífice, segundo reportou o Clarín. Depois disso, a relação voltaria a se desgastar.

Já com Mauricio Macri, o desgaste começou quando ele ainda era prefeito de Buenos Aires. O líder católico havia apoiado a candidatura do bispo Joaquín Piña que conseguiu barrar, na constituinte da província de Misiones, a reeleição indefinida do governador peronista Carlos Rovira. E esperou, em retribuição, que Macri apelasse contra a decisão que abriu caminho para o casamento entre pessoas do mesmo sexo na Argentina, o que não aconteceu.

Durante a presidência de Mauricio Macri, a Argentina deu mais um passo nas reformas progressistas: o início das discussões no Congresso sobre a legalização do aborto. Apesar do desgaste com o papa Francisco, que enfrentava a pressão dos setores mais conservadores da Igreja Católica, eles mantiveram as relações no nível institucional.

No caso de Alberto Fernández, a relação foi afetada pela legalização do aborto, concluída durante o seu período na Casa Rosada. De acordo com o Clarín, o pontífice também teria se incomodado com a estratégia de Fernández, que assim como sua vice-presidente Cristina Kirchner, tentou explorar politicamente as relações o papa.

Milei, por sua vez, atacou o líder católico antes de chegar à presidência. Depois de eleito, ele participou da missa de canonização de Mama Antula, a primeira santa da Argentina, e foi recebido pelo papa Francisco.

A relação foi apaziguada, mas eles mantiveram profundas discordâncias sobre o papel do Estado. O libertário Javier Milei promove um duro ajuste fiscal, que atinge principalmente os mais pobres na Argentina, enquanto o papa Francisco se dedicou à defesa dos vulneráveis.

"O Estado, hoje mais importante do que nunca, é chamado a exercer esse papel central de redistribuição e justiça social", disse o papa, um mês após receber Milei no Vaticano.

Francisco também criticou a repressão do governo aos protestos na Argentina. "Me mostraram as imagens da repressão, onde a polícia reprimiu os trabalhadores que exigiam os seus direitos nas ruas como se fossem desordeiros. Em vez de gastarem com justiça social, gastam na compra de gás de pimenta", disse após encontro com representantes dos movimentos sociais.

Embora na Argentina o Estado e a Igreja estejam separados, os vínculos sempre foram muito estreitos. Até a reforma constitucional de 1994, ser católico era requisito para assumir a presidência. Nesse contexto, o papa se viu no meio da polarização e das discussões em torno do peronismo.

"Nunca fui filiado, militante ou simpatizante do peronismo. Afirmar isso é uma mentira. Meus escritos sobre justiça social levaram a dizerem que sou peronista. Mas, na hipótese de ter uma concepção peronista da política, o que haveria de errado nisso?", questionou o papa sobre as acusações dos críticos de vínculos com o peronismo.

"Na Argentina, o papa era visto com um perfil de esquerda, e a direita mais liberal não gostava dele", explicou o biógrafo Sergio Rubín, coautor de O jesuíta (2013) e O Pastor (2023).

A disputa acabou afastando o papa, que nunca voltou a Buenos Aires. O papa Francisco chegou a dizer que gostaria de visitar à Argentina, mas não queria que a sua passagem pelo país fosse "usada nem para um lado, nem para o outro", expressando a preocupação com a politização de sua imagem.

Reações à morte do papa Francisco

Agora, enquanto o mundo dá adeus ao papa Francisco, os líderes políticos da Argentina deixam as desavenças com o líder católico para trás.

"Apesar das diferenças que hoje parecem pequenas, foi uma verdadeira honra para mim ter podido conhecê-lo em sua bondade e sabedoria", escreveu Javier Milei ao lamentar a morte. O presidente decretou luto oficial de sete dias e vai a Roma para a despedida do papa.

Por sua vez, Cristina Kirchner disse que ele era o "rosto de uma Igreja mais humana, com os pés na terra e o olhar fixo no céu", lembrando do primeiro encontro que teve com o papa Francisco.

O caráter humanitário do pontífice também foi destacado por Alberto Fernández. "A Igreja deveria apoiar os despossuídos, os marginalizados e os perseguidos. A Igreja deveria abraçar aqueles que foram condenados a ser minorias ou perseguidos em suas terras. A Igreja deveria levantar sua voz contra aqueles que acumulam riqueza e distribuem pobreza. No entanto, a Igreja só conseguiu fazer isso quando Francisco, o jesuíta, era o papa", escreveu nas redes sociais.

Lembrando o seu último encontro com o papa Francisco, acompanhado da mulher e das filhas, Mauricio Macri disse: "Tenho a imagem daquele dia e também de Francisco como um homem religioso de estatura inigualável, um político severo e, principalmente, um bom pastor. Sua vida foi marcada pelos ensinamentos que transmitiu com suas palavras, seu compromisso e seus gestos. Ele mesmo, com sua trajetória, é uma lição para todos nós".

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, disse nesta segunda-feira, 21, que há uma "boa chance" de que a Rússia e a Ucrânia cheguem a um acordo nesta semana para acabar com a guerra. O conflito já dura três anos.

"Há uma boa chance", declarou Trump quando perguntado se ele achava que Moscou e Kiev poderiam selar um acordo até sexta-feira, acrescentando que teve boas reunião com os dois lados.

Durante o evento anual Easter Egg Roll realizado na Casa Branca, o republicano também disse que teve "reuniões muito boas sobre o Irã" e expressou confiança de que uma solução comercial seria alcançada com a União Europeia. "No final das contas, teremos um acordo com qualquer um", afirmou ele.