Itamaraty deve refletir a cara do Brasil, diz primeira secretária-geral do órgão

Política
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Primeira mulher a se tornar secretária-geral das Relações Exteriores, a embaixadora Maria Laura da Rocha assumiu o cargo nesta quarta-feira, dia 4, num momento histórico para o movimento de mulheres na diplomacia. Em discurso, ela prometeu trabalhar "sem medir esforços" para que a igualdade de gênero se torne um objetivo em todas as ações do Itamaraty e para que a diplomacia passe a refletir "a cara da Brasil". Ela defendeu a ampliação do número de diplomatas negros, homens e mulheres, em postos de chefia.

"Não medirei esforços para evidenciar o que a Casa ganha em múltiplas dimensões valorizando as suas funcionárias mulheres e a diversidade dos seus quadros. O objetivo da igualdade de gênero deve pairar sobre todas as ações do ministério, orientando a atuação de cada um de nós em todos os momentos. Todos ganharemos com esse engajamento", disse Maria Laura, antes embaixadora do Brasil na Romênia. "É preciso aprofundar a tendência do aumento no número de mulheres e negras e negros na carreira diplomática e em postos de chefia, ampliando suas oportunidades nas classes superiores da carreira e em posições de comando na Secretaria de Estado e no exterior."

A embaixadora diz que pretende atuar para "ampliar o número de mulheres, negras e negros, pessoas menos favorecidas e candidatos de todas as regiões do País recrutados para as nossas carreiras". "Isso é ainda mais importante no caso da carreira de diplomata, que precisa refletir cada vez mais a cara do Brasil. Mas isso não se fará se não agirmos para motivá-los, desde a escola secundária, a ver na carreira diplomática, tanto quanto uma oportunidade, uma verdadeira possibilidade", indicou a secretária-geral.

A nova gestão do Itamaraty promete reativar um comitê interno de Raça e Gênero, que fora extinto. "Uma instituição de Estado mais diversa não é apenas mais justa e democrática como convém, mas é também mais eficiente, produtiva e inovadora", disse a embaixadora.

Tanto o chanceler Mauro Vieira quanto Maria Laura prometem valorizar diplomatas mais experientes, uma tradição num órgão de Estado regido por hierarquia, mas que havia sido abandonada na era Jair Bolsonaro. Ela falou também em promover "ambientes livres de qualquer tipo de assédio e preconceito". E defendeu mudanças nos critérios de remoção e ascensão na carreira, vistas como barreiras à promoção de mulheres, para que sejam mais objetivos e previsíveis.

Na política externa, seguiu o tom de Lula e Vieira em defesa de retomar a atuação focada em organismos multilaterais, reconstruir pontes com parceiros e foros tradicionais e destacar o papel do Brasil na diplomacia do clima, como "detentor da maior floresta tropical do mundo".

"Como ex-embaixadora na FAO e na Unesco, conheço bem a demanda pelo Brasil como provedor de soluções para os desafios comuns da humanidade: do flagelo da fome à mudança do clima; da assistência a refugiados e deslocados à promoção dos direito humanos; das novas ameaças à paz e segurança ao enfrentamento de pandemias e catástrofes; dos riscos representados pelas armas nucleares às tensões geopolíticas entre grandes potências; do protecionismo comercial contra países em desenvolvimento à desestruturação de cadeias globais de suprimento", disse Maria Laura.

Ela prometeu dar "especial atenção" a uma nova secretaria que cuidará do atendimento consular, uma diretriz de Vieira, diante do crescimento da comunidade brasileira no exterior. São 4 milhões de pessoas vivendo fora do País. "Trabalharemos sobre o muito que já se fez nessa área para que seja uma vitrine do Serviço Exterior Brasileiro", disse a secretária-geral.

Os diplomatas lotaram a sala Brasília para assistir à cerimônia. A maioria das mulheres vestia roupas ou acessórios na cor lilás, que representa a causa feminista. Homens usavam gravatas e lenços da mesma cor, com variações de tom.

O chanceler Mauro Vieira, por exemplo, vestia camisa lilás e gravata roxa. Celso Amorim, ex-chanceler e assessor especial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, também colocou uma gravata de mesmo tom.

A chefia da Secretaria-Geral das Relações Exteriores é o cargo número dois do Itamaraty. Trata-se, porém, do mais alto posto reservado a diplomatas de carreira, além de ser uma posição-chave na administração do ministério e na execução da política externa. É a ele que se dirigem, prioritariamente, os embaixadores acreditados e residentes no Brasil pela comunidade internacional.

Houve intensa campanha interna, na academia e até apelos políticos para que Lula nomeasse uma chanceler mulher. A nova secretária, que havia sido chefe de gabinete de Celso Amorim, era cotada, assim como a embaixadora Maria Luiza Viotti - agora um dos nomes fortes para assumir a embaixada brasileira em Washington. Será também a primeira mulher, caso a nomeação se confirme.

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A proteção político-diplomática dada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva à ex-primeira-dama peruana Nadine Heredia, condenada em caso de corrupção envolvendo a Operação Lava Jato, gerou desgaste político imediato ao petista. O asilo político, seguido de um pedido de refúgio que na prática bloqueia a extradição dela, rendeu quatro frentes de cobrança da oposição no Brasil.

Parlamentares sugeriram a abertura de investigações pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Além disso, querem convocar o chanceler Mauro Vieira a prestar explicações na Câmara e requisitaram informações por escrito ao Itamaraty.

Ao todo, a Câmara dos Deputados já registrou seis propostas legislativas relacionadas à atuação diplomática e política de Lula, em socorro a Nadine Heredia. A defesa nega qualquer irregularidade.

O deputado Evair de Melo (PP-ES), autor de quatro delas, sugeriu à PGR a investigação de possíveis irregularidades na concessão do asilo diplomático e o uso de recursos públicos no transporte dela pela Força Aérea Brasileira (FAB). Ele também sugeriu a convocação do ministro para prestar esclarecimentos em audiência pública.

O presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, Filipe Barros (PL-PR), pediu que o TCU realize uma auditoria sobre as despesas e a regularidade do emprego da FAB, que deslocou um jatinho para buscar a ex-primeira-dama em Lima e transportá-la, bem como seu filho, até Brasília.

Já os deputados do partido Novo Adriana Ventura (SP) e Marcel Van Hattem (RS) requisitaram ao Itamaraty informações sobre a decisão de Lula. Os parlamentares querem saber, por exemplo, o que embasou a decisão do governo brasileiro e se uma futura extradição, a pedido da Justiça do país vizinho, é cogitada. Ambos indagam também se foi feita alguma avaliação prévia de impactos nas relações bilaterais com o Peru.

Para Ventura e Van Hattem, "a urgência da situação foi invocada, mas a decisão ocorreu horas após a condenação judicial e ordem de prisão, sem que, até o momento, tenham sido publicamente apresentados indícios claros de motivação política na perseguição ou de risco à vida ou integridade da requerente".

"A transparência e o respeito ao Estado de Direito exigem que se esclareçamos critérios utilizados pela diplomacia brasileira para essa concessão, que tem impactos relevantes nas relações bilaterais com o Peru e no posicionamento internacional do Brasil no combate à corrupção e à impunidade", justificaram os deputados do Novo.

Por outro lado, o advogado Marco Aurélio de Carvalho, que representa Nadine no Brasil descartou quaisquer irregularidades na proteção dada a ex-primeira-dama ou no uso do avião da FAB, destacando que seria responsabilidade do País retirá-la do Peru após conceder o asilo.

"A oposição está tentando criar um fato político. Não tem nenhum embasamento (o pedido de investigação). O asilo foi concedido dentro das regras", disse, acrescentando que não vê impactos concretos para o caso de Nadine Heredia. "A oposição quer gritar e tem o direito de fazer isso. Assim como o governo tem o direito de fazer o que acha que deve ser feito dentro das regras estabelecidas pelas convenções internacionais", concluiu.

Nadine Heridia e o ex-presidente peruano Ollanta Humala foram condenados a 15 anos de prisão, acusados de receber contribuições ilegais de campanha da Odebretch e do governo venezuelano no valor de US$ 3 milhões.

Ao anunciar a sentença, na terça-feira, 15, a Justiça ordenou a prisão imediata do casal, mas apenas Humala estava presente no tribunal. Nadia, por sua vez, se asilou na embaixada do Brasil em Lima e pediu refúgio após chegar ao País.

"A embaixada do Brasil estava plena e totalmente informada sobre a sentença da senhora Heredia pelo crime de lavagem de dinheiro", disse o ministro das Relações Exteriores Elmer Schialer sobre o asilo, destacando que o Peru era obrigado pela Convenção de Caracas a conceder o salvo-conduto imediato para Nadine deixasse o país após o asilo. "Esta decisão foi tomada em estrito cumprimento das obrigações internacionais do Peru".

O Ministério das Relações Exteriores da Rússia manifestou objeção contra os planos de Tóquio de realizar exercícios militares com mísseis próximos ao território russo. O departamento manifestou sua posição em um comunicado entregue à Embaixada do Japão em Moscou nesta quinta-feira, 17.

Segundo o comunicado, o governo russo condena os testes previstos para junho na ilha de Hokkaido, que incluirão o lançamento de mísseis a partir de sistemas costeiros com alcance de até 200 km. Para Moscou, a atividade é "provocativa" e representa uma "ameaça potencial à segurança nacional", especialmente por ocorrer "nas imediações das fronteiras da Federação da Rússia".

O texto também afirma que ações como essa "contribuem para o aumento da tensão no Nordeste Asiático e na região Ásia-Pacífico como um todo" e são "absolutamente inaceitáveis". Moscou ainda adverte que "se reserva o direito de adotar todas as contramedidas necessárias para neutralizar ameaças à sua segurança" em suas fronteiras no leste. A declaração, no entanto, não especifica quais medidas poderiam ser adotadas.

Em conversa telefônica nesta quinta-feira, 17, o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, e o secretário de Estado dos Estados Unidos, Marco Rubio, abordaram os esforços para encerrar o conflito na Ucrânia, com Washington apresentando uma proposta de paz e Moscou mantendo sua disposição ao diálogo, segundo comunicados oficiais de ambos os países.

O Ministério das Relações Exteriores russo informou que Rubio, que está em Paris para discussões com aliados europeus e ucranianos, detalhou a Lavrov seus recentes contatos diplomáticos. O ministro russo "reafirmou a disposição de Moscou em continuar o trabalho conjunto com os colegas americanos para eliminar de forma confiável as causas fundamentais da crise ucraniana", segundo a nota da Rússia.

Do lado americano, a porta-voz do Departamento de Estado, Tammy Bruce, afirmou que Rubio apresentou a Lavrov a mesma proposta de paz discutida com europeus e ucranianos. "O presidente Donald Trump e os EUA querem que esta guerra termine, e apresentaram a todas as partes os contornos de uma paz duradoura e sustentável", declarou.

A nota americana destacou a "recepção encorajadora" à proposta em Paris, sugerindo abertura das partes para negociações. Enquanto isso, o comunicado russo enfatizou o acordo em manter "comunicação ativa", especialmente antes das próximas reuniões diplomáticas previstas para a semana que vem.