Zeca Veloso: 'Estou do lado dessa galera que me chama de nepobaby'

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Salvador, a música que abre o primeiro álbum de estúdio de Zeca Veloso, Boas Novas, foi surpreendentemente a última a ser composta por ele para o disco lançado nesta quarta, 26. Antes de a colocar no mundo, ele recebeu uma opinião do pai: o refrão antes descartado era o refrão que, desde sempre, deveria estar na música, defendeu Caetano. Seguiu o conselho e, depois, compôs estrofes pensando nas vozes do pai e dos irmãos, Moreno e Tom. Zeca é o filho do meio, fruto do relacionamento de Caetano e Paula Lavigne. "Acho que eles gostaram. Eles gravaram", brinca.

Salvador encabeça uma sequência de dez músicas que não tiveram pressa para vir ao mundo. Havia uma expectativa que Zeca entrasse de cabeça em sua "missão artística", como ele mesmo chama, após sua participação em Ofertório, projeto com o pai e os irmãos de 2017. Todo Homem, composta por ele e cantada com sua voz fina e afinada, lhe rendeu fãs.

Zeca decidiu não ceder à pressão das expectativas e levou o tempo que precisou para criar Boas Novas. O processo de composição começou em 2018, e a última faixa foi concluída na véspera de Natal de 2021. O cantor, então, iniciou as gravações do disco em 2022, mas decidiu fazer uma pausa.

"Foi um momento meio pessoal, mais intenso, de questões minhas que eu tinha que resolver", diz. Além disso, Boas Novas, produzido por ele e outros dez produtores, nasceu em 2025 por "depender de encontros". "Eu poderia ter feito o disco antes, mas eu não teria feito tão bem."

Costurado com um "tom profético", o disco surgiu de uma tentativa de se encontrar com Deus, como Zeca mesmo define. Evangélico desde pequeno por influência da babá, Zefinha, o músico diz que sua vivência com a fé é o que conduz o novo disco. Outras experiências, como um sonho em que ouviu John Lennon cantarolar uma das melodias do álbum, também o inspiraram.

Ao Estadão, Zeca responde se já sentiu uma "pressão" para ser músico, detalha os conselhos que já recebeu do pai e responde aos que o chamam de "nepobaby". "Temos muita desigualdade de oportunidade. É um desconforto que tem fundamento", afirma. A entrevista foi editada e condensada para melhor compreensão.

Chama muito a atenção esse tom profético e otimista que você deu para o álbum. Isso veio da religiosidade, da espiritualidade ou de outras coisas?

A minha composição ela vem muito desse lugar: da coisa espiritual, da minha fé. Tanto do que eu sei sobre a fé cristã quanto do que eu creio serem experiências com Deus. Eu recebo essas coisas e depois eu organizo elas. E uso também, conscientemente, essa coisa que se chama de 'tom profético'. Tem um vocabulário anímico, profético e, às vezes, apocalíptico. Apocalíptico no sentido mais de revelação. Apocalipse quer dizer revelação em grego. Então, acho que tem mais a ver com essa coisa da revelação e da profecia do que com desastres ou coisas que são associadas ao apocalipse.

Você canta em inglês uma das músicas, 'Carolina', que surgiu em um sonho com o John Lennon. Como foi esse sonho?

Então, no meu sonho, o John Lennon cantava essa música. Na verdade, a primeira parte da música (canta). Eu nunca tinha sonhado com uma música boa, acordado e lembrado. E, aí, eu peguei o violão e fiz a outra parte (canta). Então, é meio a meio, né? Metade dele e metade minha. Depois, fomos fazendo a letra. Tive a ajuda do Sylvio Fraga e do Tadeu Bijos e conselhos da Flora Thomson-DeVeaux.

No álbum, você manteve seu estilo único de cantar, que lembra Ney Matogrosso, Gal, Bethânia… Como você foi lapidando a sua voz para cantar? Você bebeu dessas referências ou de outras?

Que honra, eu nunca tinha ouvido isso. Sobre Bethânia eu já ouvi e reconheço mais, porque, quando eu canto grave, pode ter a ver. E há uma inspiração mais direta que eu percebo e que é consciente. Eu acho que, na verdade, infelizmente, tem a ver mais diretamente com cantores e cantoras estrangeiros. Tem a ver, com certeza, com o tempo em que eu morava com meu pai nos anos 2000 para 2010, que foram os anos dos discos com a 'banda cê'. Eu acho que ele foi influenciado pelo Radiohead, principalmente pelo [álbum] In Rainbows, as músicas Reckoner, Nude e tal. E tem a ver com o meu irmão Moreno também. Eu o ouvia muito cantando no ano 2000, que foi quando saiu o primeiro disco dele, Moreno + 2 - Máquina de Escrever Música. Ele sempre teve a voz mais aguda, bonita, e eu acho que isso também é uma coisa que estava ali no meu inconsciente.

Falando em referências, como foi a relação do seu pai com 'Boas Novas'? Ele te deu algum conselho?

Ah, muito. Eu sempre mostro [as músicas], né? Eu mostrei as músicas todas para ele e sempre pedia conselhos. Todo Homem, por exemplo, eu mostrei para ele e... Bem, deixa pra lá essa história (risos). Então, eu sempre conto com esse conselho dele, mas estou aprendendo a confiar mais na inspiração.

Mas teve algum conselho dele para esse disco que, para você, foi mais forte?

Teve em Salvador. Eu fui mostrar Salvador para ele e aí o convidei para gravar comigo. E foi a partir disso que me veio essa ideia de chamar o Moreno e o Tom também. Eu não tinha feito as estrofes que cada um canta e, depois, eu fiz cada estrofe pensando em cada um deles. Mostrei o refrão para o meu pai antes... Eu tinha uma versão que eu fiquei trabalhando muito, mas eu passei um pouco do ponto e mudei de um jeito que estragou. Eu mostrei para ele, e ele achou meio estranho. Ele falou sobre o que tinha deixado para trás, que aquele era o refrão de Salvador. Depois eu escrevi o resto e mostrei para ele também, para os meus irmãos. Acho que eles gostaram, eles gravaram (risos).

Você vem de uma família que é uma das grandes influências do que chamamos de MPB. Em algum momento da sua vida, você sentiu uma pressão, interna ou externa, para virar músico?

Acho que não. Não sei. Talvez... Não sei se é pressão, mas eu acho que vemos como um caminho possível. É a nossa principal referência, né? Então, já é natural que nos inclinemos para isso.

Mas nunca teve uma pressão direta do Caetano colocando vocês para tocar instrumentos desde pequenos, nada disso?

Não. Só a minha mãe que botou eu e o Tom em aula de piano. O Tom não seguiu muito, mas depois pegou o violão e acabou desenvolvendo mais do que todos nós. E eu fiz essas aulas, mas nunca fui muito bom.

As pessoas gostam de chamar filhos de famosos de 'nepobabies', dizem que os caminhos são facilitados, esse tipo de coisa. Imagino que, depois do lançamento do disco, esses comentários vão surgir. Te incomoda que eles venham?

Eu vou te falar bem sinceramente: eu acho que eu estou do lado deles. Temos muita desigualdade de oportunidade. Na verdade, temos uma grande desigualdade em vários sentidos, mas principalmente de oportunidade. Então, é um desconforto que tem muito fundamento.

E você acha que você consegue usar esse privilégio de oportunidades a seu favor?

Não sei se é melhor a maneira de responder isso, mas eu vejo esse disco, Boas Novas, principalmente como uma coisa de Deus. Uma coisa que vem desse lugar, que eu considero ser um lugar divino. Eu respeito muito isso. Para mim, tem mais a ver com isso do que com qualquer outra coisa. E acontece que eu sou filho do meu pai, que eu tenho essas oportunidades todas, e que é real esse desconforto com essa situação que existe de pessoas terem mais oportunidades do que outras. Lidamos com o desconforto e lidamos com a oportunidade de tentar fazer o melhor dela. Para fazer algo positivo, eu espero. Isso é o que me preocupa: usar a minha oportunidade para fazer algo de positivo.

A música 'Desenho de Animação' tem uma crítica sobre sermos um País que importa cultura. Há uma frase forte sobre as influências de Machado de Assis: "Procuro em solo tropical/Bentinho, Brás e Rubião/(...)/Mas eram eles já o sinal?/Riqueza de reprodução". Quando esse tema ficou mais forte para você?

Sendo bem sincero, eu toco nesses assuntos de uma maneira até um pouco aventureira, ousada para mim. Desenho de Animação surgiu quando eu estava analisando a minha experiência como mente criativa e consumidora na minha geração, e identificando ali que existia uma dificuldade de fazer uma música que, de alguma forma, desse uma continuidade ao que já tinha sido feito, mas não necessariamente refazendo o que já tinha sido desenvolvido. Na minha geração, possivelmente por conta da cultura americana que inundou tudo - a televisão, os filmes - nós não tínhamos a mesma variedade de referências como nos tempos do meu pai, por exemplo. Meu pai via cinema italiano no cinema em Santo Amaro, a língua franca era o francês... Desenho de Animação vem dessa coisa e usa os desenhos musicais da Disney como símbolo desse tempo em que a coisa quase deu um 'reset'. Mas também vê essa coisa toda com afeto, com uma lembrança afetiva desses desenhos animados da Disney, que foram fundamentais para a minha 'cabeça musical'.

E a faixa 'O Sal Desse Chão' praticamente irrompe no meio do álbum, com Xande de Pilares e arranjos de Pretinho da Serrinha. Em 'Ofertório', você já havia gravado 'Tá Escrito', do Revelação. Por que você decidiu manter esse 'flerte' com o pagode? Pensa em se dedicar mais a esse gênero no futuro?

Eu entendo que existe essa curiosidade do 'por que você escolheu isso ou aquilo', e eu entendo que esse disco tem uma certa 'missão artística', ele demonstra isso. Existe isso também, mas eu vejo que essa questão tem mais a ver com esse lugar do divino, do espiritual do que com os meus planos, de eu ter arquitetado alguma coisa ou que eu queira falar disso ou daquilo. Mas, obviamente, eu gosto de pagode, sempre gostei de samba, gosto muito do Xande, do Revelação. Eles me influenciaram e me influenciam.

Algumas pessoas dizem que você é o mais tímido entre os seus irmãos. Você pretende ter uma postura mais 'pop' depois do lançamento do álbum ou quer ser um artista mais intimista?

Eu estou pensando em dançar como o Michael Jackson (risos).

E quais 'boas novas1 faltam no Brasil?

Olha, eu estou muito ligado a Deus recentemente, sabe? Talvez não seja a resposta que agrade a muitos... Pode até agradar... Mas eu acho que eu sinto falta de entender Deus de uma maneira mais genuína. Eu acho que isso pode ser o segredo para muita coisa. É uma coisa que está me pegando mais agora, mas que existe desde a minha infância.

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O secretário da Segurança Pública do Estado de São Paulo, Guilherme Derrite, deve deixar o cargo na próxima segunda-feira, 1.º, conforme informação divulgada inicialmente pelo jornal O Globo e confirmada por fontes da alta cúpula das polícias ouvidas pelo Estadão.

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Na semana passada, Derrite, que recentemente se licenciou do cargo para voltar à Câmara dos Deputados e relatar o projeto de lei Antifacção no Congresso, já havia sinalizado que ia deixar a pasta no próximo mês, mas sem indicar uma data.

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A indicação de Nico, segundo fontes ouvidas pela reportagem, é tida como mais conservadora, uma vez que mantém um nome que já integra a alta cúpula da secretaria e, ao mesmo tempo, atende a um pedido de policiais civis após o cargo ser ocupado por um nome ligado à PM.

Com mais de quatro décadas de polícia, Nico ocupou diferentes posições: atuou, por exemplo, como chefe da Delegacia Antissequestro e delegado-geral da Polícia Civil na gestão Rodrigo Garcia, em 2022.

À frente da SAP desde 2023, Streifinger, por outro lado, fez carreira na PM. O coronel integrou a corporação entre 1986 e 2020, encerrando sua passagem por lá como chefe do Centro de Operações (Copom).

Na avaliação de interlocutores ouvidos pela reportagem, Streifinger, de perfil mais reservado, agrada mais o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos). Embora a indicação de um segundo nome ligado à PM em sequência não seja vista com bons olhos por alas da Polícia Civil.

Era Derrite foi marcada por casos de violência policial

Os três anos de Derrite à frente da secretaria foram marcados por alta nos índices de letalidade policial e episódios de truculência de agentes da Polícia Militar. Operações no litoral paulista terminaram com dezenas de civis mortos após mortes de policiais.

Encerrada em abril do ano passado, após quatro meses, a Operação Escudo somou 56 civis mortos, em meio a denúncias de execução pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP).

No ano passado, por conta de uma série de denúncias de violência e abusos da polícia, a permanência do ex-oficial da Rota no cargo de secretário foi questionada, mas ele foi mantido no cargo pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos).

Entre os episódios de repercussão sob sua gestão, estão as mortes de uma criança de 4 anos na Baixada Santista e de um estudante de Medicina baleado em um hotel da capital.

Houve ainda o caso de um homem atingido nas costas após tentativa de roubo em um mercado e o flagra de um policial arremessando um homem de uma ponte, na zona sul da capital paulista.

Embora o Estado tenha registrado queda de indicadores como roubos e furtos em 2024, São Paulo teve, no ano passado, a maior alta de mortes cometidas por policiais entre todos os Estados.

Foram 813 ocorrências envolvendo agentes em serviço e de folga, ante 504 em 2023, apontam dados divulgados neste ano pelo Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).

A Secretaria da Segurança Pública tem afirmado que "não compactua com desvios de conduta e pune exemplarmente aqueles que infringem a lei e desobedecem aos protocolos das polícias paulistas".

Em notas enviadas à reportagem ao longo do ano, a pasta reforça ainda que "todas as ocorrências de morte decorrente de intervenção policial são rigorosamente investigadas pelas polícias Civil e Militar, com o acompanhamento das respectivas corregedorias, do Ministério Público e do Poder Judiciário".

Um raríssimo espetáculo da natureza está em exibição no Aterro do Flamengo, na zona sul do Rio de Janeiro. Palmeiras plantadas na década de 1960 pelo pioneiro do paisagismo brasileiro Roberto Burle Marx estão dando flor pela primeira e única vez em sua existência. A florada poderá ser vista até meados do ano que vem, quando as árvores morrerão.

A Palmeira Talipot (Corypha umbraculifera) é nativa do sul da Índia e do Sri Lanka. Ela pode chegar a 30 metros de altura e tem folhas de até cinco metros de diâmetro. Mas o que chama mais atenção na planta é a sua inflorescência (a parte onde se localizam as flores), considerada a maior dentre todas as espécies conhecidas do mundo.

São milhares de minúsculas florzinhas em tons que vão do creme ao amarelo escuro que surgem apenas uma vez, normalmente quando a palmeira tem de 40 a 70 anos de idade.

"Isso depende muito do local do plantio, do clima, do solo, da insolação", explica o biólogo e paisagista Marlon da Costa Souza, gestor da divisão botânica do sítio Roberto Burle Marx, na zona oeste, onde alguns outros exemplares também estão plantados. "Em seu local de origem, ela costuma florescer aos 70 anos, mas, aqui no Brasil, a floração ocorre mais cedo."

As mudas de Talipot foram trazidas ao Brasil e plantadas no Aterro e no sítio pelo próprio Burle Marx. Alguns outros exemplares já tinham florescido no sítio e no Aterro há cerca de 20 anos e, mais recentemente, há aproximadamente cinco anos.

As flores amareladas em contraste com o verde intenso das folhas e o azul do céu oferecem um evento paisagístico realmente marcante.

Todo o processo de florescer, frutificar e maturar leva cerca de um ano. "Como ela só floresce uma vez na vida, a sua estratégia de sobrevivência é que praticamente todos os seus frutos são viáveis", afirma Souza.

Quando todos os frutos finalmente tiverem caído no chão - o que deve acontecer até maio de 2026 - a palmeira definha até a morte. Os frutos, no entanto, tendem todos a gerar novas palmeiras, renovando o ciclo da natureza.