Com a Coronavac, 'o mundo começou a ver o Butantan'

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O Instituto Butantan completa 120 anos nesta terça-feira, 23, em momento de profunda transformação. O desenvolvimento da vacina Coronavac durante a pandemia colocou a entidade na linha de frente do combate ao coronavírus, segundo a diretora de inovação do Butantan, Ana Marisa Chudzinski-Tavassi. A expectativa agora é de que o instituto deixe de ser apenas referência bibliográfica em estudos sobre veneno e se torne mais reconhecido pelas pesquisas sobre imunizantes. Além disso, as atenções estão todas voltadas ao desenvolvimento de um soro para o tratamento de pacientes de covid-19. O medicamento se mostrou seguro no teste em animais e deve ser apresentado nos próximos dias para a Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Se aprovado, serão iniciados os testes clínicos em infectados.

A senhora enxerga que houve uma mudança de patamar internacional com a Coronavac?

O Butantan sempre foi mais conhecido na literatura pelo que publica em relação a veneno, em biologia animal. Sobre a vacina, é real que pouco produziu com referência bibliográfica até recentemente. Com a pandemia, claramente começou uma série de projetos relacionados à vacina muito mais diversificado. O Butantan agora é um novo player no combate ao coronavírus. O mundo começou a ver o Butantan. A última coisa que se trabalhou relacionado à transferência de tecnologia foi no desenvolvimento da vacina da dengue, que também serviu para colocar o Butantan em um patamar diferente. Hoje usamos mais ou menos a mesma tecnologia para o coronavírus, se olhar a cultura de célula, a infecção de célula por vírus. É a mesma base. O Butantan tem expertise, tem infraestrutura para produzir isso, sabe como conduzir.

O que pode ser dito para as pessoas que desconfiam da vacina do Butantan?

Foi feita em tempo recorde, mas usamos critérios de gestão e organização. O Butantan tem uma parceria com a Sinovac e está fazendo o que faz rotineiramente... ensaios pré-clínicos, clínicos. Ninguém pulou etapas. As agências regulatórias também trabalharam com brevidade. Aprendemos que dá para diminuir o tempo.

O que falta ao Butantan hoje?

Faltam algumas estruturas que nos deixam pouco competitivos. Por exemplo, para trabalhar com coronavírus, preciso desse laboratório NB3. Se não tenho para poder fazer os testes, deixo de ser competitivo. Mesmo que tenhamos competência.

O Butantan será capaz de produzir a vacina do coronavírus do início ao fim, sem precisar importar insumo da China?

O insumo é o antígeno, que vai ser transformado para virar vacina. Quem faz isso é o laboratório NB3. O Butantan tem um laboratório NB3, mas é dedicado à vacina da influenza. Você não pode descobrir um santo para cobrir outro. Não tem como parar (o trabalho com) a vacina da influenza.

E a nova fábrica que está sendo construída?

A fábrica que o Butantan está fazendo, dentro dessa fábrica terá condição de produzir o insumo. No máximo em um ano tudo deve estar pronto.

O Butantan vem desenvolvendo um soro que pode ajudar no tratamento de pacientes com coronavírus. Como está essa pesquisa?

Está tudo pronto. Esse é um exemplo de como é bom ter estrutura e um grupo de experts que sabem do processo do começo ao fim. São 120 anos do Butantan, há 120 anos fazemos soro. Dá para fazer tudo, salvo o biotério (local onde animais são isolados para pesquisas científicas). Isso a gente teve de fazer em parceria. Diferentemente da Coronavac, que o antígeno é da China, aqui o vírus foi isolado no laboratório da USP (Universidade de São Paulo) e utilizamos a brecha no NB3 da influenza e produzimos o vírus em grande quantidade. Os vírus foram inativados por radiação para poder circular em outros laboratórios sem risco. Fizemos análise bioquímica, caracterizamos o vírus, as proteínas, se era capaz de produzir anticorpos, se eram capazes de neutralizar o vírus ativo. Isso tudo feito.

Quando que começou esse estudo?

Fizemos o processo em seis meses. O último teste demorou mais por falta de estrutura. Imunizamos os cavalos da fazenda do Butantan, o plasma desses animais veio para a unidade do instituto onde foi feito o processamento. Esse produto foi envasado e analisado pelo setor de qualidade. Fizemos os testes pré-clínicos, em duas espécies de animal, camundongo e coelho. Vimos que o produto era seguro. Apresentamos para a Anvisa em novembro. A Anvisa pediu um teste de desafio, que é produzir a doença em um animal, tratar e ver o benefício. Partimos para colaboração novamente com a USP. Mas havia uma fila de gente para utilizar e desenvolver seus projetos. Conseguimos desenvolver o teste no início de fevereiro. E está feito. Os resultados são muito bons. Vamos marcar uma reunião (com a Anvisa) ainda nesta semana para uma pré-submissão. Se entender que está ok, faremos a submissão, eles analisam e decidem se estamos aptos a utilizar o ensaio clínico.

Ou seja, existe a possibilidade de resolver o problema da doença?

Quem vai dizer isso é o ensaio clínico. Por isso a necessidade de fazer o mais rápido possível. Os modelos que temos em animais ainda não dão para dizer isso.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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