O Terço em estado de graça

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O chamamento vinha através do baixo trovejante: as primeiras estilingadas do hino Hey Amigo soavam como um toque de Hammelin, ao que o público reagia correndo para dançar na frente do palco e nos corredores de teatros e ginásios, formando a "unidade final" pregada na letra. Rockão na lata. Era o Terço, ao vivo, em estado de graça.

Durante um recorte dos longínquos anos 1970, o quarteto, então no auge, respondia pelo melhor rock feito no Brasil. Cabe aí um posfácio: um dos melhores, até hoje. Isso em um tempo com zero de mídia, em que o simples ato de ir a shows de rock era válvula de escape à ditadura ainda vigente, e as gravadoras (daqui, bem entendido) padeciam de miopia artística e comercial para lidar com aquela crescente turma dos decibéis. Dois álbuns fundamentais, Criaturas da Noite (1975) e Casa Encantada (1976), o primeiro, um monólito histórico, o segundo, igualmente um grande disco, são testemunhos de uma época em que a referência do prog rock inglês era quase um mandamento escrito em pedra, para inúmeras bandas brasileiras. Poucas digeriram esses eflúvios com a competência do Terço.

Décadas depois, essa história é repassada em O Terço - 50 Anos (Editora Ibrasa), obra concebida a quatro mãos pelo guitarrista e fundador Sérgio Hinds, ao lado do jornalista e pesquisador Nélio Rodrigues. "Há muito tempo esse livro vinha sendo cobrado, por amigos e fãs", conta Hinds. "Com a pandemia, a cobrança só aumentou. Foi quando chamei o Nélio, um grande pesquisador, que já havia entrevistado e escrito sobre o Terço várias vezes e, juntos, o concluímos. O Nélio tem um trabalho de garimpo que foi essencial em muitos detalhes, fatos e datas." O lançamento oficial, o músico adianta, acontece assim que for fechado patrocínio para a megalive pretendida para a ocasião. "O livro conta a trajetória de uma banda de rock que já passou dos 50, que começou na MPB e depois ingressou no rock progressivo, sem perder de vista outras influências. Detalhes de toda essa história e de músicos importantes que gravitaram em nosso entorno", conta.

No pico de sua arte, o Terço era Sérgio Hinds no vocal e guitarras, Sérgio Magrão (atual 14 Bis) no baixo, Luiz Moreno (falecido em 2002) nas baquetas e, único mineiro entre cariocas, Flávio Venturini nos teclados, último a integrar a trupe, indicado que foi por um conterrâneo famoso de apelido Bituca. Na época, esse combo, à exceção de Venturini, gravitava em torno do estúdio Pauta, de Rogério Duprat.

"O que existia era uma promiscuidade musical muito saudável entre nós e eles", recorda, aos risos, Luís Carlos Sá, ele mesmo, o eterno parceiro de Guarabyra, autor do prefácio de O Terço - 50 Anos. "O Sérgio Magrão e o Moreno eram da nossa banda desde os tempos de Sá, Rodrix & Guarabyra. Quando mudei para São Paulo, os dois até moraram um período comigo e minha então esposa, no Brooklyn. Entre idas e vindas do Rio, a certa altura, ao regressar a São Paulo, o Terço já era o Terço. Não dava mais para tocarmos juntos, tivemos que formar outra banda", lembra. Sá assina, inclusive, a letra da belíssima faixa-título de Criaturas da Noite.

Habitué com sucesso da era dos grandes festivais de MPB, em sua fase embrionária, iniciada em 1968, o grupo contou com músicos de talento como o guitarrista Jorge Amiden, o baterista Vinícius Cantuária e o cantor/compositor Cezar de Mercês - este, fundamental não apenas como autor do hit Hey Amigo, mas de diversas outras gemas dos cultuados discos do Terço. Com a banda ainda na ativa, Sérgio Hinds é o único elo entre todas as formações. "Começamos com um trabalho vocal forte e, nos festivais, tocamos até com orquestra. Mas sempre gostamos do rock progressivo, porque mistura o erudito. Com a entrada do Magrão e do Moreno, e depois do Venturini e a mala de músicas maravilhosas que ele trouxe, adotamos a visão do progressivo que rolava na época, Genesis, Pink Floyd, Yes, Jethro Tull. Era o que a gente mais ouvia. E aí aconteceu uma conjunção astral clássica que foi o Criaturas da Noite."

Entre os tesouros de Venturini que catalisaram o mítico álbum, a maravilhosa suíte instrumental 1974, 12 minutos de pura magia sonora. E, se ao vivo o Terço se destacava de congêneres por somar passagens instrumentalmente elaboradas a um peso incomum, muito se deve à "pegada" do baterista Luiz Moreno. De formação em conservatórios e dos poucos músicos negros no rock de então, compunha e cantava com maestria, assinando faixas antológicas. Hinds: "Nos shows, outro grande diferencial era nosso PA (sistema de som), o melhor que já ouvi no Brasil. Era todo valvulado, estupidamente diferente. O bumbo da bateria do Moreno batia do peito, era emocionante".

A soma de predicados alçou o quarteto à casa dos 150 a 200 shows por ano em ginásios lotados por todo o Brasil. O livro deixa claro a mão do empresário da banda, Mário Buonfiglio, nessa receita. "Ele foi o divisor de águas", crava Hinds. "Rico, morava em uma mansão, mas, às 7 da manhã, já saía para trabalhar em prol do Terço." Com o grupo no ímpeto pré-sucesso executando nos shows Criaturas da Noite na íntegra sem nem sequer ter gravadora ainda, coube a Buonfiglio conseguir a parceria fonográfica, no caso, com o selo Copacabana. "A partir daí, foi uma fase muito boa, de muito sucesso. E foi o Mário quem nos elevou a esse status. Ganhamos muito dinheiro, mas, jovens, torrávamos tudo."

Anos depois, com a partida de Flávio Venturini para surfar carreira solo, o Terço perdeu o chão. "Foi traumática (a saída). Ainda que na época eu, jovem, não me desse conta. Ele é um tremendo compositor, de voz supermarcante. A química funcionava com minha guitarra, a voz e as músicas dele, o baixo do Magrão, a bateria do Moreno. Então, foi como tirar o alho do tempero do feijão. De início, foi só uma grande mudança, mas depois tudo desmoronou de vez. Fiquei eu, sozinho, trocando músicos a toda hora. Fiz várias tentativas, mas a química não estava mais lá." O tempo tratou de reconciliar os músicos que, desde 2005, revivem a formação de ouro em ocasiões especiais: em 2007, saíram CD e DVD ao vivo, e em 2015, O Terço - 3D, projeto hi-tech gravado em estúdio, com DVD e Blu-Ray.

O lançamento de O Terço - 50 Anos pode, inclusive, impulsionar um já informalmente discutido álbum de inéditas. "Cogitamos, sim. Mas tudo vai do investimento. Agora, com a pandemia, muitos problemas se acentuaram. Ademais, o Terço não é uma banda popular, e o mercado desabou. Mas há vontade e há material inédito", conclui Hinds.

À prova de tempo

Originalmente de 1975, Criaturas da Noite é um clássico perene. Prog rock de primeira, sim, mas filtrado de maneira muito peculiar, com momentos de intenso brilho, remetendo também ao rock rural mimetizado do entrelaço com Sá, Guarabyra e cia. (Jogo das Pedras, a protoecológica Queimada). Arranjos vocais belíssimos permeiam teclados e guitarras hipnotizantes (Ponto Final), e pauladas como Volte na Próxima Semana e Pano de Fundo abrem caminho para a delicadeza de pérolas como a faixa-título e seu fantástico arranjo de cordas. Então subversiva, a letra de Hey Amigo escancarou o Terço a um grande público. E há o épico hino progressivo 1974, que desequilibra de vez o jogo. De quebra, a capa hiper-realista A Compreensão, de Antônio Peticov, que marcou época.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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Maria Bethânia e Caetano Veloso realizaram, na noite deste sábado, 15, o penúltimo show da turnê conjunta que tem rodado o País, mas nem tudo ocorreu como planejado. A cantora de 78 anos precisou interromper a apresentação na Farmasi Arena, no Rio de Janeiro, por conta de problemas técnicos no som.

Enquanto cantava As Canções que Você Fez pra Mim, durante seu bloco solo no show, ela começou a reclamar: "Está tudo errado aqui no som. Não dá para cantar com esse som". Em seguida, levantou a voz e interrompeu a música: "Me respeitem! Eu não vou cantar com esse som". A apresentação parou e Bethânia foi bastante aplaudida pelo público.

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"Só tem chiado no meu ouvido. Não é absolutamente o som que eu estava cantando. Querem me desafiar. Ficaram zangados comigo ontem no ensaio porque eu briguei do som. E acabou", continuou.

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"Eu estou bem. Estou me sentindo bem. Fui muito bem tratada aqui em Salvador", afirmou Preta, que destacou: "É uma coisa que já aprendi que vou ter que saber lidar porque vai ser recorrente. Primeiro porque estou com a sonda, um lugar que acumula muita bactéria."

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O fato se deu durante um evento de pré-estreia do filme Vitória: "É sempre um carrossel de emoções encontrar a maior representante da cultura desse País, a amiga de longa data, nossa rainha Fernanda Montenegro."

"Foi mais uma vez único, mas, como sempre, de aprendizado de vida. Estar ao lado dela me faz todo ouvidos. Sua paixão pela arte e pela vida é tamanha que o 'pouco' tempo que pudemos estar ali foi suficiente para eu repensar o entendimento da vida", refletiu Vinícius de Oliveira.

Em seguida, o ator explicou: "Afinal, aos 95 anos, com total capacidade intelectual e física, Fernanda veio do Rio, estava fazendo toda a social e, dali a algumas horas, partiria para o Rio novamente porque teria ensaio a tarde na ABL para a noite, então, fazer sua apresentação de 14 textos diferentes de literatura."

"Que artista, que ser humano é Fernanda Montenegro! Passarei a vida agradecendo esse acontecimento de mulher. Que ela siga nos brindando com sua arte. Obrigado e obrigado, Fernanda!", concluiu.

Em Central do Brasil, Vinícius de Oliveira deu vida ao menino Josué. Após a morte de sua mãe, no Rio de Janeiro, a personagem de Fernanda Montenegro, Dora, atravessava o País rumo ao Nordeste em busca do pai do garoto. O filme, dirigido por Walter Salles, concorreu ao Oscar nas categorias de Melhor Filme Estrangeiro e Melhor Atriz.