'Minari', um sonho americano

Geral
Tipografia
  • Pequenina Pequena Media Grande Gigante
  • Padrão Helvetica Segoe Georgia Times

Lee Isaac Chung estava mais nervoso de mostrar seu filme a seus pais, nas vésperas do Dia de Ação de Graças nos Estados Unidos, do que com a estreia em si. Ele contou ao diretor sul-coreano Bong Joon-Ho (Parasita), numa conversa promovida pela revista Variety, que temia arruinar o jantar familiar.

Mas eles amaram Minari - Em Busca da Felicidade, que entra em cartaz nos cinemas brasileiros neste sábado, 24. O longa-metragem concorre a seis Oscars neste domingo: filme, direção, roteiro original, ator (Steven Yeun), atriz (Yuh-Jung Youn) e trilha original.

A preocupação de Lee Isaac Chung baseava-se no fato de Minari ser inspirado na sua própria história e na de sua família. O cineasta estreou com Munyurangabo (2007), que se passa em Ruanda e foi exibido na mostra Um Certo Olhar, em Cannes. Seu filme seguinte, Lucky Life (2010), teve apoio da Cinéfondation e foi premiado em Tribeca. Mas o diretor estava considerando deixar a carreira de lado e se mudar para a Coreia do Sul para ser professor universitário. Minari foi sua última tentativa no cinema. E ele decidiu que tinha de ser pessoal.

No filme, que se passa nos anos 1980, Jacob (Steven Yeun, mais conhecido como o Glenn de The Walking Dead), um imigrante coreano, muda sua família da Califórnia para o interior de Arkansas, em busca de uma vida melhor. Ele e a mulher Monica (a atriz sul-coreana Yeri Han) identificam o sexo de pintinhos, mas Jacob comprou uma pequena propriedade para plantar vegetais coreanos destinados à crescente comunidade nos Estados Unidos.

A mudança gera tensão entre o casal, o que respinga nos filhos, a responsável Anne (Noel Cho) e o levado David (Alan Kim), que tem um problema no coração. A vida da família se transforma ainda mais quando a mãe de Monica, Soon-ja (Yuh-Jung Youn, atriz de vários filmes de Hong Sang-soo), vem da Coreia do Sul para cuidar das crianças enquanto os pais perseguem o sonho americano. David não gosta nada porque precisa passar a dividir com ela o quarto na casa precária que ocupam.

Escolher os atores certos era primordial. Steven Yeun, que nasceu na Coreia do Sul, mas cresceu nos Estados Unidos, conhecia de vista Lee Isaac Chung, apesar de serem parentes - o diretor é primo da mulher do ator. "Mas nunca falamos de trabalho nos casamentos em que nos encontramos", jurou Yeun, em entrevista. Foi sua agente quem os conectou.

Para o ator, ler o roteiro de Minari foi chocante. "Fiquei abismado como ele é honesto com sua perspectiva", disse o ator. "Ele não tenta se explicar. É uma história sobre esta família." Em sua opinião, muitos filmes sobre imigrantes ou comunidades marginalizadas levam em conta o que precisam significar para o resto dos Estados Unidos. "Aqui não, a história apenas se conecta com os outros em nível humano."

Ele ficou com medo de ser convidado para fazer Jacob. "Eu estava lutando comigo mesmo. Quem sou eu, como é a geração dos meus pais. Examinar meu passado para contextualizar minha visão deles na época, explorar minha realidade atual de ser um pai e conectar tudo isso."

Yeun não sabia se ia conseguir interpretar Jacob, um homem determinado em seu sonho, teimoso, sério. "Será que vou ser autêntico? Será que realmente conheço meu pai? Será que sei o que meus pais passaram?", disse ele. "As pessoas normalmente idealizam ou romantizam a primeira geração que veio para este país, e eu não queria fazer isso. Meu desejo era ir fundo nesse ser humano, mostrando suas falhas todas."

Jacob é um homem que está em conflito com Deus. "Ele deixou a Coreia, abandonou tudo, para tentar se encontrar. Tem essa mentalidade do imigrante de conquistar algo do nada", disse Yeun.

O primeiro passo foi ir da Coreia para a Califórnia. O segundo é se embrenhar em Arkansas. "Ele quer controlar a vida e moldá-la de acordo com sua visão do que ela deve ser." O ator relacionou a história com a de seu pai, um arquiteto que saiu da Coreia cheio de esperança. "Quando chegou aos Estados Unidos, ele estava em frangalhos, tentando se agarrar a qualquer coisa que o fizesse se sentir seguro", contou Yeun.

Na América, ele era nada. Tinha de começar tudo do zero, trabalhando como estoquista na loja de jeans de um parente. "Ele teve de recontextualizar sua importância, seus valores e quem ele é. E isso me tocou muito."

É impossível não pensar em Minari como um filme sobre o sonho americano. Yeun faz questão de frisar que os Estados Unidos foram, sim, construídos também por imigrantes, só que nem todos foram para lá com a vontade de fazer a América. Muitos, na verdade, são produtos de conflitos - inclusive da Guerra da Coreia. "Mas, sim, somos um país de imigrantes. É uma terra de transformar o nada em algo." De alguma maneira, ele acha que a experiência de isolamento que vivemos reflete a que os imigrantes têm. "É uma compreensão mais profunda e ampla do que são os Estados Unidos, de que não há uma experiência singular monolítica, de que são indivíduos tentando se encontrar, mas também percebendo que estão conectados uns aos outros."

O título faz alusão a isso. Minari é uma espécie de salsinha. No primeiro ano, a plantação morre. Mas, no segundo, ela pega, purificando o solo e a água. "Para mim, é uma metáfora incrível do sacrifício do começo para um imigrante", disse Yeun.

"Você chega cheio de intenções, mas, quando isso não acontece, em geral, você se entrega à natureza, vê que não tem controle. Para mim, a grande lição de interpretar Jacob foi compreender como estamos conectados, como compartilhamos experiências, como não sou muito sem o outro. Para mim, Minari é isso. Estamos todos conectados", diz o diretor.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Em outra categoria

Anora foi o grande vencedor do prêmio de Melhor Filme do Oscar 2025. Ainda Estou Aqui, longa brasileiro que concorria na categoria, não foi escolhido pelos votantes.

O longa custou US$ 6 milhões para ser produzido - um dos menores orçamentos da história da premiação - e, nas últimas estimativas, faturou cerca de US$ 38 milhões de bilheteria ao redor do mundo.

Indicações de 'Anora' ao Oscar 2025

Anora foi indicado em seis categorias no Oscar 2025: Melhor Filme, Melhor Direção, Melhor Atriz, Melhor Ator Coadjuvante, Melhor Roteiro Original e Melhor Edição.

Outros prêmios

Em maio de 2024, Anora venceu a Palma de Ouro no Festival de Cannes e se colocou como um sério concorrente ao Oscar. Ao longo da temporada, no entanto, viu os filmes rivais ganharem mais destaque e, apesar de ser bastante elogiado pela crítica, passou a ser tratado como um azarão.

A maré mudou nas últimas semanas. Surpreendentemente, o longa venceu o prêmio de Melhor Filme no Critics Choice Awards. Confirmando o bom momento, também foi vitorioso no Directors Guild Awards, no Producers Guild Awards e no Writers Guild of America Awards, três dos principais prêmios dos sindicatos de Hollywood.

Sobre o que é

Em Nova York, a jovem stripper Anora (Mikey Madison) conhece o filho de um oligarca russo e engata um improvável romance. Após um casamento impulsivo em Las Vegas, a família de Ivan Zakharov (Mark Eydelshteyn) planeja retornar para os Estados Unidos com um único objetivo - anular a união entre o casal. Descrito como um "conto de fadas às avessas", o longa subverte a história da Cinderela para falar sobre as falhas do Sonho Americano.

Elenco

Em Anora, Mikey Madison interpreta Ani, uma jovem stripper que se deslumbra com a vida de luxos que o dinheiro pode proporcionar. O papel rendeu a atriz uma indicação ao prêmio de Melhor Atriz. Já Mark Eydelshteyn é Ivan Zakharov, filho de um oligarca russo que contrata os serviços de Ani por tempo indeterminado.

Yura Borisov interpreta Igor, um capanga russo da família Zakharov. O papel rendeu ao ator uma indicação ao prêmio de Melhor Ator Coadjuvante. Completam o elenco Karren Karagulian e Vache Tovmasyan, que interpretam outros dois capangas da família Zakharov, e Aleksei Serebryakov e Darya Ekamasova, que vivem o pai e a mãe de Ivan, respectivamente.

Entrevistas

Em entrevista ao Estadão, Sean Baker e Mikey Madison discorreram sobre o que torna Anora um longa tão único. Em especial, falaram sobre a temática de trabalhadores sexuais - uma constante no trabalho de Baker - e sobre como o filme busca quebrar as expectativas do público.

"Sempre pensei em Anora como algo fora do 'mainstream' e um pouco divisivo por causa de seus temas, mas ele parece estar agradando às pessoas de maneira universal. E isso é maravilhoso", afirmou Sean Baker.

Críticas

O filme foi bastante elogiado pela crítica internacional. No site Rotten Tomatoes, que agrega análises de profissionais da indústria, o longa conta com 93% de aprovação. No New York Times, a obra de Sean Baker foi descrita como o "nascimento de uma estrela".

"Esse papel exige que ela [Mikey Madison] vá ao extremo, com elementos de pastelão, romance, comédia e tragédia, além de dançar com pouquíssima roupa e dar uns socos poderosos", escreveu a crítica Alissa Wilkinson. "E a cada momento Madison fica mais fascinante."

"Anora é uma fábula moderna e obscena, povoada por strippers e capangas. Como a maioria dos filmes de Baker, fala sobre os limites do sonho americano, sobre as muitas paredes invisíveis que se interpõem no caminho das fantasias de igualdade e oportunidade, sobre como se erguer pelas próprias pernas", finalizou.

Polêmicas

A principal polêmica de Anora decorreu da falta de um coordenador de intimidade no set de filmagem de Sean Baker. O cargo, que vem ganhando cada vez mais importância em Hollywood, é responsável por supervisionar cenas íntimas que envolvam sexo simulado e nudez.

Em uma era pós-Me Too, o trabalho do supervisor garante que todos os envolvidos se sintam seguros e possam se manifestar caso algo os deixe desconfortável. Em Anora, cenas de sexo e nudez compõem uma boa parte do filme. Baker e a equipe, no entanto, optaram por não utilizar um coordenador de intimidade durante as gravações do longa.

"Foi uma escolha que fiz. A produção me ofereceu, se eu quisesse, um coordenador de intimidade", afirmou Mikey Madison no quadro Actors on Actors, da Variety. A atriz explicou que a decisão foi tomada por ela e por Mark Eydelshteyn e que, apesar da polêmica, a experiência foi extremamente positiva para ela.

Onde assistir

Em cartaz, Anora estreou nos cinemas brasileiros em 23 de janeiro. Não há previsão, no momento, para exibição em plataformas de streaming.

Os indicados ao Oscar de Melhor Filme em 2025

Anora

O Brutalista

Um Completo Desconhecido

Conclave

Duna: Parte 2

Emilia Pérez

Ainda Estou Aqui

Nickel Boys

A Substância

Wicked

'O Brutalista' vence Oscar de melhor trilha sonora. O filme disputou categoria com Conclave, O Robô Selvagem, Wicked e Emilia Pérez. O longa venceu prêmio de melhor fotografia também.

Ainda Estou Aqui, de Walter Salles, venceu o Oscar de Melhor Filme Internacional na noite deste domingo, 3. É o primeiro longa brasileiro a conquistar o feito. O diretor Walter Salles dedicou prêmio a Eunice Paiva. Ele também dedicou estatueta a Fernanda Torres e Fernanda Montenegro. "É uma coisa extraordinária", disse sobre vitória.

A produção superou os concorrentes Emília Pérez (França), A Semente do Fruto Sagrado (Alemanha), A Garota da Agulha (Dinamarca) e Flow (Letônia). O francês, que venceu o Prêmio do Júri em Cannes 2024 e foi indicado a 13 categorias do Oscar, incluindo a de melhor filme, foi considerado como o favorito nos primeiros momentos da disputa, mas acabou se envolvendo em diversas polêmicas.