Com escassez de doses, estudantes da saúde estão em campo sem vacina contra covid

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Estudantes de diferentes áreas da saúde incluídos no grupo prioritário do Plano Nacional de Imunização (PNI) não estão recebendo a vacina contra a covid-19 em São Paulo. Mesmo com um ofício do Ministério da Saúde e com uma normativa do governo do Estado que preveem a vacinação para os profissionais em formação, a falta de doses não garante uma imunização uniforme, e muitos alunos estão em campo sem vacina.

Embora não haja um número consolidado dos estudantes que já foram vacinados, Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) admitem dificuldades no acesso ao imunizante e afirmam que pressionam autoridades para que a oferta priorize "acadêmicos em saúde e estudantes da área técnica em saúde em estágio hospitalar, atenção básica, clínicas e laboratórios" com vínculo ativo com o serviço de saúde, como estabelece o governo federal.

A estudante Carolina Conde, de 29 anos, aluna do quarto ano de enfermagem da USP, tentou se vacinar em duas UBS's na região de Artur Alvim, na zona leste da capital. Levou a declaração da Escola de Enfermagem atestando que está em atividade prática. "Mas nas duas nem tive a chance de mostrar a declaração, falam que é só para pessoas (da saúde) acima de 47 anos e que eu preciso tentar me vacinar pela faculdade", conta.

Ao Estadão, a USP afirmou que não tem acesso direto às vacinas e que, em cada campus, segue-se o protocolo do respectivo município. A prioridade das vacinas também não é definida pela universidade. "A USP, por meio da Reitoria, tem esclarecido à Secretaria Estadual da Saúde e às Secretarias Municipais as atividades que nossos alunos desenvolvem e a necessidade de estarem inoculados", informou a assessoria.

A reportagem apurou, no entanto, que dos graduandos da USP, só os alunos da Faculdade de Medicina na etapa final da formação - aqueles do quinto e sexto anos do curso Médico e do quinto ano de Fonoaudiologia, Fisioterapia e Terapia Ocupacional - foram vacinados contra a covid-19.

A Secretaria Municipal da Saúde (SMS) disse que São Paulo já solicitou maiores repasses ao governo estadual para contemplar todo o grupo de profissionais de saúde que moram no município, incluindo estudantes e professores da área. Segundo a pasta, a imunização na capital avança "conforme as doses da vacina contra a covid-19 são repassadas para o município por meio do Governo do Estado".

Vacinação desigual

Em São Paulo, a imunização de estudantes muda conforme a região do Estado e tem maior defasagem na capital, onde a demanda é maior e ainda não há um detalhamento com critérios de prioridade para esse público. Em algumas cidades, parte dos estudantes recebe o mesmo tratamento de profissionais já formados - em muitos casos, a carga horária e perfil de trabalho é semelhante - e é vacinada nas unidades em que atuam. Alguns têm preferência pelo seu nível de exposição ao coronavírus e outros são imunizados com doses remanescentes do final do dia.

Foi o caso da Marina Caravante, de 20 anos, aluna do terceiro ano de enfermagem da USP. Depois de receber negativas em três UBS's, a estudante, que atua em um dos drive-thrus da campanha de vacinação da cidade de Mogi das Cruzes, só conseguiu se vacinar com dose sobressalente. "Na própria campanha foi difícil conseguir porque não tinham doses para os profissionais, só tomei porque sobrou frasco aberto no final do dia", relata.

Já na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), campus São Paulo, os alunos conseguiram se vacinar pelo hospital universitário e pela Escola Paulista de Enfermagem (EPA) no começo da campanha de imunização. "Eu já tomei as duas doses, eles começaram distribuindo a Oxford/AstraZeneca, depois a Coronavac", conta a estudante de fonoaudiologia Vitória de Souza Dias, de 20 anos.

Medo de voltar a campo

Com doses insuficientes, a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) criou o próprio sistema e priorizou os estudantes por grau de exposição. Assim, graduandos do quinto e do sexto ano de Medicina que estão em internato, do quinto ano de enfermagem e do quarto ano de Fonoaudiologia foram os primeiros a receber o imunizante.

A instituição, entretanto, não conseguiu vacinar acadêmicos de outros anos que já têm atividades com pacientes em postos de saúde. Desde 2020, as atividades práticas para alunos em anos iniciais haviam sido suspensas, mas serão retomadas a partir de 3 de maio. Para quem vai retornar à prática sem o imunizante contra a covid, o cenário é de preocupação.

"Voltaremos para os campos de prática sem estar imunizados e não temos qualquer previsão de quando tomaremos a primeira dose. Os estudantes precisam se expor para receber a vacina?", questiona a estudante Rafaela Bussi, do quarto ano de enfermagem da Unicamp de Jundiaí.

De acordo com Maurício Etchebehere, professor da Faculdade de Ciências Médicas e assessor da Diretoria Executiva da Área da Saúde da Unicamp, o retorno a campo divide opiniões na direção da universidade e há pressão para que os estágios sigam suspensos. "Seria algo muito grave se um estudante nosso ficasse doente dentro dos nossos hospitais sem estar vacinado. Preferimos que haja um prejuízo no ensino a ter algum aluno doente", afirma Etchebehere.

No campus Botucatu da Universidade Estadual Paulista (Unesp), a 238 km da capital, a situação se repete - apenas estudantes dos últimos anos de Medicina e Enfermagem foram vacinados. "Temos pressionado as autoridades por mais vacinas, mas é difícil", diz a vice-diretora da Faculdade de Medicina, Jacqueline Caramori.

Mesmo com a expectativa de vacinação de toda a população acima de 18 anos na cidade de Botucatu por meio do estudo da Universidade de Oxford e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), anunciado na quarta-feira, 28, a Unesp vai seguir insistindo na liberação de doses. "A vacinação em massa vai incluir os alunos, mas não há previsão de começo do estudo, e ter estudantes em prática sem a vacina é angustiante", enfatiza Jacqueline.

A falta do imunizante também aflige graduandos de outros cursos da Unesp que já estão em campo sem vacina, como os do último ano da faculdade de Nutrição. Eles encaminharam uma carta à diretoria do Instituto de Biociências e à secretaria municipal de saúde pedindo a vacinação dos alunos do quinto ano que atendem pacientes diariamente em clínica. Como não há doses suficientes, eles e outros estudantes seguem sem proteção contra a covid-19 e sem previsão de quando isso ocorrerá.

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A cantora Nana Caymmi, que morreu na noite desta quinta-feira, 1º, aos 84 anos, fez aniversário no último dia 29 de abril. Internada desde julho de 2024, Nana recebeu uma mensagem da também cantora Maria Bethânia, de quem era amiga.

Bethânia escreveu: "Nana, quero que receba um abraço muito demorado, cheio de tanto carinho e admiração que tenho por você. Querida, precisamos de você e da sua voz. Queremos você perto e cheia de suas alegrias, dons e águas do mar na sua voz mais linda que há. Amor para você, hoje, seu aniversário, e sempre. Rezo à Nossa Senhora para você vencer esse tempo tão duro e difícil. Peço por sua voz e por sua saúde. Te amo. Sua irmã, Maria Bethânia".

Nana e Bethânia tinham uma longa relação de amizade e gravaram juntas no álbum Brasileirinho, de Bethânia, lançado em 2003. Bethânia afirmou mais de uma vez que Nana era a maior cantora do Brasil.

De acordo com informações divulgadas pela Casa de Saúde São José, onde Nana estava internada há nove meses para tratar de problemas cardíacos, a cantora morreu às 19h10 desta quinta-feira, em decorrência da disfunção de múltiplos órgãos.

Morreu nesta quinta-feira, 1° de maio, Nana Caymmi, aos 84 anos, em decorrência de problemas cardíacos. A morte foi confirmada pelo irmão da artista, o também músico e compositor Danilo Caymmi. Ela estava internada havia nove meses em uma clínica no Rio de Janeiro.

"Eu comunico o falecimento da minha irmã, Nana Caymmi. Estamos, lógico, na família, todos muito chocados e tristes, mas ela também passou nove meses sofrendo em um hospital", disse Danilo Caymmi.

"O Brasil perde uma grande cantora, uma das maiores intérpretes que o Brasil já viu, de sentimento, de tudo. Nós estamos, realmente, todos muito tristes, mas ela terminou nove meses de sofrimento intenso dentro de uma UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do hospital", acrescentou o irmão, em um vídeo publicado no Instagram.

Nas redes, amigos e admiradores também prestaram homenagens à cantora.

"Uma perda imensa para a música do Brasil", escreveu o músico João Bosco, com quem Nana dividiu palcos e microfones. Bosco também teve canções interpretadas por Nana Caymmi, como Quando o Amor Acontece.

O cantor Djavan disse que o País perde uma de suas maiores cantoras e ele, particularmente, uma amiga. "Descanse em paz, Nana querida. Vamos sentir muito sua falta, sua voz continuará a tocar nossos corações."

Alcione também diz que perdeu uma amiga e que a intérprete, filha de Dorival Caymmi, tinha "a voz". "Quem poderá esquecer de Nana Caymmi?"

"Longe, longe ouço essa voz que o tempo não vai levar! Nana das maiores, das maiores das maiores", postou a cantora Monica Salmaso, que já tinha prestado uma homenagem para Nana na última terça, quando a artista completou 84 anos. "Voz de catedral", descreveu Monica na ocasião.

O escritor, roteirista e dramaturgo Walcyr Carrasco disse que, nesta quinta, a música brasileira deve ficar em silêncio em respeito à partida da artista. "Que sua voz siga ecoando onde houver saudade. Meus sentimentos à família, amigos e admiradores!"

A deputada federal e ex-prefeita de São Paulo Luiza Erundina (PSOL-SP) disse que Nana Caymmi tinha umas das vozes "mais marcantes da música popular brasileira" e que a cantora deixa um "legado extraordinário" para o Brasil por meio de interpretações "únicas e carregadas de emoção". "Que sua arte siga viva, e que ela descanse em paz", disse a parlamentar.

A artista Eliana Pittman diz que se despede com tristeza de Nana Caymmi, a quem descreveu com uma das uma "das maiores vozes" que o Brasil já teve, e elogiou a cantora pela irreverência e forte personalidade.

"Nana nunca se curvou a convenções: cantava o que queria, do jeito que queria - e por isso, marcou gerações", disse Eliana, que também fez elogios qualidade técnica da intérprete. "Sua voz grave, seu timbre inconfundível e sua forma tão particular de existir na música deixam um vazio irreparável".

O Grupo MPB4 postou: "Siga em paz, querida Nana Caymmi! Nosso mais fraterno abraço para os amigos Dori Caymmi, Danilo Caymmi (irmãos de Nana Caymmi) e toda a família".

A cantora Nana Caymmi morreu nesta quinta-feira, aos 84 anos, em decorrência de problemas cardíacos. Ela estava internada há nove meses na Clínica São José, no Rio de Janeiro. A morte da cantora foi confirmada por seu irmão, o músico e compositor Danilo Caymmi, no início da noite.

Além dos problemas cardíacos que abalaram sua saúde em 2024, que obrigaram os médicos implantar um marcapasso para contornar uma arritmia cardíaca, Nana enfrentou um câncer de estômago em 2015.

Filha do compositor baiano Dorival Caymmi e da cantora Stella Maris, Nana nasceu no Rio de Janeiro, com o nome de Dinahir Tostes Caymmi, o mesmo de uma tia, irmã do pai. Incentivada pelos pais, começou a estudar piano clássico ainda criança. Em 1960, entrou no estúdio com Caymmi para fazer sua primeira gravação, Acalanto, a canção de ninar feita para ela pelo pai. No mesmo ano, gravou um compacto simples com as músicas Adeus e Nossos Beijos.

Ao mesmo tempo que dava seus primeiros passos na carreira como cantora, Nana decide deixar o Brasil e se casar com o médico venezuelano Gilberto José Aponte Paoli, com quem teve seus três filhos, Stella, Denise e João Gilberto.

De volta ao País, separada, enfrenta o preconceito de Caymmi, que decide não falar mais com a filha. Nana é então socorrida pelo irmão, Dori, que faz a canção Saveiros para ela cantar no I Festival Internacional da Canção (TV Globo). Foi vaiada ao ser anunciada a vencedora da competição.

Casada agora com Gilberto Gil, apresenta-se no III Festival de Música Popular Brasileira na TV Record, em 1967, com a canção Bom Dia, assinada em parceria com Gil. Grava com o grupo Os Mutantes a canção Alegria, Alegria, de Caetano Veloso, além de um álbum de carreira.

Em 1973, faz uma exitosa temporada em Buenos Aires, na Argentina, onde lança um disco pela gravadora Trova. No repertório, músicas de compositores que seriam presença constantes em seus discos, como Tom Jobim, João Donato, Chico Buarque, além de Caymmi. Nesse mesmo ano, Caymmi se reaproxima da filha, em um programa de televisão.

Ao longo dos anos 1970 e 1980, grava regularmente. Seus álbuns reuniam não somente um repertório sofisticado, mas também grandes músicos, como João Donato, Helio Delmiro, Toninho Horta, Novelli, além dos irmãos Dori e Danilo. Em 1980, participa da faixa Sentinela, no disco de Milton Nascimento. No início dos anos 1990, grava Bolero, disco inteiramente dedicado ao gênero.

Com o prestígio de uma das principais cantoras do País, Nana, embora tenha alcançado relativo sucesso com músicas como Mãos de Afeto, Beijo Partido, Contrato de Separação e De Volta ao Começo, além de ser voz presente em trilhas sonoras de novelas da TV Globo, não tinha, no entanto, a mesma popularidade de nomes como Maria Bethânia, Gal Costa e Elis Regina.

Sucesso popular

O reconhecimento popular só chegou em 1998, quando o bolero Resposta ao Tempo, de Cristovão Bastos e Aldir Blanc, foi escolhido para ser tema de abertura da minissérie Hilda Furacão, de Glória Perez. A história da moça de uma família tradicional mineira que larga o noivo no altar e se torna uma das mais famosos prostitutas da zona boêmia de Belo Horizonte conquistou a audiência e ampliou o público de Nana.

Anos antes, Nana havia batido na trave. Sua gravação de Vem Morena havia sido escolhida para a abertura da novela Tieta, um dos maiores sucessos da TV Globo. Porém, dias antes da estreia da trama, em agosto de 1989, o então diretor geral da emissora, José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, pediu uma música "mais animada". Ele mesmo fez a letra da canção gravada por Luiz Caldas. "Fiquei esperando minha música tocar e aparece o Luiz Caldas dizendo que a lua estava cheia de tesão", reclamou, tempos depois, Nana nos jornais.

Com a carreira em alta, arrisca e coloca em prática um antigo desejo: fazer uma segundo volume de um álbum dedicado apenas a boleros. Sangra de Mi Alma foi lançado em 2000, com clássicos do gênero como Amor de Mi Amores e Solamente Una Vez, essa última escolhida para trilha da novela Laços de Família.

Nos anos 2000, Nana se dedica a regravar as canções de Caymmi em álbuns temáticos. O Mar e o Tempo (2002), Para Caymmi: de Nana, Dori e Danilo (2004), Quem Inventou o Amor (2007) e Caymmi (2013) compreenderam boa parte da obra do compositor.

Seus últimos dois álbuns foram Nana Caymmi Canta Tito Madi, de 2019, sobre a obra do compositor pré-bossanovista, e Nana, Tom, Vinicius, de 2020, com canções de seus dois grandes amigos, Tom Jobim e Vinicius de Moraes.

Nana, porém, a essa altura, já estava afastada dos palcos. Sua última apresentação foi em 2015, em São Paulo. A cantora havia prometido voltar a cantar ao vivo se o empresário Danilo Santos de Miranda, seu grande amigo, diretor do Sesc São Paulo, se recuperasse de uma internação. Miranda morreu em outubro de 2023. O Selo Sesc, projeto criado por Miranda, guarda um registro inédito do show Resposta ao Tempo, gerado a partir de uma apresentação de Nana no Sesc Pompeia.

A última imagem conhecida de Nana é a que aparece no documentário Dorival Caymmi - Um Homem de Afetos, de Daniela Broitman. Nele, Nana dá um forte depoimento sobre o pai e canta, à capela, o samba canção Não Tem Solução, em um dos melhores momentos do filme.

Em agosto de 2024, o cantor Renato Brás lançou a faixa A Lua e Eu, sucesso de Cassiano, com a participação de Nana nos vocais. A voz de Nana foi capturada em sua casa, no Rio de Janeiro.

Em sua última entrevista ao Estadão, quando completou 80 anos, Nana manifestou o desejo de gravar as parcerias do irmão Dori com Nelson Motta. Também desejava cantar Milton Nascimento - um de seus grandes amigos - e Beto Guedes. "Se eu não gravei, são inéditas para mim", disse, reforçando uma insatisfação constante dos últimos anos, a de que não havia bons novos compositores para lhe fornecerem repertório.

Como uma metáfora da vida, Nana, também nessa entrevista, falou sobre seu sentimento ao gravar uma canção. "Ela acontece, assim como o amor. É como uma nascente, ela corre. Para quem consegue molhar o rosto nessa água límpida, como eu faço quando estou gravando, é um delírio", disse.