Morre, aos 93 anos, Antônio da Silveira Mendonça, um dos principais latinistas do Brasil

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Morreu na terça-feira, 28, aos 93 anos, em decorrência de um acidente vascular cerebral, o professor e tradutor Antônio da Silveira Mendonça, em São Paulo. Formado em Letras pela Universidade de São Paulo (USP), onde também lecionou durante décadas, Mendonça se notabilizou por ser um dos grandes latinistas do Brasil e referência no estudo da cultura do mundo clássico.

Nascido em 3 de fevereiro de 1930, na cidade de Santa Lúcia, interior de São Paulo, Mendonça formou-se no curso de Letras Clássicas e Vernáculas da USP, em 1956, aos 26 anos, e seguiu a carreira acadêmica na mesma universidade, concluindo mestrado, doutorado e pós-doutorado na instituição.

Viveu a vida de forma regrada, disciplinada, cultuando os clássicos e sempre inclinada aos estudos e à educação. A formação religiosa, na adolescência, e acadêmica, na fase adulta, o tornou um profissional poliglota, capaz de falar e lecionar até seis idiomas diferentes: português, espanhol, grego, italiano, francês e latim.

Mendonça quase seguiu carreira religiosa. Aos 12 anos, foi acolhido por padres de uma igreja em São Carlos, interior do Estado, anos depois da morte do pai, que veio a óbito quando Antônio ainda era criança. Iniciou os estudos, se destacou e até foi enviado para a Itália para estudar Teologia. Mas, desistiu e voltou ao Brasil.

Em São Paulo, ingressou na USP, onde mais tarde conheceria a sua mulher, também formada em Letras, Zulmira Pesqueira Mendonça, com quem se manteve casado por mais de 40 anos. Desta união, nasceram Luís Fernando, Marcos e Flávia.

"Ele não era de usar muitas palavras, mas, quando abria a boca, a gente parava para escutar", diz a psicóloga Flávia Mendonça, 55 anos, a filha mais nova de Antônio. Para Marcos Mendonça, administrador de empresas e filho do meio, o pai "era um cara cartesiano". "Ele era muito pontual nos horários e não gostava de falta de responsabilidade."

Na adolescência, quando Marcos estudava no Colégio Santa Cruz, em São Paulo, experimentou a sensação de ser aluno do próprio pai. "Era um professor linha-dura", lembra, "mas muitas pessoas chegavam até a mim e diziam: 'eu aprendi a escrever, de fato, com o seu pai'".

Antônio foi professor de português da tradicional escola paulista entre as décadas de 1960 e 1980. Durante este período, não ficou marcado apenas pela postura exigente que carregava de casa para a sala de aula. Mendonça também marcou os estudantes com os churrascos que fazia em eventos do Santa Cruz.

"Quando ele saiu da escola, as pessoas brincavam dizendo que até conseguiriam achar outro professor de português, mas que o churrasco dele era impossível substituir", conta Flávia.

O domínio sobre as línguas permitiu a Mendonça se destacar também com o trabalho de tradução do latim para o português de obras clássicas, como, por exemplo, A guerra civil, de Júlio César, e O divino Júlio, texto de Suetônio que integra o volume Vidas de César. E do italiano, ele também traduziu Júlio César: o ditador democrático, de Luciano Canfora.

Na USP, na condição de professor da pós-graduação do Programa de Letras Clássicas, era comum ele incentivar seus alunos a também se desenvolverem na área da tradução.

Os filhos contam, inclusive, que essa relação com os graduandos e pós-graduandos costumava ser preenchida por conselhos, pelo incentivo constante aos estudos e de reuniões e jantares na própria casa. "Ele sempre foi muito acolhedor, e gostava de comprar a causa dos seus alunos", diz Flávia.

"O professor Mendonça foi meu professor de Letras na graduação e pós-graduação", lembra Paulo Martins, atual diretor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP ao Estadão. "Era uma pessoa muito acima da média, na minha opinião, e tenho um carinho enorme por ele."

Antônio da Silveira Mendonça também liderava a área de Letras Clássicas da Universidade de Campinas (Unicamp), campo de estudo que ele mesmo fundou dentro do Departamento de Linguística da instituição no final da década de 1980.

Na USP, chegou a trabalhar por mais de 40 anos. E, mesmo aposentado, continuou lecionando, orientando teses e participando de bancas de avaliação.

Toda dedicação aos estudos da cultura clássica era também transportada para dentro de casa. Nos momentos de descanso, gostava de passar o tempo escutando cantos gregorianos e músicas francesas - melhor ainda se estivessem na voz de Édith Piaf. Porém, em alguns momentos, Mendonça deixava o erudito de lado para abrir espaço à brasilidade do samba e da MPB (Música Popular Brasileira).

O futebol, que tanto jogou na adolescência, o fez se tornar "um super-palmeirense". E foi também um admirador e praticante de tênis, de todos os tipos e ambientes: de mesa, nas quadras (onde gostava de jogar com os padres do Colégio Santa Cruz) e nas areias da praia de Ubatuba, onde a família tinha uma casa.

"Ele gostava de cuidar da família, da casa, dos alunos e de costurar essas relações", diz Marcos Mendonça. "Tanto que", lembra Flávia, "ele sempre acolheu os nossos primos aqui em casa por algum período. Nossos quartos eram com mais de uma cama. Ele tratava todos de forma muito igual, sem diferença."

De cuidador, passou a ser cuidado também. Aos 87 anos, Antônio Mendonça começou a precisar de assistência médica constante e a conviver com uma equipe de cuidadores que passou a acompanhá-lo todos os dias. Mas, sem perder o tino de orientador que cultivou por muitos anos, era comum puxar os enfermeiros de canto para dar mais uma de suas sugestões: "Estude inglês, é importante!".

Apesar de cultivar a união familiar, optou por nunca querer morar com os filhos, mesmo que isso lhe custasse ter menos tempo com aquilo que ele dizia, literalmente, amar: os netos.

Com o tempo, foi ficando mais debilitado. Teve uma fratura de fêmur que o obrigou a se locomover por cadeiras de rodas e complicações médicas o levaram a ser internado por 20 vezes este ano. "Todas as vezes em que ele voltava pra casa, a gente dizia que batia na trave e ele estava de volta para o jogo", conta Flávia. "Mas, desta vez, infelizmente, ele não voltou."

A missa de sétimo dia está marcada para segunda-feira, 4, às 19h, na Paróquia São João Bosco, na Rua Cerro Corá, nº 2.101, no Alto da Lapa.

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O corpo da cantora Nana Caymmi será velado no Theatro Municipal do Rio de Janeiro nesta sexta-feira, 2, a partir das 8h30. O enterro ocorrerá às 14h, no Cemitério São João Batista, no bairro de Botafogo.

Uma das principais cantoras do Brasil, Nana morreu na noite desta quinta-feira, 1º, aos 84 anos, depois de ficar nove meses internada na Casa de Saúde São José, no Rio, para tratar uma arritmia cardíaca. De acordo com nota divulgada pelo hospital, a causa da morte de Nana foi a disfunção de múltiplos órgãos.

Ao Estadão, o irmão de Nana, o músico e compositor Danilo Caymmi, afirmou que, além da implantação de um marcapasso para corrigir a arritmia cardíaca, Nana apresentava desconforto respiratório e passava por hemodiálise diariamente. Nana também sofria de um quadro de osteomielite, uma infecção nos ossos, que lhe causava muitas dores. Segundo ele, Nana esteve lúcida por todo o tempo, mas, no dia 30 de abril, entrou em choque séptico.

Filha do compositor Dorival Caymmi, Nana começou a carreira no início dos anos 1960, ao lado do pai. Após se afastar da vida artística para se casar - ela teve três filhos, Stella, Denise e João Gilberto -, Nana retomou a carreira ainda na década de 1960, incentivada pelo irmão Dori Caymmi.

Nos anos 1970 e 1980, gravou os principais compositores da música brasileira, como Milton Nascimento, Tom Jobim, Vinicius de Moraes, Sueli Costa, Ivan Lins, João Donato e Dona Ivone Lara.

Em 1998, conheceu a consagração popular ao ter o bolero Resposta ao Tempo, de Aldir Blanc e Cristóvão Bastos, incluído como tema de abertura da minissérie Hilda Furacão, da TV Globo.

Nana gravou discos regularmente até 2020, quando lançou seu último trabalho, o álbum Nana, Tom, Vinicius, só com canções de Tom Jobim e Vinicius de Moraes.

A cantora Nana Caymmi, que morreu na noite desta quinta-feira, 1º, aos 84 anos, fez aniversário no último dia 29 de abril. Internada desde julho de 2024, Nana recebeu uma mensagem da também cantora Maria Bethânia, de quem era amiga.

Bethânia escreveu: "Nana, quero que receba um abraço muito demorado, cheio de tanto carinho e admiração que tenho por você. Querida, precisamos de você e da sua voz. Queremos você perto e cheia de suas alegrias, dons e águas do mar na sua voz mais linda que há. Amor para você, hoje, seu aniversário, e sempre. Rezo à Nossa Senhora para você vencer esse tempo tão duro e difícil. Peço por sua voz e por sua saúde. Te amo. Sua irmã, Maria Bethânia".

Nana e Bethânia tinham uma longa relação de amizade e gravaram juntas no álbum Brasileirinho, de Bethânia, lançado em 2003. Bethânia afirmou mais de uma vez que Nana era a maior cantora do Brasil.

De acordo com informações divulgadas pela Casa de Saúde São José, onde Nana estava internada há nove meses para tratar de problemas cardíacos, a cantora morreu às 19h10 desta quinta-feira, em decorrência da disfunção de múltiplos órgãos.

Morreu nesta quinta-feira, 1° de maio, Nana Caymmi, aos 84 anos, em decorrência de problemas cardíacos. A morte foi confirmada pelo irmão da artista, o também músico e compositor Danilo Caymmi. Ela estava internada havia nove meses em uma clínica no Rio de Janeiro.

"Eu comunico o falecimento da minha irmã, Nana Caymmi. Estamos, lógico, na família, todos muito chocados e tristes, mas ela também passou nove meses sofrendo em um hospital", disse Danilo Caymmi.

"O Brasil perde uma grande cantora, uma das maiores intérpretes que o Brasil já viu, de sentimento, de tudo. Nós estamos, realmente, todos muito tristes, mas ela terminou nove meses de sofrimento intenso dentro de uma UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do hospital", acrescentou o irmão, em um vídeo publicado no Instagram.

Nas redes, amigos e admiradores também prestaram homenagens à cantora.

"Uma perda imensa para a música do Brasil", escreveu o músico João Bosco, com quem Nana dividiu palcos e microfones. Bosco também teve canções interpretadas por Nana Caymmi, como Quando o Amor Acontece.

O cantor Djavan disse que o País perde uma de suas maiores cantoras e ele, particularmente, uma amiga. "Descanse em paz, Nana querida. Vamos sentir muito sua falta, sua voz continuará a tocar nossos corações."

Alcione também diz que perdeu uma amiga e que a intérprete, filha de Dorival Caymmi, tinha "a voz". "Quem poderá esquecer de Nana Caymmi?"

"Longe, longe ouço essa voz que o tempo não vai levar! Nana das maiores, das maiores das maiores", postou a cantora Monica Salmaso, que já tinha prestado uma homenagem para Nana na última terça, quando a artista completou 84 anos. "Voz de catedral", descreveu Monica na ocasião.

O escritor, roteirista e dramaturgo Walcyr Carrasco disse que, nesta quinta, a música brasileira deve ficar em silêncio em respeito à partida da artista. "Que sua voz siga ecoando onde houver saudade. Meus sentimentos à família, amigos e admiradores!"

A deputada federal e ex-prefeita de São Paulo Luiza Erundina (PSOL-SP) disse que Nana Caymmi tinha umas das vozes "mais marcantes da música popular brasileira" e que a cantora deixa um "legado extraordinário" para o Brasil por meio de interpretações "únicas e carregadas de emoção". "Que sua arte siga viva, e que ela descanse em paz", disse a parlamentar.

A artista Eliana Pittman diz que se despede com tristeza de Nana Caymmi, a quem descreveu com uma das uma "das maiores vozes" que o Brasil já teve, e elogiou a cantora pela irreverência e forte personalidade.

"Nana nunca se curvou a convenções: cantava o que queria, do jeito que queria - e por isso, marcou gerações", disse Eliana, que também fez elogios qualidade técnica da intérprete. "Sua voz grave, seu timbre inconfundível e sua forma tão particular de existir na música deixam um vazio irreparável".

O Grupo MPB4 postou: "Siga em paz, querida Nana Caymmi! Nosso mais fraterno abraço para os amigos Dori Caymmi, Danilo Caymmi (irmãos de Nana Caymmi) e toda a família".