Chefe da embaixada dos EUA pede desculpas por crise de brasileiros deportados algemados

Internacional
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Principal autoridade dos Estados Unidos no Brasil, o novo encarregado de negócios da embaixada americana em Brasília, Gabriel Escobar, pediu "desculpas" ao Itamaraty, nesta quarta-feira, dia 29, por causa da crise causada pela deportação de brasileiros em condições degradantes.

Escobar foi pessoalmente ao Ministério das Relações Exteriores, pela segunda vez nesta semana, e tratou do episódio novamente. O Estadão ouviu relatos de diplomatas que testemunharam a conversa dele pela manhã, a portas fechadas, com a secretária de Europa e América do Norte, embaixadora Maria Luisa Escorel de Moraes.

Recém-chegado ao País, o diplomata havia pedido uma visita de cortesia para se apresentar à embaixadora, antes mesmo de a crise ocorrer. Na sexta-feira, dia 24, um voo com 88 brasileiros deportados - entre homens, mulheres e crianças - aterrissou em Manaus, e a Polícia Federal constatou que estavam algemados pelos pés e mãos em território nacional, o que contraria acerto entre os países.

O Departamento de Estado não é responsável pela operação dos voos de deportação, mas conduziu os entendimentos diplomáticos e consulares com o Itamaraty para que fossem aceitos pelo Brasil.

A agência que realiza a remoção dos imigrantes ilegais é o Serviço de Imigração e Controle de Alfândega dos EUA - US Immigration and Customs Enforcement (ICE). O uso de algemas e correntes é praxe pelas autoridades migratórias dos EUA nesses voos, mas o Brasil argumenta que não pode ser generalizado e deve ser interrompido ao entrar em território nacional.

"O uso indiscriminado de algemas e correntes viola os termos de acordo com os EUA, que prevê o tratamento digno, respeitoso e humano dos repatriados", disse o Itamaraty, em nota na qual afirmou que cobraria esclarecimentos de Washington.

Consultado previamente sobre o encontro nesta quarta-feira, o ministro Mauro Viera autorizou que Gabriel Escobar fosse recebido para tratar de assuntos diversos e recomendou que a secretária Escorel reforçasse a ele a insatisfação do Brasil a respeito do caso. O governo Lula preferiu usar canais diplomáticos e não quer escalar a primeira crise com Donald Trump.

A embaixadora disse que o Brasil vê os imigrantes não como criminosos, mas sob a ótica de direitos humanos, como trabalhadores que foram aos EUA em busca de renda e de uma vida melhor, como enviar dinheiro para seus familiares. Reiterou que, mesmo que houvesse algum condenado por crime a bordo (não era o caso), ainda assim ele teria direito à defesa e tratamento digno.

A secretária queixou-se ainda sobre o longo tempo do trajeto (teriam sido cerca de 15 horas) em más condições - o avião teria tido problemas técnicos ao sair dos EUA e parou no Panamá e em Manaus (AM), embora o destino fosse Confins (MG). Por determinação do presidente Lula, que foi avisado do caso a partir da intervenção da Polícia Federal, uma aeronave da Força Aérea Brasileira recolheu os deportados e os levou até Minas Gerais.

O Ministério das Relações Exteriores denunciou em comunicado "o uso das algemas e correntes, o mau estado da aeronave, com sistema de ar-condicionado em pane, entre outros problemas, e a revolta dos 88 nacionais a bordo pelo tratamento indigno recebido".

"O governo brasileiro considera inaceitável que as condições acordadas com o governo norte-americano não sejam respeitadas. O Brasil concordou com a realização de voos de repatriação, a partir de 2018, para abreviar o tempo de permanência desses nacionais em centros de detenção norte-americanos, por imigração irregular e já sem possibilidade de recurso", afirmou o Itamaraty.

Os deportados reclamaram do calor por suposto problema no ar-condicionado, da proibição de beber água e dificuldade para usar o banheiro por longas horas. Houve discussões a bordo e até denúncias de agressões físicas e ofensas por parte dos agentes de imigração dos EUA que conduziam o voo.

A embaixadora também argumentou que seria natural que qualquer pessoa, depois de tanto tempo dentro do avião, desejasse sair o mais rápido possível ao aterrissar, ainda mais com sistema de refrigeração danificado e no calor de Manaus.

Segundo diplomatas, além do pedido de desculpas verbal Gabriel Escobar chegou a argumentar que a PF teria demorado ao intervir no caso, mas também reconheceu que a comunidade brasileira não é o principal foco de problemas nos EUA, nem pelo aspecto numérico, nem por eventual envolvimento em crimes, embora possam ocorrer casos pontuais.

O argumento de que os imigrantes são criminosos em busca de refúgio nos EUA move apoiadores do presidente Donald Trump. Casos de países centro-americanos são muito mais graves - e foco da primeira incursão na América Latina do secretário de Estado, Marco Rubio.

O ICE tem ordem de remoção de 38.677 brasileiros, num universo de 1,4 milhão de ilegais que ainda permanecem nos Estados Unidos, aguardando remoção, no momento em que Trump ordena um recrudescimento da polícia migratória.

Na segunda-feira, dia 27, Gabriel Escobar fora chamado, por iniciativa do Itamaraty, para ouvir queixas formais do governo brasileiro em conversa com a embaixadora Márcia Loureiro, secretária de Comunidades Brasileiras e Assuntos Consulares e Jurídicos.

Escobar fala português e tem uma carreira profissional com mais de 30 anos na diplomacia dos Estados Unidos. Ele chegou a ser indicado como embaixador no Paraguai, mas o processo de aprovação não avançou a tempo.

O encarregado de negócios americano assumiu a função em Brasília no dia 21 de janeiro, e não foi uma escolha de Trump. A gestão Joe Biden organizou a vinda de Escobar para substituir interinamente a embaixadora Elizabeth Bagley, muito ligada ao Partido Democrata.

Embora já tenha indicado nomes para Colômbia, México e Argentina, entre outros, ele não apontou seu futuro embaixador no Brasil. Fontes do Itamaraty indicaram que a escolha pode demorar ainda mais.

Lula e Trump jamais se falaram e têm histórico de declarações um contra o outro, além de aliados em campos políticos opostos. A possibilidade de contato de alto nível entre eles é remota, embora fosse cogitada desde a eleição de novembro pelo Palácio do Planalto. As portas estão fechadas.

Embaixadores brasileiros afirmam que o chanceler Mauro Vieira está aberto a falar com o secretário de Estado, Marco Rubio, íntimo do espectro bolsonarista. E que o Brasil já indicou a disposição ao diálogo e a um relacionamento pragmático e construtivo.

Diante do impasse e da ausência de canais, a diplomacia vai apostar em contatos do empresariado e da política parlamentar. Uma estratégia da embaixada brasileira em Washington definida nesta semana será ativar mais a frente parlamentar Brasil-EUA no Congresso americano, a Brazil Caucus.

O grupo é formado por uma maioria de democratas e tem somente três representantes dos republicanos. A intenção da embaixada é atrair mais nomes ligados a Trump. A dupla presidência da frente conduzida pelo deputado republicano Lance Gooden, do Texas, e da deputada democrata Sydney Kamlager, da Califórnia.

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Senadores brasileiros tiveram uma primeira reunião de trabalho na noite desde sábado, em Washington, nos Estados Unidos, no âmbito da missão oficial à capital americana para debater as tarifas de 50% aos produtos brasileiros, a partir do dia 1º de agosto. Participaram das conversas Teresa Cristina (PP-MS), Nelsinho Trad (PSD-MS), Esperidião Amin (PP-SC), o astronauta Marcos Pontes (PL-SP) e Fernando Farias (MDB-AL).

O encontro foi preparatório e teve como foco atualizar os parlamentares sobre os temas prioritários e alinhar os pontos que deverão ser discutidos nas reuniões com congressistas norte-americanos e representantes do setor produtivo dos EUA.

"O objetivo foi promover uma atualização da temática e alinhar os pontos que deveremos abordar ao longo da missão. Essa preparação é fundamental para garantir uma atuação coesa, institucional e estratégica em nome do Brasil", afirmou o senador Nelsinho Trad (PSD-MS), presidente da Comissão de Relações Exteriores e coordenador da missão, em nota.

Os senadores Carlos Viana (Podemos-MG), Jacques Wagner (PT-BA) e Rogério Carvalho (PT-SE) devem chegar a Washington neste domingo.

A missão oficial do Senado brasileiro à capital americana ocorre em meio ao início do recesso parlamentar nos EUA. A Câmara dos Deputados entrou em recesso na semana passada, enquanto o Senado americano deve ter sessão até o dia 31 de julho.

Com a agenda parlamentar esvaziada, o foco da missão brasileira deve ser o setor corporativo. As tentativas de negociações do Brasil com os EUA ganharam corpo nos últimos dias, mas nenhum avanço de fato ocorreu, em meio ao temor de que os americanos adotem novas sanções contra o País.

Há a expectativa de que o presidente dos EUA, Donald Trump, assine uma ordem executiva nos próximos dias com as justificativas legais para taxar os produtos importados do Brasil em 50%, a partir de agosto, conforme relatos na imprensa. Isso porque a investigação do Escritório de Representação de Comércio dos EUA (USTR, na sigla em inglês) para apurar práticas comerciais injustas no Brasil, e que também teria o mesmo objetivo, poderia consumir mais tempo.

Na semana passada, senadores americanos enviaram uma carta ao presidente Trump, criticando a taxação ao Brasil. No documento, acusam o chefe da Casa Branca de "claro abuso de poder" e que interferir no sistema jurídico de uma nação soberana cria um "precedente perigoso" e provoca uma "guerra comercial desnecessária ".

A defesa do general Mario Fernandes pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a revogação de sua prisão preventiva ou a aplicação das mesmas medidas cautelares impostas a Jair Bolsonaro (PL). O argumento dos advogados é de que o ex-presidente da República foi denunciado como líder da organização criminosa envolvendo a tentativa de golpe, posição superior à do general dentro da acusação.

A manifestação foi protocolada no STF na noite do sábado, 26, após se encerrarem os interrogatórios do núcleo dois da ação penal da tentativa de golpe.

A defesa também afirmou que o general "não confessou plano de matar ninguém" e argumentou que os interrogatórios comprovaram que o documento "Punhal Verde Amarelo" não foi recebido por nenhum outro acusado.

Na quinta-feira, 24, Fernandes confirmou, em depoimento ao STF, ser o autor do documento "Punhal Verde Amarelo", que descrevia a possibilidade de "envenenamento" do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e "neutralização" do seu vice, Geraldo Alckmin (PSB).

O arquivo havia sido encontrado em um HD apreendido com o general, em fevereiro de 2024. O militar disse que o documento não foi apresentado a ninguém.

"Esse arquivo digital nada mais retrata do que um pensamento meu que foi digitalizado, um compilar de dados, um estudo de situação meu, de pensamento, uma análise de riscos que eu fiz e por um costume próprio decidi digitalizá-lo. Não foi apresentado a ninguém ou compartilhado com ninguém", afirmou no interrogatório.

Com base no depoimento, a Procuradoria-Geral da República opinou que o general deveria ser mantido preso e disse que as provas colhidas "tornam inverossímil presumir que o requerente, após confeccionar o material, não o divulgou a seus pares".

O argumento foi rebatido pela defesa do general. Os advogados citaram que o tenente-coronel Mauro Cid, delator na ação, foi questionado sobre o Punhal Verde e Amarelo e confirmou não ter recebido cópia do documento.

Cid também disse que o general nunca conversou com ele sobre ações de monitoramento do ministro do Supremo Alexandre de Moraes, que foram realizadas por militares das Forças Especiais. De acordo com a defesa, essas informações demonstrariam que o general não participou de nenhuma ação concreta envolvendo o plano de golpe.

"A defesa nunca presumiu nada, apenas demonstrou, e não caberia a ela este ônus, que o arquivo eletrônico não foi apresentado a ninguém, tal como declarou Mauro Cid. Agora, quem não pode presumir no devido processo legal é a acusação, que por imposição legal e sem presunções, tem o dever efetivo de comprovar e provar o fato narrado na denúncia", escreveram os advogados Marcus Vinicius Figueiredo, Igor Monteiro e Diogo Borges.

A defesa argumenta que, no interrogatório, o general somente confirmou um fato já comprovado nos autos, mas que não realizou nenhuma ação para colocar em prática o Punhal Verde Amarelo. Por isso, a defesa afirma que ele "não confessou plano de matar ninguém".

"A minuta punhal verde amarelo já era vinculada ao requerente, razão pela qual a confirmação daquele arquivo pelo requerente em seu interrogatório não exprime qualquer confissão de crime, pois como já incontroversamente constatado não foi objeto de compartilhamento ou debate com quaisquer dos acusados", afirmou a defesa.

Por isso, afirmam que a prisão preventiva e uma eventual condenação só poderiam se basear em "elementos concretos" e na certeza das provas. Eles argumentam que o fato de que outros investigados estavam no Palácio do Planalto no mesmo horário em que o documento foi impresso não comprova a acusação descrita na denúncia: "Condenação se legitima apenas pela certeza, nunca pela coincidência".

Decreto golpista de Bolsonaro

O general também havia confirmado, em seu interrogatório, ter tomado conhecimento de que o ex-presidente Jair Bolsonaro discutia um decreto com teor golpista, mas disse não ter participado da construção do documento.

A Polícia Federal citou, no relatório final, a existência de mensagens enviadas por ele a Mauro Cid nas quais pede ao tenente-coronel que convencesse Bolsonaro a assinar o decreto.

A defesa afirmou que esses elementos indicam que ele não participou da elaboração do documento. "O requerente tomou conhecimento da suposta minuta do Golpe por conversas de corredor, tanto é que jamais participou de qualquer reunião ou qualquer outra situação envolvendo a construção daquela minuta - fato incontroverso", diz a manifestação da defesa.

Por último, os advogados solicitaram que a prisão preventiva do general seja revogada ou que deveriam ser aplicadas a ele as mesmas medidas cautelares impostas a Bolsonaro, já que o ex-presidente foi denunciado como líder da organização criminosa, posição superior à ocupada por Mario Fernandes na estrutura da acusação.

"Insubsistente a manifestação da d. Procuradoria que não reflete a realidade dos fatos, causando estranheza a contradição entre a denúncia e o conteúdo da sua manifestação, objeto da presente petição, impondo-se a revogação da prisão preventiva ou a aplicação das mesmas medidas recentemente destinadas ao acusado Jair Messias Bolsonaro - indicado na denúncia como líder da organização criminosa", solicitou a defesa.

A Justiça Eleitoral de Minas Gerais aceitou denúncia do Ministério Público Estadual contra o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG). Ele se tornou réu acusado de divulgar notícias falsas e denunciação caluniosa contra o ex-prefeito de Belo Horizonte Fuad Noman na eleição de 2024. Fuad venceu o pleito, mas morreu em março deste ano vítima de câncer. A decisão foi tomada pelo juiz Marcos Antônio da Silva.

O deputado estadual Bruno Engler (PL), aliado de Nikolas que disputou a eleição para prefeito da capital mineira, a deputada estadual Delegada Sheila (PL) e a candidata a vice na chapa Cláudia Romualdo também se tornaram réus pelos mesmos crimes. O MP pediu que eles tenham os direitos políticos suspensos, o que os deixaria inelegíveis, e paguem indenização por danos morais.

Nikolas se posicionou sobre a decisão. "Devia ter feito rachadinha ou roubado o INSS. Vacilei, fui dar minha opinião", declarou. Engler e Sheila também foram procurados pelo Estadão, mas ainda não se posicionaram. A reportagem não conseguiu contato com Cláudia Romualdo.

Na reta final do segundo turno, adversários de Fuad utilizaram o livro Cobiça, escrito por ele, para acusá-lo de apologia à pedofilia. Em uma passagem da obra, a personagem rememora que foi vítima de estupro coletivo quando tinha 12 anos.

O Ministério Público afirmou que "o grupo disseminou intencionalmente informações que sabia ser inverídicas". A ação teria se dado em duas frentes: propagação de "trechos descontextualizados de obra literária de autoria do candidato e falsa imputação de responsabilidade por suposta exposição de crianças a conteúdo impróprio".

Em um vídeo divulgado nas redes sociais à época, Nikolas disse que o livro era "pornográfico". Segundo o Ministério Público, o deputado relacionou uma obra ficcional a um evento real, ao afirmar, "de forma leviana e injusta", que "o problema é quando a ficção vira a realidade e, pior, chega até seu filho". O parlamentar acusava a gestão Fuad de promover uma feira de quadrinhos na qual crianças foram expostas a "nudez, a pornografia ou até mesmo o satanismo".

Engler e Romualdo levaram o tema para a propaganda eleitoral. "Uma peça completamente perturbadora, escrita pelo prefeito Fuad Noman, um livro erótico, no qual ele descreve o estupro coletivo de uma criança de 12 anos de idade", disse o então candidato a prefeito pelo PL em uma das peças. A propaganda afirma ainda que a feira de quadrinhos tinha conteúdo sexualmente explícito.

Sheila adotou a mesma linha ao escrever em uma publicação que Fuad poderia escrever sobre o que quiser, mas que o "problema surge exatamente quando a ficção se encontra com a realidade", também mencionando o evento.

Os quatro réus terão 10 dias para responderem à acusação, juntar documentos, provas e indicar testemunhas de defesa.