Zelenski se oferece para renunciar ao cargo se a Ucrânia puder entrar para a OTAN

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O presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski, disse neste domingo, 23, que está disposto a renunciar ao cargo se isso significar paz na Ucrânia. Seu comentário veio dias depois de o presidente americano, Donald Trump, questionar sua legitimidade e o chamar de "ditador sem eleições", ecoando um argumento do Kremlin.

Ao mesmo tempo, Zelenski continuou a se opor à insistência de Trump para que ele assinasse um acordo sobre minerais que a Ucrânia diz ser desfavorável. E anunciou uma reunião na segunda-feira, 24, com mais de 30 países, pessoalmente ou online, como uma espécie de coalizão de apoio ao esforço de guerra da Ucrânia.

Não ficou imediatamente claro se Zelenski havia considerado seriamente a opção de renunciar ou se estava apenas respondendo aos últimos ataques de Washington e Moscou.

Ele acrescentou que poderia trocar sua saída pela entrada da Ucrânia na OTAN - um cenário altamente improvável, dada a oposição de Trump à entrada da Ucrânia na aliança militar.

"Se isso trouxer paz à Ucrânia e se precisarem que eu renuncie, estou pronto", disse Zelenski em uma coletiva de imprensa no domingo, na véspera do terceiro aniversário da guerra. "Em segundo lugar, posso trocar isso pela OTAN".

Por enquanto, disse Zelenski, a Ucrânia e os Estados Unidos permanecem presos em negociações sobre um acordo para trocar os minerais e outros recursos naturais da Ucrânia por ajuda americana. O líder ucraniano disse que ainda não estava pronto para assinar a última proposta dos Estados Unidos, que exigiria que a Ucrânia pagasse aos Estados Unidos US$ 500 bilhões usando as receitas de seus recursos naturais.

"Não estou assinando algo que será pago por dez gerações de ucranianos", disse, observando que as negociações continuariam.

As conversas já haviam se estendido até a noite de sábado, 22, de acordo com duas autoridades ucranianas informadas sobre as negociações, e coincidiram com um grande ataque de drones russos às cidades ucranianas durante a noite. A Força Aérea Ucraniana disse que a Rússia havia lançado 267 drones, o que considerou um recorde desde o início da guerra, há três anos. Essa afirmação não pôde ser confirmada de forma independente.

O zumbido de drones de ataque sobrevoando edifícios ecoou durante a noite no centro de Kiev, a capital, seguido pelo som de metralhadoras pesadas tentando abatê-los. A Ucrânia disse que a maioria dos drones foi abatida ou desativada por interferência eletrônica, mas que os destroços dos drones destruídos danificaram casas e provocaram incêndios em partes da capital.

Na noite de sábado, o presidente Trump aumentou a pressão sobre a Ucrânia para assinar o acordo, que está sendo negociado há mais de 10 dias. Várias minutas de acordos já foram rejeitadas pelo lado ucraniano porque não continham garantias específicas de segurança dos EUA que protegeriam Kiev contra novas agressões russas.

"Acho que estamos bem perto de um acordo, e é melhor que estejamos perto de um acordo", disse Trump à Conferência de Ação Política Conservadora na noite de sábado, observando que ele queria uma retribuição pela assistência militar e financeira americana anterior ao país devastado pela guerra. Ele também disse: "Estamos pedindo terras raras e petróleo - tudo o que pudermos conseguir".

A frustração com as negociações prolongadas alimentou uma disputa crescente entre Zelenski e Trump. O líder ucraniano disse que Trump estava vivendo em uma "teia de desinformação".

Na sexta-feira, 22, os Estados Unidos propuseram um novo esboço de acordo, obtido pelo jornal New York Times, que ainda carecia de garantias de segurança para a Ucrânia e incluía termos financeiros ainda mais rígidos. As duas autoridades ucranianas, que falaram sob condição de anonimato para discutir as negociações, disseram que a Ucrânia enviou de volta as emendas na noite de sábado.

A nova minuta do acordo reiterou a exigência dos EUA de que a Ucrânia abrisse mão de metade de suas receitas provenientes da extração de recursos naturais, incluindo minerais, gás e petróleo, bem como os ganhos provenientes de portos e outras infraestruturas.

De acordo com o acordo proposto, essas receitas seriam direcionadas a um fundo no qual os Estados Unidos teriam 100% de participação financeira, e a Ucrânia deveria contribuir para o fundo até que ele atingisse US$ 500 bilhões. Essa soma é mais de quatro vezes maior do que o valor da ajuda dos EUA comprometida com a Ucrânia até o momento e mais de duas vezes o valor da produção econômica da Ucrânia em 2021, antes da guerra.

"É astronômico para nós, e não entendo por que impor tal ônus" a uma economia que já está sofrendo com a guerra, disse Victoria Voytsitska, ex-legisladora ucraniana e especialista em energia. "Parece que as próximas duas gerações terão que pagar reparações de acordo com esse esquema."

O acordo não compromete os Estados Unidos com garantias de segurança para a Ucrânia ou promete mais apoio militar para Kiev. A palavra "segurança" foi até mesmo excluída de uma formulação contida em uma versão anterior do acordo, datada de 14 de fevereiro e analisada pelo The Times, que afirmava que ambos os países tinham como objetivo alcançar "paz e segurança duradouras na Ucrânia".

Em vez disso, o acordo diz que uma parte das receitas coletadas pelo fundo será reinvestida na reconstrução da Ucrânia. Ele também afirma que os Estados Unidos pretendem fornecer apoio financeiro de longo prazo para o desenvolvimento econômico da Ucrânia, embora nenhum valor seja especificado.

Esse possível compromisso está alinhado com o argumento da Casa Branca de que a mera presença de interesses econômicos americanos na Ucrânia impedirá futuras agressões russas.

"Essa parceria econômica estabeleceria as bases para uma paz duradoura, enviando um sinal claro ao povo americano, ao povo da Ucrânia e ao governo da Rússia sobre a importância da futura soberania e do sucesso da Ucrânia para os EUA", escreveu Scott Bessent, secretário do Tesouro dos EUA, em um artigo de opinião no sábado, 22, para o The Financial Times.

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A rede social criada por Donald Trump, Truth Social, e a plataforma de vídeos Rumble entraram com um pedido de liminar em um tribunal dos Estados Unidos contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. A informação é da agência de notícias Reuters.

O pedido busca impedir ordens emitidas pelo ministro, sob o argumento de que elas "violam a soberania americana, a Constituição e as leis dos Estados Unidos". Elas também disseram que Moraes ameaçou processar criminalmente o CEO do Rumble, Chris Pavlovski.

Na sexta-feira, 21, Moraes havia determinado a suspensão do Rumble no Brasil por tempo indeterminado, até que a plataforma cumprisse as ordens judiciais dadas e o pagamento de multas. Isso porque antes ele ordenara que a empresa indicasse representantes legais no País.

O STF já definiu que plataformas estrangeiras precisam constituir representantes no Brasil para receber intimações e responder pelas empresas.

Entenda a polêmica

Em um despacho, o ministro afirmou que a plataforma incorreu em "reiterados, conscientes e voluntários descumprimentos das ordens judiciais, além da tentativa de não se submeter ao ordenamento jurídico e Poder Judiciário brasileiros".

"Chris Pavlovski confunde liberdade de expressão com uma inexistente liberdade de agressão, confunde deliberadamente censura com proibição constitucional ao discurso de ódio e de incitação a atos antidemocráticos", escreveu Moraes.

Além de exigir a indicação de um representante legal, o ministro também havia determinado o bloqueio do canal do blogueiro Allan dos Santos e a interrupção de repasses de monetização ao influenciador. Também ordenou que novos perfis do influenciador fossem barrados. Outras redes sociais, como YouTube, Facebook, Twitter e Instagram, foram notificadas para bloquear as contas de Allan dos Santos e cumpriram as decisões de Moraes.

O STF não conseguiu intimar o Rumble porque a empresa não tem um responsável no Brasil. Os advogados localizados informaram que não são representantes legais da plataforma e que não têm poderes para receber citações ou intimações. No dia 17 de fevereiro, eles renunciaram ao mandato que tinham para atuar em causas da rede social.

O Rumble move uma ação contra Moraes na Justiça dos Estados Unidos, em conjunto com Trump Media, ligada ao presidente americano. As companhias alegam que o ministro do STF violou a soberania norte-americana ao ordenar a suspensão do perfil de Allan dos Santos. O blogueiro teve prisão preventiva decretada em 2021 e está foragido desde então.

O Rumble voltou a funcionar no Brasil em fevereiro deste ano. A plataforma, que estabelece uma política menos restrita de moderação de conteúdo, foi desativada no País em dezembro de 2023 por discordar das exigências da Justiça brasileira. Ela é conhecida por abrigar personalidades e usuários de extrema direita.

O influenciador Pablo Marçal (PRTB) foi condenado à inelegibilidade porque vendeu apoio político na campanha de 2024. Em vídeo publicado nas redes sociais, ele se ofereceu para gravar vídeos divulgando candidatos a vereador por R$ 5 mil.

Em uma transmissão ao vivo na sexta-feira, 21, o influenciador disse que vai recorrer da decisão. Ele alegou que não chegou a "materializar" os vídeos porque foi barrado pela equipe jurídica da campanha.

Pablo Marçal foi candidato à Prefeitura de São Paulo nas eleições municipais de 2024 e terminou em terceiro lugar, com 1.719.274 de votos (28,14% dos votos válidos).

Ao se oferecer para divulgar os vereadores, ele afirmou que estava "concorrendo a uma eleição desleal" porque não usou dinheiro público enquanto "os 'bonitões' gastam R$ 100 milhões para fazer propaganda enganosa".

"Você conhece alguém que queira ser vereador e é candidato, que não seja de esquerda, tá, esquerda não precisa avisar. Se essa pessoa é do bem e quer um vídeo meu para ajudar a impulsionar a campanha dela, você vai mandar esse vídeo e falar 'mano, olha aqui que oportunidade, né?' Essa pessoa vai fazer o quê? Ela vai mandar um Pix para a minha campanha de doação, Pix de cinco mil. Fez essa doação, eu mando o vídeo. Vai clicar aqui no formulário, clicou aqui no formulário, cadastra, a equipe vai entrar em contato. Tamo junto, fechou, você ajuda daqui em São Paulo e eu ajudo daí."

O juiz Antonio Maria Patiño Zorz, da 1.ª Zona Eleitoral, declarou Pablo Marçal inelegível por abuso de poder econômico e político, uso indevido de meios de comunicação social e captação ilícita de recursos.

A sentença afirma que a oferta feita pelo influenciador "foi levada a sério por candidatos a vereador que efetuaram doações confirmadas pelo requeridos" e teve "potencialidade para macular a integridade do processo eleitoral em razão do efeito que produziram na consciência política dos cidadãos".

O juiz Antonio Zorz afirmou ainda que ele espalhou fake news sobre o fundo partidário e se "colocou, de forma gravemente distorcida, como vítima de um sistema eleitoral desleal que não lhe permitiu usar financiamento público do fundo eleitoral". Com isso, na avaliação do magistrado, o influenciador comprometeu a "normalidade e legitimidade" da eleição.

Como a decisão foi tomada na primeira instância, há possibilidade de recurso ao Tribunal Regional Eleitoral.

Deflagrada pela Polícia Federal em 2015, a Operação Zelotes inicialmente apurava suspeitas de um esquema de corrupção no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf) - órgão colegiado do Ministério da Fazenda - que é a última instância administrativa para o julgamento de autuações da Receita Federal a empresas e pessoas físicas. O objetivo do esquema seria vender, por meio de conselheiros e auditores, informações privilegiadas e facilidades que pudessem resultar na reversão de multas discutidas no Carf.

Quando a operação foi deflagrada, o Carf era ocupado por 216 conselheiros, metade indicada pela Receita e outra parte por confederações empresariais, como a Confederação Nacional da Indústria (CNI), e uma parte menor pelas centrais sindicais.

Até então, os conselheiros indicados pelo setor privado podiam desempenhar suas funções no Carf e, ao mesmo tempo, advogar em casos tributários. No mês seguinte à revelação do escândalo, o governo fixou novas regras para funcionamento do órgão, com remuneração para seus integrantes e restrições ao exercício das atividades profissionais.

De acordo com os investigadores, o esquema de corrupção no Carf era "legalizado" por contratos de serviços prestados por escritórios de advocacia e consultorias que faziam lobby para influenciar nas decisões do órgão. Após abordagem das empresas alvos de multas da Receita, esses consultores elaboravam contratos para forjar a legalidade do serviço prestado. A partir daí, segundo a investigação, as empresas pagavam propina por meio de depósitos em diversas contas bancárias para evitar o rastreamento.

Os investigadores dizem que vários conselheiros do Carf se recusaram a participar do esquema e repudiaram a abordagem, mas outros aceitaram negociar decisões. À época, tramitavam no órgão mais de 115 mil processos tributários que englobam cerca de R$ 500 bilhões em discussão.

Desdobramentos da Zelote levaram a outros casos e até suspeita de compra de Medida Provisória

Com desdobramentos, a operação Zelotes foi ampliada e virou um guarda-chuva para grandes investigações sobre suspeitas de corrupção que atingiram grandes personagens da República. O ex-ministro Antonio Palocci foi uma testemunha nas investigações. O ex-ministro Guido Mantega virou réu, mas o caso dele acabou prescrito.

O caso da venda de uma Medida Provisória para favorecer montadores de veículos no segundo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em 2009, também acabou entrando no escopo da Zelotes. A denúncia foi publicada pelo Estadão em outubro de 2015.

Lula chegou a virar réu nesse caso por suposto tráfico de influência, mas foi absolvido em 2021 depois de a Justiça entender que a acusação não demonstrou de maneira convincente o envolvimento dele.

Até um filho de Lula virou réu, junto com o pai, em um processo que apontava tráfico de influência na compra de caças suecos pelo governo brasileiro. O caso das aeronaves foi suspensa pelo então ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, em 2022.

A decisão permitiu que Lula disputasse as eleições daquele ano sem responder a ações penais na Justiça. Lewandowski, hoje ministro da Justiça do governo Lula, entendeu que procuradores do DF agiam de forma articulada com membros da Lava Jato. Ele se baseou em trocas de mensagens da força-tarefa de Curitiba que acabaram vazadas por hackeamento.

Apesar dos dez anos desde a deflagração da Zelotes, ainda há ações sem julgamento e sem trânsito em julgado.