Lavrov diz que posição do Brics em defesa da Rússia não compromete mediação de Brasil e China

Internacional
Tipografia
  • Pequenina Pequena Media Grande Gigante
  • Padrão Helvetica Segoe Georgia Times

O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Serguei Lavrov, poupou de críticas nesta segunda-feira, 7, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que ameaçou países do Brics com tarifas de 10% caso adotassem políticas "anti-americanas" do grupo. Lavrov disse que o americano, que cultiva laços mais amistosos com o presidente russo Vladimir Putin, está defendendo interesses do seu país.

Lavrov afirmou que era uma "pergunta estranha", ao ser indagado por jornalistas sobre o assunto, durante a Cúpula do Brics no Rio de Janeiro. Ele reagiu dizendo que Trump não escondia sua posição em defesa da economia americana. "Ele (Trump) não esconde seus objetivos, ele defende os interesses dos Estados Unidos, principalmente econômicos, na esfera de investimentos e comércio, ele não os esconde". Para Lavrov, isso confirma "o fim do funcionamento do modelo de globalização que os Estados Unidos, no contexto neoliberal, implementaram por muitos e muitos anos".

Questionado pelo Estadão, Lavrov afirmou não enxergar que o bloco desacelerou discussões sobre um sistema financeiro alternativo, embora o governo brasileiro tenha retirado de pauta alguns temas, como a criação de uma nova moeda para fins de comércio internacional e tentando propagar a visão de que o Brics não possui viés "anti-ocidental". O foco foi reduzido nesse assunto, ao contrário do que ocorreu no ano anterior, em 2024, quando a pauta era sugestão russa em Kazan.

Embora essa seja uma pauta de interesse direto da Rússia, que deseja criar uma plataforma de investimentos e um sistema de pagamentos que escape a sanções, Lavrov se apoia no fato de que o presidente Lula a verbalizou na Cúpula de Líderes de Johannesburgo, em 2023, para atrelá-la ao petista.

"A ênfase no desenvolvimento de plataformas e mecanismos alternativos de pagamento foi feita pela primeira vez na declaração da cúpula em Joanesburgo e na proposta do presidente Lula. Ele queria um trabalho muito mais ativo nessas questões", respondeu ao Estadão.

Segundo Lavrov, a reação de Trump mostra que o mundo não vive mais sob a ordem liberal de antes. Ele acusou os EUA, sobretudo nas administrações do Partido Democrata (uma referência a Joe Biden), abusou do uso do dólar, embora agora seja coisa do passado. Ele disse que ninguém sabia quando os EUA iam querer usar o dólar para punir outros.

Lavrov diz que o Brics vem discutindo, em vez de uma nova moeda comum, o aumento das moedas nacionais para o comércio, como há iniciativas similares de Lula na América Latina. Segundo ele, na Rússia o comércio com o rublo já representa 90% do total com os países amigos do Brics. O objetivo, disse Lavrov, é evitar a dependência do dólar e do euro.

Lavrov também negou que a nova posição do Brics, em defesa dos argumentos russos na guerra da Ucrânia, não vai comprometer a sugestão de mediação apresentada pelo Brasil e China, e que levou à criação de um grupo de amigos da paz. O teor desagradou ao governo Volodmir Zelenski, que busca apoio entre países emergentes.

"Nossos amigos do Sul Global, que estão interessados em promover suas próprias iniciativas, é claro que eles podem estar na vanguarda da luta pelos direitos humanos, não como o Ocidente quer, mas como a Carta das Nações Unidas sugere", afirmou. "Não entendo como uma posição de princípio em defesa de convenções internacionais que proíbem ataques contra a infraestrutura e cidadãos pacíficos possa prejudicar qualquer iniciativa com boas intenções."

Os ataques ocorreram no fim de maio e início de junho, com explosões de viadutos e linhas de trem no Leste russo, que deixaram mortos e feridos. Moscou acusou a Ucrânia de "terrorismo" na área de fronteira, mas Kiev não assumiu a autoria.

Mesmo assim, os países do Brics atenderam aos interesses dos russos e mencionaram os ataques na declaração final. O teor foi: "condenamos nos termos mais fortes os ataques contra pontes e infraestrutura ferroviária que visaram deliberadamente civis nas regiões de Bryansk, Kursk e Voronezh, na Federação Russa, em 31 de maio e 1º e 5 de junho de 2025, resultando em várias vítimas civis, incluindo crianças".

Já ao citar a invasão russa, os países do Brics não tiveram um entendimento comum, o que ocorre desde a eclosão da guerra - somente o Brasil condenou a agressão durante votações na ONU.

Segundo Lavrov, tanto na declaração quanto nos discursos dos países sobre a guerra na Ucrânia houve manifestações "objetivas" e "bem equilibradas" e todos demonstraram entender os argumentos russos sobre a origem da invasão em 2022. O Kremlin alega que havia planos de expansão da Otan, com a eventual incorporação da Ucrânia, e diz que a aliança ocidental implantava sua "máquina de guerra" nas fronteiras russas, como afirmou o chanceler.

Em outra categoria

A ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro disse no sábado, 8, que o Congresso Nacional está "de joelhos em frente ao Supremo Tribunal Federal" e que o Judiciário governa o País. Ela também defendeu o nome do marido, Jair Bolsonaro, como "única opção" para 2026, ignorando o fato de ele estar inelegível.

"A gente tem visto um Congresso de joelhos em frente ao STF, isso é uma tristeza para a gente, porque, hoje, só quem governa é o Judiciário", disse Michelle em um evento do PL Mulher em Londrina (PR). "Os nossos deputados aprovam leis e se não tiver em concordância, eles anulam", concluiu.

No dia anterior, a defesa de Jair Bolsonaro saiu derrotada do julgamento de um recurso à condenação do ex-presidente por tentativa de golpe de Estado. Ele deve começar a cumprir a pena de 27 anos e três meses de prisão ainda neste ano.

Herança política de Bolsonaro ainda indefinida

Michelle está cotada para ser candidata a presidente da República em 2026, mas Bolsonaro ainda não bateu o martelo sobre quem será seu herdeiro político. Dentro da família, Michelle sofre a concorrência do senador Flávio Bolsonaro, um dos filhos do ex-presidente.

Com a disputa interna da direita indefinida, a ex-primeira-dama preferiu dizer que "a única opção para presidente da República da direita chama-se Jair Messias Bolsonaro". Ela disse que, se isso não acontecer, será "o verdadeiro golpe que o Judiciário está dando no povo de bem, no povo brasileiro".

No mesmo evento, Michelle disse que o marido "tem vivido dias muito difíceis". Segundo ela, Bolsonaro sofre de soluços desde que passou pela última cirurgia. "Ele chega a exaustão, ele tem vários problemas de saúde decorrente dessa última cirurgia, por ele não ter tido tempo para se recuperar, paz de espírito para se recuperar, um ambiente favorável", afirmou.

Apesar dos lamentos, Michelle demonstrou no discurso esperança com dias melhores. "Um abismo foi puxando o outro. Ele tem vivido dias muito difíceis, tendo todos os seus direitos violados. Mas essa injustiça vai acabar, eu creio", declarou.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse neste domingo, 9, que "a ameaça de uso da força militar voltou a fazer parte do cotidiano da América Latina e Caribe", em um sinal indireto às ameaças promovidas pelo governo dos Estados Unidos contra a Venezuela. Ele afirmou que "democracias não combatem o crime violando o direito internacional".

O governo de Donald Trump tem usado como pretexto para intensificar sua presença militar no Caribe o combate ao narcotráfico. Nos últimos meses, destruiu barcos que trafegavam pela região alegando que se tratava de embarcações de traficantes. Os tripulantes foram mortos.

O discurso de Lula foi feito na Cúpula Celac-União Europeia em Santa Marta, na Colômbia. O presidente brasileiro disse que a América Latina é uma "região de paz" e pretende continuar assim.

"A ameaça de uso da força militar voltou a fazer parte do cotidiano da América Latina e Caribe. Velhas manobras retóricas são recicladas para justificar intervenções ilegais. Somos região de paz e queremos permanecer em paz. Democracias não combatem o crime violando o direito internacional", declarou.

Segundo Lula, a "democracia também sucumbe quando o crime corrompe as instituições, esvaziam espaços públicos e destroem famílias e desestruturam negócios". O presidente brasileiro disse que garantir "segurança é dever do Estado e direito humano fundamental" e que "não existe solução mágica para acabar com a criminalidade". O presidente defendeu "reprimir o crime organizado e suas lideranças, estrangulando seu financiamento e rastreando e eliminando o tráfico de armas".

Lula citou a última reunião da cúpula Celac-União Europeia, há dois anos, em Bruxelas. Disse que, naquela época, "vivíamos um momento de relançamento dessa histórica parceria", mas, "deste então, experimentamos situações de retrocessos".

O petista criticou a falta de integração entre os países latinoamericanos. Afirmou que "voltamos a ser uma reunião dividida" e com ameaças envolvendo o "extremismo político".

"A América Latina e o Caribe vivem uma profunda crise em seu projeto de integração. Voltamos a ser uma região dividida, mais voltada para fora do que para si própria. A intolerância cria força e vem impedindo que diferentes pontos de vista possam se sentar na mesma mesa. Voltamos a viver com a ameaça do extremismo político, da manipulação da informação e do crime organizado. Projetos pessoais de apego ao poder muitas vezes solapam a democracia", afirmou.

Em seu discurso, Lula também citou a realização da COP30, em Belém, e mencionou o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês). Disse que o fundo "é solução inovadora para que nossas florestas valham mais em pé do que derrubadas" e que a "transição energética é inevitável".

O petista também lamentou o tornado que atingiu a cidade de Rio Bonito do Iguaçu, no Paraná, e manifestou suas condolências às vítimas da tragédia climática dos últimos dias.

O novo ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Guilherme Boulos, afirmou na tarde deste sábado, 8, em São Paulo, que governadores bolsonaristas "preferem fazer demagogia com sangue, ao tratar todo mundo da comunidade como se fosse bandido". Boulos disse que essa é a visão dos governadores do Rio, Cláudio Castro (PL), e de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e de outros chefes de Executivo estadual apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Ele lançou no Morro da Lua, região de Campo Limpo, na zona sul de São Paulo, o Projeto Governo na Rua, que tem a finalidade de ouvir a população e levar as manifestações ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Boulos declarou também que a questão do combate ao crime é antiga, mas que Luiz Inácio Lula da Silva é quem tomou a iniciativa de tentar resolver com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública e o projeto de lei antifacção. Conforme o ministro chefe da Secretaria-Geral da Presidência, com essas propostas aprovadas, o governo federal terá mais atribuições e responsabilidades para o enfrentamento ao crime.

"A gente acredita que o combate ao crime tem que fazer da maneira correta, como a Operação Carbono Oculto, da Polícia Federal, para pegar o peixe grande, não o bagrinho. O peixe grande está na Avenida Faria Lima, não na favela", acredita.