Ajuda humanitária atual é insuficiente para conter mortes por fome em Gaza, diz 'Haaretz'

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Apesar das alegações do primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, de que não há fome extrema na Faixa de Gaza, a entrega atual de ajuda humanitária no território é insuficiente para conter a crise profunda de desnutrição, segundo cálculos do jornal israelense Haaretz.

A Fundação Humanitária de Gaza (GHF, na sigla em inglês), uma organização privada apoiada por Israel e Estados Unidos que tem se ocupado da distribuição de ajuda no território desde que Tel-Aviv impôs um bloqueio de entrada, divulgou esta semana que distribuiu mais de 85 milhões de refeições desde que começou as operações há mais de 50 dias.

O número, porém, está muito aquém do necessário para que os palestinos não passem fome. Segundo cálculos feitos pelo Haaretz, se há mais de 2 milhões de palestinos em Gaza atualmente que necessitam de ao menos três refeições por dia para não serem malnutridos, seriam necessárias 353 milhões de refeições neste período.

"Mesmo que, por algum milagre, os habitantes de Gaza tivessem conseguido dividir igualmente entre si os alimentos distribuídos pela organização, cozinhá-los e extrair todas as calorias e nutrientes que continham, isso ainda seria apenas uma pequena fração dos alimentos de que precisam para sobreviver. E essa lacuna revela apenas a ponta do iceberg da matemática da fome", escreve a publicação.

O jornal destaca também a limitação dos produtos fornecidos pela fundação. De acordo com a publicação, cada pacote de ajuda, em geral, contêm quatro quilos de farinha, três de macarrão, um pote de tahine, quatro quilos de grão-de-bico e lentilhas, uma garrafa de óleo, um quilo de sal e dois quilos de arroz. Alimentos que requerem cozimento.

"Mas isso é uma missão impossível em Gaza hoje, onde quase ninguém tem uma cozinha funcionando, ou mesmo gás para cozinhar", ressalta o jornal. "Além disso, há uma grave escassez de água limpa, que também é necessária para cozinhar esses alimentos. E isso sem mencionar o óbvio: as dificuldades de guardar e armazenar alimentos por alguns dias em meio a repetidos voos e deslocamentos."

Outro problema é logístico. A GHF concentra as distribuições em apenas quatro centros. Isso obriga os palestinos a se deslocarem até os locais, contrariando os padrões de distribuição humanitária que costuma ir até os necessitados. Segundo o Haaretz, esses locais funcionam por um período curto de tempo, geralmente 15 minutos, que é tempo que leva para os alimentos acabarem. Além disso, os horários não são definidos e avisados com antecedência, forçando as pessoas a esperarem.

Essa dinâmica cria uma situação perigosa nos centros de distribuição, com aglomeração de pessoas famintas, disputando pacotes limitados de ajuda. Testemunhas e profissionais de saúde afirmam que as forças israelenses mataram centenas de pessoas ao abrir fogo contra palestinos que tentavam chegar a esses centros de distribuição ou ao se aglomerarem ao redor dos caminhões de ajuda que chegavam. O Exército israelense afirma ter disparado tiros de advertência para dispersar as ameaças.

A investigação do jornal israelense também aponta que, os palestinos que conseguem sobreviver aos tumultos em frente aos centros de distribuição saem coletando os pacotes que consegue carregar, sem que haja uma distribuição igualitária - e que priorizasse grupos vulneráveis como crianças, mulheres e pessoas com alguma necessidade especial.

Em meio a isso, há relatos de quem esteja lucrando com os pacotes de ajuda que consegue coletar. Alguns homens que conseguem pegar alimentos - alguns deles mais caros como atum, queijo e óleo - vendem em locais distantes dos centros. Quanto mais longe da distribuição, mais caro.

Por fim, o jornal denuncia a falta de variedade nos alimentos distribuídos. Não há alimentos especializados para pessoas com doença celíaca, doença cardíaca ou doença renal. E, mais grave ainda, há uma grande escassez de fórmulas infantis.

Mortes por fome

Indo contra todos os relatórios internacionais e as imagens de bebês esqueléticos em Gaza, o premiê Netanyahu afirmou que ninguém em Gaza está passando fome: "Não há política de fome em Gaza, e não há fome em Gaza. Permitimos que a ajuda humanitária chegue a Gaza durante toda a guerra - caso contrário, não haveria moradores em Gaza."

Mas Netanyahu viu seu maior aliado, o presidente Donald Trump, discordar da afirmação, observando as imagens de pessoas famintas: "Essas crianças parecem estar com muita fome", disse.

Na segunda à noite, Netanyahu foi dúbio e emitiu um comunicado no qual reconheceu que a situação no território palestino é "difícil" e disse que Israel está trabalhando para aumentar o fluxo de ajuda humanitária em Gaza.

A Organização Mundial da Saúde informou no domingo, 27, que houve 63 mortes relacionadas à desnutrição em Gaza neste mês, incluindo 24 crianças menores de 5 anos - um aumento em relação ao total de 11 mortes nos seis meses anteriores do ano.

O Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas, eleva o número ainda mais, relatando 82 mortes neste mês por causas relacionadas à desnutrição: 24 crianças e 58 adultos. Na segunda-feira, o Ministério informou que 14 mortes foram registradas em 24 horas.

Após pressão internacional, Israel anunciou, no fim de semana, pausas diárias nos ataques aéreos e para permitir a entrada de ajuda estrangeira em Gaza. Mas a população local afirma que pouco ou nada mudou em campo. A ONU descreveu a medida como um aumento de uma semana na ajuda humanitária, e Israel não informou quanto tempo essas medidas durariam.

O Exército israelense afirma que mais de 95 mil caminhões de ajuda humanitária entraram em Gaza desde o início da guerra. Isso representa uma média de 146 caminhões por dia, bem abaixo dos 500 a 600 caminhões por dia que a ONU considera necessários.

Além disso, Israel também autorizou o envio de ajuda pelo ar, o que é um risco aos palestinos já que os produtos podem cair em cima das pessoas ou até se perderem no mar.

"Essa ajuda, entregue dessa forma, é um insulto ao povo palestino", disse Hasan Al-Zalaan, que estava no local de um lançamento aéreo enquanto alguns brigavam pelos suprimentos e latas amassadas de grão-de-bico que estavam espalhados pelo chão.

Israel afirma que o grupo terrorista Hamas é a razão pela qual a ajuda humanitária não chega aos palestinos em Gaza e acusa seus combatentes de desviarem ajuda para apoiar seu domínio no território. A ONU nega que o saque de ajuda humanitária seja sistemático e que diminua ou cesse completamente quando uma quantidade suficiente de ajuda é permitida entrar em Gaza.

A ONU diz que entregar a ajuda permitida em Gaza tem se tornado cada vez mais difícil. Quando ela chega, é deixada dentro da fronteira com Gaza, e a organização precisa obter permissão militar israelense para enviar caminhões para buscá-la. Mas a ONU afirma que os militares negaram ou impediram pouco mais da metade dos pedidos de movimentação de seus caminhões nos últimos três meses.

Se a ONU conseguir recolher a ajuda, multidões famintas e gangues armadas invadem os comboios e saqueiam suprimentos. A polícia civil comandada pelo Hamas já forneceu segurança em algumas rotas, mas isso parou depois que Israel os atacou com ataques aéreos.

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O Ministério da Fazenda publicou na noite desta terça-feira, 29, em edição extra do Diário Oficial da União (DOU), uma portaria que retém 1% do valor das chamadas "emendas Pix", como ficaram conhecidas emendas parlamentares individuais repassadas no formato de "transferência especial" pelo Tesouro para Estados e municípios executarem projetos sem a necessidade de convênio firmado com a União.

"Para o custeio dos serviços de operacionalização e execução das transferências especiais realizados pela União, os valores de que trata o caput poderão ser deduzidos, conforme previsão estabelecida na Lei de Diretrizes Orçamentárias. Para o exercício de 2025, a dedução será de 1% do valor de cada transferência especial", regulamenta a portaria.

O mecanismo das "emendas Pix" foi revelado pelo Estadão/Broadcast. No ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) exigiu maior transparência e cobrou mecanismos de prestação de contas sobre o uso dos recursos. A portaria da Fazenda também busca maior publicidade na destinação dessas emendas.

"A Secretaria de Gestão e Inovação do Ministério de Gestão e Inovação dos Serviços Públicos divulgará no Transferegov.br lista de beneficiários, objetos, valores a serem transferidos e ordem de prioridade das transferências especiais extraídos do Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento - SIOP, ou outro sistema que vier a substituí-lo", diz o texto, que também prevê metas mensuráveis referentes ao valor total do plano de trabalho de cada projeto.

Após cerca de dois meses foragida, a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) foi presa na Itália nesta terça-feira, 29. A informação foi confirmada pela Polícia Federal e pelo Ministério da Justiça. Segundo apurou o Estadão com investigadores, a deputada foi localizada pelo adido da Polícia Federal em Roma, que trabalha na embaixada brasileira, em conjunto com as autoridades italianas.

Zambelli foi condenada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por articular com um hacker a invasão dos sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com o objetivo de emitir um mandado de prisão falso contra o ministro Alexandre de Moraes.

No julgamento realizado em maio deste ano, a Primeira Turma do Supremo estabeleceu pena de dez anos de prisão, em regime inicial fechado. Depois da condenação, em junho, Zambelli fugiu para o exterior. O STF pediu à Itália a extradição dela para o cumprimento de pena no Brasil. Por isso, a polícia italiana cumpriu a ordem de prisão.

Entretanto, a Justiça do país europeu ainda deve abrir um processo para decidir se vai atender ao pedido da Corte brasileira e determinar a extradição da deputada. Zambelli possui cidadania italiana.

Sua defesa alegou ontem que ela havia decidido se entregar à polícia local. Em um vídeo publicado pelo advogado Fábio Pagnozzi e gravado antes da detenção, a defesa afirma que Zambelli quis "colaborar administrativamente" com os pedidos das autoridades (mais informações nesta página).

O deputado italiano Angelo Bonelli, do Partido Europa Verde, afirmou que encontrou a deputada brasileira na Itália e forneceu o endereço à polícia de Roma. "Carla Zambelli está em um apartamento, em Roma. Forneci o endereço à polícia, neste momento a polícia está identificando Zambelli", escreveu o deputado em seu perfil no X (antigo Twitter).

Bonelli afirmou, em entrevista à GloboNews, que a deputada foi localizada por volta das 18h (horário local, às 13h no horário de Brasília), no bairro Aurélio, capital italiana. O deputado informou ao chefe da polícia italiana que, segundo ele, confirmou duas horas depois que Zambelli havia sido encontrada em um apartamento.

'Decisão política'

O procurador Vladimir Aras, ex-secretário de Cooperação Internacional da Procuradoria-Geral da República (PGR), projeta que um processo de extradição da deputada federal possa levar de um ano e meio a dois anos. "Na pior das hipóteses, ela estará solta em breve devido ao espaço para decisão política, como é comum em extradição", disse Aras ao Estadão.

Ele foi o secretário de cooperação internacional da PGR quando o Brasil conseguiu, em 2015, a extradição do ex-diretor do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, que fugiu para a Itália após ser condenado no mensalão. Aras também é professor de Direito Processual Penal na Universidade de Brasília (UnB) e especialista em Direito Penal Internacional.

Conforme o processo de extradição, um órgão equivalente ao Ministério da Justiça italiano vai decidir se pede ou não a confirmação da prisão de Zambelli. Em caso positivo, caberá à Corte de Apelação em Roma tomar uma decisão sobre o caso.

Em seguida, o Brasil terá prazo de 45 dias para formalizar a extradição. O Ministério Público italiano e a defesa de Zambelli se manifestam no processo e a Corte de Apelação decide sobre a extradição. Os advogados da deputada têm defendido que ela sofre perseguição política no Brasil.

Quem perder ainda pode recorrer à Corte de Cassação. "Se tudo correr bem, o Ministério da Justiça italiano decide se realmente vai entregá-la ao Brasil. É uma decisão política. Se optar pela extradição, a defesa pode impugnar a decisão no Tribunal Administrativo Regional de Lazio e, em seguida, no Conselho de Estado", explicou Aras.

Pizzolato fugiu do Brasil para a Itália em 2013. Ele foi preso no país europeu em fevereiro de 2014. A Justiça italiana chegou a negar o pedido de extradição e soltá-lo em outubro do mesmo ano. A decisão foi revertida após recurso. A extradição do ex-diretor do Banco do Brasil foi concretizada em outubro de 2015.

Professor de Direito Internacional da USP, Alberto do Amaral Júnior disse que a Justiça italiana analisará se os crimes atribuídos a Zambelli - invasão de dispositivos de informática e falsidade ideológica - também são puníveis pelo sistema jurídico italiano.

Segundo ele, as regras para extradição são diferentes no Brasil e na Itália. A Constituição brasileira não permite a extradição de nacionais. "Na Itália é diferente. Isso aconteceu justamente com o Pizzolato, que tinha cidadania italiana e foi extraditado a pedido da Justiça brasileira", declarou.

Prevalência

O jurista Wálter Maierovitch afirmou que, em casos de dupla cidadania, o procedimento é verificar qual delas é a prevalente. No caso de Zambelli, segundo ele, é a brasileira, porque ela construiu sua vida no Brasil e não teve atividade relevante na Itália.

Ele disse que os crimes cometidos por Zambelli têm equivalentes no sistema jurídico italiano e que a parlamentar não conseguirá respaldo político do governo da primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni.

O governo italiano é formado por uma coalizão de três partidos: a Liga Norte, comandada por Matteo Salvini - próximo do bolsonarismo, que culpa Zambelli pela derrota na eleição de 2022 -, o Força Itália, sigla de centro-direita fundada e presidida pelo ex-primeiro-ministro Silvio Berlusconi até a sua morte, em 2023, e o Irmãos de Itália, da própria Meloni.

Mesmo condenada pelo Supremo, Zambelli continua formalmente como deputada federal no Brasil enquanto a Câmara não deliberar sobre a cassação ou até que se configure o número de faltas não justificadas previsto pela Constituição. Zambelli se licenciou do mandato por 127 dias (sete para tratamento de saúde e 120 para interesse particular) no dia 5 de junho.

O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirmou que consultou o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, que repassou informações preliminares sobre a prisão da deputada. Ele disse que estava aguardando as manifestações oficiais do Ministério da Justiça e do governo italiano. "Importante lembrar que as providências que cabem à Câmara já estão sendo adotadas (...) em obediência ao Regimento e à Constituição. Não cabe à Casa deliberar sobre a prisão - apenas sobre a perda de mandato", disse Motta. (COLABOROU ADRIANA VICTORINO)

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

O líder do PT na Câmara dos Deputados, Lindbergh Farias (RJ), protocolou um requerimento à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa solicitando o encaminhamento imediato do processo de perda do mandato da deputada Carla Zambelli (PL-SP) à Mesa Diretora da Casa.

"Já tínhamos o entendimento e deduzido o pedido, em conformidade com o acórdão condenatório, no sentido de que o trânsito em julgado impõe a suspensão imediata de seus direitos políticos, nos termos do artigo 15, III, da Constituição Federal, a ser declarada pela Mesa, contudo, houve a remessa à Comissão de Constituição e Justiça, em trâmite anômalo e ilegal", escreveu o deputado.

A defesa da deputada no processo de cassação foi apresentada no começo deste mês. O processo é relatado pelo deputado Diego Garcia (Republicanos-PR), que deve apresentar relatório pedindo a cassação ou não da deputada.

Mesmo condenada e agora presa, Zambelli segue com seu mandato parlamentar enquanto a Câmara não deliberar sobre a cassação ou até que se configure o número de faltas não justificadas previsto pela Constituição.

Cabe à Mesa Diretora iniciar o procedimento com base na condenação criminal. A praxe do presidente da Casa, entretanto, tem sido levar o tema à votação no plenário.

O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), disse que aguarda manifestações oficiais do Ministério da Justiça e do governo italiano sobre a prisão da deputada.

Zambelli foi presa na Itália nesta terça-feira, 29. Ela estava foragida desde junho, quando saiu do Brasil dias após ser condenada a dez anos de prisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O nome da deputada constava na lista de difusão vermelha da Interpol.

Segundo apurou o Estadão com investigadores, a deputada foi localizada pelo adido da Polícia Federal (PF) em Roma, que trabalha na embaixada, em conjunto com as autoridades italianas.