Trump indica retaliar Canadá por reconhecimento sobre Estado palestino

Internacional
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O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou na manhã desta quinta-feira, 31, que seria "muito difícil" fazer um acordo comercial com o Canadá depois que o primeiro-ministro do país, Mark Carney, anunciou na quarta-feira, 30, que planejava reconhecer a Palestina como um Estado em setembro.

O comunicado do primeiro-ministro canadense ocorre depois que o presidente da França, Emmanuel Macron, disse que também iria reconhecer a Palestina em setembro, assim como o primeiro-ministro do Reino Unido, Keir Starmer.

"Isso tornará muito difícil para nós fazermos um acordo comercial com eles", afirmou Trump em uma publicação na plataforma Truth Social.

Trump estabeleceu o prazo de 1º de agosto para que diversos países terminassem de negociar acordos comerciais com sua administração; caso contrário, ele disse, tarifas de até 50% seriam impostas sobre os produtos que eles enviam para os Estados Unidos.

A partir de sexta-feira, as exportações do Canadá, o segundo maior parceiro comercial dos Estados Unidos, sofreriam uma tarifa de 35% caso não haja um acordo.

Pressão

Desde que assumiu o cargo em janeiro, Trump frequentemente pressionou aliados a mudar políticas, ameaçando tarifas mais altas ou dificultando negociações comerciais.

Recentemente, sua ameaça de se retirar das negociações comerciais com Camboja e Tailândia pareceu contribuir para um rápido acordo de cessar-fogo após um conflito de cinco dias entre os países. Na quarta-feira, o republicano afirmou que iria impor uma tarifa de 25% sobre todos os produtos indianos, citando suas compras de petróleo e equipamento militar da Rússia.

No início deste ano, ele ameaçou o Canadá com tarifas caso não agisse para impedir o tráfico de fentanil através de sua fronteira com os Estados Unidos, que é mínimo.

Ameaça de anexação

O presidente americano também tem um longo histórico de ameaças de anexação do Canadá e imposição de tarifas pesadas.

O assédio do republicano provocou uma reviravolta eleitoral no país vizinho, que fez o conservador Pierre Poilievre perder o favoritismo que tinha após um desgaste e uma queda de popularidade do governo liberal de Justin Trudeau.

Após a renúncia de Trudeau em janeiro e a entrada de Mark Carney como novo líder do Partido Liberal, a legenda governista passou os conservadores nas pesquisas e venceu as eleições. Apesar de representar um partido considerado impopular, Carney conseguiu se colocar como um outsider por conta de sua experiência como presidente do Banco do Canadá e do Banco da Inglaterra depois do Brexit.

Já Poilievre, que era frequentemente comparado com Trump devido às suas políticas e retórica, amargou uma derrota e a perda do próprio assento no Parlamento canadense.

A retórica de Trump sobre a anexação diminuiu depois da vitória de Carney e os dois líderes se encontraram na Casa Branca, mas ainda não conseguiram fechar um acordo comercial.

Anúncio de Carney

O anúncio de Carney sobre a Palestina ocorreu em uma ação coordenada com a França e o Reino Unido. Apesar de Trump criticar e ameaçar o Canadá, ele afirmou na segunda-feira em uma reunião com o primeiro-ministro do Reino Unido, Keir Starmer, que "não se importava" se ele tomasse uma posição.

Segundo o primeiro-ministro canadense, o reconhecimento será feito para preservar a esperança de uma solução de dois Estados na questão Israel-Palestina. Apesar disso, Carney ressaltou que certas "condições" como a realização de eleições precisam ocorrer dentro da Autoridade Palestina para o reconhecimento.

Assim como fez com a França e o Reino Unido, Israel criticou de imediato a iniciativa, que considera parte de uma "campanha distorcida de pressão internacional".

"Reconhecer um Estado palestino na ausência de um governo responsável, instituições funcionais ou uma liderança benevolente, recompensa e legitima a monstruosa barbárie do Hamas em 7 de outubro de 2023", afirmou a embaixada de Israel em Ottawa.

Carney declarou que a decisão se baseou na convicção "arraigada" do Canadá em uma solução de dois Estados para o conflito, que existe desde a criação do Estado de Israel, em 1948.

O anúncio acontece em um momento em que Israel prossegue com a campanha militar na Faixa de Gaza, iniciada após o ataque terrorista do Hamas em 7 de outubro de 2023. Mais de 60 mil palestinos morreram, incluindo as principais lideranças do Hamas, e nos últimos meses Israel tem impedido a entrada de ajuda humanitária no território.

O bloqueio da ajuda humanitária agravou a situação de miséria e fome na Faixa de Gaza. Mais de 100 organizações humanitárias e a ONU denunciaram na semana passada uma crise de fome generalizada no local, incluindo mortes causadas por desnutrição.

Em paralelo, algumas autoridades do governo israelense defendem a anexação do território, com a expulsão de palestinos.

"Essa possibilidade de uma solução de dois Estados está se erodindo diante dos nossos olhos", afirmou Mark Carney.

O primeiro-ministro canadense falou em "contínuo fracasso" de Israel para prevenir a catástrofe humanitária em Gaza e citou a expansão de assentamentos israelenses na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental.

"Durante décadas, esperou-se que [a solução de dois Estados] fosse alcançada como parte de um processo de paz baseado em um acordo negociado entre o governo israelense e a Autoridade Palestina", ressaltou. "Lamentavelmente, este enfoque já não é sustentável", acrescentou.

Hoje, 143 países entre os 193 que fazem parte da ONU, incluindo o Brasil, reconhecem a Palestina como Estado. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)

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O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, iniciou a sessão de retorno das atividades do Judiciário, na manhã desta sexta-feira, 1º, com um eloquente discurso de solidariedade ao ministro Alexandre de Moraes, sancionado pelo governo americano por meio da Lei Magnitsky. O magistrado defendeu as decisões tomadas por seu colega, relator da ação penal do golpe que pode levar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) à condenação por atentado à democracia.

Para o ministro, Moraes conduziu este e outros processos com "inexcedível empenho, bravura e custo pessoais elevados". "Nem todos compreendem os riscos que o País e a importância de uma atuação firme e rigorosa, mas sempre dentro do devido processo legal", disse.

O chefe do Poder Judiciário brasileiro também enviou uma mensagem clara ao governo do presidente Donald Trump (EUA): "Todos os réus serão julgados com base nas provas produzidas, sem qualquer interferência, venha de onde vier".

O recente movimento de sanções a ministros do STF e aplicação de tarifas aos produtos brasileiros por Trump é motivado, sobretudo, pelo objetivo de livrar Bolsonaro do julgamento na Primeira Turma do STF.

O ex-presidente foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) com base em investigações da Polícia Federal (PF) que o apontou como líder de uma organização criminosa criada para dar um golpe de Estado no final de 2022 com o objetivo de mantê-lo no governo e invalidar o resultado das eleições daquele ano.

"Foi necessário um tribunal atuante para evitar o colapso das instituições como ocorreu em vários países do mundo", disse Barroso.

'História de golpe'

Barroso iniciou o seu discurso com um retrospecto histórico do golpismo que interferiu nos rumos da sociedade brasileira desde início da República até a ruptura provocada pelos militares em 1964. "As tentativas de quebra da institucionalidade nos acompanham desde os primeiros passos da democracia brasileira".

"Do início da república até o final do regime militar a história do Brasil foi a história de golpes, contragolpes, rupturas e tentativas de rupturas da legalidade institucional", afirmou Barroso, seguido de uma defesa de que o "constitucionalismo é o antídoto para tudo isso".

Ainda em sua análise histórica, o magistrado observou que três espectros rondam a normalidade democrática brasileira desde os seus primórdios: "presidentes autoritários, militares envolvidos em política e ameaças ao Supremo Tribunal Federal".

Em uma análise sobre ações golpistas mais recentes, o presidente do STF citou a tentativa de atentado a bomba no aeroporto de Brasília em 2022, as inúmeras ameaças de morte de ministros, o relatório das Forças Armadas que tentou apontar fraudes nas urnas eletrônicas nas últimas eleições, os acampamentos golpistas em frente aos quartéis e os atos golpistas de 8 de Janeiro como deslinde de todas essas ações.

"Nós superamos o ciclo do atraso e o nosso papel no Supremo Tribunal Federal é impedir a volta ao passado", disse.

Moraes foi sancionado por lei usada contra ditadores e terroristas

Alexandre de Moraes foi sancionado pela Secretaria do Tesouro dos Estados Unidos nesta quarta-feira, 30, sob a acusação de 'autorizar detenções arbitrárias antes do julgamento e suprimir a liberdade de expressão'.

Logo após a aplicação da Lei Magnitsky os ministros Gilmar Mendes, Flávio Dino e o próprio Barroso declararam apoio ao colega.

O rol de punições a Moraes inclui o bloqueio de bens em seu nome ou que sejam seus, mas que, eventualmente, estejam sob posse de americanos. Além disso, quaisquer empresas ou entidades ligadas ao ministro estão proibidas de operar no país.

A Lei Magnitsky também pode aplicar sanções a instituições financeiras e outras pessoas que "se envolverem em determinadas transações ou atividades" com o ministro. Empresas como bancos e operadoras de cartões de crédito estão proibidas de realizarem qualquer operação que envolva Moraes.

Como mostrou o Estadão, o uso da Magnitsky pelos EUA é inédito contra um ministro de Suprema Corte no mundo. Alvos típicos da medida são autoridades de regimes autoritários, integrantes de grupos terroristas, criminosos ligados a esquemas de lavagem de dinheiro e agentes de segurança acusados de assassinatos em série.

No dia 18 de julho, Moraes impôs medidas cautelares a Bolsonaro - como o uso de tornozeleira eletrônica - sob suspeita de articular, com o filho, Eduardo Bolsonaro, medidas de retaliação do governo Donald Trump que buscam atingir o STF.

O decano do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, afirmou nesta sexta-feira, 1º, que acompanhou com "perplexidade" a escalada de ataques a membros da Corte e defendeu que as medidas adotadas pelos Estados Unidos - contra o ministro Alexandre de Moraes -, motivadas por discordância política, "demandam uma resposta à altura da dignidade de nossa Corte e da soberania do Estado brasileiro".

O decano disse ver uma "ação orquestrada de sabotagem contra o povo brasileiro, por parte de pessoas avessas à democracia, armadas com os mesmos radicalismo, desinformação e servilismo que vêm caracterizando sua conduta já há alguns anos".

Segundo Gilmar, os ataques à soberania "foram estimulados por radicais inconformados com a derrota do seu grupo político nas últimas eleições presidenciais". O ministro chegou a citar indiretamente o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), destacando que o parlamentar "na linha de frente do entreguismo, fugiu do País para covardemente difundir aleivosias contra o Supremo Tribunal Federal, num verdadeiro ato de lesa-pátria".

O ministro ainda defendeu Moraes, destacando que "não é de hoje" que o colega é alvo de "críticas infundadas". "Não há nenhum fato real, concreto e individualizado que sinalize o menor desvio, ou descuido, do relator em relação ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório", frisou com relação à conduta de Moraes.

Em referência a Moraes, Gilmar indicou ainda que é fundamental defender os que, "com coragem e retidão, enfrentam essas ameaças, mesmo quando isso implica suportar o peso de críticas injustas e ataques pessoais".

"Devem ser fortemente rechaçadas quaisquer insinuações vazias sobre a lisura do rito observado pelo relator. Tais calúnias devem ser compreendidas pelo que verdadeiramente são: retórica política barata dos acusados e seus asseclas para desacreditar o Tribunal e tentar desviar o foco do debate público dos graves fatos que estão sendo revelados pelas testemunhas e pelas provas apresentadas pela PGR", ponderou.

Segundo o decano, a atuação do STF não é "imune à críticas" e elas são bem vindas quando visam um aperfeiçoamento das instituições, mas é preciso distinguir entre ponderações "sérias" sobre a Corte e "opiniões levianas". No caso de Moraes, o decano destacou que as críticas partem de "radicais que buscam interditar funcionamento do Judiciário".

Big techs

O decano destacou ainda que um dos focos de insatisfação de "radicais" quanto ao STF está relacionada às bigh techs. "Mera perspectiva de impor deveres às redes sociais despertou lobbies poderosos", explicou o decano, logo antes de destacar que a Corte máxima "não se dobra a intimidações".

Ainda de acordo com o ministro, muitas das manifestações de "golpismo" foram impulsionadas pelas plataformas. Ainda de acordo com o ministro, apesar da resistência das plataformas, o STF sinalizou que as redes sociais não são "terra sem lei".

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes chamou de "covarde e traiçoeira" a "organização miliciana" que tem atuado para impor sanções dos Estados Unidos ao País e a autoridades brasileiras com o objetivo de frear o julgamento da ação penal sobre tentativa de golpe de Estado, que pode condenar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a até 43 anos de prisão.

"Estamos vendo diversas condutas dolosas e recorrentes de uma verdadeira organização criminosa que, nunca vista antes na história do País, age de maneira covarde e traiçoeira para submeter este Supremo Tribunal Federal ao crivo de uma Estado estrangeiro", afirmou, sem mencionar nomes como o do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e do comunicador Paulo Figueiredo, que têm ostentado nas redes sociais o lobby por sanções ao Brasil.

O ministro, que relata a ação penal do golpe, afirmou nesta sexta-feira, 1º, que "pseudo-patriotas" atuam por meio "coação contra o STF com a finalidade de obter um súbito, inexiste e inconstitucional arquivamento de ações penais propostas pelo procurador-geral da República".

Esses objetivos têm sido vocalizados por Eduardo e Paulo Figueiredo e foram expressamente manifestados na carta enviada pelo presidentes do Estados Unidos, Donald Trump, ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no momento do anúncio das tarifas de 50% aos produtos brasileiros.

Trump colocou como condição para o fim das sanções o arquivamento do processo em curso contra Bolsonaro. Lula, por sua vez, tem defendido a soberania nacional e a independência do Poder Judiciário para tomar as suas decisões.

Segundo Moraes, o arquivamento das ações penais seria um ato "tirânico" em benefício de pessoas que se acham acima da Constituição. Na avaliação do ministro, essas condutas configuram expressos atos de "traição do Brasil" e confissão de atos criminosos, como obstrução de Justiça, coação no curso do processo e, principalmente, atentado à soberania nacional.

"Não estão só ameaçando, coagindo, autoridades públicas, ministros do Supremo Tribunal Federal e fazem isso diariamente nas redes sociais ameaçando as famílias dos ministros e do procurador-geral da República. Uma atitude costumeiramente afeita a milicianos do submundo do crime", disse Moraes.

Na última quarta-feira, 30, o ministro foi alvo da Lei Magnitsky, que impõe sanções financeiras a agentes públicos envolvidos em casos de corrupção e graves violações de direitos humanos. A decisão foi celebrada pelo bolsonarismo e ostentada como trunfo por Eduardo Bolsonaro.

Moraes, contudo, afirmou nesta sexta-feira que vai "ignorar" as medidas aplicadas e "continuar trabalhando, como vem fazendo tanto no plenário como na Primeira Turma, sempre de forma colegiada". O ministro tem sido respaldado pela maioria da Corte em suas decisões que têm infligido derrotas à extrema direita.

"O devido processo legal nas ações penais neste Supremo Tribunal Federal é o resultado do colegiado. É o resultado da vontade do colegiado, seja no Plenário, quando sua competência for, seja nas Turmas", disse Moraes.

O ministro assegurou que os quatro núcleos denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como parte da ação golpista serão julgados ainda neste semestre pela Primeira Turma e que o STF não vai se "acovardar".

O magistrado garantiu que esses agentes serão responsabilizados. "Acham que estão lidando com gente da lei deles, que estão lidando com milicianos, mas estão lidando com ministros da Suprema Corte".

"Enganam-se essa organização miliciana e aqueles brasileiros escondidos e foragidos fora do território nacional em esperar fraqueza institucional ou debilidade democrática", afirmou.