Baixa adesão em plebiscito deixa Maduro em desconforto: 'Perdeu base de apoio', diz analista

Internacional
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O plebiscito deste domingo, 3, na Venezuela, sobre a anexação do Essequibo - território da Guiana contestado por Caracas desde o século 19 - evidenciou a dificuldade da ditadura Nicolás Maduro em mobilizar a base chavista.

O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) anunciou depois de um atraso de quase 24 horas uma participação de 50%, sem explicar se esses números correspondem ao número de eleitores ou de votos dados a cada uma das cinco perguntas do plebiscito. À confusão e à demora no anúncio da participação na votação, se somam indícios de que a adesão foi, na realidade, muito mais baixa.

Registros de mídias digitais independentes, imagens realizadas por eleitores em todo o país e até boletins nas televisões estatais refletiram outra cara da votação: centros de votação vazios, ruas silenciosas e pouca mobilização.

Participação em xeque

Nas últimas votações do país, boicotadas pela maior parte da oposição, a participação foi de 46% na última eleição presidencial, em 2018, quando Maduro se reelegeu mediante acusações de fraude e de 30% na disputa para a Assembleia Nacional em 2020, durante a pandemia.

A votação da primária opositora, realizada em outubro e que não contou com o apoio do CNE, teve 2,3 milhões de votos, pouco mais de 10% do que seria o total de eleitores aptos a votar. Para Maduro, era importante mostrar uma mobilização maior.

"Há um contraste entre uma cifra que pressupõe muita gente nas ruas do país e as imagens que publicaram-se depois", disse ao Estadão a analista política venezuelana e especialista em assuntos eleitorais Eglée González-Lobato.

Em meio a retórica belicosa e nacionalista, Maduro usou o plebiscito para medir a adesão da base chavista à ditadura. No poder há 10 anos, o chavista tem usado diversos meios para fraudar o sistema eleitoral venezuelano, da inabilitação de opositores à cassação de mandatos, passando pela vinculação de distribuição de auxílio à população mais pobre a votos no regime.

Promessa de eleições livres

As eleições de 2024 ocorrerão num contexto ligeiramente distinto, já que Maduro comprometeu-se com os EUA a realizar eleições livres em troca do alívio de sanções. Ainda há muito ceticismo entre analistas venezuelanos sobre o compromisso do ditador, já que Maria Corina Machado, escolhida pela oposição para desafiá-lo não está autorizada no momento a participar da disputa.

De todo modo, diante da mobilização opositora nas primárias, que foram invalidadas pelo regime, Maduro se viu diante da necessidade de dar uma resposta política à coesão dos rivais.

Segundo o cientista político venezuelano Jesús Castellanos Vásquez, as falhas na mobilização e no controle social implementados pelo chavismo para a votação do domingo colocam Maduro é uma posição desconfortável.

"[Maduro] sabe que pode contar com as instituições estatais, incluindo a administração eleitoral e o TSJ, mas ontem ficou claro que ele perdeu uma parte importante de sua base de apoio", disse Castellanos em entrevista ao Estadão. "O principal objetivo do regime de Maduro é preparar as condições para a eleição presidencial de 2024, seja tentando se reconectar com sua base, o que parece complicado pelos níveis de frustração e insatisfação, e/ou fechando ainda mais as possibilidades de participação da oposição democrática."

De acordo com Eglée González-Lobato, o resultado do plebiscito aumenta o descontento dentro do chavismo com a figura de Maduro, em um período complexo pré-eleitoral no qual ambos lados querem de alguma forma a mudança.

Para ela, o plebiscito buscava ser um teste para a adesão ao chavismo, sem concorrência e sem representação da oposição, e mesmo assim acabou tendo um resultado bastante modesto. "Como realizar uma campanha de sucesso, tentando sair do beco sem saída em que se encontra, representando mais do mesmo?", questionou.

Batalha pela eleição de 2024

Segundo Castellanos, a oposição terá uma tarefa titânica, pois as condições eleitorais podem se tornar ainda mais limitadas com o aumento da repressão do governo a figuras importantes para o processo, mas a votação também indica que Maduro não é unânime dentro do regime.

"Esse plebiscito é uma demonstração não apenas do apoio que existe à figura do Maria Corina Machado como uma possibilidade de mudança, mas também da dissociação do regime de Maduro", disse.

Já Eglée González Lobato acredita que o plebiscito abre caminho para uma pressão política interna e externa para que Maduro organize de fato uma transição. "Há que se criar um caminho para gerar a confiança para começar a falar de condições políticas para debater se a eleição de 2024?, disse.

A especialista acredita que isso implicaria no "avanço na transição justa, que poderia inclusive significar um compartilhamento do poder com alguns membros ou grupos da oposição moderada" para encontrar uma saída comum para a sociedade venezuelana.

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Termina nesta quinta-feira, 6, o prazo para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e os demais denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) no inquérito do golpe enviarem suas defesas prévias ao Supremo Tribunal Federal (STF).

A defesa prévia é o conjunto de argumentos apresentado pelos acusados antes da instauração formal do processo. Serve justamente para tentar convencer os ministros a rejeitar a denúncia e, com isso, encerrar o caso sem a deflagração de uma ação penal.

O prazo de 15 dias começou a contar a partir da notificação dos advogados, determinada pelo ministro Alexandre de Moraes no dia 19 de fevereiro.

A Primeira Turma do STF vai analisar as manifestações das defesas para decidir se há elementos suficientes para receber a denúncia da PGR. Pelas regras internas do Supremo, as duas turmas da Corte são responsáveis pelos julgamentos de casos criminais.

As defesas montaram forças-tarefa para analisar os autos e preparar sua argumentação. O Estadão apurou que os criminalistas Paulo Amador da Cunha Bueno e Celso Vilardi, que representam o ex-presidente Jair Bolsonaro, vão apresentar questões preliminares de ordem processual e entregar o rol de testemunhas para serem ouvidas se a denúncia for recebida.

Em entrevista ao Estadão, logo após a denúncia do procurador-geral Paulo Gonet chegar ao STF, os advogados afirmaram que a tese da acusação "não faz qualquer sentido". Segundo a denúncia, o plano golpista fracassou porque a cúpula do Exército não aderiu. Um dos argumentos da defesa do ex-presidente é o de que, se quisesse dar um golpe, Bolsonaro poderia ter trocado os comandantes das Forças Armadas para obter apoio dos militares.

Prazo

As defesas pediram a suspensão da contagem do prazo alegando que não tiveram acesso a todas as provas da investigação. Os advogados exigem, por exemplo, o espelhamento de todas as mensagens extraídas dos celulares apreendidos no inquérito.

Os criminalistas Paulo Amador da Cunha Bueno e Celso Vilardi também defenderam que o prazo deveria ser prorrogado para que as defesas tivessem direito a, no mínimo, o mesmo tempo usado pela PGR para formular a denúncia (83 dias).

Todos os pedidos foram rejeitados por Alexandre de Moraes. O ministro alegou que "o amplo e integral acesso aos elementos de prova já documentados nos autos está plenamente garantido à defesa dos denunciados". Também apontou que os advogados "sempre tiveram total acesso aos autos, inclusive retirando cópias e com ciência dos despachos proferidos".

Alexandre de Moraes levantou o sigilo dos autos depois de receber a denúncia. São 18 volumes de documentos que somam mais de 3 mil páginas.

A delação do tenente-coronel Mauro Cid também foi tornada pública. O STF deu publicidade aos anexos do termo de colaboração premiada, tanto em vídeo como por escrito.

Moraes ainda compartilhou com todos os 34 denunciados provas de investigações sigilosas que têm relação com a denúncia. São investigações que envolvem o aparelhamento da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), o uso da Polícia Rodoviária Federal para influenciar as eleições de 2022 e os atos do 8 de Janeiro.

Veja quais crimes são atribuídos a Bolsonaro e a seus aliados:

- tentativa de abolição violenta do estado democrático de direito (pena de 4 a 8 anos);

- golpe de estado (pena de 4 a 12 anos);

- organização criminosa armada (pena de 3 a 8 anos que pode ser aumentada para 17 anos com agravantes citados na denúncia);

- dano qualificado pela violência e grave ameaça, contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima (pena de 6 meses a 3 anos);

deterioração de patrimônio tombado (pena de 1 a 3 anos).

Veja a lista completa de denunciados:

Ailton Gonçalves Moraes Barros

Alexandre Ramagem

Almir Garnier Santos

Anderson Torres

Angelo Martins Denicoli

Augusto Heleno

Bernardo Romão Correa Netto

Carlos Cesar Moretzsohn Rocha

Cleverson Ney Magalhães

Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira

Fabrício Moreira de Bastos

Fernando de Sousa Oliveira

Filipe Garcia Martins

Giancarlo Gomes Rodrigues

Guilherme Marques de Almeida

Hélio Ferreira Lima

Jair Bolsonaro

Marcelo Bormevet

Márcio Nunes de Rezende Júnior

Marcelo Costa Câmara

Mario Fernandes

Marília Ferreira de Alencar

Mauro Cid

Nilton Diniz Rodrigues

Paulo Renato de Oliveira Figueiredo Filho

Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira

Rafael Martins de Oliveira

Reginaldo de Oliveira Abreu

Rodrigo Bezerra de Azevedo

Ronald Ferreira de Araujo Júnior

Silvinei Vasques

Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros

Walter Souza Braga Netto

Wladimir Matos Soares

O ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), autorizou a devolução de celulares, computadores, veículos e joias apreendidos pela Polícia Federal na Operação 18 Minutos, que mira suspeitas de corrupção no Tribunal de Justiça do Maranhão.

A decisão foi tomada após a conclusão do inquérito. A PF indiciou três desembargadores e dois juízes por suposta participação em fraudes processuais em troca de propinas.

O ministro justificou que, encerrado o inquérito e a fase de coleta de provas, a retenção dos bens não é mais necessária. "As diligências investigativas atingiram sua finalidade, permitindo que as apurações avancem sem a necessidade de perpetuação de medidas cautelares que impliquem o agravamento da situação dos investigados", diz um trecho da decisão.

Noronha menciona que o Código Penal assegura a restituição de itens apreendidos na investigação criminal "sempre que cessada sua utilidade para o processo investigativo".

"As medidas cautelares não podem se transvestir em penas antecipadas, devendo permanecer estritamente vinculadas à finalidade processual ou investigativa que justificou sua decretação", complementou o ministro.

Somados, os bens apreendidos e o dinheiro bloqueado na Operação 18 Minutos somaram mais de R$ 29 milhões. A ordem inicial de bloqueio era de R$ 17 milhões. Esse foi outro motivo que levou o ministro a liberar os objetos e veículos.

"Considerando os valores apreendidos, que se manterão acautelados, entendo que a manutenção de bens como telefones, computadores, laptops, veículos e joias não encontra justificativa no momento atual."

A decisão sobre a devolução dos bens aos magistrados foi noticiada inicialmente pelo portal Direito e Ordem e confirmada pelo Estadão.

A operação investigou um esquema de corrupção e fraudes na liberação relâmpago de alvarás para pagamento de honorários advocatícios de grandes valores. O nome 18 Minutos batizou a investigação porque esse foi o tempo que decorreu entre uma autorização judicial e o levantamento de grande soma junto ao banco.

A PF indiciou os desembargadores Luiz Gonzaga Almeida Filho, Nelma Celeste Souza Silva Sarney, cunhada do ex-presidente José Sarney, e Antônio Pacheco Guerreiro Junior e dois juízes de primeiro grau. O Estadão já pediu manifestação dos magistrados. O espaço permanece aberto

A repercussão da vitória de Ainda Estou Aqui como Melhor Filme Internacional no Oscar conseguiu superar a polarização do debate político brasileiro nas redes sociais, aponta um estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV). A avaliação é que predominaram publicações que exaltam o orgulho pela cultura nacional e que representam o Brasil de forma positiva para o restante do mundo, escanteando os conflitos políticos entre direita e esquerda.

O levantamento também identificou que houve baixo engajamento de perfis alinhados à direita, com poucas contas parabenizando os responsáveis pelo filme ou comentando a vitória.

À esquerda o movimento foi na direção oposta: as publicações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), da deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) e da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) - que assim como o ex-deputado Rubens Paiva, cuja história é narrada no filme, foi presa e torturada pela ditadura militar - estiveram entre as com maior volume de interações.

"Foi interessante o silêncio da direita. Não conseguiram construir nenhum argumento crítico contrário. Soaria impatriótico, desumano e não engajaria", analisou o sociólogo Marco Aurélio Ruediger, diretor da Escola de Comunicação da FGV e um dos responsáveis pelo estudo.

Ele avalia que o filme consegue ser patriótico sem ser chauvinista ou reacionário, ao mesmo tempo que transmite uma mensagem de força e potência das mulheres ao narrar a reconstrução pessoal de Eunice Paiva e de sua família.

"Isso dá pista de haver uma fresta para o Brasil se unir e se reinventar quebrando a polarização com base em valores universais e um repertório cultural mais amplo", diz o sociólogo. "É uma pista para a política agora e em 2026", acrescentou.

A vitória de Ainda Estou Aqui gerou cerca de 4 milhões de publicações no X, no Instagram, no YouTube e em sites de notícia e ultrapassou 75 milhões de engajamento geral no Facebook, no X e no Instagram. As publicações sobre a obra na conta oficial da Academia no Instagram (@theacademy) foram responsáveis por 30% de todas as interações do perfil em 2025. Foram 3,8 milhões de interações e 24 milhões de visualizações.