Chanceler de Milei se reúne com empresários brasileiros e defende mudanças no Mercosul

Internacional
Tipografia
  • Pequenina Pequena Media Grande Gigante
  • Padrão Helvetica Segoe Georgia Times
A ministra de Relações Exteriores de Javier Milei, Diana Mondino, se reuniu nesta terça-feira, 16, com representantes do setor empresarial brasileiro, momento em que voltou a afirmar que o governo argentino não defende a ruptura de relações ou o fim do Mercosul. Na sede da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), a chanceler defendeu mudanças no bloco, mas voltou a afirmar que juntos os países têm mais força.

Questionada por empresários sobre a possibilidade de o Mercosul ser "remodelado" depois de afirmações de Milei, Mondino repetiu: "isso não é verdade". "Não é verdade que se tenha falado em acabar com o Mercosul e cortar relações com o Brasil. O que se diz, e trabalhamos com os países como Brasil, Paraguai e Uruguai nesse sentido, é uma modernização, um choque de adrenalina", afirmou "O Mercosul tem 32 anos e nunca se modificou, enquanto o mundo mudou".

"As empresas do Mercosul mudaram, mas o convênio nunca mudou. É fundamental que tenhamos muitíssimo mais elementos, por exemplo, o mero fato de levar bens de um país a outro hoje no Mercosul não é considerado, e não temos nenhum tratamento preferencial entre países do Mercosul. Não temos tratamento especial para nossos estudantes", continuou.

E reiterou: "Caso alguém não tenha escutado aí atrás: não é verdade que vamos acabar com o Mercosul".

Segundo a ministra, o Mercosul teria ainda mais potencial se também se voltasse a outros setores não contemplados atualmente e se investisse na possibilidade de fazer convênio com outros países. Indo em uma linha diferente do que tem proposto o Uruguai, que defende que países possam negociar por fora do bloco, a chanceler preferiu defender uma unidade nas negociações.

Ela defendeu o acordo Mercosul-União Europeia, que tem sido negociado há anos e se tornou uma forte agenda do governo Lula, inclusive em seu encontro com o presidente francês Emmanuel Macron em sua viagem ao Brasil no mês passado. Segundo ela, embora o acordo não seja "uma panaceia" e tenha caminhado muito lentamente, ele permite aos países do bloco integrar-se com grandes compradores do mercado europeu.

O futuro do Mercosul foi uma das primeiras preocupações do governo brasileiro quando Javier Milei assumiu a presidência. Durante a campanha, o libertário indicou que viraria as costas à região, tendo chamado o bloco de "estorvo" durante debates presidenciais. O tom, porém, amenizou após a posse. Dias antes do libertário assumir a presidência, Mondino viajou de surpresa à Brasília, onde fez o primeiro gesto amigável ao Mercosul ao lado do chanceler brasileiro, Mauro Vieira.

Defesa de reformas

Sem fazer declarações à imprensa, a ministra utilizou sua passagem por São Paulo - depois de ter se reunido com Vieira e o vice-presidente Geraldo Alckmin em Brasília - para defender as reformas econômicas e de Estado que têm sido conduzidas por Javier Milei na Argentina. Sua exposição ao setor empresarial brasileiro se focou em garantir que as relações entre Brasil e Argentina se mantêm fortes, apesar dos comentários recentes do presidente argentino que causaram rusgas com o governo brasileiro.

"Junto com Brasil, porque estamos nas mesmas circunstâncias, podemos ser a solução para o mundo em muitos dos problemas identificados agora", afirmou. Entre os setores, a chanceler citou energia, segurança alimentar, tecnologia, ecoturismo, entre outros.

Para isso, ela defendeu que o governo argentino consiga avançar com suas reformas econômicas e de Estado, que estão travadas devido a embates políticos entre o presidente e governadores e deputados de sua base de apoio. Ela elogiou o avanço da meta de déficit zero pelo governo, uma medida que, segundo ela, beneficia o comércio com o Brasil.

"O mundo é muito complexo, mas desde o A Liberdade Avança (partido de Milei) isso se torna muito simples porque tudo vira decisão do setor privado", afirmou. "Estamos tentando abrir os olhos do mundo para as oportunidades que têm na Argentina, de importação e exportação, de atrair investidores".

"A vontade política, o presidente Milei tem. Em sua campanha disse que ia reduzir o gasto e está reduzindo". Citou o sucesso em atingir o déficit zero no mês de fevereiro, uma medida conseguida a custos da recessão no serviço e comércio argentino, além do arrocho dos salários.

A ministra teceu críticas a quem se opõe ao mega DNU (Decreto de Necessidades e Urgências) lançado por Milei logo nos primeiros dias de governo. Uma medida que, segundo ela, visa simplificar o sistema produtivo argentino. "O DNU cita apenas liberdades individuais. Não sei porque seriam contra as liberdades individuais".

Criticou o trecho da reforma trabalhista que foi derrubado pela Justiça por considerá-lo inconstitucional. O decreto, que está parcialmente derrubado após receber uma rejeição no Senado, segue em vigência enquanto a Câmara não o vota. O recurso, porém, está judicializado e também pode cair na Corte Suprema.

Mondino também defendeu a Lei Ônibus, que no momento busca desregulamentar 250 setores - dos mais de 600 que pretendia o governo inicialmente.

A agenda da ministra em São Paulo seguiu de um almoço com representantes do setor empresarial na Fiesp, seguido de outros encontros não revelados por sua equipe diplomática. Acompanha a ministra, representantes do setor empresarial argentino, como o presidente da presidente da UIA (União Industrial Argentina), Daniel Funes de Rioja e o ex-embaixador da Argentina no Brasil, Daniel Scioli.

Carta de Milei

Na capital federal, Mondino foi recebida no Palácio do Itamaraty por Mauro Vieira, com quem teve uma reunião privada e depois deram uma declaração à imprensa. Ela também foi recebida pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, mas não por Lula.

Em entrevista coletiva, a chanceler afirmou que seu governo não pretende intervir em questões internas do Brasil. Na semana passada, Milei ofereceu "a ajuda que ele precisasse" ao magnata Elon Musk, dono do X (antigo Twitter), que trava embate com o Supremo Tribunal Federal (STF) e autoridades dos demais poderes no Brasil. Apesar da promessa, segundo ela, o governo argentino não vai interferir.

"Os temas internos e judiciais de cada país são próprios de cada país. O governo argentino jamais vai interferir nos processos democráticos ou nos processos judiciais de cada país. Confiamos na Justiça de cada país. Nós defendemos a liberdade de expressão em todos os sentidos", disse a ministra de Milei, em resposta a questionamento de jornalistas no Itamaraty.

Em sua passagem por Brasília, Mondino entregou a Vieira uma carta escrita por Milei endereçada a Lula, a terceira que o libertário escreve ao brasileiro. Um encontro entre ambos não está previsto no curto prazo.

Segundo apurou o Estadão, o conteúdo não veio a público ainda, porque o ministro Mauro Vieira ficou de entregar a carta ainda lacrada ao presidente Lula. Mas a missiva é uma nova forma de reiterar a "prioridade na relação com o Brasil", segundo a ministra disse a interlocutores da diplomacia brasileira.

Trata-se da terceira carta de Milei a Lula desde sua eleição, marcada por divergências, ofensas e provocações na campanha eleitoral para a Casa Rosada. O argentino, ícone da direita regional e aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro, mandou uma carta para convidar Lula a sua posse - o que foi ignorado pelo petista - e depois escreveu outra comunicando a decisão de não ingressar no Brics. Nesta segunda, ele disse que aguardava por um momento para se reunir com Lula pela primeira vez. (COM FELIPE FRAZÃO)

Em outra categoria

A rede social criada por Donald Trump, Truth Social, e a plataforma de vídeos Rumble entraram com um pedido de liminar em um tribunal dos Estados Unidos contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. A informação é da agência de notícias Reuters.

O pedido busca impedir ordens emitidas pelo ministro, sob o argumento de que elas "violam a soberania americana, a Constituição e as leis dos Estados Unidos". Elas também disseram que Moraes ameaçou processar criminalmente o CEO do Rumble, Chris Pavlovski.

Na sexta-feira, 21, Moraes havia determinado a suspensão do Rumble no Brasil por tempo indeterminado, até que a plataforma cumprisse as ordens judiciais dadas e o pagamento de multas. Isso porque antes ele ordenara que a empresa indicasse representantes legais no País.

O STF já definiu que plataformas estrangeiras precisam constituir representantes no Brasil para receber intimações e responder pelas empresas.

Entenda a polêmica

Em um despacho, o ministro afirmou que a plataforma incorreu em "reiterados, conscientes e voluntários descumprimentos das ordens judiciais, além da tentativa de não se submeter ao ordenamento jurídico e Poder Judiciário brasileiros".

"Chris Pavlovski confunde liberdade de expressão com uma inexistente liberdade de agressão, confunde deliberadamente censura com proibição constitucional ao discurso de ódio e de incitação a atos antidemocráticos", escreveu Moraes.

Além de exigir a indicação de um representante legal, o ministro também havia determinado o bloqueio do canal do blogueiro Allan dos Santos e a interrupção de repasses de monetização ao influenciador. Também ordenou que novos perfis do influenciador fossem barrados. Outras redes sociais, como YouTube, Facebook, Twitter e Instagram, foram notificadas para bloquear as contas de Allan dos Santos e cumpriram as decisões de Moraes.

O STF não conseguiu intimar o Rumble porque a empresa não tem um responsável no Brasil. Os advogados localizados informaram que não são representantes legais da plataforma e que não têm poderes para receber citações ou intimações. No dia 17 de fevereiro, eles renunciaram ao mandato que tinham para atuar em causas da rede social.

O Rumble move uma ação contra Moraes na Justiça dos Estados Unidos, em conjunto com Trump Media, ligada ao presidente americano. As companhias alegam que o ministro do STF violou a soberania norte-americana ao ordenar a suspensão do perfil de Allan dos Santos. O blogueiro teve prisão preventiva decretada em 2021 e está foragido desde então.

O Rumble voltou a funcionar no Brasil em fevereiro deste ano. A plataforma, que estabelece uma política menos restrita de moderação de conteúdo, foi desativada no País em dezembro de 2023 por discordar das exigências da Justiça brasileira. Ela é conhecida por abrigar personalidades e usuários de extrema direita.

O influenciador Pablo Marçal (PRTB) foi condenado à inelegibilidade porque vendeu apoio político na campanha de 2024. Em vídeo publicado nas redes sociais, ele se ofereceu para gravar vídeos divulgando candidatos a vereador por R$ 5 mil.

Em uma transmissão ao vivo na sexta-feira, 21, o influenciador disse que vai recorrer da decisão. Ele alegou que não chegou a "materializar" os vídeos porque foi barrado pela equipe jurídica da campanha.

Pablo Marçal foi candidato à Prefeitura de São Paulo nas eleições municipais de 2024 e terminou em terceiro lugar, com 1.719.274 de votos (28,14% dos votos válidos).

Ao se oferecer para divulgar os vereadores, ele afirmou que estava "concorrendo a uma eleição desleal" porque não usou dinheiro público enquanto "os 'bonitões' gastam R$ 100 milhões para fazer propaganda enganosa".

"Você conhece alguém que queira ser vereador e é candidato, que não seja de esquerda, tá, esquerda não precisa avisar. Se essa pessoa é do bem e quer um vídeo meu para ajudar a impulsionar a campanha dela, você vai mandar esse vídeo e falar 'mano, olha aqui que oportunidade, né?' Essa pessoa vai fazer o quê? Ela vai mandar um Pix para a minha campanha de doação, Pix de cinco mil. Fez essa doação, eu mando o vídeo. Vai clicar aqui no formulário, clicou aqui no formulário, cadastra, a equipe vai entrar em contato. Tamo junto, fechou, você ajuda daqui em São Paulo e eu ajudo daí."

O juiz Antonio Maria Patiño Zorz, da 1.ª Zona Eleitoral, declarou Pablo Marçal inelegível por abuso de poder econômico e político, uso indevido de meios de comunicação social e captação ilícita de recursos.

A sentença afirma que a oferta feita pelo influenciador "foi levada a sério por candidatos a vereador que efetuaram doações confirmadas pelo requeridos" e teve "potencialidade para macular a integridade do processo eleitoral em razão do efeito que produziram na consciência política dos cidadãos".

O juiz Antonio Zorz afirmou ainda que ele espalhou fake news sobre o fundo partidário e se "colocou, de forma gravemente distorcida, como vítima de um sistema eleitoral desleal que não lhe permitiu usar financiamento público do fundo eleitoral". Com isso, na avaliação do magistrado, o influenciador comprometeu a "normalidade e legitimidade" da eleição.

Como a decisão foi tomada na primeira instância, há possibilidade de recurso ao Tribunal Regional Eleitoral.

Deflagrada pela Polícia Federal em 2015, a Operação Zelotes inicialmente apurava suspeitas de um esquema de corrupção no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf) - órgão colegiado do Ministério da Fazenda - que é a última instância administrativa para o julgamento de autuações da Receita Federal a empresas e pessoas físicas. O objetivo do esquema seria vender, por meio de conselheiros e auditores, informações privilegiadas e facilidades que pudessem resultar na reversão de multas discutidas no Carf.

Quando a operação foi deflagrada, o Carf era ocupado por 216 conselheiros, metade indicada pela Receita e outra parte por confederações empresariais, como a Confederação Nacional da Indústria (CNI), e uma parte menor pelas centrais sindicais.

Até então, os conselheiros indicados pelo setor privado podiam desempenhar suas funções no Carf e, ao mesmo tempo, advogar em casos tributários. No mês seguinte à revelação do escândalo, o governo fixou novas regras para funcionamento do órgão, com remuneração para seus integrantes e restrições ao exercício das atividades profissionais.

De acordo com os investigadores, o esquema de corrupção no Carf era "legalizado" por contratos de serviços prestados por escritórios de advocacia e consultorias que faziam lobby para influenciar nas decisões do órgão. Após abordagem das empresas alvos de multas da Receita, esses consultores elaboravam contratos para forjar a legalidade do serviço prestado. A partir daí, segundo a investigação, as empresas pagavam propina por meio de depósitos em diversas contas bancárias para evitar o rastreamento.

Os investigadores dizem que vários conselheiros do Carf se recusaram a participar do esquema e repudiaram a abordagem, mas outros aceitaram negociar decisões. À época, tramitavam no órgão mais de 115 mil processos tributários que englobam cerca de R$ 500 bilhões em discussão.

Desdobramentos da Zelote levaram a outros casos e até suspeita de compra de Medida Provisória

Com desdobramentos, a operação Zelotes foi ampliada e virou um guarda-chuva para grandes investigações sobre suspeitas de corrupção que atingiram grandes personagens da República. O ex-ministro Antonio Palocci foi uma testemunha nas investigações. O ex-ministro Guido Mantega virou réu, mas o caso dele acabou prescrito.

O caso da venda de uma Medida Provisória para favorecer montadores de veículos no segundo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em 2009, também acabou entrando no escopo da Zelotes. A denúncia foi publicada pelo Estadão em outubro de 2015.

Lula chegou a virar réu nesse caso por suposto tráfico de influência, mas foi absolvido em 2021 depois de a Justiça entender que a acusação não demonstrou de maneira convincente o envolvimento dele.

Até um filho de Lula virou réu, junto com o pai, em um processo que apontava tráfico de influência na compra de caças suecos pelo governo brasileiro. O caso das aeronaves foi suspensa pelo então ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, em 2022.

A decisão permitiu que Lula disputasse as eleições daquele ano sem responder a ações penais na Justiça. Lewandowski, hoje ministro da Justiça do governo Lula, entendeu que procuradores do DF agiam de forma articulada com membros da Lava Jato. Ele se baseou em trocas de mensagens da força-tarefa de Curitiba que acabaram vazadas por hackeamento.

Apesar dos dez anos desde a deflagração da Zelotes, ainda há ações sem julgamento e sem trânsito em julgado.