Alívio e impotência pelos que ficaram; veja depoimentos de brasileiros que deixaram o Líbano

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A brasileira Fayze Samir, de 67 anos, respirou aliviada ao descer do avião que pousou em Guarulhos (SP) na manhã deste domingo, 6, depois de partir no sábado do Líbano. "Faz um mês que ninguém dorme bem", diz ela, relembrando os bombardeios constantes. "Você está sentado, vê aqueles aviões em cima da gente, você sente quase a casa cair em cima de você". Embora sua cidade, que fica a cerca de 1h30 de Beirute, não tenha sido diretamente atingida, o impacto dos conflitos era sentido de perto. "Os vizinhos não têm sossego. Nem a noite, nem o dia", desabafa.

Fayze é uma dentre os 229 repatriados com auxílio do governo brasileiro. Na manhã deste domingo, os primeiros brasileiros resgatados do Líbano desembarcaram na Base Aérea de São Paulo, em Guarulhos, sendo recebidos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com bandeiras do Brasil e do Líbano em mãos, os repatriados desceram da aeronave em meio a aplausos e gestos de comemoração.

Ela descreveu o momento da partida do Líbano, a caminho do aeroporto Beirute, como momentos de terror - há cerca de uma semana, Israel tem atacado áreas mais centrais da capital libanesa, incluindo proximidades do aeroporto. "Meu Deus, a gente pensa que já era. Bombardeavam por toda parte". Mesmo com a alegria de ter chegado ao Brasil em segurança, Fayze se diz dividida, já que muitos parentes, incluindo seus irmãos e a família do marido, permanecem no Líbano. "Eles não têm como vir", disse, com a voz embargada. "Deus vai salvar eles."

O voo que partiu de Beirute às 13h18 (horário de Brasília) de sábado, 5, trouxe 219 adultos e 10 crianças de colo - duas cidadãs do Uruguai também estavam a bordo a pedido do governo vizinho. Este foi o primeiro voo da Operação "Raízes do Cedro", do governo federal, que pretende resgatar cerca de 500 brasileiros por semana do Líbano, diante da escalada entre Israel e o grupo libanês Hezbollah.

O Líbano tem a maior comunidade de brasileiros no Oriente Médio - composta por mais de 20 mil pessoas - e cerca de 3 mil brasileiros manifestaram interesse na repatriação. Agora no Brasil, repatriados tentam reconstruir suas rotinas, enquanto vivem a angústia de acompanhar à distância a situação de amigos e familiares que ficaram no Líbano.

Embora aliviada por estar segura, a ansiedade de Fayze Samir permanecia forte. Ela, que foi recepcionada pelo marido, conta que só ficará tranquila ao reencontrar com seus filhos que vivem em Foz do Iguaçu, no Paraná. Moradora do Líbano há 23 anos, Fayze inicialmente planejava visitar o Brasil apenas no final do ano, mas os bombardeios perto de sua casa precipitaram sua vinda. Agora, diz a brasileira, o plano é permanecer no País enquanto o Líbano não estiver seguro.

'O trauma persiste'

A jovem Nessryn Khalaf, de 28 anos, viveu a maior parte de sua vida no Líbano, para onde se mudou com seus pais e sua irmã aos 8 anos. Vivendo em Beirute, trabalhando e com um mestrado recém-finalizado em Oxford, Nessryn afirma que relutou em deixar sua casa em meio aos bombardeios.

"Eu estava mentindo para mim mesma, falando 'não vai acontecer nada, não'. Eu não queria sair de casa, porque a gente não ia ter para onde ir. Não temos família lá, é só a minha avó paterna, que está doente e mora com a gente. E a nossa casa é a nossa casa, tudo que eu tenho está lá, a nossa gatinha se sentia bem lá", diz Nessryn que trouxe a gata Lili no voo de volta ao Brasil.

A decisão de partir foi tomada pensando em sua mãe, que sofre de problemas cardíacos. "A gente saiu correndo, o meu pai teve que carregar a minha avó, que não consegue mais andar. A gente entrou no carro e foi. Dois minutos depois eles bombardearam o meu bairro", conta.

O pai de Nessryn permaneceu em Beirute para cuidar da avó, que necessita de cuidados médicos constantes. "Três dias atrás, bombardearam onde o meu pai estava", disse explicando que a situação na capital libanesa é caótica, com os voos comerciais lotados e a rota de fuga pela Síria bloqueada após os ataques.

No Brasil, o sentimento de impotência persiste. "Dói muito ver o que estão fazendo com o Líbano", desabafa, ao relembrar de amigos e familiares que ficaram. "O trauma persiste", diz Nessryn.

'Eu não vou ficar aqui'

Enquanto esperava pelo atendimento do governo federal, perto de onde o avião que a trouxe ao Brasil permanecia de motor ligado, Karla Araújo Cardoso disse: "o barulho da turbina do avião parece o barulho da bomba antes de cair".

A cearense veio ao Brasil no voo de repatriação com seus dois filhos, Khaled e Karim. Esposa de um libanês, Carla foi morar em Beirute em agosto de 2023, buscando tratamento para o filho mais novo, que tem autismo, e uma escola melhor para o mais velho.

"Em outubro começou a guerra em Gaza. Aí o Líbano se envolveu. Mas era só no sul do Líbano que eles trocavam bombas. E todo mundo dizia, isso é só lá. Nada vai chegar até Beirute'. Todo mundo sempre disse isso", relembra.

Mas no último mês, conta Karla, os bombardeios se aproximaram de sua casa. Na sexta-feira, a professora de seu filho mais novo telefonou avisando que a aula terminaria mais cedo. "Eu disse 'não, mas não tem bombardeio em Beirute', e ela me disse, 'vem, porque todo mundo está com medo'", conta.

Bombardeios foram vistos e ouvidos pela cearense perto de sua casa. "Meu filho ficou com muito medo", diz. "Há uns dois dias, teve um bombardeio muito, muito, forte. Ficamos com medo. E aí eu disse, eu quero ir embora, eu não vou ficar aqui", conta Karla, que agora volta a Fortaleza.

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O deputado federal Lindbergh Farias (PT-RJ) quer reunir informações contra a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL) para defender a atual ocupante do posto, Rosângela da Silva, a Janja, de críticas da oposição ao governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O parlamentar enviou ofícios à Polícia Federal, à Casa Civil e à Controladoria Geral da União (CGU) pedindo informações sobre viagens, gastos e investigações em andamento contra a mulher do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Farias, que é líder da bancada do PT, indicou que as respostas dos órgãos servirão como base para ações na Câmara dos Deputados para desgastar Michelle. "Cada requerimento contra Janja, nós vamos apresentar 2 contra Michelle Bolsonaro. A turma da rachadinha com cartão corporativo não tem moral. Vamo [sic] pra cima", escreveu o deputado nas redes sociais.

Janja tem sido criticada por opositores por gastos em viagens ao exterior e por ter um gabinete informal no governo Lula mesmo sem ter um cargo na gestão federal. Como mostrou o Estadão, ela tem uma equipe com 12 assessores que até o final do ano passado tinha gastado R$ 1,2 milhão em viagens. A Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República diz que servidores exercem funções fixadas em lei.

O PL Mulher, que é comandado por Michelle Bolsonaro, disse em nota que o petista "requentou uma série de denúncias mentirosas" contra a ex-primeira-dama. "Isso constitui uma louca tentativa de fazer desviar os olhos da população dos recentes escândalos do governo petista, da alta dos preços dos alimentos e da gasolina, bem como das gafes e gastos da atual primeira-dama", disse o órgão partidário.

Lindbergh questionou a Polícia Federal e a CGU se os órgãos abriram investigações sobre supostos desvios de recursos públicos durante o governo Bolsonaro com o objetivo de pagar despesas da ex-primeira-dama. Ele também entrou com uma representação criminal para o Ministério Público Federal investigar o caso.

Mensagens encontradas no celular do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid, mostram pedidos de assessoras de Michelle para que ele fizesse depósitos em dinheiro vivo na conta da ex-primeira-dama e também realizasse saques para o pagamento das contas. A mulher de Jair Bolsonaro também utilizava o cartão de crédito de uma amiga, assessora parlamentar no Senado, para alguns gastos.

O líder do PT na Câmara perguntou à Casa Civil, comanda por Rui Costa (PT), quantas viagens a ex-primeira-dama realizou durante o governo Bolsonaro, quanto custaram os voos e se eles foram pagos com dinheiro público, além das justificativas para os deslocamentos.

Lindbergh Farias também perguntou à pasta o que foi feito para seguir a recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre o programa Pátria Voluntária, criado pelo governo Bolsonaro e comandado por Michelle para incentivar o voluntariado no Brasil. O TCU constatou em uma auditoria finalizada em 2023 que não havia critérios objetivos para selecionar as instituições sociais que receberiam recursos do programa e sugeriu à pasta que dessa transparência à prestação de contas das entidades que foram beneficiadas.

A ministra do Planejamento, Simone Tebet (MDB), lidera o ranking de aprovação entre os chefes de Ministérios do governo Lula, de acordo com uma pesquisa da AtlasIntel. O levantamento aponta que Tebet é a mais bem avaliada pelos brasileiros, enquanto o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, registra a maior rejeição.

Com 62% de aprovação, Tebet se destaca como a ministra mais bem avaliada, seguida por Mauro Vieira, das Relações Exteriores, e Macaé Evaristo, dos Direitos Humanos e Cidadania, ambos com 54%. Wellington Dias, responsável pela Assistência Social, aparece com 51%, enquanto Ricardo Lewandowski, da Justiça, soma 47% de aprovação.

Na outra ponta, Juscelino Filho lidera a rejeição, sendo avaliado negativamente por 70% dos entrevistados. Anielle Franco, da Igualdade Racial, aparece em seguida, com 59% de reprovação. Já Fernando Haddad, da Fazenda, Carlos Lupi, da Previdência Social, e André Fufuca, dos Esportes, registram um índice de desaprovação de 55% cada.

A pesquisa ouviu 2.595 pessoas entre os dias 24 e 27 de fevereiro. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos, com um nível de confiança de 95%.

O levantamento também questionou os entrevistados sobre a necessidade de uma reforma ministerial no governo Lula. A maioria, 58%, afirmou que o presidente deve promover mudanças na equipe, enquanto 30% defenderam a manutenção dos atuais ministros e 12% não souberam opinar.

Quando perguntados sobre o impacto dessas possíveis alterações, 51% acreditam que trocas na equipe podem melhorar o governo, ao passo que 29% consideram que não haveria diferença significativa, e 20% não souberam responder.

Entre as prioridades para uma eventual reforma, a melhoria na articulação política foi apontada como a mais urgente, mencionada por 34% dos entrevistados. Em seguida, aparecem a busca por maior eficiência na gestão pública (28%) e a substituição de ministros com altos índices de rejeição (22%).

O presidente Lula deu início a sua reforma ministerial na última semana. Nísia Trindade deixou o comando do Ministério da Saúde, sendo substituída por Alexandre Padilha, que, por sua vez, abriu espaço para Gleisi Hoffmann assumir a Secretaria de Relações Institucionais.

O Brasil caiu seis posições no ranking global de democracia (Democracy Index) de 2024, elaborado pela empresa de inteligência da The Economist, ficando agora no 57º lugar.

No capítulo dedicado ao Brasil, intitulado 'democracia brasileira em risco', o estudo afirma que a polarização política aumentou na última década e gerenciar o impacto das plataformas de mídia social na democracia brasileira tem sido problemático, o que levou a Suprema Corte a "passar do limite".

O documento diz que a questão chegou ao auge em agosto de 2024, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) ordenou o bloqueio à empresa de mídia social X porque representava uma "ameaça direta à integridade do processo democrático" antes das eleições locais nacionais de outubro de 2024.

"Restringir o acesso a uma grande plataforma de mídia social dessa forma por várias semanas não tem paralelo entre países democráticos. A censura de um grupo de usuários ultrapassou os limites do que pode ser considerado restrições razoáveis à liberdade de expressão, especialmente no meio de uma campanha eleitoral", argumenta o texto. E acrescenta: "Tornar certos discursos ilegais, com base em definições vagas, é um exemplo de politização do judiciário".

Na sequência, a The Economist cita um levantamento do Latinobarómetro de 2023 sobre liberdade de expressão que apontou que 64% dos brasileiros afirmaram que ela "é mal garantida ou não é garantida", porcentual que estaria acima da média regional de 45%.

Além disso, 62% dos brasileiros dizem que não expressam suas opiniões sobre os problemas que o País enfrenta, ficando atrás apenas de El Salvador e bem acima da média regional de 44%.

A pontuação do Brasil, segundo a pesquisa, também foi afetada negativamente por novos detalhes da "suposta tentativa de golpe" em 2022 contra o então presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, e membros do STF, que teria sido organizado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e membros do alto escalão das Forças Armadas, que negam irregularidades.

"O plano de golpe também sugere que há uma tolerância perturbadora à violência política no Brasil que está ausente em democracias mais consolidadas", afirma a pesquisa.

O ranking de democracia da The Economist é liderado pela Noruega, seguido pela Nova Zelândia e Suécia. Coreia do Norte, Mianmar e Afeganistão ocupam as três ultimas posições, de uma lista de 167 países.