Desembargador com R$ 3 mi encontrados pela PF recebeu salário de R$ 247 mil

Política
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O desembargador Júlio Roberto Siqueira Cardoso, alvo da Operação Ultima Ratio - investigação sobre suposto esquema de venda de sentenças no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul - , ganhou salários superiores a R$ 200 mil no primeiro semestre do ano, entre janeiro e junho, quando se aposentou; Seu contracheque foi turbinado no período com pagamentos referentes a férias, 'retroativos' e 'direitos eventuais' - somados, só os penduricalhos garantiram a Cardoso R$ 650 mil na conta.

O Estadão busca contato com a defesa. O espaço está aberto para manifestação.

Na última quinta-feira, 24, munidos de ordem do ministro Francisco Falcão, do Superior Tribunal de Justiça, agentes federais fizeram buscas na casa do desembargador e encontraram uma mala estufada de dinheiro vivo, quase R$ 3 milhões. A PF investiga a verdadeira origem da fortuna. Os investigadores suspeitam de venda de sentenças.

A PF pediu a prisão do desembargador, mas a Procuradoria-Geral da República não considerou necessário seu confinamento - manifestação acatada pelo ministro Falcão, que mandou monitorar Cardoso e outros cinco desembargadores da Corte estadual com tornozeleira eletrônica.

O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul é um dos que melhor paga seus magistrados em todo o País, indica o Conselho Nacional de Justiça. A média salarial é R$ 120 mil todo mês. Há períodos, no entanto, em que penduricalhos dobram esse valor. Júlio Cardoso, por exemplo, recebeu contracheque de R$ 248 mil em junho e de R$ 237 mil em fevereiro.

Apenas sob a rubrica 'direitos eventuais' o desembargador recebeu, entre janeiro e junho, R$ 650 mil, majoritariamente ligados à indenização de férias (R$ 240 mil) e pagamentos retroativos não especificados (R$ 371 mil).

Ao todo, nos primeiros seis meses do ano Cardoso recebeu R$ 842,2 mil líquidos de salários - o rendimento bruto bateu em R$ 1 milhão.

Os valores recebidos pelo magistrado aposentado estão na média do que foi pago aos cinco colegas dele que também estão na mira da Operação Ultima Ratio - Vladimir Abreu da Silva, Alexandre Aguiar Bastos, Sideni Soncini Pimentel, Marcos José de Brito Rodrigues e Sérgio Fernandes Martins, o presidente da Corte. Todos foram afastados de suas funções por 180 dias.

Os cinco também ganharam R$ 200 mil de salários em alguns meses deste ano. De janeiro e setembro, somados, tiraram R$ 1 milhão líquidos cada um.

O decreto de afastamento não atingiu Cardoso justamente em razão de sua aposentadoria, que ele alcançou menos de cinco meses antes da abertura da fase ostensiva da Ultima Ratio.

A investigação aponta 'indícios suficientes de autoria e materialidade dos crimes de corrupção' e que a prisão preventiva do grupo de magistrados seria 'medida necessária para a garantia da ordem pública, tendo em vista que a prática foi reiterada havendo fortes indícios de que continuem na prática criminosa'.

A Operação Ultima Ratio também requereu as prisões de: Osmar Domingues Jeronymo, conselheiro afastado do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul; do advogado Félix Jayme Nunes da Cunha, apontado como lobista de sentenças, do servidor afastado do TJ Danillo Moya Jeronymo, de seu sobrinho, Osmar Diego Moya Jeronymo, e dos empresários Percival Henrique de Sousa Fernandes e Everton Barcellos de Souza.

Também com relação aos cinco desembargadores, a PGR entendeu que, apesar de os indícios colhidos no inquérito da Ultima Ratio serem 'robustos e demonstradores de fatos graves', o afastamento dos desembargadores da ativa seria 'suficiente para estancar a prática delitiva e assegurar o bom andamento das apurações'.

Júlio Cardoso teve a casa vasculhada pela PF na quinta-feira, 24. Durante a diligência, os investigadores apreenderam quase R$ 3 milhões em espécie estocados em uma mala.

A PF suspeita que o desembargador teria incorrido em 'ilegalidades' em julgamento que levou ao 'pagamento indevido' de mais de R$ 5 milhões à advogada Emmanuelle Alves Ferreira da Silva. Ela foi presa em 2018 sob acusação de uso de documentos falsos para tentar aplicar um golpe em um aposentado e receber R$ 5,5 milhões.

Emmanuelle, posteriormente, foi beneficiada por uma decisão do Superior Tribunal de Justiça que anulou sua condenação ao cravar que não existe o crime de 'estelionato judiciário'.

O ministro do STJ autorizou a quebra dos sigilos bancário e fiscal de Cardoso. As informações vão permitir que os investigadores mergulhem em 'transações imobiliárias de grande monta realizadas pelo desembargador com o emprego de recursos de origem não rastreável'.

No capítulo em que aponta pistas de corrupção que podem implicar o desembargador aposentado, relatório da PF cita a compra de casas em Campo Grande e na Bahia. Uma delas teria valor de R$ 1,4 milhão, 'havendo notícia apenas do pagamento de um cheque no valor de R$ 450 mil'.

Segundo os investigadores, a lavratura da escritura de um imóvel ocorreu em data próxima à decisão assinada por Cardoso que 'resultou no pagamento indevido de mais de R$ 5 milhões' à Emmanuelle. O rastreamento bancário, segundo a PF, mostra que a advogada transferiu R$ 275 mil a um advogado, também investigado, que 'mantém estreitos laços' com Júlio Cardoso.

O inquérito destaca uma comunicação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sobre um depósito em espécie de R$ 90 mil, em 2021, em favor do desembargador, feito por uma mulher que atuava como sua assessora até a sua aposentadoria.

COM A PALAVRA, O DESEMBARGADOR JÚLIO ROBERTO SIQUEIRA CARDOSO

Até a publicação deste texto, o Estadão buscou contato com o desembargador aposentado Júlio Roberto Siqueira Cardoso, mas sem sucesso. O espaço está aberto para suas manifestações (Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.; Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.)

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A CEO de notícias da BBC, Deborah Turness, e o diretor-geral da emissora britânica, Tim Davie, renunciaram ao cargo neste domingo, 9. A saída acontece após o jornal The Telegraph mostrar que a BBC havia editado enganosamente um discurso do presidente dos EUA, Donald Trump, para dar a impressão de que ele havia incitado diretamente à violência nos atos de invasão ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021. A fala distorcida de Trump foi exibida no programa Panorama de 3 de novembro de 2024, a uma semana das eleições presidenciais nos Estados Unidos.

Em sua rede social, a Truth Social, Donald Trump celebrou a demissão de quem chamou de "jornalistas corruptos". "Essas são pessoas muito desonestas que tentaram manipular as eleições presidenciais. Para piorar, vêm de um país estrangeiro, um que muitos consideram nosso principal aliado. Que terrível para a democracia!", postou.

A ministra britânica da Cultura, Lisa Nandy, havia classificado horas antes como "extremamente grave" a acusação contra a BBC por apresentar declarações de Trump de maneira enganosa.

"É um dia triste para a BBC. Tim foi um excelente diretor-geral durante os últimos cinco anos", afirmou o presidente da Corporação Britânica de Radiodifusão, Samir Shah, em comunicado. Ele acrescentou que Davie enfrentava "pressão constante (...) que o levou a tomar a decisão" de renunciar.

Colagem de trechos separados levou a versão distorcida do discurso

O caso, revelado na terça-feira, 4, baseia-se em um documentário exibido uma semana antes das eleições presidenciais dos EUA de 2024. A BBC é acusada de ter montado trechos separados de um discurso de Trump de 6 de janeiro de 2021 de forma que parece indicar que ele teria dito a seus apoiadores que marchariam com ele até o Capitólio para "lutar como demônios".

Na versão completa, o então presidente republicano - já derrotado nas urnas pelo democrata Joe Biden - diz: "Vamos marchar até o Capitólio e vamos incentivar nossos valentes senadores e representantes no Congresso."

A expressão "lutar como demônios" corresponde, na verdade, a outro momento do discurso.

Em carta enviada ao conselho da BBC e publicada no site, a CEO de notícias disse que a polêmica em torno do programa Panorama sobre o presidente Trump chegou a um ponto em que está prejudicando a BBC - uma instituição que ela adora.

Já Tim Davie, diretor-geral, disse que abdicou ao cargo após intensas exigências pessoais e profissionais de gerir o posto ao longo de muitos anos nestes "tempos turbulentos".

Um dia antes do início oficial da COP30 em Belém, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, publicou em sua rede social, a Truth Social, nesta domingo, 9, uma mensagem dizendo que a Amazônia foi destruída para a construção de uma estrada.

"Eles destruíram a floresta amazônica no Brasil para a construção de uma rodovia de quatro faixas para que ambientalistas pudessem viajar", escreveu Trump na mensagem, ressaltando que o caso "se tornou um grande escândalo".

Junto com a mensagem, Trump postou um vídeo de quatro minutos da Fox News, com uma reportagem do enviado da emissora a Belém para cobrir a COP30.

Na reportagem, o editor Marc Morano diz, com uma imagem de Belém ao fundo, que mais de 100 mil árvores foram cortadas na Amazônia para construir a estrada e mostrar como o "governo brasileiro está cuidando da floresta tropical".

Ainda na reportagem postada por Trump, o jornalista destaca que pela primeira vez não há uma delegação oficial dos Estados Unidos em uma conferência das Nações Unidas sobre o clima desde 1992. Mesmo países europeus estão deixando esses compromissos de lado, ressalta o jornalista.

A reportagem fala ainda da queda das vendas de carros elétricos e de demissões em fábricas nos Estados Unidos.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, disse há pouco que a BBC alterou seu discurso de 6 de janeiro de 2021, dia da invasão ao Capitólio, e celebrou a demissão de "pessoas muito desonestas que tentaram influenciar uma eleição presidencial".

"As principais pessoas da BBC, incluindo TIM DAVIE, o CHEFE, estão todas se demitindo/DEMITIDAS, porque foram pegas 'alterando' meu excelente (PERFEITO!) discurso de 6 de janeiro. Além de tudo, eles são de um país estrangeiro, que muitos consideram nosso Aliado Número Um. Que coisa terrível para a Democracia!", escreveu o republicano na Truth Social.

A CEO de notícias da BBC, Deborah Turness, e o diretor-geral da emissora britânica, Tim Davie, renunciaram ao cargo nesta trade. A saída acontece após o jornal The Telegraph mostrar que a BBC havia editado enganosamente um discurso de Trump para dar a impressão de que ele havia incitado diretamente à violência nos atos de invasão ao Capitólio.