Senado adia votação de projeto sobre Ficha Limpa

Política
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Após sucessivas divergências em relação ao texto, o Senado Federal adiou a votação de um projeto de lei que enfraquece a Lei da Ficha Limpa e afrouxa o prazo de inelegibilidade para políticos. A proposta reduz o período em que um político condenado fica impedido de disputar eleição e poderia beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro.

"Acredito que mesmo aqui dentro do plenário, a gente pode evoluir para conseguir com as bancadas que destacaram para entrar num acordo", disse o relator, senador Weverton (PDT-MA).

Senadores contestaram a votação da urgência (procedimento que acelera a tramitação) do projeto, feita no ano passado, e pediram para que a proposição voltasse à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O requerimento, do senador Alessandro Vieira (MDB-SE), foi derrotado por 34 votos a 20.

O texto foi alvo de disputa entre a oposição e o governo em torno de um trecho que para apoiadores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode beneficiar Bolsonaro. Na redação final, os petistas conseguiram alterar a versão original do projeto para impedir que a proposta pudesse ser usada para reduzir o prazo de inelegibilidade do ex-presidente.

"Conversei com o PL longamente e eles já sabiam que (Bolsonaro) não era beneficiado mesmo, então não vai mudar em nada", afirmou o relator.

Durante a sessão desta terça-feira, 18, petistas e bolsonaristas manifestaram apoio à proposta. Beto Faro (PT-PA) diz que o projeto de lei "visa dar justiça e equidade" e Izalci Lucas (PL-DF) afirmou que é "inadmissível pessoas que estão há 20 anos em função de uma decisão judicial".

O texto cria novas condições para o começo da contagem do prazo de inelegibilidade e, se aprovado, beneficiará mesmo candidatos que já foram condenados, encurtando o tempo de afastamento dos pleitos.

Juristas, como um dos idealizadores da Lei de Ficha Limpa Márlon Reis, argumentam que se o projeto fosse aprovado com o mesmo texto que veio da Câmara, poderia tornar Bolsonaro - inelegível até 2030 - novamente elegível.

Márlon Reis conversou com senadores no final de agosto de 2024 para tentar convencê-los a votar contra o projeto. Após esse diálogo, o PT no Senado apresentou uma proposta para evitar que Bolsonaro possa ser beneficiado e manifestou posição contrária à proposição.

O ponto de divergência entre bolsonaristas e petistas no ano passado é o caso de abuso de poder econômico ou político.

No texto que veio da Câmara, a contagem do prazo de inelegibilidade é iniciada no ano da eleição em que ocorreu o abuso. O candidato apenas se tornaria inelegível em episódio que implicasse na cassação de diploma, registro ou mandato, algo que não é exigido atualmente.

É nessa situação que Bolsonaro poderia ser beneficiado. Márlon Reis argumenta que a atual inelegibilidade não causou cassação de registro ou diploma do ex-presidente, já que ele perdeu a eleição e não foi diplomado. Por essa interpretação, o ex-presidente poderia recuperar sua condição de elegibilidade. Um trecho do projeto ainda diz que o texto tem efeito para condenações pretéritas.

O líder do governo no Congresso Nacional, Randolfe Rodrigues (PT-AP), disse que apresentou a emenda para alterar essa passagem porque a redação deixava o texto "muito subjetivo" e abria a possibilidade para a interpretação de juízes. "O dispositivo estava afrouxando a imunidade, deixava muito aberto", afirmou. "Dependeria da subjetividade do juiz para dizer o que se impunha uma inelegibilidade."

Segundo o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), o projeto não afeta Bolsonaro, mas ele disse que o partido trabalharia para impedir a alteração no texto proposta por Randolfe. "Esse é um projeto que não atinge ele. Há uma preocupação da base do governo Lula, já apresentou emenda apresentada pelo relator, mas nós vamos destacar (votação de um trecho do texto em separado). Pessoal dorme e acorda pensando no Bolsonaro", disse.

O projeto de lei, de autoria da deputada Dani Cunha (União-RJ), filha do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (Republicanos-RJ), estabelece duas possíveis contagens para o prazo de inelegibilidade, que tem oito anos de duração.

A primeira conta a partir da decisão judicial que decretar a perda do cargo e não após o cumprimento da pena, como é hoje. Ela vale para membros do Poder Executivo e do Poder Legislativo em nível federal, estadual e municipal.

A segunda ocorre em caso de renúncia após representação de membros do Legislativo ou do Executivo que pode levar a abertura de processo por infringir a Constituição em vários níveis. Nesse caso, a data da inelegibilidade começa a partir da renúncia.

Na legislação atual, o político fica inelegível durante todo o período em que exerceria o mandato e a contagem de oito anos começaria após o fim da legislatura.

O texto também fixa o teto de inelegibilidade em 12 anos, caso um político receba uma nova condenação que o tornaria novamente inelegível. Se um senador, por exemplo, renuncia em seu primeiro ano de mandato, ele pode ficar até 15 anos sem poder disputar uma eleição.

A Lei da Ficha Limpa é alvo de constantes ataques de Bolsonaro, que manifestou querer "acabar com a Lei da Ficha Limpa" e também já foi criticado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), que afirmou que o prazo de oito anos é uma "eternidade".

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