Mulheres 'laranjas' receberam R$ 5,4 milhões da corrupção no Tocantins, diz relatório

Política
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A Polícia Civil do Tocantins afirma que uma rede de "laranjas" e empresas de fachada foi usada para distribuir o dinheiro desviado de contratos públicos na gestão do ex-governador Mauro Carlesse (2018-2022) sem deixar rastros.

O suposto esquema é investigado na Operação Via Avaritia, em curso desde 2019. A Polícia Civil atribui ao ex-governador a liderança dos desvios. Carlesse nega e diz que o inquérito tem motivação política.

Os contratos sob suspeita foram firmados com a Prime Construções, que recebeu mais de R$ 15 milhões do governo na gestão de Carlesse.

A empresa teve o sigilo bancário quebrado na investigação. A Polícia Civil identificou repasses para diversas pessoas físicas e jurídicas sem justificativa aparente.

"Indicando que as contas estavam sendo utilizadas, possivelmente, para movimentar recursos de terceiros", diz o relatório da Operação Via Avaritia.

Uma das "laranjas" seria Sandra Maria da Silva. No período investigado, ela recebeu R$ 1.771.662,54 da Prime Construções em "montantes avulsos".

Segundo a Polícia Civil, Sandra recebeu 16 parcelas do auxílio emergencial na pandemia da covid-19, "não apresentando, aparentemente, capacidade econômica compatível com os valores movimentados em sua conta".

Os investigadores concluem que os repasses foram feitos "com o fim de ocultar e dissimular a localização, disposição, movimentação e propriedade de valores provenientes dos crimes praticados pelo suposto grupo criminoso".

A Prime Construções também transferiu vultosos recursos (R$ 3.681.336,90) à empresa Dualmec, registrada em um endereço fictício em Joinville (SC), onde na verdade funciona uma pizzaria.

O CNPJ está registrado em nome de Edi Aguida Gorski. Segundo a Polícia Civil, a sócia "reside numa casa humilde", tem apenas um Ford Fiesta, ano 1998, registrado em seu nome e também foi beneficiária do auxílio emergencial na pandemia.

Os investigadores afirmam que a Dualmec foi criada no papel para que a Prime Construções "pudesse operacionalizar os contratos". Em troca, Edi e o marido, Júlio César, receberiam uma comissão em cima do "faturamento" da empresa de fachada.

"Segundo Júlio César, Francisco Morilha (gerente de obras da Prime Construções) teria lhe imposto a condição de ceder o token da conta bancária da Dualmec para que pudesse operacionalizar os contratos da Prime, ficando ajustado que receberia 3% do que a Dualmec faturasse. Nesse sentido, a Dualmec era uma empresa fictícia utilizada por Francisco Morilha para gerir as obras da Prime, numa espécie de regime de subempreita informal", apontam os delegados Romeu Fernandes de Carvalho Filho e Guilherme Rocha Martins, da Divisão Especializada de Repressão à Corrupção.

Além do ex-governador, foram implicados na investigação quatro ex-secretários de Estado, sete servidores públicos e empresários. A Polícia Civil diz ter reunido "indícios veementes" do envolvimento de Carlesse. Diante das suspeitas, o caso deve subir ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que tem atribuição para processar autoridades com foro privilegiado mesmo após o fim do mandato.

Com a palavra, o criminalista Nabor Bulhões, que representa o ex-governador Mauro Carlesse

"O relatório da Polícia Civil do Tocantins é ilegal, abusivo e inconstitucional. A Polícia Civil não detém competência nenhuma para investigar governador durante o exercício do mandato ou mesmo após o término do mandato. O foro competente é do Superior Tribunal de Justiça. A investigação tem claramente uma conotação política. Quando se falou em uma nova candidatura de Mauro Carlesse foi instaurada essa operação. Não tive acesso a esse relatório parcial, mas afirmo com absoluta convicção e segurança que o governador Carlesse não praticou nenhum ato ilícito em sua administração. De qualquer forma, o documento não tem validade, porque, reitero, é ilegal, inconstitucional. Um abuso. Uma operação policial marcada por evidente interesse político."

Com a palavra, o empresário Marcus Emmanoel Chaves Vieira, da Prime Construções

O empresário Marcus Emmanoel Chaves Vieira, proprietário da Prime Construções Ltda, afirmou ao Estadão que não houve nenhuma irregularidade no âmbito do contrato com o governo do Tocantins. "Prestamos os serviços contratados. Nosso contrato foi auditado pelo Tribunal de Contas do Estado que apontou um dano ao erário no montante de R$ 1,37 milhão. Firmamos um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) com o Tribunal e com a Secretaria de Estado da Infraestrutura."

Ao jornal, Marcus Emmanoel disse que a auditoria do TCE abordou relatórios de medição e inspeções nos locais onde os serviços foram realizados. As falhas indicadas pelos auditores resultaram na multa de R$ 1.372.707,29. "O TAC incluiu a obrigação de execução de obras na praça do Girassol e outros serviços do governo estadual, cobrindo o valor. Da nossa parte foi isso."

Marcus Emmanoel relata que a Proplan Construtora é que estava sob investigação. "Essa empresa, pertencente à filha do gerente de outro órgão, prestou um serviço pequeno para a Prime. Fizemos uma concorrência para um serviço muito específico, a gente não tinha maquinário à época, eles ganharam no menor preço. Fizemos tomada de preços com três empresas, a deles (Proplan) levou pelo menor preço. A Proplan executou aquela parte, emitiu nota fiscal, coisa de cento e poucos mil. Essa empresa estava sendo investigada. Quando a Polícia fez buscas na Proplan encontrou o nosso recibo pelo serviço que contratamos deles. Por isso, fomos envolvidos na Operação Via Avaritia. Na verdade, a Proplan é que estava sendo investigada."

"Fizemos tudo como manda o figurino", afirma. "Fomos alvos de busca e apreensão, a Polícia levou documentos e ficou nisso. Não fomos mais procurados."

O empresário rebate o trecho do relatório policial que classifica a Prime como 'empresa de fachada' com sede em uma pequena sala na periferia de Brasília. "Empreiteira não tem que ter escritório bonito, ela tem que ser avaliada por sua competência na execução de seus serviços. Não há motivo para requintes, não atendemos clientes, público externo. A Polícia não tem que achar cadeiras de couro no nosso escritório. Essa observação é a prova que não há fatos contra a Prime. Quando não se tem um argumento, vão para o genérico. Somos uma empresa idônea, apenas em 2029 fizemos R$ 30 milhões em obras para órgãos federais, estaduais e municipais. Nós tínhamos obras em todos os segmentos, várias esferas. Já fizemos obras até em Tribunal de Contas."

Ele diz que no Tocantins a Prime mantém "mais de 30 colaboradores com carteira assinada, tudo regularizado, engenheiro residente inclusive". "Em nenhum momento a Prime fugiu de suas responsabilidades, jamais nos omitimos. Quando houve a busca e apreensão em nosso endereço em Brasília, na mesma hora nosso Jurídico entrou em contato com a Polícia e nos prontificamos a depor."

Marcus Emmanoel afirma que não tem ligação com o ex-governador Mauro Carlesse; "Eu vi o governador duas vezes, pessoalmente. Amizade? Eu nem sabia como ela era. Uma vez o encontrei no lançamento do projeto da reforma da residência oficial, uma outra vez durante vistoria de obras. Nossos contratos eram sempre com a Secretaria da Infraestrutura, na ocasião dirigida pelo Renato de Assunção, depois pela Juliana Passarin. A gente tratava com a equipe técnica, com o Carioca, gestor do contrato, e com o fiscal Oscar. Nunca tratamos nada politicamente com alguém do governo."

O empresário destaca que o relatório 01/2020 do Tribunal de Contas do Estado foi elaborado por dois auditores. "Quando houve isso, a Secretaria da Infraestrutura nos chamou e avisou que estavam apontando irregularidades nos serviços. Era plena pandemia, os insumos da construção civil já tinham triplicado de preço, o contrato por si só já nem compensava para a empresa, a mão de obra a valores estratosféricos, material que se comprava por 50 foi para 120, as fábricas pararam. Entregamos à Polícia Civil os três orçamentos que fizemos, resultando na subcontratação da Proplan, a nota fiscal que emitimos e o nosso pagamento, saindo da conta da Prime para a conta da Proplan. Ora, isso é propina? Com nota fiscal? A gente fez um trabalho sério. Podem investigar."

Com a palavra, os outros citados no relatório da Polícia Civil do Tocantins

O Estadão fez contato com outros citados no extenso relatório da Polícia Civil do Tocantins, mas não obteve retorno. O espaço está aberto.

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A CEO de notícias da BBC, Deborah Turness, e o diretor-geral da emissora britânica, Tim Davie, renunciaram ao cargo neste domingo, 9. A saída acontece após o jornal The Telegraph mostrar que a BBC havia editado enganosamente um discurso do presidente dos EUA, Donald Trump, para dar a impressão de que ele havia incitado diretamente à violência nos atos de invasão ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021. A fala distorcida de Trump foi exibida no programa Panorama de 3 de novembro de 2024, a uma semana das eleições presidenciais nos Estados Unidos.

Em sua rede social, a Truth Social, Donald Trump celebrou a demissão de quem chamou de "jornalistas corruptos". "Essas são pessoas muito desonestas que tentaram manipular as eleições presidenciais. Para piorar, vêm de um país estrangeiro, um que muitos consideram nosso principal aliado. Que terrível para a democracia!", postou.

A ministra britânica da Cultura, Lisa Nandy, havia classificado horas antes como "extremamente grave" a acusação contra a BBC por apresentar declarações de Trump de maneira enganosa.

"É um dia triste para a BBC. Tim foi um excelente diretor-geral durante os últimos cinco anos", afirmou o presidente da Corporação Britânica de Radiodifusão, Samir Shah, em comunicado. Ele acrescentou que Davie enfrentava "pressão constante (...) que o levou a tomar a decisão" de renunciar.

Colagem de trechos separados levou a versão distorcida do discurso

O caso, revelado na terça-feira, 4, baseia-se em um documentário exibido uma semana antes das eleições presidenciais dos EUA de 2024. A BBC é acusada de ter montado trechos separados de um discurso de Trump de 6 de janeiro de 2021 de forma que parece indicar que ele teria dito a seus apoiadores que marchariam com ele até o Capitólio para "lutar como demônios".

Na versão completa, o então presidente republicano - já derrotado nas urnas pelo democrata Joe Biden - diz: "Vamos marchar até o Capitólio e vamos incentivar nossos valentes senadores e representantes no Congresso."

A expressão "lutar como demônios" corresponde, na verdade, a outro momento do discurso.

Em carta enviada ao conselho da BBC e publicada no site, a CEO de notícias disse que a polêmica em torno do programa Panorama sobre o presidente Trump chegou a um ponto em que está prejudicando a BBC - uma instituição que ela adora.

Já Tim Davie, diretor-geral, disse que abdicou ao cargo após intensas exigências pessoais e profissionais de gerir o posto ao longo de muitos anos nestes "tempos turbulentos".

Um dia antes do início oficial da COP30 em Belém, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, publicou em sua rede social, a Truth Social, nesta domingo, 9, uma mensagem dizendo que a Amazônia foi destruída para a construção de uma estrada.

"Eles destruíram a floresta amazônica no Brasil para a construção de uma rodovia de quatro faixas para que ambientalistas pudessem viajar", escreveu Trump na mensagem, ressaltando que o caso "se tornou um grande escândalo".

Junto com a mensagem, Trump postou um vídeo de quatro minutos da Fox News, com uma reportagem do enviado da emissora a Belém para cobrir a COP30.

Na reportagem, o editor Marc Morano diz, com uma imagem de Belém ao fundo, que mais de 100 mil árvores foram cortadas na Amazônia para construir a estrada e mostrar como o "governo brasileiro está cuidando da floresta tropical".

Ainda na reportagem postada por Trump, o jornalista destaca que pela primeira vez não há uma delegação oficial dos Estados Unidos em uma conferência das Nações Unidas sobre o clima desde 1992. Mesmo países europeus estão deixando esses compromissos de lado, ressalta o jornalista.

A reportagem fala ainda da queda das vendas de carros elétricos e de demissões em fábricas nos Estados Unidos.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, disse há pouco que a BBC alterou seu discurso de 6 de janeiro de 2021, dia da invasão ao Capitólio, e celebrou a demissão de "pessoas muito desonestas que tentaram influenciar uma eleição presidencial".

"As principais pessoas da BBC, incluindo TIM DAVIE, o CHEFE, estão todas se demitindo/DEMITIDAS, porque foram pegas 'alterando' meu excelente (PERFEITO!) discurso de 6 de janeiro. Além de tudo, eles são de um país estrangeiro, que muitos consideram nosso Aliado Número Um. Que coisa terrível para a Democracia!", escreveu o republicano na Truth Social.

A CEO de notícias da BBC, Deborah Turness, e o diretor-geral da emissora britânica, Tim Davie, renunciaram ao cargo nesta trade. A saída acontece após o jornal The Telegraph mostrar que a BBC havia editado enganosamente um discurso de Trump para dar a impressão de que ele havia incitado diretamente à violência nos atos de invasão ao Capitólio.