CNJ abre processo disciplinar contra juiz que tem avião e fazenda de R$ 30 milhões

Política
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O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou abertura de processo administrativo disciplinar contra o juiz titular da 2ª Vara Cível de Campo Grande (MS), Paulo Afonso de Oliveira. Alvo da Operação Ultima Ratio, deflagrada em outubro pela Polícia Federal, o juiz está sob suspeita de ligação com esquema de venda de sentenças e de movimentação financeira incompatível com seu patrimônio declarado ao Fisco.

Entre os bens do magistrado estão um avião que a PF estima custar até R$ 1,2 milhão e uma fazenda de mil hectares em Mato Grosso do Sul avaliada em pelo menos R$ 30 milhões.

Ao CNJ, Paulo Afonso nega atos de corrupção. Ele afirma que o avião que adquiriu é dotado de "equipamentos obsoletos", de modo que não alcançaria o valor mencionado pela PF. A fazenda, ele diz, "é constituída por área de preservação permanente e de uso restrito e, portanto, não pode ser utilizada para a exploração econômica".

A Operação Ultima Ratio mira cinco desembargadores e um conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul, além do juiz Paulo Afonso.

A decisão sobre abertura do Processo Administrativo Disciplinar foi tomada por unanimidade pelos conselheiros na sessão da última terça-feira, 10. A investigação atribui a Paulo Afonso "desvios de conduta" e "afronta a deveres funcionais". Ele pode ser aposentado compulsoriamente, sanção mais "severa" prevista na Lei Orgânica da Magistratura.

O CNJ votou também pela manutenção do afastamento cautelar do magistrado. Ele já está fora das funções desde que a Operação Ultima Ratio saiu às ruas.

O relator do caso é o corregedor nacional de Justiça, ministro Mauro Campbell. Ele indica haver "elementos que corroboram a suspeita" sobre Paulo Afonso de violação à Lei Orgânica da Magistratura (Loman) e ao Código de Ética da Magistratura.

Em seu voto, Campbell observa que após a quebra do sigilo bancário e fiscal de Paulo Afonso "foram constatados saques em espécie em data próxima à prolação de decisão importante nos autos da execução extrajudicial, que totalizaram R$ 580 mil".

Também foi registrado, de "maneira atípica", o pedido de provisionamento para saque da quantia de R$ 100 mil, feito em 2 de abril de 2018, "mesmo dia em que o investigado (Paulo Afonso) rejeitou os embargos à execução opostos por uma vítima de estelionato supostamente praticado por uma advogada, casada com um outro juiz de Mato Grosso do Sul. O golpe rendeu à advogada, que chegou a ser presa, a quantia de R$ 5 milhões, segundo a PF.

O provisionamento foi seguido de dois saques de mesmo valor, três dias após. A PF diz que os dados bancários evidenciaram que o provisionamento feito na conta de Paulo Afonso foi realizado quando o saldo disponível era de R$ 39.160,23.

"Do exposto se observa que, por ocasião do provisionamento, Paulo Afonso de Oliveira não possuía saldo suficiente para o saque e já tinha pleno conhecimento de que no dia 5 de abril de 2018 receberia um crédito em espécie da ordem de R$ 100 mil", assinala o corregedor da Justiça.

Avião de R$ 1 milhão por R$ 100 mil

Despertou a atenção dos investigadores a aquisição pelo magistrado de 50% de uma aeronave Cessna 182P, fabricada em 1974, prefixo PT-JNS, pelo valor de R$ 100 mil, de acordo com sua declaração.

A PF anota que uma aeronave do mesmo modelo, fabricada no mesmo ano, é encontrada à venda no mercado pelo valor de R$ 750 mil a até R$ 1,2 milhão, "sendo evidente, portanto, o subdimensionamento do valor do bem em sua declaração".

A Operação Ultima Ratio indica, também, que Paulo Afonso comprou a Fazenda Recanto da Serra, em 27 de maio de 2008, pelo valor "sub declarado" de R$ 700 mil. Segundo a PF, atualmente, uma fazenda de mil hectares do interior de Mato Grosso do Sul é avaliada entre R$ 30 milhões e R$ 70 milhões, "sendo fortes os indícios de que tal bem possa ter sido adquirido com recursos ilícitos ou não declarados, por parte do magistrado Paulo Afonso".

A investigação constatou que o juiz elaborou uma proposta de compra de outra fazenda, denominada Nova Guaporé, na região de Bodoquena/MS, pelo valor de R$ 18 milhões, "montante equivalente a aproximadamente 35 anos do subsídio bruto de um desembargador no Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul". "Malgrado o negócio em apreço não tenha se concretizado, é notável a intenção do magistrado em adquirir bem de elevadíssimo valor agregado, em montantes manifestamente incompatíveis com seus rendimentos declarados, seja como magistrado, seja como produtor rural", pontua relatório da PF.

A proposta de Paulo Afonso pela Nova Guaporé incluía a transferência de dois apartamentos como parte do pagamento - um apartamento no valor de R$ 2,5 milhões e outro de R$ 700 mil.

A investigação mostra que o juiz registrou em sua conta bancária "vultosas transferências" recebidas de um frigorífico que teria repassado propinas a um colega dele, casado com a advogada que foi presa pelo estelionato de R$ 5 milhões.

Defesa

Ao CNJ, a defesa de Paulo Afonso sustentou que a reclamação disciplinar deveria ser arquivada por ausência de justa causa. Segundo os advogados do juiz, sua conduta no âmbito de ação de execução questionada já foi objeto de "exaustiva apuração" por parte da Corregedoria do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, "nada havendo de novo que seja capaz de alterar a conclusão do Órgão Especial da Corte Estadual que analisou o proceder de Paulo Afonso e concluiu pela sua correção".

Sobre o provisionamento de R$ 100 mil, ainda que não houvesse saldo em conta, salientou a defesa que, "em verdade, o que ocorreu foi um erro do caixa do banco".

"Por ocasião do saque, houve um erro do funcionário do banco, que ao chegar à unidade após a quantia ter sido disponibilizada (sacada) no caixa da agência, acreditou que Paulo Afonso havia entregue o numerário para realização de depósito, razão pela qual tal funcionário efetivou a operação de depósito inadvertidamente", protesta a defesa.

"Ao ser alertado de que os recursos em questão haviam sido sacados e deveriam ser entregues ao magistrado, foi realizado novo saque e, dessa vez, entregando-se os recursos a Paulo Afonso, portanto, o magistrado nunca recebeu um depósito de R$ 100 mil em sua conta. Foi um erro do funcionário do banco", insistem os advogados.

Paulo Afonso alega que a aeronave adquirida teria "equipamentos de aviônica obsoletos, de modo que, por esta razão, não alcançaria o valor mencionado pela autoridade policial".

Sobre a fazenda Recanto da Serra, o juiz afirmou que a gleba foi adquirida por ele e sua ex-mulher em 2008 e que a maior parte da propriedade - cerca de 70% - "é constituída por reserva ambiental, reserva legal, área de preservação permanente e área de uso restrito e, portanto, não pode ser utilizada para a exploração econômica".

Paulo Afonso dá sua versão para depósitos recebidos de um frigorífico. "São decorrentes de sua atividade agropecuária, havendo absoluta legalidade em tais expressivos pagamentos."

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A CEO de notícias da BBC, Deborah Turness, e o diretor-geral da emissora britânica, Tim Davie, renunciaram ao cargo neste domingo, 9. A saída acontece após o jornal The Telegraph mostrar que a BBC havia editado enganosamente um discurso do presidente dos EUA, Donald Trump, para dar a impressão de que ele havia incitado diretamente à violência nos atos de invasão ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021. A fala distorcida de Trump foi exibida no programa Panorama de 3 de novembro de 2024, a uma semana das eleições presidenciais nos Estados Unidos.

Em sua rede social, a Truth Social, Donald Trump celebrou a demissão de quem chamou de "jornalistas corruptos". "Essas são pessoas muito desonestas que tentaram manipular as eleições presidenciais. Para piorar, vêm de um país estrangeiro, um que muitos consideram nosso principal aliado. Que terrível para a democracia!", postou.

A ministra britânica da Cultura, Lisa Nandy, havia classificado horas antes como "extremamente grave" a acusação contra a BBC por apresentar declarações de Trump de maneira enganosa.

"É um dia triste para a BBC. Tim foi um excelente diretor-geral durante os últimos cinco anos", afirmou o presidente da Corporação Britânica de Radiodifusão, Samir Shah, em comunicado. Ele acrescentou que Davie enfrentava "pressão constante (...) que o levou a tomar a decisão" de renunciar.

Colagem de trechos separados levou a versão distorcida do discurso

O caso, revelado na terça-feira, 4, baseia-se em um documentário exibido uma semana antes das eleições presidenciais dos EUA de 2024. A BBC é acusada de ter montado trechos separados de um discurso de Trump de 6 de janeiro de 2021 de forma que parece indicar que ele teria dito a seus apoiadores que marchariam com ele até o Capitólio para "lutar como demônios".

Na versão completa, o então presidente republicano - já derrotado nas urnas pelo democrata Joe Biden - diz: "Vamos marchar até o Capitólio e vamos incentivar nossos valentes senadores e representantes no Congresso."

A expressão "lutar como demônios" corresponde, na verdade, a outro momento do discurso.

Em carta enviada ao conselho da BBC e publicada no site, a CEO de notícias disse que a polêmica em torno do programa Panorama sobre o presidente Trump chegou a um ponto em que está prejudicando a BBC - uma instituição que ela adora.

Já Tim Davie, diretor-geral, disse que abdicou ao cargo após intensas exigências pessoais e profissionais de gerir o posto ao longo de muitos anos nestes "tempos turbulentos".

Um dia antes do início oficial da COP30 em Belém, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, publicou em sua rede social, a Truth Social, nesta domingo, 9, uma mensagem dizendo que a Amazônia foi destruída para a construção de uma estrada.

"Eles destruíram a floresta amazônica no Brasil para a construção de uma rodovia de quatro faixas para que ambientalistas pudessem viajar", escreveu Trump na mensagem, ressaltando que o caso "se tornou um grande escândalo".

Junto com a mensagem, Trump postou um vídeo de quatro minutos da Fox News, com uma reportagem do enviado da emissora a Belém para cobrir a COP30.

Na reportagem, o editor Marc Morano diz, com uma imagem de Belém ao fundo, que mais de 100 mil árvores foram cortadas na Amazônia para construir a estrada e mostrar como o "governo brasileiro está cuidando da floresta tropical".

Ainda na reportagem postada por Trump, o jornalista destaca que pela primeira vez não há uma delegação oficial dos Estados Unidos em uma conferência das Nações Unidas sobre o clima desde 1992. Mesmo países europeus estão deixando esses compromissos de lado, ressalta o jornalista.

A reportagem fala ainda da queda das vendas de carros elétricos e de demissões em fábricas nos Estados Unidos.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, disse há pouco que a BBC alterou seu discurso de 6 de janeiro de 2021, dia da invasão ao Capitólio, e celebrou a demissão de "pessoas muito desonestas que tentaram influenciar uma eleição presidencial".

"As principais pessoas da BBC, incluindo TIM DAVIE, o CHEFE, estão todas se demitindo/DEMITIDAS, porque foram pegas 'alterando' meu excelente (PERFEITO!) discurso de 6 de janeiro. Além de tudo, eles são de um país estrangeiro, que muitos consideram nosso Aliado Número Um. Que coisa terrível para a Democracia!", escreveu o republicano na Truth Social.

A CEO de notícias da BBC, Deborah Turness, e o diretor-geral da emissora britânica, Tim Davie, renunciaram ao cargo nesta trade. A saída acontece após o jornal The Telegraph mostrar que a BBC havia editado enganosamente um discurso de Trump para dar a impressão de que ele havia incitado diretamente à violência nos atos de invasão ao Capitólio.