Documentário sobre tragédia aérea que matou 199 abre debate sobre Congonhas: 'Uma metáfora'

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O cineasta Angelo Defanti (O Clube dos Anjos, Verissimo) começou a pensar no que seria sua nova série documental quando errou o horário de um voo e chegou com duas horas de antecedência ao Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, em 2016. Para aproveitar o tempo, ele acabou indo visitar o Memorial 17 de Julho, erguido em homenagem às vítimas do acidente do voo 3054, da TAM, em 2007, e encontrou uma situação de completo abandono.

"O Memorial estava numa situação deplorável que hoje só piorou. Aquilo ali me pareceu uma metáfora de um acidente que eu, como brasileiro, também tinha vivido grudado na televisão quando ele aconteceu em horário nobre", recorda, em entrevista ao Estadão. "Desde quando tive essa centelha, comecei a pesquisar e vi que era um buraco quase sem fundo."

Foi a partir deste interesse que nasceu Congonhas: Tragédia Anunciada, série em três capítulos que chega nesta quarta, 23, à Netflix. O documentário, como muitos que resgatam histórias de tragédias marcantes, traz relatos de familiares de vítimas e a longa busca por algum tipo de resposta ou responsabilização. Mas o diretor explica que há um diferencial.

"Nessa máxima da aviação de que um acidente nunca é causado por um único fator, e sim uma série de fatores que, em cadeia, colaboram e resultam para um acidente, eu fui entendendo também que a cauda do acidente de Congonhas, era muito longa, longuíssima, muito mais do que outros acidentes", opina.

O acidente ocorreu em 17 de julho de 2007, quando o voo TAM 3054 partiu do Aeroporto Internacional de Porto Alegre rumo a Congonhas. Durante o pouso, a aeronave não conseguiu frear e acabou escorregando para além dos limites da pista, planando sobre a Avenida Washington Luís e colidindo com um prédio de cargas da companhia aérea. É o acidente aéreo com mais mortes da história da aviação brasileira, com 199 vítimas.

Para revisitá-lo, Defanti traça uma rota que passa tanto pela dor dos familiares de vítimas quanto pela burocrática investigação que engloba órgãos de regulamentação e um momento de caos instaurado. Afinal, o País estava no meio do chamado apagão aéreo, uma intensa crise no setor instaurada pelo acidente do voo Gol 1907, de 2006. Atrasos sistemáticos nos voos, problemas na estrutura aeroportuária e até uma greve de controladores de voo denunciaram um sistema de transporte aéreo que enfrentava problemas devido à falta de estrutura e planejamento.

"São duas coisas que se cruzam. Primeiro, abordar a pessoa respeitosamente, provar uma certa seriedade", explica Angelo, ao falar sobre a série dar vazão a esses assuntos com entrevistas com figuras como Marco Antonio Bologna, então presidente da TAM, Denise Abreu, então presidente da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), e Clara Ant, assessora especial do presidente Lula à época.

"Vários desses exigiram longas e longas conversas e longas negociações. Mas também tem um outro lado da moeda, que é o acidente em si. Uma coisa muito importante é renovar o acidente para as novas gerações, para a gente não perdê-lo no imaginário e na lembrança pública. Talvez pessoas que fossem se retrair normalmente toparam falar com a gente por conta disso, por conta de uma missão pessoal, social e coletiva, de participar disso", reflete.

O que 'Congonhas: Tragédia Anunciada' traz de novidade?

Segundo Angelo, um dos grandes desafios do projeto foi a pesquisa, já que houve intensa cobertura midiática na época do acidente. "Foi um acidente que todo mundo cobriu. O que você quiser pensar, tem. O que, por um lado, é maravilhoso. Por outro, é uma grande roubada, você tem que ver os materiais de todos os canais", confessa.

Para organizar o discurso, a série se equilibra sobre alguns eixos principais, como a dor das famílias, as investigações das causas do acidente e a própria situação do aeroporto, engolido pela cidade.

"Desses eixos, até diria que existem mais. Também o próprio acidente em si, não só a investigação do acidente. A dor dos familiares, mas também a busca por justiça. O lado dos pilotos, como é o lado humano e também técnico dos pilotos."

Por isso, Defanti acredita que a grande contribuição da série é abrir debates sobre como o acidente influencia nos conhecimentos e procedimentos de segurança atuais da aviação, e também iniciar uma conversa sobre os eventos desencadeados pela existência de um aeroporto como Congonhas no meio da cidade.

"Algumas coisas não puderam entrar na série, como a fuligem que tem nos arredores de Congonhas. Uma fuligem mesmo, uma poeira muito mais densa. Crianças com problemas cognitivos, porque é aquele barulho a cada 90 segundos. Inconscientemente, tem reverberações também de pessoas com problemas cardíacos. E isso a gente não pôde botar para dentro, mas justamente me parece que incorpora a possibilidade de melhor debate, melhores perguntas ao redor do aeroporto de Congonhas. A gente está usando o acidente como uma plataforma para conversar melhor. Tanto é que a gente não se aprofunda tanto nos temas específicos de Congonhas, para as pessoas, a partir da série, saírem dali e talvez tomarem atenção ao redor disso."

Críticas ao governo federal e Lula são 'ovo da serpente'

Outro ponto que o documentário salienta foram as críticas à resposta dada pelos órgãos governamentais e, sobretudo, pelo presidente Lula, que demorou três dias para fazer um pronunciamento oficial pelo acidente. Ant opina que houve uma tentativa de responsabilizar a presidência, uma narrativa que mudou aos poucos após a Infraero divulgar um vídeo mostrando que o Airbus pousou em uma velocidade incomum, muito mais rápido do que a aeronave que pousou minutos antes.

"Hoje, a gente olhando em perspectiva, tantos anos depois, tinha algum ovo da serpente rolando ali que tentou usar o acidente de Congonhas e que também me parece que não conseguiu. Foi uma tentativa mal fadada ali naquela época", sugere o realizador. "Algo que surgiria depois, mas que eu acho que era um descalabro tão grande utilizar a dor daquelas famílias e a proporção desse acontecimento nefasto, nacional, que isso foi um pouco morrendo."

Por isso, ele crê que contar essa história hoje é lembrar que o passado, por mais triste que seja, ensina.

"Cada avião que decola e que pousa hoje no Brasil em segurança é também decorrência de aprendizados. Um acidente, por mais lamentável que ele seja, também precisa ser aprendido, precisa ensinar coisas. E o acidente de Congonhas ensinou. Se isso acontece novamente no Brasil, tomara que não, que a gente fique um pouco mais vacinado com essas coisas."

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Imagens de drone flagraram, neste sábado, 2, densas camadas de espuma tóxica cobrindo uma grande extensão do Rio Tietê, na região de Salto, no interior de São Paulo. Autor das imagens, o fotógrafo Daniel Santos, diz que subiu o drone entre às 10 horas e o meio-dia. Ele relata que o fenômeno se repete praticamente todo ano e vem se agravando.

A Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) informou que intensificou as fiscalizações e aplicou multas. O governo do Estado diz que investirá R$ 20 bilhões em saneamento até 2029.

De acordo com Santos, que é morador de Salto, ele tem registrado espumas no Tietê há dez anos e o problema acontece de forma recorrente. "Nunca melhorou, mas agora parece que está pior. As pessoas que vêm visitar esta região das cachoeiras reclamam muito do cheiro. Nós, moradores, estamos até acostumados, mas os visitantes relatam irritação nos olhos e no nariz devido aos gases que saem das espumas."

De acordo com a ambientalista Malu Ribeiro, diretora de políticas públicas da Fundação SOS Mata Atlântica, embora o problema das espumas seja recorrente, por causa da baixa vazão neste período do ano, o fato reflete a concentração de poluentes que o rio recebe especialmente da Região Metropolitana de São Paulo.

"Quando as águas com essa carga enorme de poluição chegam às corredeiras de Salto, formam espumas provenientes de sulfactantes, que são produtos biodegradáveis, como saponáceos, detergentes, pasta de dente e outros presentes no esgoto", diz.

Este ano, segundo ela, além da estiagem, houve um "gravíssimo problema" que foi o rompimento de uma rede de esgoto na altura da Marginal Tietê.

"A Sabesp, que é responsável pelo saneamento na região e também pelo projeto de despoluição do Tietê, de forma inadequada, lançou os efluentes da região norte da capital paulista diretamente no rio. Isso fez com que aumentasse a carga poluidora no rio justamente no período de estiagem, agravando o problema para uma cena que não deveríamos mais estar vendo diante dos avanços que foram feitos nos índices de coleta e saneamento de esgoto."

Conforme registrou o Estadão, no dia 27 de junho, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) despejou esgoto diretamente no Rio Tietê, entre as pistas local e central da Marginal, em frente à Avenida Engenheiro Caetano Alvares. A empresa disse ao jornal que "foi preciso realizar uma manobra emergencial para esvaziar a rede no trecho em obras da marginal Tietê, com o objetivo de identificar o que originou a cratera na via.

A dirigente da SOS Mata Atlântica aponta que outra falha voltou a ser registrada neste sábado em uma estação elevatória de esgoto do Rio Pinheiros, drenando efluentes diretamente para o rio, que é afluente do Tietê. Segundo ela, lançar esgoto in natura no rio é proibido pela Constituição paulista desde 1989 e fatos como estes comprometem investimento feito na despoluição do Rio Tietê nos últimos 30 anos.

A reportagem entrou em contato com a Sabesp e aguarda retorno.

O que diz o governo

O governo de São Paulo informou que o programa IntegraTietê, prevê R$ 20 bilhões de investimento em saneamento e na conexão de 2,2 milhões de domicílios à rede de esgoto até 2029. Conta ainda com um Grupo de Fiscalização Integrada das Águas do Rio Tietê (GFI-Tietê), que já percorreu 7,1 mil quilômetros do Rio e aplicou R$ 6,6 milhões em multas.

A Cetesb acompanha os episódios de formação de espuma no Rio Tietê e intensificou as fiscalizações, tendo realizado este ano 324 coletas de amostras e 114 vistorias em estações de tratamento, indústrias e municípios que ainda não tratam esgoto.

No período, foram aplicadas penalidades que somam R$ 3,8 milhões a agentes poluidores. Além disso, o Estado trabalha na limpeza e desassoreamento do Rio, já tendo retirado desde 2023 mais de 3,5 milhões de metros cúbicos de sedimentos do Tietê e seus afluentes.

Moradores e associações de São Paulo fizeram um "café-manifestação" contrário à obra de um empreendimento de alto padrão no entorno de um casarão tombado em Higienópolis na manhã deste sábado, 2. A incorporadora Helbor vai construir prédios de cerca de 20 pavimentos em área junto à antiga residência da família Rodrigues Alves, conhecida por ter sido endereço do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) durante a ditadura militar.

O ato ocorreu como parte de um "encontro-manifestação" marcado pelo Coletivo Pró-Higienópolis e a Associação de Proprietários, Protetores e Usuários de Imóveis Tombados (APPIT), além de outras entidades. O grupo tem criticado que a nova construção ficaria a cinco metros de distância do casarão, "ocupando quase toda a área de seu antigo jardim". Também fala na necessidade de rever o regramento do tombamento do espaço.

O empreendimento de alto padrão preservou e manterá o casarão tombado, como ocorre em outras obras do tipo, a exemplo do Shopping Higienópolis. Em nota, a Helbor destaca que o projeto é desenvolvido "com total respeito à legislação vigente, em conformidade com o Plano Diretor da cidade".

A incorporadora também ressaltou ter obtido autorização do Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp), ligado à Prefeitura e que delibera sobre intervenções em bens tombados na esfera municipal.

"O imóvel, que esteve abandonado por anos, foi revitalizado e agora será reintegrado à vida do bairro, oferecendo um novo espaço qualificado para os moradores e visitantes", completou. É localizado na esquina das Ruas Piauí e Itacolomi.

Nas últimas décadas, o imóvel teve o destino discutido várias vezes. Em 1990, por exemplo, foi vendido para uma construtora, o que acabou barrado na Justiça. Depois, chegou a ser discutida uma transformação em museu, o que atraiu interesse da Polícia Militar.

Em 2015, por sua vez, foi publicada uma lei que o incluiu em lista de imóveis repassados à Prefeitura para abater dívidas - que seriam destinados à moradia popular. O plano não foi adiante, contudo.

Empreendimento terá apartamentos de alto padrão

Ao todo, a Helbor tem dois empreendimentos previstos para o entorno do casarão. O principal é o Casa Piauí Higienópolis, com 40 apartamentos, de 245 m² e 251 m², com quatro suítes, além de três a quatro vagas de garagem. Na divulgação, é chamado de "alto padrão" e "exclusivo".

O casarão deverá ser preservado. A incorporadora é a mesma do caso da travessa pública que deve ser vendida pela Prefeitura de São Paulo, como mostrou o Estadão.

Os manifestantes afirmam ter reunido 200 pessoas no ato deste sábado. Eles preferem utilizar o termo "café-manifestação" em vez de protesto, pois se inspiraram em "coffee parties" realizadas no exterior, com o objetivo de discutir o futuro de Higienópolis.

Qual é a história do casarão?

O antigo casarão foi leiloado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em 2018, por R$ 26 milhões. O valor foi quase 75% a mais do que o lance inicial. Esteve fechado por cerca de duas décadas.

O imóvel foi residência da família do ex-presidente brasileiro Rodrigues Alves. Além disso, entre os anos 1960 e 2000, foi endereço da Polícia Federal, por onde passaram de contrabandistas a opositores da ditadura militar.

É conhecido por ter sido sede do Dops. Também foi carceragem de um dos líderes da Camorra, Francesco Toscanino, e do ex-juiz Nicolau dos Santos Neto (o Lalau) - condenado por desvios na Justiça do Trabalho.

O casarão centenário é de estilo art nouveau. É tombado desde 2012 pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp) por ser um "exemplar de moradia abastada do início do século 20".

O corpo de uma mulher de 30 anos foi encontrado em uma das piscinas do Motel Astúrias na tarde de sexta-feira, 1º. O estabelecimento fica localizado nas imediações da Marginal Pinheiros, no distrito homônimo da zona oeste de São Paulo.

De acordo com a Secretaria da Segurança Pública (SSP), o Corpo de Bombeiros foi ao local, onde constatou a morte. O caso é investigado como "morte suspeita" pela Polícia Civil.

À polícia, os responsáveis pelo motel relataram que a vítima chegou ao local acompanhada de um homem na noite de quinta-feira, 31.

O homem teria deixado o quarto algumas horas depois, sozinho. Retornou, contudo, no dia seguinte, acompanhado de outra mulher. Nesse momento, foi abordado pela polícia e conduzido para prestar esclarecimentos no 14º DP (Pinheiros).

Em depoimento, os representantes do motel apontaram que funcionários tentaram contato com a mulher diversas vezes na sexta, após encerrar o horário da pernoite. Como não obtiveram retorno, entraram na suíte, onde encontraram o corpo da vítima.

De acordo com o portal Metrópoles, o motel tem a política de permitir a saída de um dos clientes apenas com a anuência do outro. Por isso, teria ligado para a suíte e obtido o aval da mulher. O homem teria, então, deixado o estabelecimento no mesmo automóvel em que chegou, um modelo da Mercedes Benz.

"A perícia foi solicitada e as investigações seguem em andamento", apontou a SSP em nota. O motel fica localizado na Avenida Doutora Ruth Cardoso, nas proximidades da Ponte Eusébio Matoso.

Segundo o site do estabelecimento, há piscinas em algumas suítes, nas denominadas "Mansões" e "Presidencial". Nessas opções, os valores de pernoite vão de R$ 421 a R$ 680.