Com lideranças consolidadas, Superterça aponta dificuldades que Trump e Biden terão na eleição

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Era matematicamente impossível que Donald Trump ou Joe Biden garantissem a nomeação para concorrer à presidência dos Estados Unidos nesta Superterça. Mas atingir o "número mágico" de delegados, parece só uma questão de tempo - 2024 deve ser uma reedição da disputa de 2020. E as primárias simultâneas em 15 Estados apontam para as dificuldades que os dois lados terão na corrida à Casa Branca, em novembro.

Sem concorrentes de peso, Biden venceu as primárias democratas em todos os Estados nesta terça-feira, 5, mas voltou a ser alvo dos votos de protesto pela guerra em Gaza. Trump, do outro lado, consolidou sua liderança no Partido Republicano, vencendo em 14 dos 15 Estados que foram às urnas.

A exceção na noite foi Vermont, onde o ex-presidente perdeu para Nikki Haley. Nesta quarta, Haley anunciou a retirada da sua candidatura à presidência pelo Partido Republicano após os resultados desfavoráveis obtidos nesta Superterça. Com isso, o ex-presidente Donald Trump não tem mais rivais nas primárias republicanas e se confirma como nomeação do partido, em uma reedição da disputa eleitoral de 2020 contra o democrata Joe Biden.

"Seu nome não consegue gerar a mobilização necessária ou superar o trumpismo, mesmo em Estados mais moderados", afirma o professor de Relações Internacionais da FAAP Lucas Leite, antes de saber da desistência da candidata.

"Esse cenário é a demonstração empírica de como o Partido Republicano foi cooptado pelo trumpismo e seu radicalismo. Muitos republicanos podem até concordar que um moderado seria melhor em razão do respeito às instituições e do posicionamento do país internacionalmente, mas sabem que seriam voto vencido" completa.

Vermont foi apenas a segunda vitória de Haley desde que o republicanos de Iowa deram a largada nas prévias, ainda em janeiro - a primeira veio no domingo, em Washington DC.

O desempenho de Nikki Haley não chega nem perto de ameaçar a liderança de Trump nas primárias. No entanto, Lourival Sant'anna notou, em coluna no Estadão, que os números da noite desta terça apontam para as dificuldades que o ex-presidente pode enfrentar lá na frente: parte desse eleitorado republicano mais moderado que está com ela hoje pode virar para o lado democrata.

"Há espaço para um terço ou um quarto dos republicanos votar em Biden, ou, na hipótese mais benigna para Trump, não sair para votar", disse o analista partir dos resultados iniciais da Superterça.

Haley teve ao menos 35% dos votos em Massachusetts e Virgínia, 34% no Colorado e mais de 20% no Maine, Minnesota e Carolina do Norte.

Trump sequer mencionou a rival no discurso em que celebrou os resultados. Ele voltou à carga para temas como política externa e imigração - um sinal de que já está virando a página para o embate com Joe Biden. "Somos um país de terceiro mundo nas nossas fronteiras", disse o republicano.

Biden e o voto de protesto

O democrata, por sua vez, venceu em todos os 15 Estados sem dificuldades, com margens que variam, em média, entre 70 e 80 pontos porcentuais. O presidente é candidato natural à reeleição e não tem oponentes realmente competitivos.

Ainda que tenha conquistado uma vitória expressiva, Biden voltou a ser alvo de votos de protesto pelo apoio dos EUA a Israel, que trava uma guerra contra o grupo terrorista Hamas na Faixa de Gaza. O conflito foi desencadeado pelo atentado que matou 1,2 mil pessoas em 7 de outubro. Do lado palestino, o número de mortos passa de 30 mil (segundo ministério da Saúde local, controlado pelo Hamas). E o drama humanitário no enclave aumenta a pressão por um cessar-fogo.

O presidente esperava que uma trégua nos combates fosse anunciada até esta segunda, mas Tel-Aviv desistiu da última rodada de negociações, no fim de semana. O motivo é que o Hamas teria se recusado a apresentar uma lista com os reféns vivos que continuam no enclave.

Como já havia acontecido no Michigan, na semana passada, as campanhas pelo voto "não comprometido" se repetiram nesta Superterça. A mais expressiva delas ocorreu em Minnesota, onde esse voto de protesto estava perto dos 20% com mais de 85% das urnas apuradas.

"No caso dos democratas, a crítica a uma política de apoio irrestrito a Israel tem gerado movimentação na comunidade muçulmana e árabe dos Estados Unidos em favor do voto de protesto. Além disso, 3/4 da população jovem do país é contrária à manutenção do apoio financeiro a Israel", destaca Lucas Leite.

Além da pressão do eleitorado árabe-americano, Biden tem visto Trump avançar parcelas da população que costumam escolher os democratas.

"Os resultados podem confirmar o que as pesquisas têm indicado, que Trump tem capturado parte desse eleitorado que outrora era dado como certo para o Partido Democrata, notadamente, hispânicos, negros e jovens", afirma o analista político e professor do departamento de ciência política do Berea College Carlos Gustavo Poggio, ao alertar que a situação do presidente é complicada.

Nas pesquisas para novembro, o líder republicano ampliou a vantagem sobre o democrata, mesmo acumulando uma série de problemas com a Justiça. No levantamento do New York Times/Siena College, divulgado no fim de semana, a diferença foi de cinco pontos porcentuais: Trump com 48% e Biden com 43% das intenções de voto.

Em nota, Biden apresentou a eleição como o momento de defender a democracia e as liberdades fundamentais - ideia que também esteve presente na campanha de 2020. E exaltou medidas do governo na economia, como as taxas de desemprego e o aumento dos salários, afirmando que "esse progresso estará em risco se Trump voltar à Casa Branca".

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A Polícia Federal concluiu que foi montada uma associação criminosa no governo Jair Bolsonaro para desviar joias e presentes de alto valor recebidos em razão do cargo pelo ex-chefe do Executivo. "Essa atuação ilícita teve a finalidade de desviar bens, cujo valor mercadológico somam o montante de US$ 4.550.015,06 ou R$ 25.298.083,73", diz a PF, no relatório final do inquérito das joias sauditas - caso revelado pelo Estadão.

O ex-presidente foi indiciado por crimes de associação criminosa, peculato e lavagem de dinheiro na quinta-feira, 4. Nesta segunda, 9, o ministro Alexandre de Moraes retirou o sigilo do relatório final da PF sobre o caso e deu 15 dias para que o procurador-geral da República Paulo Gonet se manifeste sobre a conclusão dos investigadores. O documento tem mais de 400 páginas.

Segundo a PF, os valores obtidos das vendas dos presentes e joias eram convertidos em dinheiro em espécie e ingressavam no patrimônio pessoal do ex-presidente, por meio de pessoas interpostas.

A Polícia Federal listou os "bens que foram objeto dos atos de desvio e tentativa de desvio perpetrados pela associação criminosa com a finalidade de enriquecimento ilícito do ex-presidente":

Kit ouro branco relógio - Rolex - DayDate Especial Edition - US$ 73,749,50

Kit ouro branco caneta - Chopard Rollerball - US$ 20,000,00

kit ouro rose relógio - Chopard L.U.C triple Certification Tourbillon Automatic - US$ 109.101,83

kit ouro rose caneta - Chopard - Rollerball - US$ 4.000,00

Joias Femininas retidas pela RFB - relógio Chopard LL'Heure Du Diamant Medium Oval - US$ 187.608,00

Joias Femininas retidas pela RFB - Anel prateado Chopard - US$ 30.292,91

Joias Femininas retidas pela RFB - Par de brincos Chopard - US$ 126.341,56

Joias Femininas retidas pela RFB - Colar prateado Chopard - US$ 671.660,20

Bem retido pela RFB - Escultura de um cavalo árabe dourado - US$ 4.971,12

Segundo a PF, o valor parcial dos presentes entregues por autoridades estrangeiras ao então presidente somou o montante de US$ 1.227.725,12 ou R$ 6.826.151,66.

"O valor não considera os bens ainda pendentes de perícia, além das esculturas douradas de um barco e uma árvore e o relógio Patek Philippe, que foram desviadas do acervo público brasileiro e ainda não foram recuperadas", frisou a corporação.

Os investigadores apontam que a associação criminosa integrada por Bolsonaro e 11 de seus aliados usou a estrutura do Gabinete Adjunto de Documentação Histórica para "legalizar" a incorporação dos bens de alto valor, presenteados por autoridades estrangeiras, ao acervo privado do ex-chefe do Executivo.

Indiciado por peculato, associação criminosa e lavagem de dinheiro no inquérito das joias sauditas - caso revelado pelo Estadão - o ex-presidente Jair Bolsonaro "subtraiu diretamente" esculturas douradas de um barco e uma árvore e um relógio Patek Philippe. A conclusão é da Polícia Federal, que constatou que o grupo criminoso montado no governo do ex-presidente usavam duas formas para desviar joias e presentes de alto valor presenteados ao ex-presidente em razão de seu cargo. Um deles envolvia a subtração direta dos itens, por Bolsonaro, sem passar pelo Gabinete Adjunto de Documentação Histórica da Presidência.

Segundo a PF, o relógio Patek Philippe Calatrava foi presenteado ao ex-presidente da República quando ele visitou o Reino do Bahrein, nos dias 16 e 17 de novembro de 2021. "O bem foi desviado do acervo público brasileiro, sem registro no GADH, e posteriormente foi vendido em loja especializada nos Estados Unidos em junho de 2022", diz a PF.

Já as esculturas douradas de um barco e uma árvore (Palm Tree) foram entregues a Bolsonaro, quando viajou para os Emirados Árabes Unidos e o Reino do Bahrein, em novembro de 2021. "Os bens foram desviados do acervo público, sem registro no GADH e posteriormente foram levados, de forma escamoteada, aos Estados Unidos, por meio do avião Presidencial. Por meio de interpostas pessoas, o grupo investigado tentou vender as esculturas em lojas especializadas na cidade de Miami mas, como não eram constituídas por ouro maciço, conforme pensavam os investigados, não obtiveram êxito nas negociações", indicou a PF.

Ainda de acordo com os investigadores, as esculturas e o relógio ainda não foram recuperadas. Como mostrou o Estadão, a PF estima que o valor mercadológico dos bens desviados pela associação criminosa integrada por Bolsonaro somam o montante de US$ 4.550.015,06 ou R$ 25.298.083,73.

A Polícia Federal implica o general Mauro Cesar Cid, pai do delator Mauro Cid, na tentativa de venda dos presentes diretamente subtraídos por Bolsonaro.

Segundo os investigadores, enquanto lotado no escritório da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos em Miami, ele usou sua conta bancária para receber o montante de US$ 68 mil decorrente da venda dos relógios Rolex Daydate - outro bem supostamente desviado pela associação criminosa - e Patek Philippe, em 13 de junho de 2022 para a empresa PRrecision Watches. Em 2023, ele guardou em sua casa as esculturas douradas (barco e arvore), para serem vendidos nos Estados Unidos.

A Polícia Federal indicou que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) usou dinheiro em espécie obtido por meio da venda de joias desviadas da Presidência da República para bancar as despesas dele e da família na temporada de três meses que ficou nos Estados Unidos, no início de 2023. Bolsonaro viajou ao País norte-americano no último dia do seu mandato. Procurada, a defesa de Bolsonaro ainda não se manifestou.

"A análise contextualizada das movimentações financeiras de Jair Messias Bolsonaro no Brasil e nos Estados Unidos demonstra que o ex-presidente, possivelmente, não utilizou recursos financeiros depositados em suas contas bancárias no Banco do Brasil e no BB América para custear seus gastos durante sua estadia nos Estados Unidos, entre os dias 30 de dezembro de 2022 e 30 de março de 2023", diz relatório da Polícia Federal.

"Tal fato indica a possibilidade de que os proventos obtidos por meio da venda ilícita das joias desviadas do acervo público brasileiro, que, após os atos de lavagem especificados, retornaram, em espécie, para o patrimônio do ex-presidente, possam ter sido utilizados para custear as despesas em dólar de Jair Bolsonaro e sua família, enquanto permaneceram em solo norte-americano", complementa.

Segundo a PF, o uso de dinheiro em espécie para pagamento de despesas cotidianas é uma das formas mais usuais para reintegrar o "dinheiro sujo" à economia formal, com aparência lícita.

Bolsonaro foi indiciado na última semana por crimes de associação criminosa, peculato e lavagem de dinheiro. Nesta segunda-feira, 9, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes retirou o sigilo do relatório final da PF e deu 15 dias para que o procurador-geral da República Paulo Gonet se manifeste sobre a conclusão dos investigadores.

Segundo a PF, a associação criminosa tentou desviar joias avaliadas em R$ 25,3 milhões. Os bens incluem relógios de luxo das marcas Rolex e Chopard, além de canetas, colar e brincos. Os valores obtidos das vendas dos presentes eram convertidos em dinheiro em espécie e ingressavam no patrimônio pessoal do ex-presidente, por meio de pessoas interpostas.

Em um áudio obtido pela Polícia Federal, o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de Ordens de Bolsonaro, afirma que seu pai, o general Mauro Lourena Cid, estaria em posse de US$ 25 mil, que deveria ser entregue em espécie a Bolsonaro.

"Eu acho que quanto menos movimentação em conta, melhor né? Tem 25 mil dólares com meu pai. Eu estava vendo o que que era melhor fazer com esse dinheiro, levar em 'cash' aí. Meu pai estava querendo inclusive ir aí falar com o presidente", afirmou Mauro Cid, em 18 de janeiro de 2023, em conversa com o coronel Marcelo Camara, assessor do ex-presidente. Na ocasião, Bolsonaro estava em Orlando, nos Estados Unidos.