PF vê crime político e prende deputado e irmão, suspeitos da morte de Marielle

Política
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Seis anos após o assassinato de Marielle Franco (PSOL) e o motorista Anderson Gomes, três investigados foram presos neste domingo, 24, por suspeita de envolvimento na tentativa de mandar matar a vereadora do Rio de Janeiro. As prisões do deputado federal Chiquinho Brazão (União Brasil-RJ), de seu irmão Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE), e do ex-chefe da Polícia Civil do Rio Rivaldo Barbosa - responsável por parte das investigações do caso no âmbito estadual - representam o avanço mais significativo da apuração até aqui. Os mandados de prisão preventiva foram cumpridos por determinação do ministro Alexandre de Moras, do Supremo Tribunal Federal (STF), diante de relatório da Polícia Federal (PF) que apontou crime político, motivado pelo fato de Marielle contrariar interesses da milícia e a grilagem de terras na zona oeste do Rio.

 

O inquérito revelou detalhes do funcionamento de uma rede de autoridades públicas suspeitas de estar por trás do crime praticado em 14 de março de 2018. Em entrevista concedida na tarde de ontem, após ler o relatório de 479 páginas da PF, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, afirmou que a investigação e a prisão dos possíveis mandantes é um "triunfo expressivo do Estado brasileiro". Ele alertou que as apurações relatam o "modus operandi da milícia no Rio" e o "entrelaçamento com os órgãos públicos".

 

Domingos Brazão, hoje conselheiro, já foi deputado estadual; Chiquinho é parlamentar federal, e Rivaldo era o chefe da Polícia Civil do Estado na época do crime. Os três foram levados ontem de avião para presídios diferentes em Brasília.

 

O nome de Rivaldo foi apontado como a "surpresa" da investigação por familiares e políticos que conviviam com Marielle. É um personagem que levou a apuração a se debruçar sobre a atuação da Polícia Civil do Rio na condução do processo investigatório. Rivaldo é suspeito de ser parte do conluio para a execução de Marielle. Sua função teria sido a de garantir que não haveria punição ou investigação conclusiva.

 

Há um ano conduzindo as apurações, a PF relatou detalhes da motivação do crime e da atuação dos investigados, presos ontem. Com base no relatório, Moraes expediu os mandados cumpridos. As investigações apontam para a ação da milícia no Rio, e sua ligação crescente com a política, como o principal motivo para a execução de Marielle. Segundo a PF, enquanto o grupo sobre o qual os irmãos Brazão tinha influência atuava para regularizar terras para fins comerciais, a vereadora e seus aliados políticos queriam usar os terrenos para fins sociais, de moradia popular. Chiquinho Brazão foi vereador junto com Marielle.

 

Descontrole

 

Um projeto de lei em específico teria sido a origem da irritação do então vereador com Marielle. De autoria de Chiquinho, o texto tratava da regulamentação fundiária de loteamentos em bairros da zona oeste do Rio. A votação foi apertada, por conta dos votos do PSOL, o que teria levado o vereador ao "descontrole".

 

"No mesmo sentido, apontam diversos indícios do envolvimento dos Brazão, em especial do Domingos, em atividades criminosas, incluindo as relacionadas com milícias e grilagem de terras. Por fim, ficou designada a divergência no campo político sobre questões de regularização fundiária direito de moradia", diz o relatório policial.

 

A ação da PF, batizada de Operação Murder Inc., também cumpriu 12 mandados de busca e apreensão na capital fluminense, expedidos pelo Supremo. Segundo a PF, também são apurados crimes de organização criminosa e obstrução de Justiça.

 

O diretor-geral da Polícia Federal, delegado Andrei Rodrigues, afirmou que a motivação do crime também precisa ser "olhada em um contexto". "A gente não pode dizer, e isso estava nos relatórios, que houve um único e exclusivo fato. O que há são várias situações que envolvem a vereadora Marielle Franco, que levaram a esse grupo de oposição, envolve também a questão das milícias, disputas de territórios. Precisamos fazer essa análise olhando há seis anos. Havia um cenário e havia uma disputa", afirmou.

 

Bloqueio

 

A prisão preventiva ocorreu cinco dias após Lewandowski anunciar a homologação da delação premiada de Ronnie Lessa, ex-policial militar apontado como o responsável por executar a vereadora e Anderson. Em depoimento, o comparsa de Élcio Queiroz - que, segundo a investigação dirigia o carro usado no crime - citou o deputado Chiquinho Brazão, o que motivou a remessa do caso para o Supremo, por causa do foro.

 

Além das prisões e das buscas, Moraes também determinou bloqueio de bens; afastamento das funções públicas; e outras medidas cautelares, como tornozeleira eletrônica, recolhimento domiciliar noturno, entrega de passaporte e suspensão de porte de armas.

 

O TCE-RJ disse que policiais federais foram até o gabinete de Domingos Brazão ontem pela manhã para cumprir o mandado de busca e apreensão contra o conselheiro. Também foram alvos de medidas cautelares Erica Andrade, esposa de Rivaldo Barbosa; Giniton Lages, delegado da Polícia Civil e ex-chefe do Departamento de Homicídios; Marco Antonio Barros, comissário de Polícia Civil; e Robson Calixto Fonseca, assessor do TCE-RJ.

 

Delações

 

Andrei Rodrigues, chefe da PF, afirmou que as delações premiadas de Ronnie Lessa e Elcio de Queiroz tiveram peso importante na elucidação do caso. Mas elas foram complementadas com outras provas. "Procuramos corroborar tudo que é falado pelos colaboradores, inclusive uma colaboração corrobora com a outra", frisou.

 

Os presos foram levados pela manhã para à Superintendência da Polícia Federal, no Rio. Eles passaram por audiência de custódia. À tarde, foram transferidos para Brasília.

 

O advogado Ubiratan Guedes, que representa o conselheiro Domingos Brazão afirmou que ele "nunca teve nenhuma ligação com Marielle Franco". "Segundo informações que nós tivemos, a imputação que tem contra ele é de obstrução de Justiça", afirmou o advogado.

 

O STF marcou uma sessão extraordinária para esta segunda-feira, 25, para que a Primeira Turma da Corte analise as medidas determinadas no inquérito sobre o assassinato da vereadora.

 

A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, comemorou as prisões em publicação numa rede social "Grande dia", escreveu a ministra no X (antigo Twitter). "Só Deus sabe o quanto sonhamos com esse dia! Hoje é mais um grande passo para conseguirmos as respostas que tanto nos perguntamos nos últimos anos: quem mandou matar a Mari e por quê? Agradeço à PF e ao STF. Estamos mais perto da Justiça!"

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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A pressão sobre o chefe do Pentágono, Pete Hegseth, aumentou na segunda-feira, 21, após relatos de um segundo bate-papo online no aplicativo Signal, usado por ele para discutir operações militares secretas.

O deputado Don Bacon se tornou o primeiro congressista republicano a pedir a renúncia de Hegseth.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, reafirmou seu apoio ao secretário da Defesa, Pete Hegseth após o The New York Times reportar que ele havia compartilhado planos militares para o ataque ao Iêmen em grupo com familiares no aplicativo de mensagens Signal.

Anteriormente, a revista The Atlantic havia publicado que o seu editor-chefe Jeffrey Goldberg havia sido incluído por engano em outro grupo do Signal, em que a cúpula da Casa Branca discutia a ofensiva contra os rebeldes houthis.

As autoridades americanas negam que as informações compartilhadas por Pete Hegseth fossem confidenciais enquanto reforçam o seu apoio ao secretário de Defesa, atribuindo as notícias a ex-funcionários insatisfeitos com as mudanças no Pentágono.

Ao falar com repórteres no gramado da Casa Branca, onde participava das celebrações de Páscoa, Trump reafirmou a confiança em Hegseth e minimizou as preocupações sobre o vazamento de planos militares como "perda de tempo".

"Ele está fazendo um excelente trabalho. Perguntem aos houthis como ele está se saindo", disse o presidente, referindo-se ao grupo rebelde, que é apoiado pelo Irã e foi alvo dos ataques dos Estados Unidos.

De acordo com o NYT, o secretario de Defesa americano compartilhou detalhes sobre os ataques em 15 de março, antes que os bombardeios fossem lançados, em grupo que incluía a mulher, o irmão e o advogado pessoal de Pete Hegseth.

Os detalhes compartilhados no grupo eram essencialmente os mesmos que Hegseth enviou, no mesmo dia, em outro grupo do Signal que, por engano, incluía o editor da revista The Atlantic.

Pete Hegseth se mostrou furioso com a matéria do NYT, que atribuiu a "difamações anônimas de ex-funcionários descontentes sobre notícias antigas".

Ao chegar para as celebrações de Páscoa com a família, ele apontou para os repórteres e os chamou de "farsantes". Na sequência, se voltou para os filhos pequenos, que estavam ao fundo. "Essas crianças aqui, são o motivo pelo qual estamos lutando contra a mídia de notícias falsas", disse.

Em resposta às críticas do governo, um porta-voz disse que o NY Times tem confiança na precisão da reportagem e destacou que o Pentágono "não negou a existência do grupo de mensagens".

Embora as autoridades americanas tenham insistido que nenhuma informação confidencial foi compartilhada no grupo, o NY Times disse que isso não vem ao caso porque a sua reportagem "não caracterizou a informação como confidencial".

Trump e Hegseth conversaram por telefone na noite de domingo. Segundo uma fonte informada sobrea a ligação, o presidente disse ao seu secretário que "delatores ressentidos" seriam culpados pela reportagem e reafirmou que o apoiava.

Essa ideia de que delatores ressentidos estariam por trás da reportagem foi reforçada pela secretária de imprensa da Casa Branca Karoline Leavitt em entrevista ao Fox & Friends, programa da Fox News que era apresentado por Pete Hegseth. "É isso que acontece quando todo o Pentágono está trabalhando contra você e contra as mudanças monumentais que você está tentando implementar", disse. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)

Dos peronistas ao libertário Javier Milei, o papa Francisco teve relações tensas com presidentes da Argentina. Alvo da politização, ele acabou se distanciado do seu país de origem e morreu sem nunca ter retornado a Buenos Aires.

A disputa envolvendo o líder católico ganhou novos contornos quando Javier Milei o insultou como "imbecil" e "representante do maligno na Terra" durante as eleições. O libertário, contudo, não foi o único líder argentino a criticar o papa, que tinha relações delicadas com a política.

Embora tenha recebido todos os presidentes no Vaticano, Francisco morreu sem ter visitado a Argentina enquanto papa por temer que o seu retorno fosse usado politicamente - por um lado ou pelo outro.

Relação com presidentes argentinos

A relação espinhosa do papa com a política argentina vem de muito antes de Javier Milei.

O casal Néstor e Cristina Kirchner considerava Francisco o "líder espiritual da oposição". Os peronistas chegaram a acusá-lo de colaborar com a ditadura militar argentina entregando padres para o regime - denúncia que nunca ficou comprovada.

Depois que o arcebispo de Buenos Aires Jorge Bergoglio se tornou o papa Francisco, em 2013, a então presidente Cristina Kirchner foi aconselhada por aliados a rever sua posição e pediu desculpas. "Achei que você fosse outra coisa", teria dito Cristina em encontro com o pontífice.

Ela foi recebida pelo papa quatro vezes e foi atrás de Francisco durante as suas visitas ao Brasil, Paraguai e Cuba. Mas o uso político da aproximação por parte de Cristina Kirchner desagradou o pontífice, segundo reportou o Clarín. Depois disso, a relação voltaria a se desgastar.

Já com Mauricio Macri, o desgaste começou quando ele ainda era prefeito de Buenos Aires. O líder católico havia apoiado a candidatura do bispo Joaquín Piña que conseguiu barrar, na constituinte da província de Misiones, a reeleição indefinida do governador peronista Carlos Rovira. E esperou, em retribuição, que Macri apelasse contra a decisão que abriu caminho para o casamento entre pessoas do mesmo sexo na Argentina, o que não aconteceu.

Durante a presidência de Mauricio Macri, a Argentina deu mais um passo nas reformas progressistas: o início das discussões no Congresso sobre a legalização do aborto. Apesar do desgaste com o papa Francisco, que enfrentava a pressão dos setores mais conservadores da Igreja Católica, eles mantiveram as relações no nível institucional.

No caso de Alberto Fernández, a relação foi afetada pela legalização do aborto, concluída durante o seu período na Casa Rosada. De acordo com o Clarín, o pontífice também teria se incomodado com a estratégia de Fernández, que assim como sua vice-presidente Cristina Kirchner, tentou explorar politicamente as relações o papa.

Milei, por sua vez, atacou o líder católico antes de chegar à presidência. Depois de eleito, ele participou da missa de canonização de Mama Antula, a primeira santa da Argentina, e foi recebido pelo papa Francisco.

A relação foi apaziguada, mas eles mantiveram profundas discordâncias sobre o papel do Estado. O libertário Javier Milei promove um duro ajuste fiscal, que atinge principalmente os mais pobres na Argentina, enquanto o papa Francisco se dedicou à defesa dos vulneráveis.

"O Estado, hoje mais importante do que nunca, é chamado a exercer esse papel central de redistribuição e justiça social", disse o papa, um mês após receber Milei no Vaticano.

Francisco também criticou a repressão do governo aos protestos na Argentina. "Me mostraram as imagens da repressão, onde a polícia reprimiu os trabalhadores que exigiam os seus direitos nas ruas como se fossem desordeiros. Em vez de gastarem com justiça social, gastam na compra de gás de pimenta", disse após encontro com representantes dos movimentos sociais.

Embora na Argentina o Estado e a Igreja estejam separados, os vínculos sempre foram muito estreitos. Até a reforma constitucional de 1994, ser católico era requisito para assumir a presidência. Nesse contexto, o papa se viu no meio da polarização e das discussões em torno do peronismo.

"Nunca fui filiado, militante ou simpatizante do peronismo. Afirmar isso é uma mentira. Meus escritos sobre justiça social levaram a dizerem que sou peronista. Mas, na hipótese de ter uma concepção peronista da política, o que haveria de errado nisso?", questionou o papa sobre as acusações dos críticos de vínculos com o peronismo.

"Na Argentina, o papa era visto com um perfil de esquerda, e a direita mais liberal não gostava dele", explicou o biógrafo Sergio Rubín, coautor de O jesuíta (2013) e O Pastor (2023).

A disputa acabou afastando o papa, que nunca voltou a Buenos Aires. O papa Francisco chegou a dizer que gostaria de visitar à Argentina, mas não queria que a sua passagem pelo país fosse "usada nem para um lado, nem para o outro", expressando a preocupação com a politização de sua imagem.

Reações à morte do papa Francisco

Agora, enquanto o mundo dá adeus ao papa Francisco, os líderes políticos da Argentina deixam as desavenças com o líder católico para trás.

"Apesar das diferenças que hoje parecem pequenas, foi uma verdadeira honra para mim ter podido conhecê-lo em sua bondade e sabedoria", escreveu Javier Milei ao lamentar a morte. O presidente decretou luto oficial de sete dias e vai a Roma para a despedida do papa.

Por sua vez, Cristina Kirchner disse que ele era o "rosto de uma Igreja mais humana, com os pés na terra e o olhar fixo no céu", lembrando do primeiro encontro que teve com o papa Francisco.

O caráter humanitário do pontífice também foi destacado por Alberto Fernández. "A Igreja deveria apoiar os despossuídos, os marginalizados e os perseguidos. A Igreja deveria abraçar aqueles que foram condenados a ser minorias ou perseguidos em suas terras. A Igreja deveria levantar sua voz contra aqueles que acumulam riqueza e distribuem pobreza. No entanto, a Igreja só conseguiu fazer isso quando Francisco, o jesuíta, era o papa", escreveu nas redes sociais.

Lembrando o seu último encontro com o papa Francisco, acompanhado da mulher e das filhas, Mauricio Macri disse: "Tenho a imagem daquele dia e também de Francisco como um homem religioso de estatura inigualável, um político severo e, principalmente, um bom pastor. Sua vida foi marcada pelos ensinamentos que transmitiu com suas palavras, seu compromisso e seus gestos. Ele mesmo, com sua trajetória, é uma lição para todos nós".