Em 'Sempre Garotas', diretora aborda a descoberta da sexualidade, ainda um tema tabu

Variedades
Tipografia
  • Pequenina Pequena Media Grande Gigante
  • Padrão Helvetica Segoe Georgia Times

Festivais de cinema, principalmente aqueles focados na cena independente, como SXSW e Sundance, geralmente apresentam boas surpresas. Sempre dá para encontrar, na programação, produções que correm à margem dos grandes estúdios, encabeçados por boas ideias e diretores novos, frescos, criativos. Um bom exemplo disso é Sempre Garotas, filme indiano já em cartaz, já reconhecido em muitos países.

Dirigido e roteirizado pela estreante Shuchi Talati, o longa fez uma carreira invejável pelos festivais de cinema em que passou - principalmente pensando em um filme de primeira viagem. Levou dois prêmios em Sundance, quatro no Mumbai Film Festival e um numa competição paralela no Festival de Berlim. Ainda foi indicado para o Gotham Awards e ganhou o John Cassavetes Awards, para produções até US$ 1 milhão, no Spirit Awards, o "Oscar" do cinema independente.

Não é para menos. Sempre Garotas vem com uma proposta ousada de contar a história de Mira (Preeti Panigrahi), uma garota, em um rígido internato situado ao pé do Himalaia, que descobre pela primeira vez o desejo e o romance. No entanto, sua curiosa e rebelde maioridade é afetada por sua jovem mãe.

Ao Estadão, Shuchi esbanjou simpatia numa conversa de 20 minutos sobre seu trabalho. Falou de inspirações, do desafio de fazer um primeiro longa e, acima de tudo, sobre a tarefa de romper o preconceito ao falar de sexualidade na sociedade da India.

Pode explicar de onde surgiu a ideia para o filme?

Ele nasceu de um lugar de raiva e rebeldia. Eu estudei em uma escola muito parecida com a que está retratada no filme, onde, assim que me tornei adolescente, houve um policiamento intenso sobre como as meninas se vestiam e se comportavam. Qualquer expressão de desejo ou sexualidade era punida. Então, quis escrever uma história que refletisse esse ambiente que conheço tão bem, mostrando, contra esse pano de fundo, o despertar sexual de uma jovem. E, na narrativa, foi fundamental para mim não punir nem julgar essa descoberta, mas tratá-la como algo normal, celebrá-la - deixar que ela se divertisse. Essa foi a semente do filme.

E essa semente não só deu certo como você ainda foi premiada em Sundance logo com seu primeiro longa. Como viveu tudo isso?

Foi uma experiência incrível. Estudei cinema nos Estados Unidos e, para quem vive lá, Sundance é quase uma Meca do cinema independente. Só o fato de ter um filme selecionado já parecia um sonho. No começo, pensei: "Só de estar aqui já é tudo o que eu poderia querer". Mas depois, claro, você começa a torcer por um prêmio. Recebemos dois: do público e um especial do júri de atuação para Preeti Banerjee, que interpreta a protagonista. O do público, especialmente, foi uma validação da conexão que senti com a plateia em cada sessão - risos, suspiros, reações espontâneas. E o reconhecimento da Preeti foi motivo de muito orgulho. Ela entregou uma atuação realmente especial.

Falando na protagonista, o filme aborda a descoberta do desejo sexual por uma jovem mulher, algo que ainda é tabu em muitos lugares do mundo, inclusive no Brasil. Como foi abordar esse tema, pensando na realidade das mulheres no mundo e também na Índia?

Era importante justamente por ser um tema ainda tabu em todo lugar, em diferentes graus. As mulheres são ensinadas a sentir vergonha de seus corpos e desejos. Então, quis tratar o tema com franqueza, sem recuar. Mostramos masturbação, uma menina olhando para seus próprios genitais pela primeira vez - momentos muito íntimos. Mas, ao mesmo tempo, era fundamental não sexualizar a personagem. O desafio foi ser emocionalmente explícita, sem ser fisicamente explícita. Não há nudez no filme. Meu foco sempre foi capturar a experiência emocional, a insegurança sobre o próprio corpo, a ansiedade sobre o desejo do parceiro, sem transformar a personagem em objeto.

A propósito, como fez para encontrar o elenco? E como foi o preparo para as cenas íntimas?

Para o elenco principal - a Meera, o namorado Sri e a mãe -, tivemos processos diferentes. Sempre admirei o trabalho da Kani Kusruti, que interpreta a mãe. Para os dois jovens, fizemos uma busca ampla. Tanto Preeti quanto Keshav vieram de chamadas abertas de elenco. Nenhum deles era ator profissional: ela estudava em uma universidade em Délhi e ele cursava engenharia. Eles se destacaram desde o começo. Preeti tinha uma força e dignidade essenciais para a personagem, enquanto Keshav conseguiu equilibrar charme e gentileza - era importante que ele desafiasse a protagonista sem soar como um bad boy problemático. Sobre as cenas íntimas, nós três trabalhamos juntos, com cuidado e respeito. Não tínhamos um coordenador de intimidade - esses profissionais ainda são raros e caros na Índia; então criamos um processo próprio: desenvolvemos a coreografia das cenas juntos, discutimos tudo com transparência, e os atores sempre tinham a opção de dizer "não". Mostrávamos como os planos seriam filmados antes de gravar. Na prática, filmar essas cenas acabou sendo uma experiência bonita.

E como foi o processo de construir a relação entre mãe e filha? É uma tarefa complexa.

Essa relação evoluiu ao longo de muitos rascunhos do roteiro. Nos primeiros, eu me identificava só com a filha e carregava muita raiva dos adultos. Inicialmente, nem havia uma mãe no roteiro - o conflito era com uma professora. Mas, com o tempo, percebi a importância de ter compaixão por todos os personagens. Conversar com minha mãe, com mães de amigos, com tias, todas que foram mães muito jovens, me trouxe uma nova perspectiva. Eu, uma mulher na casa dos 30, passei a ver a mãe como uma mulher jovem também, que teve de renunciar aos próprios desejos para viver em função da filha e do marido. Essa percepção mudou tudo para mim e deu profundidade à relação entre mãe e filha no filme.

Como foi a recepção ao filme na Índia?

A estreia no Festival de Cinema de Mumbai foi uma loucura! Os ingressos se esgotaram em minutos e havia filas enormes para conseguir entradas de última hora. Assistir ao filme com o público indiano foi muito especial, porque eles riam não só das cenas universais, mas também de detalhes culturais muito específicos. Recebi muitos relatos emocionados de jovens mulheres que se viram retratadas na tela pela primeira vez. Depois, o filme foi lançado no Prime Video e, embora o digital não tenha essa conexão presencial, pude acompanhar reações principalmente pelo Letterboxd. Fiquei tocada principalmente pelos comentários de jovens homens refletindo sobre seus comportamentos passados, suas mães, irmãs - e como o filme os fez repensar suas atitudes.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Em outra categoria

O sonho dos alquimistas do século XVII acaba de se tornar realidade pelas mãos de físicos do Superacelerador de Partículas (LHC) da Europa: transformar chumbo em ouro. A transmutação ocorreu por apenas uma fração de segundos e a um custo altíssimo, mas, de fato, aconteceu, como atesta um estudo publicado esta semana na Physical Review.

A transmutação aconteceu na Organização Europeia para Pesquisa Nuclear (CERN), o principal laboratório europeu de física de partículas em Genebra, na Suíça, onde o LHC forçou a colisão de átomos de chumbo.

A alquimia é considerada até certo ponto a precursora da química moderna, mas ela envolvia também uma boa dose de misticismo e ocultismo. O maior sonho dos alquimistas era transformar o abundante chumbo no precioso ouro. Mas, o grande empecilho dessa transformação sempre foi a diferença no número de prótons dos dois elementos (são 82 no chumbo e 79 no ouro), o que torna impossível a transmutação por meio da química.

Os pesquisadores do CERN, então, conseguiram realizar a tão sonhada transformação ao provocar a colisão de feixes de átomos de chumbo viajando praticamente na velocidade da luz. Quando os átomos do chumbo passam um pelo outro, é formado um intenso campo eletromagnético que produz um pulso de energia capaz de fazer com que o núcleo do átomo expulse três prótons - transformando-se em ouro.

A transformação durou apenas um microssegundo - muito mais rápido do que um piscar de olhos e impossível de se ver a olho nu. O trabalho do CERN, no entanto, é o "primeiro a detectar e analisar de forma sistemática a assinatura do ouro na produção do LHC", nas palavras de Uliana Dmitrieva, uma especialista em física de partículas.

O experimento foi repetido diversas vezes entre 2015 e 2018. Durante esse período foram criados cerca de 86 bilhões de núcleos de ouro, o que corresponde a apenas 29 trilionésimos de grama. A grande maioria desses átomos de ouro era instável e durou cerca de um microssegundo antes de se fragmentar e deixar de ser ouro.

Um outro superacelerador de partículas do CERN, o SPS, já havia conseguido transformar chumbo em ouro em experimentos realizados entre 2002 e 2004, segundo Jangyong Jia, um físico da Universidade Stony Brook, em Nova York, que participou do trabalho. Mas, o experimento mais recente tem mais probabilidade de ser bem sucedido e permite uma observação melhor, ele acrescentou.

Os pesquisadores do CERN não planejam começar a produzir ouro, mas afirmam que a compreensão de como os prótons podem alterar um núcleo vai ajudar na própria performance do LHC.

"Entender esse processo é crucial para controlar a qualidade dos feixes e a estabilidade do processo", disse Jia.

Um protesto realizado na tarde desta segunda-feira, 12, por moradores da Favela do Moinho, a última comunidade ainda de pé no centro de São Paulo, afetou a circulação de ao menos três linhas de trem com operação na capital paulista.

As linhas 7-Rubi, 10-Turquesa e 8-Diamante tiveram a operação interrompida por volta das 16h. O trajeto do Expresso Aeroporto também foi impactado. Os serviços teriam voltado à normalidade somente por volta das 17h30.

No começo da tarde, o governo de São Paulo começou a demolição das primeiras casas de famílias que foram retiradas da comunidade, em meio a um plano da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) de transformar o espaço em um parque.

Contrários à medida, moradores colocaram barricadas em cima de trilhos que ficam logo ao lado da favela, cravada há cerca de três décadas sob o viaduto que interliga as avenidas Rudge e Rio Branco, perto da Estação Júlio Prestes.

A gestão estadual afirma que está oferecendo alternativas variadas de moradia para que as mais de 800 famílias que vivem na favela saiam dali voluntariamente, com oferta de auxílio-moradia enquanto os imóveis não ficam prontos.

Muitos afirmam, porém, que as propostas oferecidas têm sido insuficientes, sobretudo para famílias que querem ficar no centro - há gerações que cresceram na favela. Como mostrou o Estadão, alguns moradores relatam que têm aceitado as propostas por medo de ficar sem nada.

A CPTM informou que, por volta das 16h10 desta segunda, a circulação dos trens do serviço 710 foi interrompida entre as estações Palmeiras-Barra Funda e Luz, devido ao protesto na linha férrea nas proximidades do Moinho.

"As composições da Linha 7-Rubi estão circulando entre as estações Jundiaí e Palmeiras-Barra Funda, já os trens da Linha 10-Turquesa circulam entre as estações Rio Grande da Serra e Luz", afirmou, em nota.

A CPTM sugeriu, como alternativa, que os passageiros optassem pelas Linhas 1-Azul e 3-Vermelha do Metrô, que passam pelas estações. Disse ainda que, também afetados, os trens do serviço Expresso Aeroporto estavam partindo da Estação da Luz (em vez da Estação Palmeiras-Barra Funda).

Já a ViaMobilidade afirmou, por volta das 17h, que a circulação de trens estava interrompida entre as estações Júlio Prestes e Palmeiras-Barra Funda, na Linha 8-Diamante. Os passageiros, afirmou a concessionária, estavam sendo orientados sobre possíveis alternativas por avisos sonoros.

"Equipes da concessionária acompanham a situação em tempo real, em articulação com as autoridades competentes, e trabalham para restabelecer a operação no menor prazo possível", disse a concessionária. "A ViaMobilidade reforça seu compromisso com a segurança dos passageiros e a continuidade dos serviços."

Seis casas foram demolidas no primeiro dia

Conforme a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação, os trabalhos desta segunda tiveram início por seis casas que representam risco pela estrutura precária, já lacradas pela Prefeitura. A ação, que durou aproximadamente das 14h às 16h, foi realizada conjuntamente pela Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), pela Subprefeitura da Sé e pela Defesa Civil.

A secretaria acrescenta que foram realizadas, até aqui, mudanças de 168 famílias que moravam na Favela do Moinho. Os trabalhos tiveram início no dia 22 de abril. "Ao todo, 752 famílias já aderiram ao reassentamento (88% do total), sendo que 599 estão habilitadas, ou seja, já estão aptas a assinar contratos e receber as chaves assim que as unidades estiverem prontas", diz a pasta.

"Até agora, 548 já escolheram o imóvel de destino para atendimento final ou sinalizaram a opção por Carta de Crédito Individual para buscar uma casa no mercado, mesmo número que já iniciou o processo para recebimento de auxílio moradia", acrescenta. A previsão é que os trabalhos continuem nos próximos dias para realizar as mudanças agendadas com novas famílias.

O governo Tarcísio de Freitas planeja transformar a comunidade em um parque, além de criar "um polo de desenvolvimento urbano potencializado para a implantação da Estação Bom Retiro". A área, porém, pertence à União. Para conseguir viabilizar o projeto, é preciso que o governo federal aceite ceder o terreno ao Estado, em processo pleiteado pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (SDUH).

Questionada pela reportagem sobre a demolição das primeiras casas, a pasta ainda não se manifestou.

O governo de São Paulo assinou um convênio com o Ministério da Justiça e Segurança Pública para receber um investimento de R$ 27,8 milhões para ampliar o programa de câmeras corporais da Polícia Militar do Estado.

O acordo, firmado entre a Secretaria da Segurança Pública do Estado (SSP) e a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), foi publicado na sexta-feira, 9, no Diário Oficial do Estado (DOE), com vigência até abril de 2027.

A assinatura ocorre logo após o governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) entrar em acordo com a Defensoria Pública e o Ministério Público do Estado sobre a política de uso das chamadas bodycams pela PM.

Entre outros pontos, a gestão estadual se comprometeu a ampliar o número de câmeras para 15 mil - hoje, são cerca de 10 mil. Foram firmadas também novas definições para acompanhamento do uso do equipamento.

O documento foi homologado quinta-feira, 8, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), responsável por mediar o processo com os outros órgãos estaduais. A decisão ocorreu após três audiências de conciliação promovidas pela Corte.

A principal mudança afeta o modelo de gravação. Conforme previsto em edital, ele deixará de ser ininterrupto. Os policiais terão autonomia para acionar o equipamento somente durante operações e abordagens.

O novo modelo começou a ser usado ainda em fase de testes no final do ano passado. À época, Tarcísio passou a defender o equipamento e admitiu que tinha errado ao questionar a eficácia e importância das câmeras nas fardas. Ele também alegou que a troca só seria feita após avaliação dos resultados.

As discussões chegaram ao STF justamente após o MP e a Defensoria questionarem o fim da gravação ininterrupta - que poderia prejudicar a qualidade e a eficácia do registro da ocorrência.

Com a inclusão de políticas de fiscalização, obrigatoriedade do uso em determinadas circunstâncias, ampliação do número de equipamentos, distribuição e transparência, o modelo foi aceito e o acordo, homologado.

Gravação

Como é: Modelo atual usado pelos policiais tem gravação contínua, ou seja, registra tudo que ocorre durante o turno.

Como será: Gravação deixa de ser ininterrupta. Policiais passam a ter autonomia para acionar o equipamento durante abordagens e operações.

Acionamento

Como é: Modelo atual prevê apenas acionamento manual, ou seja, precisa ser feito pelo próprio policial.

Como será: As câmeras poderão ser acionadas de três formas:

pelos próprios policiais;

pelo Centro de Operações da Polícia Militar;

e de maneira automática, por bluetooth, quando um agente estiver a menos de dez metros de uma ocorrência.

Se a câmera for desligada durante uma ocorrência, haverá mecanismos de ativação automática, sem a perda de imagens.

Quantidade

Como é: PM tem atualmente 10.025 mil equipamentos em uso.

Como será: Número deverá subir para 15 mil câmeras. Dessa forma, todos os batalhões considerados prioritários serão atendidos.

Uso em operações de risco

Como é: Uso não é obrigatório em grandes operações ou ações em comunidades e após ataques a policiais.

Como será: Uso passa a ser obrigatório nas seguintes situações:

- Operações de grande envergadura;

- Incursões em comunidades vulneráveis;

- Em resposta a ataques praticados contra policiais militares.

Distribuição

Como é: Não tinha critério e chegou até a ser direcionada para batalhões que atuam no trânsito.

Como será: Direcionada aos batalhões de alta e média letalidade, como os Batalhões de Ações Especiais de Polícia (BAEPs) e unidades da Baixada Santista.

Transparência

Como é: Sem dados públicos sobre a distribuição, acesso às imagens dependia de autorização judicial.

Como será: Ministério Público do Estado (MP-SP) deverá ser comunicado mensalmente sobre todos os processos administrativos instaurados. Relatórios semestrais deverão ser divulgados sobre a atividade disciplinar, em razão do uso inadequado.

Fiscalização

Como é: Sem regras e informações claras sobre uso incorreto do equipamento.

Como será: Governo deverá fortalecer programa de capacitação sobre o uso adequado das câmeras, além de editar, no prazo de 60 dias, norma com as diretrizes e os procedimentos operacionais relativos à utilização pela PM. O Estado assumiu o compromisso de conduzir, de forma rápida e com base nas leis aplicáveis, processos administrativos disciplinares para apurar eventual descumprimento das normas relativas ao uso do equipamento.