O comandante do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope), tenente-coronel Marcelo Corbage, prestou depoimento ao Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) na segunda-feira, 10, sobre a operação nos Complexos da Penha e do Alemão que deixou 121 mortes. Ele desmentiu a afirmação do governador do Rio, Cláudio Castro (PL), de que o famigerado "muro do Bope" teria sido planejado para encurralar traficantes e evitar confrontos em áreas com moradores.
Segundo Corbage, "não é verdade que os policiais do Bope tenham se posicionado previamente na Serra os Misericórdia para fazer o que é conhecido como 'troia'" - um tipo de emboscada ilegal em que policiais ficam escondidos para atacar suspeitos. "Pelo contrário, os traficantes já se encontravam entrincheirados em verdadeiros bunkers na Serra da Misericórdia", prosseguiu.
A declaração do comandante contradiz o principal argumento alardeado pelo governador do Rio e seus aliados para explicar o fato de os confrontos terem ocorrido na área de mata, onde posteriormente foram encontrados dezenas de corpos.
Familiares das vítimas afirmam que a polícia montou uma armadilha e realizou execuções na Serra da Misericórdia, inclusive com possíveis ocorrências de tortura. Corpos foram identificados com ferimentos a faca e uma pessoa foi encontrada degolada. A Defensoria Pública do Rio diz ter sido impedida de participar da identificação dos corpos
"Os confrontos estão acontecendo, e não vou dizer 100% porque pode ter acontecido um ou outro, mas majoritariamente em área de mata. Foi pensado para encurralá-los lá para que a população sentisse o mínimo possível.", disse Castro.
Em contraponto ao governador, Corbage afirmou que os "criminosos" teriam ido para a mata com o objetivo de se antecipar aos policiais civis e pegá-los desprevenidos. "Imagens de drone mostram criminosos se deslocando ordenadamente para a Vacaria, claramente com a intenção de preparar uma emboscada para as forças de segurança. Em razão de relativa falta de resistência, os policiais civis foram progredindo, sendo atraídos para uma armadilha", afirmou.
O tenente-coronel afirmou aos promotores do MPRJ que a estratégia traçada para a operação foi fracionar os traficantes do Comando Vermelho (CV) para impedir que se deslocassem até a outras localidades e prestassem apoio a outros bandos. "É neste sentido, de impedir o livre deslocamento de criminosos, foi que se falou em "muro do Bope", afirmou.
Ainda de acordo com o tenente-coronel, o Bope não teria que ter atuado originalmente na região da Vacaria, onde fica a Serra da Misericórdia, mas foi preciso em "em razão da necessidade de prestar os primeiros socorros", pois era a única equipe que contava com paramédicos.
"Coube ao Bope atuar na área da Serra da Misericórdia no Complexo do Alemão. A ideia era tomar o alto da serra e impedir que os traficantes do Alemão viessem em socorro aos seus comparsas da Vila Cruzeiro. Essa estratégia tinha como objetivo permitir que a PCERI, com o apoio do BP Choque cumprissem os mandados de prisão e busca e apreensão na Vila Cruzeiro", afirmou.
A declaração de Corbage foi corroborada pelo depoimento do coronel Ranulfo Souza Brandão Filho, que também afirmou aos investigadores que "o Bope não ocupou antecipadamente a região (de mata) à espera de que eventuais traficantes".
Segundo o Brandão, "a estratégia de ocupar a área da mata (para prestar apoio à Polícia Civil), no alto da Serra da Misericórdia, levou a que o Bope tivesse que enfrentar, desde a sua chegada, reação armada de traficantes que já estavam escondidos naquele local".
O capitão da Polícia Militar do Rio, Jansen Ferret, reproduziu o mesmo discurso dos demais colegas. "Na estratégia dos opositores, acabou sendo interessante que as forças policiais tomassem posição na mata, pois assim poderiam disparar contra os agentes camuflados."
Comandante contradiz Castro sobre 'muro do Bope'
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