'Yanomamis falam que a floresta está morrendo'

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Indigenista e missionário do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), o padre Corrado Dalmonego está em missão com a população Yanomami, na Amazônia, há 15 anos. As cenas que chocaram o Brasil nos últimos dias, segundo ele, não são fruto de um processo recente, mas de abandono que se estende por anos. Ele avalia que o garimpo ilegal está no cerne das mazelas vividas pelos indígenas - e nele vê diversas das causas da alta da desnutrição.

O trabalho do Cimi, vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), se divide em duas frentes, conforme explica o padre. Uma de assessoria jurídica junto aos movimentos indígenas e outra de trabalho de base nas comunidades. Até 2021, esteve em campo com os povos e, agora, acompanha e integra um grupo com pesquisadores Yanomami em Boa Vista, que estuda, sob uma visão étnica, os impactos do garimpo.

Na semana passada, o governo federal declarou emergência em saúde na terra indígena, diante de problemas de acesso a serviços de saúde e aumento dos casos de fome e malária. Especialistas dizem que o enfraquecimento dos órgãos federais de apoio aos indígenas na gestão Jair Bolsonaro (PL) agravaram a crise. "Estamos vivenciando nos últimos quatro, cinco anos, uma situação que dez anos atrás era inimaginável", diz Dalmonego.

Como você descreveria esses povos que estão na maior terra indígena do País?

Um povo que conserva sua língua, suas tradições, cultos, espiritualidade, de forma particular entre os povos indígenas no Brasil. Sobre essa situação que está sendo fortemente visibilizada, sabemos que é consequência não de algo recente, mas de uma situação de abandono, não apenas omissão, mas de ações culposas, dolosas que foram frequentemente denunciadas e apresentadas a todas as instâncias: os três poderes do Estado brasileiro, e também internacionais, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, a Corte Interamericana de Genebra...

É uma situação que há anos está sendo denunciada, mas que hoje, provavelmente com a mudança do governo e a atenção que está sendo dada, encheu manchetes. É um genocídio que está ocorrendo há anos, com culpas além de omissões. Trabalho com eles há quinze anos e posso dizer, partilhando com outros amigos e parceiros do povo Yanomami: estamos vivenciando nos últimos quatro, cinco anos, uma situação que dez anos atrás era inimaginável.

Por que inimaginável?

A gente assiste à invasão do território Yanomami por cerca de 20 mil garimpeiros espalhados no território, que é habitado por 28 mil habitantes. Esta invasão ilegal do garimpo traz consequências devastadoras, não apenas no ambiente - como desflorestamento, assoreamento dos rios, contaminação dos rios por mercúrio -, mas acarreta consequências desastrosas para as comunidades que são obrigadas, em seu território, a viver com invasores que agem desenvolvendo atividades ilegais associadas a grupos criminosos, como investigações da polícia já evidenciaram. Agora, por exemplo, estavam circulando as informações sobre a desnutrição da população, a fome que se difundiu no território. Por quê? O primeiro fator certamente é a invasão do território por essa atividade ilegal de exploração minerária. No que isso acarreta? A floresta Yanomami é urihi, não é apenas um bosque, a floresta é viva, a floresta tem sua dimensão biológica mas também social e espiritual.

Agora a floresta está morrendo, dizem os Yanomami. E os recursos, portanto, com um olhar mais ocidental, que garantem a sobrevivência dos Yanomami que vivem de roça, caça, colheita e pesca, são ameaçados. O barulho dos maquinários, dragas nos rios, motobombas para a destruição das margens dos rios e da floresta para a extração mineral, afugenta a caça. A contaminação mata os peixes. A destruição da floresta afeta os recursos naturais. A destruição das roças. Isso afeta a sustentabilidade alimentar, a autossuficiência alimentar das comunidades. Isso claramente tem impactos naquilo que agora está sendo noticiada como a desnutrição da população. O garimpo também é um veículo de fornecimento de bebidas alcoólicas, drogas, armas, munições e aliciamento dos jovens da força de trabalho para o garimpo. Isso tira a força de trabalho de pessoas que seriam indispensáveis para autossustentação das famílias.

O garimpo ilegal é a principal causa das mazelas vividas pelos Yanomamis?

O garimpo ilegal é vetor também de patologias, de doenças que podem ser a malária, tuberculose, infecções respiratórias, mesmo a covid-19. O garimpo também impede a atuação das equipes multidisciplinares de saúde para o atendimento às comunidades. Já foi notificado no ano passado que por diversos meses alguns postos de saúde chamados UBSI (unidades básicas de saúde indígena) tiveram de ser abandonados pelas equipes de saúde por causa de conflitos. Conflitos entre Yanomami e garimpeiros e conflitos que a presença garimpeira provoca entre as comunidades com bebida alcoólica, com aliciamento, com fornecimento de armas. O garimpo é um fator de aumento exponencial dos conflitos. Isso se reflete claramente em sofrimento por parte dos setores mais frágeis da população, que são crianças e anciãos.

O senhor falou que os Yanomami são um povo que conserva sua cultura de forma particular. Qual a importância dele para o Brasil e o mundo? Há risco de extinção dessa cultura?

O povo de Yanomami é um dos mais numerosos povos indígenas do Brasil, apesar de se falar de seis línguas diferentes, as línguas são intercompreensíveis. Com certeza, podemos reconhecer que é a riqueza, a diversidade de povos, de culturas, de línguas é uma riqueza para a sociedade brasileira e para o mundo inteiro. O que está acontecendo, o genocídio físico, é a dimensão mais evidente da destruição. Mas esse genocídio físico é também acompanhado de um etnocídio, pois a sociedade envolvente, com uma ausência de políticas públicas. Isso traz para os Yanomami, os piores aspectos de nossa sociedade...

O QUE DIZ O MINISTÉRIO DA SAÚDE

Segundo o Ministério da Saúde, uma equipe de 13 profissionais da Força Nacional do SUS foi enviada a Boa Vista para fortalecer a assistência médica e outra equipe multidisciplinar, com oito profissionais de saúde da Aeronáutica, será deslocada de Manaus para a região.

A pasta também pretende acelerar um edital do programa Mais Médicos para "recrutar profissionais, tanto formados no Brasil como no exterior, para atuação nos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI) de maneira permanente, inclusive no DSEI Yanomami".

No último domingo, 22, o ministério também tornou disponível o link de cadastro para inscrições de novos voluntários que queiram apoiar a Força Nacional do SUS para serviços em território Yanomami. Só entre domingo e segunda-feira, 23, foram quase 20 mil inscrições, diz o governo.

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O aguardado show de Lady Gaga na praia de Copacabana, na zona sul do Rio de Janeiro, teve início na noite deste sábado, 3. É possível assistir ao vivo pela Globo, na TV aberta, pelo canal pago Multishow e pelo streaming Globoplay. Previsto para começar às 21h45, o show contou com um atraso e a cantora apareceu em um vídeo no palco somente por volta de 22h10.

Todo mundo no Rio. Mesmo. Quando ainda faltavam 12 horas para o início do show de Lady Gaga na praia de Copacabana, as filas para ter acesso à Avenida Atlântica já davam voltas nos quarteirões internos do bairro. Por razões de segurança, era preciso passar por um dos 18 pontos de bloqueio para alcançar a orla, instalados desde cedo em ruas transversais aparelhados com detectores de metais e câmeras de reconhecimento facial.

Em experiências anteriores, como o show de Madonna, no ano passado, e o réveillon, as aglomerações só se formaram faltando poucas horas para o início do espetáculo. Mas com Gaga foi bem diferente. Já na manhã de sábado havia fila ocupando dois quarteirões. A temperatura em torno dos 25ºC ajudou. O céu estava claro, o sol brilhando, mas não havia muito calor.

Uma faixa da avenida Nossa Senhora de Copacabana, uma das principais vias do bairro, estava ocupada por fãs na altura do palco. O professor de educação física Humberto Machado, de 38 anos, que veio para o show com um grupo de amigos da Paraíba e do Rio Grande do Norte, contou que ficou na fila para acesso à orla por cerca de meia hora.

"A gente achou que seria rápido para entrar porque ainda era muito cedo", contou o professor. "Mas a fila era impressionante."

O professor e seus amigos levavam água e sanduíches em recipientes de plástico para aguentar por toda a tarde e noite. Recipientes de vidro, líquidos inflamáveis e objetos perfurocortantes estavam proibidos e estavam sendo confiscados nas barreiras.

O bairro, rapidamente apelidado de "Gagacabana", era uma grande festa desde cedo, sem registro de incidentes. Fãs totalmente montados, os "little monsters" (monstrinhos), não paravam de chegar a pé, de ônibus e, principalmente, de metrô, exibindo leques, chapéus e todo tipo de indumentária remetendo à artista, a "mother monster" (mãe monstra).

Em frente ao Copacabana Palace, onde a diva está hospedada, o movimento foi ininterrupto a madrugada inteira, sobretudo depois do ensaio aberto na noite de sábado, em que Gaga cantou mais de dez músicas para deleite de todos que estavam na orla, entre elas grandes sucessos como Abracadabra, Bad romance e Shallow, a mais baixada por fãs no Brasil nas plataformas de streaming.

Antes mesmo do fim da manhã longos trechos da praia já estavam ocupados por fãs marcando lugar na areia para assistir ao show da diva e vendedores ambulantes. E não só. As árvores do canteiro central da Atlântica e mesmo da calçada próxima aos prédios estavam sendo disputadas desde cedo pelos que queriam garantir um lugar 'vip' para assistir ao show.

A tatuadora Aisha Dutra, de 22 anos, e a estudante Lilian Magalhães, de 26 anos, estavam aboletadas em uma árvore desde cedo. Elas são do bairro de Santa Cruz, na zona oeste, mas alugaram um apartamento por temporada em Copacabana, especialmente para estarem perto do show. O plano da dupla era chegar à praia às 5h da manhã deste sábado. Mas como elas só foram dormir de madrugada, depois do fim do ensaio, acabaram chegando à orla às 8h.

"Ontem, durante o ensaio, a gente subiu numa árvore e viu que era a melhor opção, porque tinha gente dormindo na grade desde ontem e não tinha mais lugar perto do palco", explicou a tatuadora, devidamente instalada na árvore.

Na tarde de sexta-feira, 2, a Prefeitura informou que dados consolidados pela Rodoviária Novo Rio e pelo Aeroporto Internacional Tom Jobim (Galeão) indicavam a chegada de mais 500 mil visitantes na cidade entre os dias 1º e 3 de maio, superando as expectativas iniciais de 240 mil pessoas. Desse total, 25% seriam turistas estrangeiros.

Há ainda turistas chegando com carros particulares, ônibus fretados e voos pousando no Aeroporto Santos Dumont. A média de ocupação da rede hoteleira é de 86% em toda a cidade, mas em Copacabana chega a 95%.

A Polícia Militar (PM) reforçou o esquema de segurança.

"A novidade para este show são os capacetes brancos, grupos de policiais especializados em patrulhamento de multidão", explicou a tenente-coronel Cláudia Moraes, porta-voz da PM. "Eles vão circular entre as pessoas, sobretudo nos pontos de maior concentração, para evitar furtos de oportunidade de passar uma sensação maior de segurança."

A prefeitura espera a presença de mais de 1,6 milhão de pessoas na praia de Copacabana, onde está montado o palco e as 16 torres com telões de nove metros de altura por cinco metros de largura, permitindo que todos acompanhem o show mesmo à distância. Segundo a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e a Riotur, o evento deve injetar mais de R$ 600 milhões na economia da cidade.

"A cidade está muito cheia mesmo, tem muito turista", assegurou o motorista de uber Gustavo Monteiro, de 33 anos. "É bom para todo mundo. Por mim, tinha um show desse por mês."

Faltando cerca de duas horas para o início do show de Lady Gaga na praia de Copacabana, os pontos de revista montados nas vias transversais de acesso à Avenida Atlântica apresentavam filas de até uma hora de duração.

As maiores eram vistas no acesso da rua Duvivier, o mais próximo ao palco. A fila tinha uma extensão de mais de dois quarteirões. Nos pontos de entrada um pouco mais distantes, como o da Hilário de Gouveia, ainda era possível entrar na orla com apenas 20 minutos de espera.

O enfermeiro Vítor Souza, de 32 anos, que veio de Campos, no interior do Estado, especialmente para o show, contou que ficou por mais de 40 minutos numa fila e acabou desistindo.

Ele conseguiu chegar na praia por meio de uma outra entrada, bem mais distante do palco. "Foi bem mais complicado do que achei que ia ser", contou. "Mas finalmente eu consegui passar."

As filas nos 18 pontos de acesso montados nas ruas transversais à avenida Atlântica começaram a ser formar por volta das 9h da manhã deste sábado, 3. Policiais militares munidos de detectores de metal revistavam as pessoas uma a uma antes de darem acesso à orla. Vidros, explosivos e armas encontrados eram confiscados. Os pontos de acesso também contavam com câmeras de reconhecimento facial.

O perfil oficial do Metrô do Rio de Janeiro fez uma postagem anunciando que o "tempo de viagem está maior" "devido ao grande fluxo do desembarque de clientes na estação Cardeal Arcoverde/Copacabana para o show da Lady Gaga". A empresa recomenda o desembarque pela Siqueira Campos/Copacabana.

O maior show da vida de Lady Gaga

O show desta noite na praia de Copacabana promete ser o maior da carreira de Lady Gaga. A expectativa da Prefeitura é de que pelo menos 1,6 milhão de pessoas estarão reunidas na orla. Até hoje, a apresentação de Gaga com o maior público tinha sido em abril passado, no Festival Coachella, nos EUA, onde reuniu por volta de 100 mil pessoas.

O palco da apresentação desta noite tem nada menos que 1.260 m2, bem maior do que o montado para Madonna no ano passado, que tinha 821 m2. A megaestrutura tem 2,20 m de altura desde a base na areia. Um telão de LED de última geração ficará no fundo do palco.

Gaga vai apresentar um show em cinco atos, com direito a diversas trocas de roupa e um cenário que lembra o de uma peça de teatro - a cantora chama de "ópera gótica". A previsão é de que o espetáculo tenha 2h30 de duração, ao longo das quais Gaga vai contar a história de seu próprio "caos pessoal" ao lutar com sua própria persona, derrotar fantasmas e conseguir renascer.

Pabllo Vittar faz abertura

Uma surpresa para os fãs de Lady Gaga que aguardam o início do show da diva pop. A artista Pablo Vittar, que se apresentou com Madonna no ano passado, está abrindo o show desta noite como DJ.

"É muito louco, parece que estou tendo um deja-vu", afirmou Pablo em uma entrevista concedida à rede de TV CNN antes de subir ao palco, adiantando que pretendia tocar "muito tribal house, muito tech, muito remix e algumas músicas minhas". "Ano passado, com Madonna comemorando 40 anos de carreira, e agora nesse show histórico com a Gaga. Estou muito feliz."