No Brasil, mulheres negras enfrentam um maior risco de serem vítimas de violência física e sexual

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As violências podem resultar em impacto significativo na vida das vítimas, comprometendo sua saúde física, emocional e social

O Dia da Mulher Negra Latina Americana e Caribenha, ocorreu em 25 de julho e destacou a luta contínua e árdua das mulheres negras em meio a uma sociedade que é, intrinsecamente, racista e misógina. Essa data traz a reflexão sobre as experiências e trajetórias dessas mulheres, sendo uma oportunidade crucial para a conscientização sobre a importância de políticas públicas de saúde para este público.


 

Um levantamento revelou que, no Brasil, as mulheres representam 75% das vítimas de violência física e sexual, sendo as pretas e pardas as mais afetadas. Em algumas regiões do país, elas enfrentam mais que o dobro do risco de sofrer algum tipo de violência em comparação com as mulheres brancas. O estudo foi realizado com mais de 1 milhão de dados do Sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação) do Ministério da Saúde, abrangendo o período de 2015 a 2022. É importante ressaltar que esses dados se referem às mulheres que buscaram atendimento no SUS (Sistema Único de Saúde).


 

A Dra. Zélia Maria Campos, membro da Comissão Especializada em Violência Sexual e Interrupção Gestacional Prevista em Lei, da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), ressalta que embora a violência contra a mulher seja reconhecida como um problema de saúde pública no Brasil, o recorte ético-racial não tem sido devidamente considerado nas discussões. As desigualdades persistem e exigem a implementação de ações e políticas públicas que possam modificar a situação adversa enfrentada pela população negra.


 

No entanto, para que essas políticas públicas sejam eficazes, é fundamental que elas sejam inclusivas, levando em consideração as demandas regionais e enfrentando o desafio de envolver a sociedade no processo de desconstrução dos discursos que mantêm as desigualdades entre os indivíduos. É necessário reconhecer que o combate e a abolição das desigualdades étnicos-raciais representam um grande desafio para as políticas públicas. Para isso, torna-se indispensável que essas políticas apontem para reformulação das práticas enraizadas na sociedade brasileira, garantindo o atendimento das necessidades e promovendo o direito à igualdade para parcelas da população que atualmente enfrentam exclusão no país.


 

"A violência sexual tem várias consequências, e a gravidez resultante desse tipo de violência é especialmente complexa em termos de reações psicológicas e sociais. Para a maioria das mulheres, ela é frequentemente encarada como uma segunda violência e considerada intolerável. A gravidez resultante de violência sexual traz consigo uma série de desafios emocionais e sociais" alerta a médica.


 

Em casos de violência sexual, existem diversas possíveis consequências decorrentes desses atos, tais como gravidez indesejada. A gravidez resultante de estupro acarreta uma série de impactos psicológicos para as mulheres em situação de violência sexual. Esse tipo de situação é frequentemente presente em casos de abuso incestuoso e geralmente se configura como uma forma de revitimização, na qual a culpa e a responsabilidade pela gravidez são atribuídas à vítima, que não pode revelar a paternidade. Além disso, ela muitas vezes é obrigada a assumir sozinha a responsabilidade por uma criança não desejada, o que reaviva constantemente as lembranças da violência sofrida.


 

"A violência sexual também pode resultar em sequelas físicas e orgânicas, como lesões físicas gerais, incluindo hematomas, contusões e lacerações, ferimentos genitais e anais, infecções sexualmente transmissíveis (ISTs), disfunções sexuais, traumas e, em casos extremos, desfechos letais relacionados à prática do aborto clandestino", destaca a Dra. Zélia.


 

Consequências


 

As sequelas da violência sexual podem ter um impacto significativo na vida das pessoas que vivenciam essa situação. Entre as mais comuns, podemos citar:


 

  • Transtorno de estresse pós-traumático (TEPT): O TEPT é um quadro psicológico no qual a sobrevivente experimenta ansiedade intensa, rememoração frequente e constante do evento traumático, além de sintomas de angústia e depressão. Esses sintomas podem interferir nas atividades diárias e no bem-estar emocional da pessoa.


 

  • Sentimentos de vergonha e culpa: as mulheres frequentemente experimentam sentimentos intensos de vergonha e culpa, muitas vezes se responsabilizando pessoalmente pelo ocorrido. Esses sentimentos podem ser debilitantes e afetar negativamente a autoestima e o senso de autovalorização.


 

  • Depressão: é uma consequência comum da violência sexual, resultando do sentimento de culpa, autocrítica e das emoções negativas associadas ao trauma. Essa condição pode levar a um isolamento progressivo e, em casos graves, até mesmo a pensamentos ou tentativas de suicídio.


 

  • Abuso de substâncias: muitas sobreviventes recorrem ao abuso de substâncias como forma de lidar com os intensos sentimentos de angústia, culpa, raiva e depressão que surgem após a violência sexual. O uso de psicoativos pode ser uma tentativa de aliviar o sofrimento emocional, mas pode levar a consequências adicionais para a saúde física e mental.


 

Todas essas consequências têm um impacto significativo na vida dessas pessoas, afetando sua saúde física, emocional e social. Elas podem enfrentar dificuldades em se relacionar sexualmente, problemas de sono, efeitos colaterais dos medicamentos utilizados no tratamento, bem como dificuldades em retomar o trabalho ou outras atividades diárias. É fundamental oferecer atendimento dentro das primeiras 72 horas da ocorrência da violência sexual, com apoio multidisciplinar, intra e intersetorial adequado, livre de julgamentos e com empatia. Neste período, é possível oferecer medicamentos de reconhecida eficácia para a profilaxia da gravidez indesejada, do HIV e de outras IST (Gonorreia; Sífilis; Clamídia; Tricomoníase); vacina ou imunoglobulina para Hepatite B para as pessoas que não estão imunizadas e, garantir o acompanhamento pelo período médio de 6 meses com recursos, para ajudar as sobreviventes a superarem essas sequelas e reconstruírem suas vidas.

 

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