Além das suspeitas de venda de decisões que colocaram o desembargador Sebastião de Moraes Filho no centro de investigações criminais e disciplinares, o elo de familiares do magistrado com outros gabinetes do Tribunal de Justiça de Mato Grosso também chamou a atenção do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
A mulher de Moraes Filho, Marlene Prado de Moraes, e o filho do casal, Márcio Thadeu Prado de Moraes, que é advogado, ocuparam formalmente cargos de salários elevados no Tribunal de Justiça por vários anos - mas, na prática, nunca exerceram tais funções, segundo a suspeita da Corregedoria Nacional de Justiça.
Entre dezembro de 2017 e agosto de 2024, Marlene teria desempenhado a função de técnico judiciário no gabinete do desembargador Carlos Alberto Alves da Rocha, com remuneração de R$ 42,6 mil brutos ou R$ 31,2 mil líquidos.
Márcio Thadeu foi assessor técnico-jurídico do desembargador Dirceu dos Santos no mesmo período - dezembro de 2017 a agosto de 2024.
Em setembro de 2024, o advogado foi transferido para o Departamento Gráfico do Tribunal de Justiça, onde segundo o portal da transparência o vínculo está ativo. O salário atual dele é de R$ 31,7 mil brutos ou R$ 22,2 mil líquidos.
O CNJ investiga se houve nepotismo cruzado nas nomeações. A suspeita é a de que a mulher e o filho do desembargador tenham sido empregados nos gabinetes de outros magistrados apenas no papel, sem trabalhar efetivamente. A defesa do desembargador Moraes Filho, a cargo da advogada Mariana Albuquerque Rabelo, nega que ele tenha cometido irregularidades.
Em relatório obtido pelo Estadão, o ministro Mauro Campbell, corregedor do CNJ, afirma que "muito possivelmente, ambos os desembargadores alojaram parentes de Sebastião de Moraes Filho em seus respectivos gabinetes, colocando-os, ato contínuo, à disposição do reclamado, em prática popularmente conhecida como nepotismo cruzado".
A Corregedoria do CNJ pediu ao Tribunal de Mato Grosso informações sobre a produtividade dos servidores. Os dados reforçaram as suspeitas. Nos últimos cinco anos, Márcio Thadeu fez apenas 25 registros de atos administrativos, todos de cunho pessoal, como pedidos de folga compensatória.
"Não foram identificados atos judiciais, minutas ou elementos indicativos de efetivo trabalho na unidade, o que evidencia que, muito provavelmente, Márcio Thadeu Prado de Moraes, filho do desembargador Sebastião de Moraes Filho, simplesmente, não trabalhava", concluiu Mauro Campbell.
A situação da mulher do desembargador é a mesma. O Departamento de Tecnologia da Informação do Tribunal de Justiça de Mato Grosso encontrou apenas um ato administrativo vinculado às credenciais de Marlene. Foi uma abertura de chamado. Ela também não produziu nenhuma minuta ou documento no sistema de processos.
O Estadão apurou que quando foi intimado a prestar informações, Márcio Thadeu não compareceu. Marlene ficou em silêncio.
Nesta semana, o CNJ decidiu, por unanimidade, abrir um processo administrativo disciplinar contra o desembargador. O órgão também manteve seu afastamento cautelar até a conclusão do procedimento.
Mauro Campbell instaurou reclamações disciplinares para verificar a conduta dos desembargadores Carlos Alberto Alves da Rocha e Dirceu dos Santos e notificou a Procuradoria-Geral da República (PGR) por ver indícios de peculato e falsidade ideológica nas fichas de avaliação de desempenho dos servidores. O Estadão pediu manifestação dos magistrados por meio da assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça. O espaço está aberto.