China usa rede de portos para ganhar vantagem sobre EUA

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A China construiu uma rede de portos ao redor do mundo nos últimos 20 anos que a preparou para uma competição comercial com os EUA, que ganha cada vez mais tração em meio à guerra tarifária iniciada pelo presidente norte-americano, Donald Trump. A infraestrutura está espalhada em cinco continentes e se tornou pilar do comércio mundial.

Enquanto a Casa Branca adota uma política cada vez mais protecionista, com as tarifas, Pequim vai na contramão e busca expandir mercados. Do ponto de vista geoestratégico, a China tem a possibilidade de usar essa estrutura portuária para expandir sua força naval e de espionagem.

Apesar da demonstração de força, no entanto, a crise imobiliária, de endividamento interno e a pressão americana sobre a economia chinesa têm diminuído o volume dos investimentos em portos, já que o governo tem direcionado recursos para estimular a economia e desenvolver outras áreas.

Alianças

Em 2020, a China se tornou a maior parceira comercial de 120 países, incluindo o Brasil, e no ano passado o superávit comercial atingiu o recorde de US$ 990 bilhões (cerca de R$ 5,7 trilhões). Cerca de 95% desse comércio foi feito por rotas marítimas.

Em diversos discursos nos últimos cinco anos, o líder chinês, Xi Jinping, falou sobre a expansão do comércio exterior como necessária para o crescimento econômico - na visão dele, tanto da China quanto de outros países. E, nesse sentido, os portos são cruciais. "Costumamos dizer que, para ficarmos ricos, precisamos primeiro construir estradas. Mas, em áreas costeiras, para ficarmos ricos, também precisamos de portos", disse Xi, em 2017.

O maior plano chinês para a expansão do comércio exterior foi a Rota da Seda Marítima, lançada por Xi em 2013, seu primeiro ano de governo. O programa fez parte da Iniciativa do Cinturão e Rota, criada para ampliar o acesso da China aos mercados mundiais, com investimentos em infraestrutura no exterior. A América Latina foi uma das regiões mais beneficiadas com a iniciativa, o que aumentou a influência chinesa e despertou preocupações dos EUA.

No ano passado, Xi viajou ao Peru nos dias que antecederam a reunião do G-20, no Rio de Janeiro, para prestigiar a abertura do Porto de Chancay, operado majoritariamente pela Cosco, uma empresa estatal chinesa, pelos próximos 60 anos. O porto foi anunciado como transformador para as relações comerciais da China com a América Latina e abriu uma rota mais curta com a região pelo Oceano Pacífico, sem precisar usar o Canal do Panamá ou cruzar os oceanos Índico e Atlântico.

Segundo a pesquisadora do Centro de Relações Exteriores (CFR) Zongyuan Zoe Liu, o interesse de Pequim em expandir sua rede portuária é natural, em razão da importância do comércio exterior para a economia chinesa e das dificuldades internas do país. "É muito importante para a China, na economia e na geopolítica, ter uma rede portuária confiável, que facilite o seu papel no comércio internacional", disse.

Segurança

O Porto de Chancay é um exemplo para ilustrar a importância da infraestrutura, tanto para a economia quanto para a geopolítica. Através dele, a China tem acesso mais fácil a soja, milho e carne bovina, essenciais para a segurança alimentar de uma nação de 1,4 bilhão de pessoas, e a minérios como o lítio, usados para a fabricação de baterias de carros elétricos, o produto mais forte da indústria chinesa atual.

A infraestrutura também é o pilar para a China ocupar o espaço que pode ser deixado pelos EUA sob a nova política de tarifas de Trump, que foi utilizada como ameaça a Colômbia e México nos primeiros dez dias de governo - e deve diminuir o comércio entre EUA e os países taxados. No dia 6, o governo colombiano anunciou a abertura de uma nova rota com a China que utiliza as instalações de Chancay.

Mas, para além dos objetivos comerciais mais óbvios, ter uma rede de infraestrutura portuária oferece à China mais acesso a informação e possibilidade de expandir sua presença militar. Hoje, essas são as maiores preocupações dos EUA.

Inteligência

A presença da China nos portos se dá de duas formas: na operação por empresas estatais, como a Cosco, ou por empresas privadas, como a Hutchison Holding, sediada em Hong Kong. As operações acontecem de maneira parcial - por exemplo, no controle de apenas um terminal de contêiner - ou total, quando ela controla todas as etapas de um porto.

A princípio, isso oferece a essas empresas uma gama de informações sobre cargas movimentadas nos portos, que segundo analistas, pode dar vantagem à China sobre concorrentes, incluindo em espionagem. "Esse controle pode oferecer, inclusive, informações sobre transporte de equipamentos militares. Em um contexto de disputa com os EUA, são informações valiosas", disse o professor de economia da USP e da FIA, Celso Grisi, especialista em comércio exterior.

Bases

Outro aspecto do controle chinês alertado pelos analistas é a possível instalação de bases navais nos portos em águas profundas, importante para a China defender rotas de suprimento. De acordo com um levantamento da CFR, 57 dos 105 portos operados por chineses possuem capacidade para receber navios de guerra. No entanto, a China teria mais capacidade de instalar bases nos portos em que ela detém a operação majoritária.

Pelo menos um desses portos, o de Djibuti, localizado na saída do Mar Vermelho, tem uma base já instalada. Apesar de terem uma operação minoritária no porto, os chineses conseguiram um acordo para instalar a base em uma das principais rotas do comércio global e alvo de tensões constantes. Outros locais, como os portos de Lagos, na Nigéria, e de Pireu, na Grécia, já receberam navios de guerra da Marinha chinesa.

Para os EUA, a expansão naval chinesa, que transformou a China na maior Marinha do mundo, é uma preocupação no longo prazo para sua segurança, mas não uma ameaça atual. Hoje, os americanos possuem bases navais em mais de 10 países, contra apenas uma da China.

Apesar disso, essa preocupação ajuda a explicar as declarações de Trump sobre a soberania do Canal do Panamá. O presidente americano alega que a região possui a presença de soldados chineses e utiliza o fato de a Hutchison Holdings operar em dois dos cinco portos adjacentes ao canal como prova. A empresa está no local desde 1997.

Para Zongyuan, no entanto, as operações por parte de empresas chinesas, sejam elas estatais ou privadas, não dão a Pequim a capacidade de interferir com seus interesses. "A Cosco, por exemplo, tem estreita relação com o governo. Mas o CEO da Cosco precisa manter seu emprego. Se o desempenho da empresa cair, eles serão responsabilizados. Do ponto de vista deles, eles não querem perturbação nos portos", afirmou. "No seu relatório anual, a Cosco fala sobre isso, sobre ver as tensões crescentes como um risco para a empresa, tanto em operação quanto em receita."

Problemas

Apesar da rede de portos, problemas internos da China diminuíram os investimentos em infraestrutura portuária ao redor do mundo. O país enfrenta uma crise de endividamento nas províncias e quebra do mercado imobiliário, que fez milhões de chineses perderem empregos na construção civil.

Como consequência, o governo chinês passou a direcionar os recursos para estimular a economia e o desenvolvimento em outras áreas, como a transição energética. O volume de investimentos em portos no exterior caiu nesta década e novos projetos não são apresentados com tanta frequência.

"A China tem enfrentado problemas internos na sua economia. Isso forçou o governo chinês a redirecionar seus gastos", disse Jacob Gunter, analista do centro de estudo Mercator Institute for China Studies.

Além disso, a desconfiança internacional com relação a Pequim também cresceu nesta década. Muitos países que receberam os investimentos no passado adotaram a política de afastamento da China - um exemplo seria a Grécia, que permitiu um navio militar chinês entrar no porto de Pireu no passado e dificilmente permitiria hoje, pela desconfiança crescente entre a União Europeia e Pequim. Outras nações, em especial as africanas, tiveram dificuldades de arcar com os empréstimos chineses e não conseguem novos financiamentos.

Influência

De acordo com Gunter, houve também o problema de sustentabilidade em muitos lugares, o que levou a China a perder contratos e obras. Algumas empresas ocidentais correram para adquirir participações destes portos, embora não na mesma proporção que as empresas chinesas.

Gunter ressalta que, mesmo sem novos investimentos, o pioneirismo da China em construir uma rede global de portos garante ao país uma influência no transporte marítimo pelos próximos anos e uma vantagem sobre os EUA.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) apresentou, nesta quinta-feira, 23, uma representação solicitando que o tribunal investigue a legalidade dos contratos de aluguel de veículos de alto padrão utilizados pelo Senado Federal.

O documento é assinado pelo subprocurador-geral Lucas Furtado, que destacou um novo contrato firmado com a empresa Quality Aluguel de Veículos para a locação de 79 SUVs, no valor de R$ 796,5 mil, montante superior ao contrato anterior, de R$ 377,8 mil. As informações são da CNN Brasil.

Os veículos contratados são de alto padrão, com itens como teto solar, motor turbo e conectividade avançada. Para Furtado, o uso de recursos públicos deve ser direcionado ao "bem-estar coletivo", principalmente, considerando um momento de "restrições orçamentárias".

"O Senado opta por alugar veículos em um momento dessas restrições orçamentárias, quando é preciso priorizar gastos que atendam efetivamente aos interesses da sociedade", afirmou o subprocurador.

"Decisões como essa devem ser amplamente debatidas e justificadas, garantindo que cada centavo gasto seja direcionado para promover o bem-estar coletivo", acrescentou.

Furtado também ressaltou que as verbas públicas devem ser aplicadas com base em critérios técnicos sólidos, voltados ao atendimento das demandas da população.

Diante do caso, o Ministério Público pediu que o TCU apure possíveis irregularidades na locação das SUVs, avalie a necessidade dos veículos de luxo e examine as justificativas técnicas apresentadas, verificando se a locação é mais vantajosa que a compra.

Se forem confirmadas irregularidades, o subprocurador-geral solicita que o TCU abra uma tomada de contas especial para identificar os responsáveis e encaminhe o caso ao presidente do Senado.

O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta quinta-feira, 23, para manter o entendimento que permite a nomeação de parentes para cargos políticos na administração pública. Por 6 votos a 1, a Corte reforçou o entendimento de que a prática não configura nepotismo, desde que os indicados tenham qualificação técnica.

Foram favoráveis a esta tese o relator Luiz Fux e os ministros Cristiano Zanin, André Mendonça, Nunes Marques, Alexandre de Moraes e Dias Toffoli. Flávio Dino foi o único voto contrário até o momento. O julgamento foi suspenso.

O caso analisado é um recurso especial apresentado pela Prefeitura de Tupã (SP). Em 2013, a cidade aprovou uma lei que proibia a contratação de parentes até terceiro grau do prefeito, do vice-prefeito e de vereadores para cargos temporários ou em comissão na administração municipal.

O texto, porém, abria uma exceção: a nomeação de parentes para o cargo de secretário da Prefeitura de Tupã.

O trecho foi considerado inconstitucional pela Justiça paulista. A Prefeitura recorreu ao STF, que determinou que o julgamento terá repercussão geral - a tese vencedora será aplicada em outros casos semelhantes.

O Supremo firmou em 2008 a Súmula Vinculante nº 13, que proíbe a nomeação de cônjuge, companheiro ou parente até o terceiro grau em cargos de confiança ou comissão. A exceção, como na lei municipal de Tupã aprovada cinco anos depois, é a nomeação para cargos de natureza política, como ministros, secretários estaduais ou municipais.

Durante o julgamento desta quinta, Fux reafirmou esse entendimento e disse que o chefe do Executivo tem o direito de escolher seu secretariado. Ele ressalvou que é preciso que os nomeados tenham qualificação técnica para exercer o cargo e que o nepotismo cruzado segue proibido - quando duas autoridades, em órgãos diferentes, trocam favores e nomeiam parentes uma da outra.

"A mensagem do Supremo é que a regra é a possibilidade, a exceção é a impossibilidade. Não é uma carta de alforria para nomear quem quer que seja", disse Fux.

Único voto divergente até o momento, Flávio Dino defendeu a mudança da jurisprudência. Ele argumentou que o Congresso Nacional aprovou uma lei em 2021 banindo o nepotismo e tipificando a prática como improbidade administrativa, sem colocar os cargos políticos como exceção.

"Eu estou falando de precedente de 2008. Em 2021, é claro que o Congresso Nacional conhecia os precedentes. Contudo, ao legislar banir o nepotismo e tipificá-lo como improbidade não excepcionou cargos políticos (...) e esta é a razão pela qual eu proponho a revisão da jurisprudência", declarou.

O julgamento será retomado na próxima sessão com os votos dos ministros Edson Fachin, Gilmar Mendes e Cármen Lúcia.

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) sinalizou nesta quinta-feira, 23, que a ala bolsonarista da oposição pode concordar em recuar em relação a alguns pontos da "anistia ampla" que defendem, como o perdão para crimes específicos. A ideia é tentar viabilizar a aprovação do projeto sobre o 8 de janeiro que tramita atualmente na Câmara dos Deputados.

"Podemos negociar penas por depredação de patrimônio que podem não ser anistiadas, desde que individualizadas. Podemos negociar as penas de quem tentou explodir caminhões de combustível no aeroporto também, não concordamos com isso. Mas queremos que o projeto deixe claro que não existem crimes de tentativa de golpe de Estado", disse ao jornal O Globo.

"Vamos esperar o que será apresentado, mas já temos nossa estratégia pronta de defender a anistia ampla. Faremos emendas com base em um texto que consideramos justo", afirmou.

O senador já declarou que acredita que a melhor alternativa é "fazer o processo andar". "A gente vai usar os recursos regimentais para fazer as emendas para que a gente possa trazer um texto que nos atenda. A maioria decide o que é melhor", afirmou no mês passado.

A proposta em tramitação foi apelidada de "PL da Dosimetria" pelo relator Paulinho da Força (Solidariedade-SP) e não inclui perdão para os participantes dos atos golpistas. Pode, no entanto, beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) com a redução de sua pena, fixada em 27 anos e três meses pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Paulinho assumiu a relatoria em setembro, mas tem encontrado dificuldades em viabilizar sua aprovação por falta de consenso e adiado a apresentação do parecer.

Na quarta-feira, 22, o STF publicou o acórdão do julgamento que condenou o ex-presidente, dando início ao prazo para que os réus apresentem recursos. Não é possível reverter as condenações, mas pode haver, por exemplo, ajuste nas penas fixadas aos réus do núcleo crucial.