Groenlândia vai às urnas nesta terça-feira

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A Groenlândia vai às urnas nesta terça-feira, 10, para renovar o seu Parlamento. Se fosse antes do retorno de Donald Trump à Casa Branca, poucas pessoas fora da ilha prestariam atenção ao pleito. Agora, contudo, o território autônomo da Dinamarca entrou na mira dos Estados Unidos - e de sua política externa cada vez mais agressiva.

 

Com reservas de terras raras e localização estratégica, a ilha tem atraído a cobiça das grandes potências enquanto a sua população anseia por independência. Nesse cenário, o resulto das eleições na Groenlândia pode ter impactos que vão além do Ártico.

 

Enquanto os cerca de 44 mil eleitores da Groenlândia se preparavam para votar, Trump escreveu que os Estados Unidos apoiam o seu direito de determinar o próprio futuro. E prometeu: "Continuaremos a mantê-los seguros, como temos feito desde a Segunda Guerra Mundial. Estamos prontos para investir bilhões de dólares para criar novos empregos e fazer você ficar rico. E, se você quiser, damos as boas-vindas a você para fazer parte da maior nação do mundo, os Estados Unidos da América!"

 

Durante o seu primeiro governo, Trump sugeriu que poderia comprar a Groenlândia da Dinamarca, um aliado histórico dos Estados Unidos. De volta à Casa Branca, ele insiste na ideia de controlar o território ártico - como fez também com a Faixa de Gaza, o Canal do Panamá e até mesmo com o Canadá, que ameaça anexar aos Estados Unidos. E não descarta usar a força militar para conseguir o que quer.

 

Em discurso ao Congresso americano, Donald Trump se dirigiu diretamente ao "povo incrível da Groenlândia" e disse que os Estados Unidos precisam da ilha para a segurança nacional e internacional. "Realmente precisamos dela para a segurança global e acho que vamos obtê-la. Vamos obtê-la de um jeito ou de outro", declarou.

 

Acontece que a Groenlândia não quer fazer parte dos Estados Unidos. Pelo menos foi isso que mostrou uma pesquisa recente da consultoria Verian: 85% dos entrevistados responderam que são contra deixar o Reino da Dinamarca para se juntar aos EUA. Apenas 6% disseram que são a favor e 9% não souberam responder.

 

Defensor da independência da Groenlândia, o primeiro-ministro Mute Egede tem insistido que a ilha deve decidir o próprio futuro e cobrou respeito de Donald Trump às vésperas da eleição. "Merecemos ser tratados com respeito, e não acho que o presidente dos EUA tenha feito isso recentemente", disse à emissora pública dinamarquesa DR.

 

A maioria na Groenlândia (56%, segundo a pesquisa Verian) é a favor da independência, que assumiu papel central nas eleições. A posição, inflamada pelos ressentimentos com a Dinamarca pelo passado de colonização, é refletida pelos principais partidos que disputam o Parlamento.

 

O Inuit Ataqatigiit (Comunidade do Povo), do primeiro-ministro Mute Egede, e o seu companheiro de coalizão Siumut (Avante) prometeram convocar um referendo pela independência da ilha, sem dizer quando fariam.

 

No campo da oposição, o proeminente partido pró-independência Naleraq quer negociar o divórcio com a Dinamarca e sinalizou a disposição para fortalecer os laços com os Estados Unidos uma vez que a ilha estivesse livre de Copenhague. Para o líder do partido Juno Berthelsen, o interesse de Donald Trump fortalece a posição da Groenlândia na busca por emancipação.

 

A Dinamarca reconheceu o direito da Groenlândia à independência na lei que ampliou a autonomia da ilha, em 2009. A grande questão é quando e como. Com a economia baseada na pesca, o território depende do subsídio anual de US$ 500 milhões que recebe de Copenhague - e corresponde a metade do seu orçamento - para manter o estado de bem-estar social no estilo dos países nórdicos. Isso inclui assistência médica e educação gratuitas.

 

Na mesma pesquisa em que 56% responderam que votariam "sim" pela independência se o referendo fosse realizado hoje, 45% disseram que não querem o divórcio da Dinamarca se isso for afetar negativamente a qualidade de vida na ilha.

 

Ainda assim, há o sentimento anticolonial, intensificado pelas revelações de maus-tratos de autoridades dinamarqueses contra os indígenas inuits, da Groenlândia. No seu discurso de Ano Novo, o primeiro-ministro Mute Egede defendeu que o território deve se liberar "das amarras do colonialismo".

 

Na última eleição, a Groenlândia chegou a debater se a exploração das terras raras seria a saída para diversificar a sua economia e a garantir a independência da Dinamarca. Mas venceu a preocupação com o impacto ambiental, que impulsionou o Inuit Ataqatigiit, partido de Mute Egede à vitória.

 

Afinal, por que os EUA querem a Groenlândia?

 

São esses recursos escondidos sob o gelo do ártico que despertaram o interesse de grandes potências em um dos territórios mais remotos e intocados do planeta. As terras raras são minerais usados para fazer de computadores e celulares a baterias e tecnologias necessárias para a transição energética. Hoje, é a China quem domina essa produção.

 

Além das terras raras, o Serviço Geológico dos Estados Unidos identificou potenciais depósitos offshore de petróleo e gás natural na Groenlândia.

 

Se os recursos são parte da explicação para o interesse de potências como Estados Unidos, China e Rússia no território dinamarquês, as mudanças climáticas respondem o por que agora. O derretimento do gelo está expondo as riquezas minerais da Groenlândia e abrindo a Passagem Noroeste pelo Ártico.

 

A ilha tem uma localização estratégica, ao longo e duas possíveis rotas pelo Ártico, que poderiam reduzir o tempo de navegação entre o Atlântico Norte e o Pacífico, evitando os gargalos dos canais de Suez e Panamá.

 

Essas rotas ainda não são viáveis comercialmente, mas chamam atenção e reacenderam a competição envolvendo Estados Unidos, Rússia e China pelo acesso aos recursos minerais da região. Pequim tem interesse em construir uma Rota da Seda Polar, que seria parte do mega projeto de infraestrutura do Cinturão e Rota, e alarmou Washington.

 

A posição da Groenlândia, na costa nordeste do Canadá, também tem sido estratégica para a defesa da América do Norte desde a 2ª Guerra, quando os EUA ocuparam o território. Desde então os americanos, mantém instalações militares na ilha, incluindo a Base Espacial de Pituffik, que oferece suporte para alertas de mísseis, defesa antimísseis e operações de vigilância espacial para os Estados Unidos e a Otan. (Com agências internacionais).

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ATENÇÃO EDITOR: esta matéria foi originalmente publicada em 20/10/2022, sob o título "Governo compra cestas básicas de empresa 'laranja', diz TCU", e atualizada em 11/03/2025.

O Tribunal de Contas da União (TCU) investiga fraude em duas licitações do governo federal para compra de até 2,2 milhões de cestas básicas. Relatório da Corte, obtido pelo Estadão, aponta "fortes indícios" de que uma das empresas vencedoras está em nome de "laranjas". Os pregões foram organizados pelo Ministério da Cidadania nos últimos dois anos.

A pasta se dispôs a gastar até R$ 290,2 milhões para adquirir alimentos, como arroz, feijão, óleo, macarrão, farinha, leite em pó, açúcar e fubá, para atender famílias pobres em todo o País. A maior parte das licitações foi vencida pela empresa A Popular Cestas Básicas de Alimentos Eireli, de Contagem (MG), que ganhou 11 lotes no valor de até R$ 216 milhões.

Segundo a auditoria do TCU, a Popular está em nome de um "laranja", beneficiário do Auxílio Emergencial, e faz parte de um grupo de empresas controladas por Carlos Murilo Pessoa Gonçalves Moreira e Paulo Sergio Pessoa Moreira. O relatório afirma que os dois empresários mineiros usaram "parentes e pessoas interpostas com a provável finalidade de ocultação patrimonial".

Em relatório entregue ao ministro-substituto do TCU, Weder de Oliveira, a Secretaria de Controle Externo de Aquisições Logísticas (Selog) pediu que o Ministério da Cidadania aponte quais são os mecanismos de controle adotados pela pasta para "garantir que a entrega das cestas básicas está sendo efetivamente realizada, principalmente em razão do presente ano eleitoral". O ministro concordou com a solicitação em despacho de 21 de setembro.

A distribuição de cestas básicas pelo governo federal faz parte de uma ação do ministério contra a insegurança alimentar e nutricional. O valor autorizado pela pasta para a compra de alimentos, neste ano, é de R$ 116 mihões. Do total, R$ 79 milhões são para a Popular.

Técnicos do TCU identificaram que, em fevereiro deste ano, outra empresa do grupo supostamente comandado pelos irmãos Moreira entregou os alimentos ao Ministério da Cidadania, no lugar da Popular. A auditoria contabilizou 40.675 cestas básicas no valor de R$ 4,9 milhões, adquiridas no pregão do ano passado.

As mercadorias vendidas ao Ministério da Cidadania pela A Popular Cestas Básicas de Alimentos Ltda. foram entregues pela transportadora Super Cesta Básica de Alimentos Eireli. Segundo o TCU, essa transportadora está impedida de licitar e contratar com a administração pública federal por causa de uma sanção aplicada pelo Comando da 4ª Região Militar, após a empresa não ter executado um contrato. O pregão do Ministério da Cidadania foi feito em fevereiro de 2021, dois meses após a Super Cesta Básica ter sido proibida de participar de licitação e de contratar com a União. O então ministro João Roma tinha acabado de assumir a Pasta. Um segundo pregão foi feito em maio deste ano já na gestão de Ronaldo Bento.

"Os indícios obtidos apontam que a participação da A Popular Cestas Básicas de Alimentos Ltda. no certame teve como objetivo possível burla à sanção aplicada à empresa Super Cesta Básica de Alimentos Eireli", afirma o relatório. "O contrato firmado pela primeira empresa (Popular) estaria, em realidade, sendo, ao menos parcialmente, executado pela segunda (Super Cesta Básica), que sequer participou do certame, pois não poderia, em razão da penalidade sofrida. Essa constatação implica em possível fraude à licitação."

As licitações do Ministério da Cidadania tinham como objetivo criar atas de registro de preços. Nesta modalidade, as empresas concordam em vender uma quantidade pré-determinada de produtos por um valor previamente ajustado. Os órgãos podem comprar o número de produtos que desejarem e não são obrigados a adquirir toda a lista licitada. A ata registrada pelo ministério no ano passado foi encerrada. A deste ano está em aberto.

Apreensão

Parte das irregularidades apontadas pelos auditores do tribunal teve origem em uma apreensão da Secretaria de Fazenda da Paraíba. Em 21 de fevereiro, fiscais da pasta interceptaram uma carreta com cestas básicas em Campina Grande, interior do Estado. A carga estava acompanhada de uma nota fiscal no valor de R$ 233 mil, emitida pela Popular e tinha Hudson Rafael Rocha, beneficiário do auxílio emergencial, como destinatário.

A Secretaria de Fazenda identificou que o documento encontrado na carreta estava ligado a um grupo de outras notas fiscais no valor de R$ 11 milhões, emitidas entre 9 e 18 de fevereiro deste ano. Todas haviam sido emitidas pela Popular e destinadas a Hudson Rocha.

O relatório do TCU descreve que fiscais da secretaria paraibana estiveram no endereço onde as cestas seriam entregues, em Campina Grande, e "foram impedidos de entrar" no local. Dois dias depois da apreensão, em 23 de fevereiro, a pasta estadual recebeu uma ligação de uma servidora do Ministério da Cidadania, que se identificou como coordenadora de Aquisição e Distribuição de Alimentos. A funcionária informou que a Popular havia vencido a licitação e seria a responsável pela distribuição das cestas básicas.

Segundo o documento da Corte de Contas, na ocasião, a servidora foi informada que notas fiscais de remessa de bens e mercadorias não poderiam ter uma pessoa física como destinatário, como era o caso de Hudson Rocha, apenas um órgão público ou uma entidade. A norma é do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), órgão vinculado ao Ministério da Economia.

O relatório descreve também que, no dia da ligação da servidora da Cidadania para a Secretaria da Fazenda da Paraíba, os fiscais voltaram ao galpão em Campina Grande. Hudson Rocha apresentou um e-mail com uma autorização de Rachel Mello para emissão de nota fiscal em nome dele. Segundo o TCU, a data da mensagem "é posterior" à emissão de onze notas fiscais, de um conjunto de 49 relacionadas à aquisição de cestas básicas da Popular.

"Não há elementos que justifiquem razoavelmente o envio de mensagem de e-mail", afirma a Selog. "O fato de ter havido questionamento do Ministério da Cidadania junto à Sefaz/PB, quase que imediatamente após a apreensão das cestas básicas, bem como o envio de e-mail de servidora desse órgão federal, autorizando a emissão de nota fiscal em nome de terceiro, pode indicar um possível acesso privilegiado da empresa A Popular Cestas Básicas de Alimentos Ltda. junto ao contratante."

Em 25 de fevereiro, fiscais da Secretaria de Fazenda de Minas Gerais foram aos endereços da Popular e de uma empresa encarregada de transportar as cestas básicas contratadas pelo Ministério da Cidadania, ambas em Contagem, interior do Estado. Na transportadora, receberam "documentos de controle de entrega das mercadorias" em nome da Super Cesta Básica de Alimentos Eireli, em vez da Popular.

"Cabe destacar que no Pregão Eletrônico 6/2022, a empresa A Popular Cestas Básicas de Alimentos Ltda., vencedora de quatro dos sete itens, apresentou atestado fornecido pelo Ministério da Cidadania, em face da licitação havida no ano anterior, ou seja, a possível fraude no Pregão Eletrônico 2/2021 teve reflexo no certame subsequente", aponta o relatório.

Procurado, o Ministério da Cidadania não retornou. Ao Estadão, o empresário Paulo Moreira disse conhecer a Super Cesta Básica. Ele afirmou que não é dono da empresa Popular. A reportagem não localizou Hudson Rafael Carlos Murilo Pessoa Gonçalves Moreira.

A defesa de Filipe Martins, ex-assessor de Assuntos Internacionais no governo Jair Bolsonaro, optou por uma estratégia ousada e "suicida" no inquérito do golpe.

Os advogados pediram que os ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal (STF), e o procurador-geral da República Paulo Gonet sejam impedidos de participar do processo.

A iniciativa tem pouca chance de prosperar no STF. A defesa sabe que a perspectiva de vitória é quase inexistente, mas insiste na argumentação para jogar luz sobre o que considera um processo "arbitrário, vingativo e inquisitorial".

Filipe Martins é um dos 34 acusados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de ter participado da tentativa de golpe para manter Bolsonaro no poder após a derrota nas eleições de 2022. A PGR imputa ao ex-assessor a confecção de uma das minutas de decreto que teriam circulado no núcleo duro do golpe. O texto previa a prisão de Alexandre de Moraes e do também ministro do STF Gilmar Mendes, além do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), então presidente do Senado.

Filipe Martins passou seis meses preso preventivamente no inquérito. A justificativa foi a de que ele teria tentado fugir do Brasil para escapar da investigação. O nome do ex-assessor constou em uma lista de passageiros do avião presidencial que decolou para Orlando, nos Estados Unidos, em 30 de dezembro de 2022.

A defesa comprovou que ele nunca embarcou com a comitiva do então presidente. Os advogados juntaram comprovantes de gastos no cartão e de corridas por carro aplicativo, tudo no Brasil, e bilhetes de uma ponte aérea nacional.

Com o levantamento do sigilo da investigação, a defesa descobriu que o ministro Alexandre de Moraes já havia autorizado a quebra do sigilo dos dados de geolocalização do telefone celular de Martins no período entre junho de 2022 e outubro de 2023. Ou seja, quando ele foi preso na Operação Tempus Veritatis, em 8 de fevereiro de 2024, a PF já tinha meios para verificar que ele permaneceu no Brasil.

Esse foi um dos argumentos usados pela defesa para pedir a suspeição de Moraes. Os advogados afirmam que houve "grave abuso de autoridade e má-fé processual". "Filipe Martins tem sido vítima de lawfare, ou seja, do uso do sistema de justiça como instrumento de perseguição política."

Outra estratégia da defesa para pressionar o STF a afastar Moraes do caso e anular a investigação foi traçar um paralelo do inquérito do golpe com a Operação Lava Jato.

Os advogados de Filipe Martins comparam a atuação de Alexandre de Moraes à do ex-juiz e atual senador Sergio Moro. O STF derrubou decisões de Moro e reconheceu que ele foi parcial ao condenar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

"O que a Suprema Corte fez valer para Sergio Moro - assim esperamos - também deve valer para o ministro Alexandre de Moraes", defendem os criminalistas.

A defesa do ex-assessor afirma que, assim como Sergio Moro "expandiu de forma artificial a sua competência para se tornar um juízo universal de combate aos crimes de colarinho branco", o ministro Alexandre de Moraes busca ser um "juízo universal da democracia".

"Desde 2019, inúmeros processos criminais ligados ao grupo político do ex-presidente Jair M. Bolsonaro têm sido 'preventos' ao gabinete de Sua Excelência, por um irrestrito e larguíssimo conceito de conexão, abarcando inclusive pessoas sem qualquer prerrogativa de foro, como o Excipiente, cujo julgamento logicamente foge da competência do Supremo Tribunal Federal."

O ex-assessor também alega que sua prisão foi decretada para forçá-lo a fazer uma delação premiada. A defesa afirma que o procurador-geral Paulo Gonet foi conivente e "atuou de maneira parcial e comprometida, distorcendo os fatos e ignorando provas essenciais".

"Ao ocultar a prova da geolocalização, sustentar sua prisão injustificada e atuar de forma coordenada com o magistrado para aumentar a pressão sobre o Excipiente, com o intuito de que ele delatasse, o Procurador-Geral da República jogou ping-pong com o Juiz, utilizando o Excipiente, e incorreu em flagrante quebra da imparcialidade, legalidade e impessoalidade, o que torna nulos todos os atos praticados por eles no curso da investigação e da denúncia."

Já o pedido de suspeição de Flávio Dino tem como base manifestações feitas pelo ministro antes de assumir a cadeira no STF. São publicações nas redes sociais com críticas a Bolsonaro e a seus aliados, o que segundo a defesa configura quebra de imparcialidade.

Em relação ao ministro Cristiano Zanin, os advogados mencionam sua atuação como advogado do PT em processos contra o ex-assessor na Justiça Eleitoral. Também afirmam que o ministro atuou diretamente na defesa de Lula "que, segundo a acusação, teria sido alvo de uma suposta tentativa de golpe".

A defesa de Bolsonaro já tentou afastar Moraes, Dino e Zanin do julgamento, sem sucesso. Os ministros se declararam aptos a participar do processo.

O ex-assessor também enviou ao STF o rol de testemunhas para serem ouvidas no processo se a denúncia da PGR for aceita. São 29 nomes, incluindo o próprio ministro Alexandre de Moraes, o ex-procurador-geral da República Augusto Aras, parlamentares bolsonaristas e embaixadores.

Veja a lista completa:

1. General Freire Gomes, ex-comandante do Exército;

2. Brigadeiro Baptista Júnior, ex-comandante da Aeronáutica;

3. Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro;

4. Deputado Marcel Van Hattem;

5. Deputado Eduardo Bolsonaro;

6. Vereador Carlos Bolsonaro;

7. Deputado Hélio Lopes;

8. Senador Eduardo Girão;

9. Senador Rodrigo Pacheco;

10. Carlos Frederico Santos, subprocurador-geral da República;

11. Fabio Alvarez Shor, delegado da Polícia Federal, Chefe da Divisão de Contrainteligência da PF;

12. Alexandre de Moraes;

13. Augusto Aras, ex-procurador-geral da República;

14. Fernanda Januzzi, ex-chefe do cerimonial do ministro Alexandre de Moraes no Tribunal Superior Eleitoral;

15. Onyx Lorenzoni, ex-ministro da Casa Civil e ex-ministro do Trabalho e Previdência;

16. Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde e deputado federal;

17. Mateus Matos Diniz, ex-assessor especial da Presidência da República;

18. Anelise Hauagge, esposa de Filipe Martins;

19. Amauri Saad, advogado;

20. Padre José Eduardo;

21. André Chermont, ex-chefe do cerimonial da Presidência da República;

22. Eduardo Tagliaferro, perito, ex-chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação do Tribunal Superior Eleitoral;

24. Stella Maria Flores Floriani Burda, promotora de Justiça;

25. Saleh Ahmad Salem Alzaraim Alsuwaidi, embaixador dos Emirados Árabes Unidos no Brasil;

26. Yossi Shelley, ex-embaixador de Israel no Brasil (2017-2022);

27. Todd Chapman, ex-embaixador dos Estados Unidos no Brasil (2019-2022);

28. Rotyslav Tronenko, ex-embaixador da Ucrânia no Brasil (2019-2022);

29. Bader Abbas Alhelaibi, embaixador do Bahrein no Brasil.

Por 7 votos a 4, o Supremo Tribunal Federal (STF) ampliou novamente o alcance do foro privilegiado. Os ministros reconheceram que autoridades mantém a prerrogativa mesmo após deixarem os cargos. Na prática, o tribunal expande sua competência para julgar personalidades do mundo político. A maioria estava formada desde setembro, mas só agora a votação foi concluída.

É a segunda mudança de posicionamento da Corte sobre o tema. Em 2018, o STF restringiu o foro por prerrogativa de função. A decisão foi tomada para baixar o volume de ações criminais após o Mensalão. Desde então, inquéritos e processos criminais envolvendo autoridades como deputados e senadores só precisavam começar e terminar no STF se tivessem relação com o exercício do mandato. Agora, o tribunal recua e define que, quando se tratar de crimes funcionais, o foro deve ser mantido, mesmo após a saída do cargo.

Os ministros Gilmar Mendes, Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso e Kassio Nunes Marques formaram a maioria. Ficaram vencidos André Mendonça, Edson Fachin e Cármen Lúcia.

O julgamento foi concluído no plenário virtual do STF. O tema começou a ser analisado em março de 2024, mas o desfecho foi adiado por sucessivos pedidos de vista (mais tempo para análise) dos ministros.

O ministro Gilmar Mendes, relator do processo, pautou o debate. Ele argumentou que era preciso "recalibrar os contornos" do foro. O voto dele foi seguido pela maioria. Pelo entendimento, o foro privilegiado de um político ou autoridade fica mantido no STF se o crime tiver sido cometido durante o exercício da função, mesmo em caso de renúncia, não reeleição, cassação ou outra hipótese de perda do cargo.

A discussão ganhou tração em meio à transferência das investigações sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes ao STF. O deputado Chiquinho Brazão, denunciado como mandante do crime, era vereador na época. O ministro Alexandre de Moraes, no entanto, argumentou que houve tentativas de obstrução do inquérito quando ele já tinha assento na Câmara dos Deputados, o que em sua avaliação justifica o deslocamento do caso ao Supremo.

A decisão também sepulta as tentativas do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de outros denunciados no inquérito de transferir a investigação para a primeira instância.

O pano de fundo do julgamento é um habeas corpus do senador Zequinha Marinho (Podemos-PA). Ele é réu em uma ação penal na Justiça Federal do Distrito Federal por suspeita operar um esquema de rachadinha quando foi deputado. A defesa nega as acusações e alega que o processo deveria tramitar no Supremo, porque desde então ele exerce cargos com prerrogativa de foro.

Uma das zonas cinzentas envolvendo o alcance do foro era justamente o cenário dos "mandatos cruzados" - quando um deputado (estadual ou federal) ou senador troca de Casa Legislativa. Em 2021, a Segunda Turma manteve o foro do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) no caso das "rachadinhas" na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), o que levou ao arquivamento da denúncia.

Quem tem direito a foro privilegiado no Brasil?

Mesmo com a mudança em 2018, o escopo do foro privilegiado no Brasil é amplo em termos comparativos, sobretudo pela lista de autoridades que têm direito a ele - de políticos a embaixadores e magistrados de tribunais superiores. Países como Japão, Argentina e Estados Unidos não preveem um foro específico em função do cargo público, embora concedam imunidade ao presidente. Em outros, como na França, a prerrogativa se estende apenas ao chefe do Executivo e aos ministros de Estado.

Veja quem tem direito ao foro privilegiado no Brasil:

- Presidente da República;

- Vice-Presidente;

- Deputados;

- Senadores;

- Procurador-Geral da República;

- Ministros de Estado;

- Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica;

- Membros de Tribunais Superiores;

- Chefes de missão diplomática de caráter permanente.