Presidente de Cuba vem ao Brics sem equacionar dívida com Brasil e sob cerco de Trump

Internacional
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O ditador de Cuba, Miguel Díaz-Canel, vai participar pela primeira vez da da Cúpula de Líderes do Brics, a convite do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Cuba vai participar na condição de país parceiro. O convite foi feito apesar da dívida de US$ 1,2 bilhão com o Brasil pendente de negociação.

Após retomar laços com Brasília a partir da posse de Lula, em 2023, Cuba reconheceu o tamanho da dívida com o País, mas indicou não ter meios de pagá-la atualmente, o que levou a um impasse.

Até fevereiro, a dívida de Cuba (soma de indenizações aos bancos financiadores - como o BNDES -, atrasos e juros de mora) atingiu US$ 742 milhões e havia mais US$ 459 milhões a vencer, perfazendo cerca de US$ 1,2 bilhão (R$ 6,4 bilhões).

Assim como a Venezuela, o governo Lula quis estabelecer uma mesa de negociação para calcular o tamanho da dívida, sondar propostas e contrapropostas de pagamento, e estudar a criação ou a retomada de linhas crédito/financiamento à exportação de bens e serviços com Cuba.

Para integrantes do Itamaraty a par das conversas, apesar de terem concordado sobre os valores devidos e indicarem disposição de pagar, os cubanos disseram que "claramente não têm nenhuma condição de quitar" a dívida.

O calote cubano é uma pedra no sapato do Brasil, já que a retomada de linhas de financiamento a exportações brasileiras à ilha, uma saída para dinamizar a economia local, depende de que Cuba pague os débitos existentes.

Os governos brasileiro e cubano tentam encaixar horários para que Lula e Díaz-Canel conversem à margem da reunião do Brics. A bilateral ainda não foi confirmada.

Cuba passa por uma série de problemas econômicos e estruturais, como apagões e crise alimentar, e enfrenta agora um cerco ainda maior dos EUA. O presidente Donald Trump instruiu os principais membros do seu governo a revisar a política para aumentar restrições ao turismo à ilha e impedir transações financeiras.

Ao contrário do que ocorreu com a negociação entre Brasil e Venezuela, que foi paralisada inclusive por indisposição política, a discussão da dívida com o governo de Cuba concluiu a fase de conciliação de valores no ano passado. No entanto, ainda não teve início a próxima etapa de discussões.

Cuba e Venezuela deixaram de pagar ao Brasil a partir de 2018, segundo o BNDES, principal operador das linhas de crédito à exportação de bens e serviços de engenharia, operados por empreiteiras que seriam flagradas na Operação Lava Jato. A obra mais icônica em Cuba foi a do Porto de Mariel.

Segundo o Ministério da Fazenda, as negociações começaram presencialmente em Brasília, em fevereiro de 2004. Cuba enviou membros do Banco Central, do Banco Nacional, do Ministério de Comércio Exterior e Investimento Estrangeiro e da Embaixada em Brasília.

Pelo lado brasileiro, participaram o Ministério da Fazenda (Secretaria de Assuntos Internacionais, Secretaria do Tesouro Nacional e Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional), o Ministério das Relações Exteriores, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, o BNDES e a Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores e Garantias (ABGF).

O encontro de contas, coordenado pelo Ministério da Fazenda e o Banco Nacional de Cuba, foi feito após troca de mensagens eletrônicas, reuniões virtuais e uma missão à Havana, em setembro de 2024, e apenas restaram "diferenças residuais".

Apesar da consolidação, não houve ainda o início de eventual negociação em torno da resolução dos atrasos e dos valores a vencer e já devidos.

Ao contrário do esfriamento de relação de alto nível com Caracas, Lula continua com laços próximos em Havana. Ele se reuniu algumas vezes com Díaz-Canel em bilaterais, e visitou a ilha comunista em 2023.

No ano passado, o país ganhou o apoio do Brasil para alcançar o status de parceiro do Brics.

Apesar de ter sido prestigiado com um convite para ir à Cúpula Brasil-Caribe, em 13 de junho, Díaz-Canel faltou e enviou o vice-presidente Salvador Valdés Mesa, por sobrecarga de agenda doméstica.

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Três dos quatro ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) votaram pelo recebimento da denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Eduardo Tagliaferro, que foi assessor de Alexandre de Moraes no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Com isso, será aberta uma ação penal e ele será transformado em réu.

Ele foi acusado de agir contra a legitimidade do processo eleitoral e atuar para prejudicar as investigações de atos como os de 8 de janeiro de 2023. Tagliaferro está na Itália. O governo brasileiro já iniciou um processo de extradição contra ele.

A votação começou no plenário virtual na sexta-feira, 7, e deve ser oficialmente encerrada na próxima sexta-feira, 14. Votaram até agora Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin. Falta o voto de Cármen Lúcia.

O ex-assessor responderá por quatro crimes: revelar ou facilitar a divulgação de um fato que o servidor público tem conhecimento em razão do seu cargo e que deve permanecer secreto; coação no curso de processo judicial; tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito; e tentar impedir ou dificultar investigação contra organização criminosa.

"A participação do denunciado manifestou-se de forma engendrada com a organização criminosa que atuava com o objetivo de praticar golpe de Estado, reforçando a campanha de deslegitimação das instituições mediante vazamento de informações sigilosas e criação de ambiente de intimidação institucional", escreveu Moraes no voto.

Após instaurada a ação penal, as investigações serão aprofundadas, com a produção de provas e o depoimento do acusado, de testemunhas de defesa e de testemunhas de acusação. Ao fim das apurações, a Primeira Turma vai realizar o julgamento final, que pode ser pela condenação ou absolvição do réu.

A ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro disse no sábado, 8, que o Congresso Nacional está "de joelhos em frente ao Supremo Tribunal Federal" e que o Judiciário governa o País. Ela também defendeu o nome do marido, Jair Bolsonaro, como "única opção" para 2026, ignorando o fato de ele estar inelegível.

"A gente tem visto um Congresso de joelhos em frente ao STF, isso é uma tristeza para a gente, porque, hoje, só quem governa é o Judiciário", disse Michelle em um evento do PL Mulher em Londrina (PR). "Os nossos deputados aprovam leis e se não tiver em concordância, eles anulam", concluiu.

No dia anterior, a defesa de Jair Bolsonaro saiu derrotada do julgamento de um recurso à condenação do ex-presidente por tentativa de golpe de Estado. Ele deve começar a cumprir a pena de 27 anos e três meses de prisão ainda neste ano.

Herança política de Bolsonaro ainda indefinida

Michelle está cotada para ser candidata a presidente da República em 2026, mas Bolsonaro ainda não bateu o martelo sobre quem será seu herdeiro político. Dentro da família, Michelle sofre a concorrência do senador Flávio Bolsonaro, um dos filhos do ex-presidente.

Com a disputa interna da direita indefinida, a ex-primeira-dama preferiu dizer que "a única opção para presidente da República da direita chama-se Jair Messias Bolsonaro". Ela disse que, se isso não acontecer, será "o verdadeiro golpe que o Judiciário está dando no povo de bem, no povo brasileiro".

No mesmo evento, Michelle disse que o marido "tem vivido dias muito difíceis". Segundo ela, Bolsonaro sofre de soluços desde que passou pela última cirurgia. "Ele chega a exaustão, ele tem vários problemas de saúde decorrente dessa última cirurgia, por ele não ter tido tempo para se recuperar, paz de espírito para se recuperar, um ambiente favorável", afirmou.

Apesar dos lamentos, Michelle demonstrou no discurso esperança com dias melhores. "Um abismo foi puxando o outro. Ele tem vivido dias muito difíceis, tendo todos os seus direitos violados. Mas essa injustiça vai acabar, eu creio", declarou.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse neste domingo, 9, que "a ameaça de uso da força militar voltou a fazer parte do cotidiano da América Latina e Caribe", em um sinal indireto às ameaças promovidas pelo governo dos Estados Unidos contra a Venezuela. Ele afirmou que "democracias não combatem o crime violando o direito internacional".

O governo de Donald Trump tem usado como pretexto para intensificar sua presença militar no Caribe o combate ao narcotráfico. Nos últimos meses, destruiu barcos que trafegavam pela região alegando que se tratava de embarcações de traficantes. Os tripulantes foram mortos.

O discurso de Lula foi feito na Cúpula Celac-União Europeia em Santa Marta, na Colômbia. O presidente brasileiro disse que a América Latina é uma "região de paz" e pretende continuar assim.

"A ameaça de uso da força militar voltou a fazer parte do cotidiano da América Latina e Caribe. Velhas manobras retóricas são recicladas para justificar intervenções ilegais. Somos região de paz e queremos permanecer em paz. Democracias não combatem o crime violando o direito internacional", declarou.

Segundo Lula, a "democracia também sucumbe quando o crime corrompe as instituições, esvaziam espaços públicos e destroem famílias e desestruturam negócios". O presidente brasileiro disse que garantir "segurança é dever do Estado e direito humano fundamental" e que "não existe solução mágica para acabar com a criminalidade". O presidente defendeu "reprimir o crime organizado e suas lideranças, estrangulando seu financiamento e rastreando e eliminando o tráfico de armas".

Lula citou a última reunião da cúpula Celac-União Europeia, há dois anos, em Bruxelas. Disse que, naquela época, "vivíamos um momento de relançamento dessa histórica parceria", mas, "deste então, experimentamos situações de retrocessos".

O petista criticou a falta de integração entre os países latinoamericanos. Afirmou que "voltamos a ser uma reunião dividida" e com ameaças envolvendo o "extremismo político".

"A América Latina e o Caribe vivem uma profunda crise em seu projeto de integração. Voltamos a ser uma região dividida, mais voltada para fora do que para si própria. A intolerância cria força e vem impedindo que diferentes pontos de vista possam se sentar na mesma mesa. Voltamos a viver com a ameaça do extremismo político, da manipulação da informação e do crime organizado. Projetos pessoais de apego ao poder muitas vezes solapam a democracia", afirmou.

Em seu discurso, Lula também citou a realização da COP30, em Belém, e mencionou o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês). Disse que o fundo "é solução inovadora para que nossas florestas valham mais em pé do que derrubadas" e que a "transição energética é inevitável".

O petista também lamentou o tornado que atingiu a cidade de Rio Bonito do Iguaçu, no Paraná, e manifestou suas condolências às vítimas da tragédia climática dos últimos dias.