O que significa chamar um embaixador de volta? Entenda a crise entre Brasil e Israel

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva abriu uma crise diplomática com Israel ao comparar a guerra em Gaza ao extermínio de judeus pela Alemanha Nazista na 2ª Guerra. Em uma reprimenda dura, o petista foi declarado 'persona non-grata' e embaixadores convocados e se explicar nesta segunda-feira, 19.

No direito internacional, as sanções diplomáticas são respostas de um Estado a comportamentos considerados hostis, mesmo que legais. E podem levar ao rompimento de relações, se agravadas.

"É o pior momento das relações entre Brasil e Israel na última década", afirma o cientista político, professor de relações internacionais, colaborador do Centro de Estudos Político-Estratégicos da Marinha, Maurício Santoro.

Entenda o passo a passo de uma crise diplomática.

'Persona non-grata'

O termo em latim é usado por um Estado para indicar que não aceitará mais um agente diplomático, que deverá ser chamado de volta ao país que representa, segundo o Dicionário da Diplomacia.

"O Estado pode, a qualquer momento e sem a necessidade de explicar sua decisão, notificar que o chefe da missão ou qualquer outro membro do pessoal diplomático é persona non grata ou não é aceitável. Em qualquer um dos casos, a pessoa em questão deve ser recolhida ou encerrar suas funções na missão", prevê a Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas.

No caso específico do presidente Lula, o que Israel sinaliza é que o petista não é bem-vindo no país a menos, como condicionou Tel-Aviv, que se retrate. O petista, no entanto, tem resistido em recuar.

"Isso significa que o presidente não pode visitar Israel. E a condição que governo israelense colocou para revogar essa decisão seria o presidente Lula pedir desculpas formalmente, se retratar pelo que falou", afirma Maurício Santoro.

"O primeiro gesto de Lula é que ele não vai fazer isso e, se de fato recusar em mudar o discurso estaria proibido de voltar (a Israel)", acrescenta Santoro ao apontar para para "ironia histórica" - em 2010, Lula foi o primeiro presidente brasileiro a visitar Israel em missão oficial.

Convocação de embaixadores

A convocação de um embaixador estrangeiro para consultas é o gesto dos Estados para demonstrar insatisfação - conversas que costumam ocorrer de forma reservada no ministério das Relações Exteriores.

Dessa vez, no entanto, Israel quebrou o protocolo e levou o embaixador no Brasil Frederico Meyer para uma reprimenda pública, no Memorial do Holocausto. "Foi uma decisão muito dura, que foge aos protocolos habituais do diplomacia", afirma Maurício Santoro que chama atenção para a velocidade em que a crise escalou.

Brasília também chamou o embaixador de Israel Daniel Zonshine para se explicar e, em sinal de agravamento da tensão, determinou que Frederico Meyer voltasse de Tel-Aviv para o Brasil por tempo indeterminado. Essa é considerada uma medida excepcional de descontentamento na linguagem diplomática.

"Convocar o próprio embaixador é um gesto de muita insatisfação dos países, que pode preceder o rompimento de relações diplomáticas", afirma Maurício Santoro.

De acordo com o analista, a volta do embaixador ao Brasil pode durar algumas semanas à espera pelo desenrolar da crise ou pode resultar em uma ruptura das relações entre Brasília e Tel-Aviv. A tensão também poderia ser superada a partir de um pedido de desculpas do presidente, mas, pelo menos por enquanto, o petista não deu sinais de que vá recuar.

Histórico de tensões

Apesar da gravidade, a convocação do embaixador em Tel-Aviv não é inédita. Em 2014, durante do governo Dilma Rousseff, Brasília chamou o seu representante diante do que considerou uso "desproporcional" da força por Israel em Gaza. Na época, o então porta-voz do ministério das Relações Exteriores israelense Yigal Palmor disse que a decisão era lamentável e chamou o Brasil de "anão diplomático".

"Uma demonstração lamentável de como o Brasil, um gigante econômico e cultural, continua a ser um anão diplomático", disse. Com a escalada da crise, o presidente eleito de Israel Reuven Rivlin ligou para Dilma e se desculpou pelas falas do porta-voz israelense.

O que disse Lula

O presidente brasileiro tem criticado Israel pela guerra em Gaza desde o início do conflito mas cruzou o que Tel-Aviv chamou de "linha vermelha" ao comparar o conflito com o Holocausto.

"O que está acontecendo em Gaza não aconteceu em nenhum outro momento histórico, só quando Hitler resolveu matar os judeus", disse Lula em entrevista no domingo, 18, em Adis Abeba, Etiópia. O presidente brasileiro também criticou Israel ao afirmar que Tel-Aviv não obedece a nenhuma decisão da ONU e afirmou que defende a criação de um Estado palestino. Para Lula, o conflito "não é uma guerra entre soldados e soldados, é uma guerra entre um Exército altamente preparado e mulheres e crianças", afirmou. "Não é uma guerra, é um genocídio", completou o presidente brasileiro.

A declaração de Lula é a mais recente de uma série de críticas a atuação de Israel do Hamas em Gaza. Desde os atentados de 7 de outubro, o presidente repudiou os ataques do Hamas e condenou a resposta israelense, que chamou, mais de uma vez, de genocídio.

A comparação da atuação militar de Israel ao Holocausto, quando 6 milhões de judeus foram exterminados pelos nazistas, é considerada um tipo de antissemitismo, por tentar equiparar as vítimas a seus algozes.

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O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, disse, em entrevista à TV Record, que sua relação com os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), "é a melhor possível". "Até parece que eu convivo com Hugo Motta há 50 anos, embora ele não tenha 50 anos de idade. Minha convivência com Alcolumbre é muito boa. Acho que vamos ter uma relação extraordinariamente civilizada", declarou.

Lula repetiu o discurso que tem adotado desde o início do mandato de que pretende ter um diálogo com o Congresso sobre cada uma das medidas que forem enviadas pelo governo para o Legislativo.

Afirmou ainda que não quer que os chefes das duas Casas aceitem "tudo o que [o governo] mandar".

"Nunca vou querer que os presidentes da Câmara e do Senado aceitem tudo o que [o governo] mandar. O que quero é estabelecer uma nova forma de conversar. Antes de mandar projeto para o Congresso, tenho de conversar com Alcolumbre, Hugo Motta e lideranças do governo. Não posso mandar de forma aleatória", disse o presidente da República.

O vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, afirmou que "enquanto alguns maquinam o assassinato de seus adversários, Lula promove diálogo e estende as mãos em benefício do povo e do Brasil". A declaração, uma provocação aos bolsonarismo, ocorreu durante a cerimônia de lançamento do edital de construção do túnel entre Santos e Guarujá.

Na ocasião, o palco foi dividido por políticos de posições opostas, como o presidente Lula e o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).

Alckmin celebrou o projeto do túnel que tende a fortalecer as atividades no Porto de Santos.

O vice-presidente também destacou o número de geração de empregos mais forte que o esperado pelo mercado no começo do ano.

"Mais de 51% dos empregos gerados em janeiro foi na indústria. E a indústria que exporta paga salário mais alto aos trabalhadores", citou Alckmin.

O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, afirmou nesta quinta-feira, 27, ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que ele está "fazendo história" com as parcerias que estão sendo construídas entre governo federal e estadual. "Tem gente do lado do Tarcísio que não gosta de vê-lo ao meu lado, e vice-versa", disse o petista, durante cerimônia de lançamento do edital do túnel Santos-Guarujá.

Lula também disse que fotografia de hoje marca "novo momento da história do Brasil". O presidente também afirmou que vai para Santa Catarina na semana que vem e criticou o governador Jorginho Mello (PL), mas garantiu que não está preocupado. "Vou ao Estado que tem o governador que mais fala mal de mim", comentou.

O projeto do túnel imerso ligando os municípios paulistas possui valor de investimento estimado em R$ 5,96 bilhões.

Dessa quantia, R$ 5,13 bilhões serão divididos entre os governos de São Paulo e o federal.

O restante será da concessionária que vencer o leilão previsto para ser realizado em agosto. A futura empresa será responsável pela construção, operação e manutenção do ativo.

No último dia 12, o governador Tarcísio se reuniu com o presidente Lula para tratar do tema. No encontro, foi formalizado o convênio que viabiliza a construção do túnel por São Paulo junto ao Ministério dos Portos e Aeroportos.

"Apresentamos uma proposta que iria acelerar o leilão do túnel Santos-Guarujá e o governo federal topou. O presidente da República deu 'ok'. Hoje publicaram o convênio de delegação", disse Tarcísio no dia 18. "Já tem data para o leilão, que é 1º de agosto. Estaremos na Bolsa para celebrar."