Guiana compra navio-patrulha de R$ 212 mi em meio a disputa com Venezuela

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A Guiana comprou um navio-patrulha de R$ 212 milhões da empresa naval francesa Ocea para reforçar a sua proteção territorial em meio a disputa com a Venezuela pela região do Essequibo. A compra foi considerada "uma ameaça à paz" pela vice-presidente venezuelana, Delcy Rodriguez, em seu perfil no X.

 

O Ministério das Finanças assinou a carta de intenção para a compra da embarcação nesta quarta-feira, 10. De acordo com o chefe das Forças de Defesa da Guiana, o brigadeiro Omar Khan, a decisão visa fortalecer a capacidade da Guarda Costeira na zona econômica exclusiva e proteger os "bens marítimos" e o território soberano da Guiana.

 

Após a notícia da compra, a vice-presidente venezuelana criticou a decisão nas redes sociais. "A falsa vítima Guiana comprou um navio de patrulha oceânica a uma empresa francesa. A Guiana, juntamente com os Estados Unidos, os parceiros ocidentais e o antigo senhor colonial (o Reino Unido), constituem uma ameaça à paz da nossa região. A Venezuela continuará a monitorar estas ações da Guiana e persistirá no caminho da legalidade internacional", declarou.

 

A compra acontece meses após as disputas em torno do Essequibo, área rica em petróleo e hoje pertencente à Guiana, voltarem à tona com um plebiscito da Venezuela que perguntou aos venezuelanos se reconheciam a região como parte do país. Depois de o resultado, o governo venezuelano criou a província do Essequibo e distribuiu um novo mapa do país nas escolas.

 

As ações de Nicolás Maduro levantaram as preocupações do governo da Guiana sobre a anexação da região. Após o plebiscito, o presidente Mohamed Irfaan Ali afirmou que iria fortalecer as defesas do país e buscou apoio da comunidade internacional. A Guiana tem um exército muito inferior ao da Venezuela, com um efetivo de 3,4 mil soldados contra 123 mil, segundo o Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS, de Londres).

 

O governo guianense também aprofundou uma cooperação com as forças armadas dos EUA, iniciada em 2022. Em dezembro do ano passado, semanas após o plebiscito venezuelano, os militares dos dois países realizaram um exercício militar aéreo no Essequibo pela primeira vez. No mês passado, o governo de Irfaan Ali anunciou a criação do Instituto de Defesa Nacional da Guiana, em parceria com o Centro William Perry para Estudos de Defesa Hemisférica, dos EUA.

 

"Trata-se de nos posicionar como um país, como uma universidade e como uma instituição de segurança regional de primeira linha", disse Irfaan Ali.

 

Irfaan Ali também não descartou autorizar a instalação de bases militares americanas na região, num sinal que irrita a Venezuela e a oposição guianense, que vê como interferência estrangeira dos EUA no país. No início deste mês, Maduro afirmou ter informações de que essas bases foram instaladas. Os EUA e a Guiana negam a alegação.

 

As tensões em torno do Essequibo pareciam ter diminuído após o encontro diplomático entre os líderes dos dois países ocorrido nas ilhas de São Vicente e Granadinas em dezembro, com mediação do Brasil e dos países caribenhos. No fim do encontro, os dois presidentes se comprometeram em procurar o diálogo para solucionar a questão.

 

Após o encontro, a Assembleia Nacional da Venezuela (AN) adiou a votação do projeto de anexação da região, que corresponde a dois terços da área da Guiana, e Maduro afirmou que iria manter o diálogo diplomático.

 

Entretanto, no início deste mês, Maduro promulgou a lei que criou a província venezuelana do Essequibo e os dois países voltaram a aumentar o tom. O ditador venezuelano acusa a Guiana de ser governada pela Exxon e pelos EUA e atender interesses estrangeiros - o que feriria um dos termos do acordo firmado em dezembro, de não haver interferência de terceiros. A Guiana, por sua vez, acusa a Venezuela de não respeitar a soberania territorial.

 

Internamente, os guianenses se unem em torno da defesa do Essequibo, mas se dividem sobre as relações do governo com a ExxonMobil e com os EUA. Muitos acusam a empresa de agir "acima da lei" no país e temem que um envolvimento com os americanos ameace a soberania nacional.

 

A Exxon foi responsável pela descoberta do petróleo na região do Essequibo em 2015. A exploração do combustível transformou o país, até então um dos mais pobres da América do Sul. Em 2022, o PIB cresceu 63%, o maior crescimento do mundo, e no ano passado o crescimento foi de 35%. Sem o petróleo, seria inferior a 8%.

 

A descoberta também reacendeu a disputa centenária da região, que fez parte da Venezuela durante o período colonial espanhol e durante os primeiros anos de sua independência, mas acabou tomada pelo Império Britânico em 1814 e passou a fazer parte da então Guiana Britânica.

 

Em 1899, um tribunal realizado em Paris deu ao Império Britânico a posse sobre a região. Anos depois, em 1966, antes da independência da Guiana, a Venezuela disse que a arbitragem do tribunal foi imparcial e voltou a reivindicar a área. A ONU reconheceu a imparcialidade do tribunal, mas disse que os dois países deveriam dialogar para chegar a um consenso, o que nunca aconteceu.

 

Sem solução, a questão foi parar na Corte Internacional de Justiça (CIJ) em 2017, por decisão do secretário-geral da ONU, António Guterres, que se valeu da prerrogativa estabelecida pelo próprio Acordo de Genebra no caso de as partes não chegarem a um entendimento. Em dezembro do ano passado, dias antes do plebiscito venezuelano, a CIJ determinou que "as duas partes devem se abster de quaisquer ações que possam agravar ou estender a disputa antes da decisão da Corte ou torná-la ainda mais difícil de ser resolvida".

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A rede social criada por Donald Trump, Truth Social, e a plataforma de vídeos Rumble entraram com um pedido de liminar em um tribunal dos Estados Unidos contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. A informação é da agência de notícias Reuters.

O pedido busca impedir ordens emitidas pelo ministro, sob o argumento de que elas "violam a soberania americana, a Constituição e as leis dos Estados Unidos". Elas também disseram que Moraes ameaçou processar criminalmente o CEO do Rumble, Chris Pavlovski.

Na sexta-feira, 21, Moraes havia determinado a suspensão do Rumble no Brasil por tempo indeterminado, até que a plataforma cumprisse as ordens judiciais dadas e o pagamento de multas. Isso porque antes ele ordenara que a empresa indicasse representantes legais no País.

O STF já definiu que plataformas estrangeiras precisam constituir representantes no Brasil para receber intimações e responder pelas empresas.

Entenda a polêmica

Em um despacho, o ministro afirmou que a plataforma incorreu em "reiterados, conscientes e voluntários descumprimentos das ordens judiciais, além da tentativa de não se submeter ao ordenamento jurídico e Poder Judiciário brasileiros".

"Chris Pavlovski confunde liberdade de expressão com uma inexistente liberdade de agressão, confunde deliberadamente censura com proibição constitucional ao discurso de ódio e de incitação a atos antidemocráticos", escreveu Moraes.

Além de exigir a indicação de um representante legal, o ministro também havia determinado o bloqueio do canal do blogueiro Allan dos Santos e a interrupção de repasses de monetização ao influenciador. Também ordenou que novos perfis do influenciador fossem barrados. Outras redes sociais, como YouTube, Facebook, Twitter e Instagram, foram notificadas para bloquear as contas de Allan dos Santos e cumpriram as decisões de Moraes.

O STF não conseguiu intimar o Rumble porque a empresa não tem um responsável no Brasil. Os advogados localizados informaram que não são representantes legais da plataforma e que não têm poderes para receber citações ou intimações. No dia 17 de fevereiro, eles renunciaram ao mandato que tinham para atuar em causas da rede social.

O Rumble move uma ação contra Moraes na Justiça dos Estados Unidos, em conjunto com Trump Media, ligada ao presidente americano. As companhias alegam que o ministro do STF violou a soberania norte-americana ao ordenar a suspensão do perfil de Allan dos Santos. O blogueiro teve prisão preventiva decretada em 2021 e está foragido desde então.

O Rumble voltou a funcionar no Brasil em fevereiro deste ano. A plataforma, que estabelece uma política menos restrita de moderação de conteúdo, foi desativada no País em dezembro de 2023 por discordar das exigências da Justiça brasileira. Ela é conhecida por abrigar personalidades e usuários de extrema direita.

O influenciador Pablo Marçal (PRTB) foi condenado à inelegibilidade porque vendeu apoio político na campanha de 2024. Em vídeo publicado nas redes sociais, ele se ofereceu para gravar vídeos divulgando candidatos a vereador por R$ 5 mil.

Em uma transmissão ao vivo na sexta-feira, 21, o influenciador disse que vai recorrer da decisão. Ele alegou que não chegou a "materializar" os vídeos porque foi barrado pela equipe jurídica da campanha.

Pablo Marçal foi candidato à Prefeitura de São Paulo nas eleições municipais de 2024 e terminou em terceiro lugar, com 1.719.274 de votos (28,14% dos votos válidos).

Ao se oferecer para divulgar os vereadores, ele afirmou que estava "concorrendo a uma eleição desleal" porque não usou dinheiro público enquanto "os 'bonitões' gastam R$ 100 milhões para fazer propaganda enganosa".

"Você conhece alguém que queira ser vereador e é candidato, que não seja de esquerda, tá, esquerda não precisa avisar. Se essa pessoa é do bem e quer um vídeo meu para ajudar a impulsionar a campanha dela, você vai mandar esse vídeo e falar 'mano, olha aqui que oportunidade, né?' Essa pessoa vai fazer o quê? Ela vai mandar um Pix para a minha campanha de doação, Pix de cinco mil. Fez essa doação, eu mando o vídeo. Vai clicar aqui no formulário, clicou aqui no formulário, cadastra, a equipe vai entrar em contato. Tamo junto, fechou, você ajuda daqui em São Paulo e eu ajudo daí."

O juiz Antonio Maria Patiño Zorz, da 1.ª Zona Eleitoral, declarou Pablo Marçal inelegível por abuso de poder econômico e político, uso indevido de meios de comunicação social e captação ilícita de recursos.

A sentença afirma que a oferta feita pelo influenciador "foi levada a sério por candidatos a vereador que efetuaram doações confirmadas pelo requeridos" e teve "potencialidade para macular a integridade do processo eleitoral em razão do efeito que produziram na consciência política dos cidadãos".

O juiz Antonio Zorz afirmou ainda que ele espalhou fake news sobre o fundo partidário e se "colocou, de forma gravemente distorcida, como vítima de um sistema eleitoral desleal que não lhe permitiu usar financiamento público do fundo eleitoral". Com isso, na avaliação do magistrado, o influenciador comprometeu a "normalidade e legitimidade" da eleição.

Como a decisão foi tomada na primeira instância, há possibilidade de recurso ao Tribunal Regional Eleitoral.

Deflagrada pela Polícia Federal em 2015, a Operação Zelotes inicialmente apurava suspeitas de um esquema de corrupção no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf) - órgão colegiado do Ministério da Fazenda - que é a última instância administrativa para o julgamento de autuações da Receita Federal a empresas e pessoas físicas. O objetivo do esquema seria vender, por meio de conselheiros e auditores, informações privilegiadas e facilidades que pudessem resultar na reversão de multas discutidas no Carf.

Quando a operação foi deflagrada, o Carf era ocupado por 216 conselheiros, metade indicada pela Receita e outra parte por confederações empresariais, como a Confederação Nacional da Indústria (CNI), e uma parte menor pelas centrais sindicais.

Até então, os conselheiros indicados pelo setor privado podiam desempenhar suas funções no Carf e, ao mesmo tempo, advogar em casos tributários. No mês seguinte à revelação do escândalo, o governo fixou novas regras para funcionamento do órgão, com remuneração para seus integrantes e restrições ao exercício das atividades profissionais.

De acordo com os investigadores, o esquema de corrupção no Carf era "legalizado" por contratos de serviços prestados por escritórios de advocacia e consultorias que faziam lobby para influenciar nas decisões do órgão. Após abordagem das empresas alvos de multas da Receita, esses consultores elaboravam contratos para forjar a legalidade do serviço prestado. A partir daí, segundo a investigação, as empresas pagavam propina por meio de depósitos em diversas contas bancárias para evitar o rastreamento.

Os investigadores dizem que vários conselheiros do Carf se recusaram a participar do esquema e repudiaram a abordagem, mas outros aceitaram negociar decisões. À época, tramitavam no órgão mais de 115 mil processos tributários que englobam cerca de R$ 500 bilhões em discussão.

Desdobramentos da Zelote levaram a outros casos e até suspeita de compra de Medida Provisória

Com desdobramentos, a operação Zelotes foi ampliada e virou um guarda-chuva para grandes investigações sobre suspeitas de corrupção que atingiram grandes personagens da República. O ex-ministro Antonio Palocci foi uma testemunha nas investigações. O ex-ministro Guido Mantega virou réu, mas o caso dele acabou prescrito.

O caso da venda de uma Medida Provisória para favorecer montadores de veículos no segundo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em 2009, também acabou entrando no escopo da Zelotes. A denúncia foi publicada pelo Estadão em outubro de 2015.

Lula chegou a virar réu nesse caso por suposto tráfico de influência, mas foi absolvido em 2021 depois de a Justiça entender que a acusação não demonstrou de maneira convincente o envolvimento dele.

Até um filho de Lula virou réu, junto com o pai, em um processo que apontava tráfico de influência na compra de caças suecos pelo governo brasileiro. O caso das aeronaves foi suspensa pelo então ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, em 2022.

A decisão permitiu que Lula disputasse as eleições daquele ano sem responder a ações penais na Justiça. Lewandowski, hoje ministro da Justiça do governo Lula, entendeu que procuradores do DF agiam de forma articulada com membros da Lava Jato. Ele se baseou em trocas de mensagens da força-tarefa de Curitiba que acabaram vazadas por hackeamento.

Apesar dos dez anos desde a deflagração da Zelotes, ainda há ações sem julgamento e sem trânsito em julgado.