Moraes expõe delação que cita pressão de Bolsonaro sobre chefes das Forças

Política
Tipografia
  • Pequenina Pequena Media Grande Gigante
  • Padrão Helvetica Segoe Georgia Times

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), derrubou nesta quarta-feira, 19, o sigilo da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid. A colaboração deu subsídios para a investigação que resultou na denúncia contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros 33 - incluindo Cid - pela trama de um golpe de Estado após a derrota na eleição de 2022. O ex-presidente foi acusado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de liderar as articulações por uma ruptura institucional. A delação do ex-ajudante de ordens da Presidência reforça o papel atribuído a Bolsonaro de condutor do plano golpista e relata pressão do ex-mandatário sobre comandantes das Forças Armadas e outros militares de alta patente.

 

A colaboração premiada esteve sob ameaça real de rescisão em novembro de 2024. A Polícia Federal (PF) avaliava que Cid estava omitindo informações. Pressionado, o tenente-coronel prestou depoimento diretamente a Moraes. Ele ficou frente a frente com o ministro na sala de audiências do STF e foi questionado sobre "contradições" em oitivas anteriores.

 

"Quero os fatos, por isso que eu marquei essa audiência. Eu diria que é a última chance do colaborador dizer a verdade sobre tudo", disse Moraes. Àquela altura, a PGR já havia se manifestado a favor da prisão preventiva de Cid. O tenente-coronel foi avisado que, se não colaborasse, sairia da oitiva preso. "Eventuais novas contradições não serão admitidas", afirmou o ministro.

 

Cid então relatou envolvimento de Bolsonaro no plano de golpe. Ele cravou que partiu do ex-presidente a ordem para os comandantes das Forças divulgarem uma nota conjunta autorizando a permanência de manifestantes nos acampamentos montados diante de quartéis. Os chefes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica condenaram no texto "eventuais restrições a direitos, por parte de agentes públicos".

 

Segundo Cid, o ex-presidente "sempre dava esperanças que algo fosse acontecer para convencer as Forças Armadas a concretizarem o golpe".

 

"Esse foi um dos motivos pelos quais o então presidente Jair Bolsonaro não desmobilizou as pessoas que ficavam na frente dos quartéis. Em relação a isso, o colaborador também se recorda que os comandantes das três Forças assinaram uma nota autorizando a manutenção da permanência das pessoas na frente dos quartéis por ordem do então presidente Jair Bolsonaro", diz o termo de depoimento.

 

Urnas

 

Cid afirmou ainda que Bolsonaro pressionou o então ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira - ex-comandante do Exército, também denunciado pela PGR -, para mudar um relatório em que a Força terrestre não identificou falhas nas urnas eletrônicas.

 

No depoimento de novembro de 2024, Cid afirmou: "O general Paulo Sérgio, a conclusão dele ia ser isso (ausência de falhas nas urnas). Aí, o presidente estava pressionando para que ele escrevesse isso de outra forma, né? O presidente queria que ele escrevesse que tivesse fraude. O que acabou saindo, eu acho, foi que não se poderia comprovar porque não era possível auditar".

 

Em sua delação, o tenente-coronel disse também que Bolsonaro se reuniu com a cúpula das Forças Armadas para discutir a possibilidade de uma intervenção militar para anular o resultado da eleição de 2022. Segundo Cid, o ex-presidente chamou os comandantes - Marco Antônio Freire Gomes (Exército), Carlos de Almeida Baptista Junior (Aeronáutica) e Almir Garnier Santos (Marinha) - para uma reunião. O argumento para convencer a alta cúpula das Forças Armadas foi a apresentação de uma versão da "minuta do golpe", que daria suporte jurídico à trama. Na versão de Cid, o então presidente "queria entender a reação dos comandantes das Forças em relação ao seu conteúdo".

 

Posteriormente, o general Marco Antônio Freire Gomes e o brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior confirmaram a reunião em depoimento à PF. Almir Garnier está entre os denunciados.

 

Monitoramento

 

Na denúncia, a PGR afirma que os atos golpistas do 8 de Janeiro foram gestados nos acampamentos e que os militares das Forças Especiais do Exército, conhecidos como "kids pretos", direcionaram as manifestações. Foi também no depoimento a Moraes que Cid implicou Bolsonaro em um suposto monitoramento do ministro do Supremo. Segundo o tenente-coronel, o ex-presidente pediu a aliados que vigiassem Moraes às vésperas do Natal daquele ano.

 

Cid também complicou o general Walter Braga Netto, ex-ministro de Bolsonaro e ex-candidato a vice-presidente na chapa derrotada em 2022 - também acusado formalmente pela PGR. Segundo ele, Braga Netto fazia a ponte com os manifestantes nos acampamentos golpistas. O general foi preso no dia 14 de dezembro passado, após o depoimento do tenente-coronel.

 

Cid ainda citou uma reunião com Braga Netto, em novembro de 2022. Segundo ele, o encontro foi organizado para discutir a "necessidade de ações que mobilizassem as massas populares e gerassem caos social". O passo seguinte seria a decretação do estado de sítio. "O general Braga Netto, juntamente com os coronéis Oliveira e Ferreira Lima concordavam com a necessidade de ações que gerassem uma grande instabilidade e permitissem uma medida excepcional pelo Presidente da República. Uma medida excepcional que impedisse a posse do então presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva", declarou Cid.

 

'Copa 2022'

 

Os militares chegaram a pedir dinheiro ao PL, partido de Bolsonaro, para montar a "Operação Copa 2022" - conforme as investigações, a operação foi uma ação clandestina integrada ao plano maior, "Punhal Verde e Amarelo". O grupo, formado no aplicativo Signal e batizado de "Copa 2022," tinha como objetivo monitorar e assassinar Moraes.

 

Mauro Cid alegou que imprimiu o plano que detalhava a logística da operação para entregar a um dirigente do partido, "provavelmente tesoureiro ou ordenador de despesa". "O dirigente do PL disse ao colaborador que não poderia utilizar dinheiro do partido para esse tipo de operação."

 

No mesmo despacho em que abriu o sigilo da delação, Moraes notificou Bolsonaro e os outros 33 denunciados por cinco crimes. Caso o Supremo aceite a denúncia, eles se tornarão réus em uma ação penal. A denúncia foi apresentada na noite de anteontem pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet. Os denunciados terão 15 dias para responder às acusações feitas pela PGR.

 

Os advogados de Bolsonaro afirmam em nota que a denúncia é baseada no acordo de colaboração de Cid, classificada pela defesa do ex-presidente como "fantasiosa".

 

US$ 86 mil por venda de joias

 

Mauro Cid afirmou em sua delação que entregou ao ex-presidente US$ 86 mil (R$ 492 mil pelo câmbio de ontem) decorrentes da venda de joias recebidas como presentes enquanto chefe de Estado. O caso das joias foi revelado em março de 2023 pelo Estadão.

 

O montante corresponde a US$ 68 mil obtidos com a venda dos relógios Rolex e Patex Philippe a uma loja na Filadélfia e mais US$ 18 mil da venda de demais joias em um centro especializado de Miami, ambas cidades nos Estados Unidos. O valor foi fracionado e entregue em espécie a Bolsonaro em diferentes ocasiões, para evitar que "circulasse no sistema bancário", segundo Cid.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Em outra categoria

A matéria enviada anteriormente trazia um erro no título. Segue a versão corrigida.

Os Estados Unidos sancionaram nesta terça-feira, 25, três funcionários do Ministério da Inteligência e Segurança do Irã envolvidos no sequestro, detenção e provável morte do ex-agente especial do FBI Robert Levinson. Os indivíduos Reza Amiri Moghadam, Gholamhossein Mohammadnia e Taqi Daneshvar desempenharam um papel no sequestro e provável morte de Levinson e nos esforços do Irã para encobrir ou ofuscar sua responsabilidade, afirmou o Departamento do Tesouro dos EUA.

Os Estados Unidos sancionaram nesta terça-feira, 25, três funcionários do Ministério da Inteligência e Segurança do Irã envolvidos no sequestro, detenção e provável morte do ex-agente especial do FBI Robert Levinson. Os indivíduos Reza Amiri Moghadam, Gholamhossein Mohammadnia e Taqi Daneshvar desempenharam um papel no sequestro e provável morte de Levinson e nos esforços do Irã para encobrir ou ofuscar sua responsabilidade, afirmou o Departamento do Tesouro dos EUA.

O Ministério das Relações Exteriores do Brasil confirmou na manhã desta terça-feira, 25, a morte do brasileiro Walid Khalid Abdalla Ahmad, de 17 anos, em uma prisão israelense. Em nota, o Itamaraty cobrou explicações sobre a morte de Ahmad e pediu uma investigação "célere e independente".

O adolescente morava em Silwad, vilarejo palestino na Cisjordânia, e foi detido por Israel em setembro de 2024. Ele foi acusado de agredir militares israelenses e não foi julgado antes de morrer.

De acordo com o Itamaraty, as circunstâncias e a data da morte de Ahmad não foram esclarecidas. O governo brasileiro está prestando assistência à família de Ahmad por meio do Escritório de Representação do Brasil em Ramallah, a capital administrativa da Autoridade Palestina (AP).

"Onze brasileiros residentes no Estado da Palestina seguem presos em Israel, a maioria dos quais sem terem sido formalmente acusados ou julgados, em clara violação ao Direito Internacional Humanitário", afirma a nota. "O governo brasileiro solidariza-se com os familiares e amigos do nacional e transmite sinceras condolências, ao tempo em que continuará a exigir do governo de Israel as explicações necessárias acerca da morte".

Segundo a ONG Defesa das Crianças Internacional - Palestina, o caso dele foi relatado à Comissão de Assuntos de Presos e Ex-Presos, e o Gabinete de Ligação Palestino informou à família de Walid sobre a morte e que ele sofria de doenças como sarna e disenteria amebiana.

Nota da Federação Árabe Palestina

A morte do brasileiro havia sido noticiada por uma nota da Federação Árabe Palestina na segunda-feira, 24, mas ainda não tinha sido confirmada pelo governo do Brasil.

Segundo a entidade, a prisão em que Ahmad estava, o centro de detenções de Megido, é conhecido pelo uso de métodos de tortura contra prisioneiros palestinos. A federação pediu o rompimento das relações diplomáticas entre Brasil e Israel e questionou se o governo brasileiro sabia que Ahmed estava na prisão antes de sua morte.

Diversos relatórios de organizações que lutam pelos direitos dos palestinos já acusaram as prisões israelenses de abusos de direitos humanos, com o uso de métodos de tortura, agressões e negligencia médica, mas o serviço penitenciário de Israel e o Exército negaram as acusações.

Relação Brasil-Israel

Brasil e Israel vivem um momento de quase rompimento das relações diplomáticas. As relações azedaram depois que o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, comparou as ações do Exército de Israel em Gaza com os métodos da Alemanha Nazista, de Adolf Hitler, em fevereiro de 2024.

Após as fortes declarações, o governo de Israel declarou que Lula foi rotulado como "persona non grata" no país. O então chanceler de Israel e hoje ministro da Defesa, Israel Katz, realizou uma coletiva de imprensa com o então embaixador brasileiro em Israel Frederico Meyer dentro do Museu da história do Holocausto Yad Vashem, em Jerusalém, e o Brasil pediu o regresso de Meyer a Brasília.

Desde então, o governo Lula não indicou um embaixador para Israel e Tel-Aviv não conseguiu o aval do Brasil para substituir seu embaixador em Brasília.