País vive o retorno do discurso do 'tio do churrasco', diz Moraes em aula magna na USP

Política
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O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), ministrou nesta segunda-feira, 24, a aula magna de recepção aos calouros da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), no salão nobre do prédio histórico no Largo do São Francisco.

O tema escolhido foi a crise da democracia e o alinhamento das big techs com grupos de extrema-direita. O ministro falou por 45 minutos.

"Há uma instrumentalização das redes sociais por grupos econômicos e ideologicamente fascistas, de extrema-direita, para corroer a democracia por dentro. Esse é o grande desafio hoje de quem defende a democracia", iniciou Moraes.

O fenômeno - batizado pelo ministro de "populismo digital" em trabalhos acadêmicos - busca uma "doutrinação em massa", uma "lavagem cerebral", defendeu Moraes.

Em sua exposição, o ministro identificou o que, na avaliação dele, são as causas da crise da democracia. "Para combater o mal, é importante conhecer suas raízes."

Moraes afirmou que o Brasil vive o retorno do que chamou de "discurso do 'tio do churrasco'" - uma visão de mundo preconceituosa, saudosista e ressentida -, o que se deve, no diagnóstico do ministro, à concentração de renda e à ampliação de direitos a grupos antes marginalizados, como pobres, mulheres e pessoas LGBTQIAP+.

"Vejam que isso pega principalmente, de início, homens brancos, heterossexuais, em torno de 45 anos para frente", resumiu o ministro. "Esse discurso surgiu por uma revolta contra determinados momentos em que crises econômicas achataram o modo de vida de uma determinada parcela da população. Há pessoas que ficaram com rancor pela universalização de direitos e pela excessiva concentração de renda."

Moraes argumentou que grupos políticos extremistas souberam explorar esse sentimento e que as grandes empresas de tecnologia se aliaram a eles em busca da maximização de seus lucros.

"As big techs não são enviadas de Deus, não são neutras, são grupos econômicos que querem dominar a economia e a política mundial, ignorando fronteiras, as soberanias nacionais, as legislações, para conseguir lucro", disse o ministro.

"A gente não pode deixar de reconhecer a genialidade disso. 'Democracia é um negócio', dizem eles. Tudo para as big techs é dinheiro, é um negócio. Só que é um negócio muito mais lucrativo, porque se pode fazer as leis, se pode mandar."

O ministro citou como exemplo o PL das Fake News. O projeto de lei para regulamentar as redes sociais foi retirado de pauta pelo Congresso após amplo lobby e pressão de grandes empresas de tecnologia, como Google e Telegram.

"Todas elas bombardearam nas redes dizendo que os parlamentares eram contra a democracia e a liberdade de expressão. Os algoritmos fizeram chegar milhares de mensagens aos parlamentares ameaçando, coagindo", lembrou Moraes.

O ministro também criticou a própria lógica de funcionamento das redes sociais, do engajamento pela indignação.

"Rede social é amor ou ódio. Não dá pra ter discussão séria. Meio termo não existe. E a notícia falsa ligada a discurso de ódio tem mais circulação que qualquer outro tipo de notícia."

Moraes desativou na semana passada o perfil que mantinha no X (antigo Twitter). O ministro brincou sobre a decisão de deixar a rede social: "Eu não posso nem sair do X que já me deduram".

A criação de limites legais para a operação das redes sociais é uma das bandeiras do ministro. O fenômeno do "populismo digital" foi tema da tese apresentada por ele como requisito para assumir a cadeira de professor titular na Faculdade de Direito da USP. Moraes conserva a posição de que as plataformas são lenientes com discursos de ódio e, em alguns casos, com conteúdos ilegais porque essas publicações geram engajamento e, por consequência, mais lucro. As empresas, por sua vez, consideram que exageradas as decisões para remover perfis.

O ministro já mandou tirar do ar, temporariamente, o X e o Telegram por descumprirem exigências previstas na legislação brasileira para operar no País. A plataforma de vídeos Rumble está sob bloqueio determinado por Moraes.

A aula abordou ainda os ataques mais comuns capitaneados por líderes neoautoritários, como as tentativas de lançar os sistemas de votação em descrédito e de interferir no Poder Judiciário.

"Atacar as eleições livres e periódicas 'queima o filme', então eles atacam a forma como as eleições são feitas. Nos Estados Unidos, a voto por carta. No Brasil, a urna eletrônica. Se fosse for sinal de fumaça a votação, iam atacar o sinal de fumaça. Por quê? Para descredibilizar o sistema democrático."

Sobre as investidas contra os tribunais constitucionais, por meio de tentativas de cooptar ministros ou de alterar regras de funcionamento interno, ampliando a composição das Cortes, por exemplo, Moraes ironizou: "Qualquer semelhança com a ditadura é mera coincidência histórica."

O ministro encerrou a aula com uma fala de defesa da Constituição. Ele afirmou que "todas as ideologias devem respeito à democracia e à Constituição".

"A Constituição de 1988, com todas as chuvas e trovoadas, aguentou dois impeachments e uma tentativa de golpe", disse. "As instituições devem criar estabilidade, segurança, devem ser um anteparo a qualquer arroubo extremista, antidemocrático. Devem fazer valer a Constituição."

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O presidente da Rússia, Vladimir Putin, manifestou interesse em cooperar com os Estados Unidos na área de metais raros. "Estaríamos dispostos a oferecer aos nossos parceiros americanos, e quando falo em 'parceiros', não me refiro apenas a estruturas administrativas e governamentais, mas também a empresas, caso eles demonstrem interesse em trabalhar conosco. Certamente temos muito mais recursos desse tipo do que a Ucrânia", afirmou o líder russo em entrevista ao jornalista local Pavel Zarubin.

Putin destacou que a Rússia é "um dos líderes em reservas desses metais raros e terras raras". Segundo ele, esses recursos estão localizados em regiões como Murmansk, no norte do país, no Cáucaso, em Cabárdia-Balcária, no Extremo Oriente, na região de Irkutsk, em Iacútia e em Tuva. "Estamos prontos para atrair parceiros estrangeiros para os nossos territórios históricos, que foram reintegrados à Federação Russa. Também há reservas lá. Estamos prontos para trabalhar com nossos parceiros, incluindo os americanos, nesses locais", acrescentou.

O presidente russo também criticou o líder ucraniano, Volodymyr Zelensky, afirmando que ele se tornou "uma figura tóxica" para as forças armadas da Ucrânia devido a ordens "estúpidas". "Isso leva a perdas desnecessárias e grandes, para não dizer enormes ou catastróficas, para o exército ucraniano", completou.

Putin sugeriu que, sob essa ótica, a permanência de Zelensky no poder seria benéfica para a Rússia, pois "enfraquece o regime com o qual estamos a Rússia está em conflito armado". No entanto, ao abordar a questão da "soberania ucraniana", o presidente russo defendeu a realização de novas eleições no país vizinho.

Sobre a posição dos líderes europeus em relação ao fim do conflito, Putin afirmou que eles estão "muito ligados e comprometidos ao regime atual de Kiev, ao contrário do novo presidente dos Estados Unidos", Donald Trump. "Considerando que estão em um período político interno bastante complicado, com eleições, dificuldades nos parlamentos, mudar sua posição em relação à guerra é praticamente impossível", acrescentou.

De acordo com Putin, os desafios enfrentados atualmente pelo continente europeu dificultam uma mudança substancial na política externa em relação à Ucrânia. "Eu não espero que nada mude aqui. Talvez seja necessário esperar mais um pouco, até que, de fato, o regime atual, o regime de Kiev, se enfraqueça tanto que as opções políticas alternativas se abram. Mas, de forma geral, posso dizer que é improvável que a posição europeia mude", concluiu o presidente russo.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou que gostaria que houvesse um acordo direto para o fim da guerra da Ucrânia, mas não descartou a possibilidade de haver um cessar-fogo no momento.

Os comentários foram feitos em coletiva de imprensa ao lado do presidente da França, Emmanuel Macron, que foi recebido nesta segunda-feira na Casa Branca.

O presidente da França, Emmanuel Macron, afirmou que um acordo sobre os minerais ucranianos pode ajudar a garantir a soberania da Ucrânia. "Avançamos em passos significativos em nosso encontro. Conversamos sobre desejo de paz duradoura", afirmou Macron, em entrevista coletiva ao lado do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que o recebeu nesta segunda-feira, 24, na Casa Branca após o republicano abrir espaço em sua agenda para o encontro.

Reiterando que compartilha do desejo de paz duradoura, Macron ressalvou que a paz não pode significar a rendição da Ucrânia. "Ninguém quer viver em um mundo em que os fortes podem violar fronteiras".

"Precisamos garantir paz para a Ucrânia e toda a região", afirmou, Macron. "Europa está comprometida com a paz duradoura. Europeus estão dispostos a fazer mais e ir mais longe", completou.