Liberdade de imprensa cai a pior nível no mundo, e Brasil ganha posição pós-Bolsonaro, diz RSF

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O indicador do Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa, da ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF), manteve em 2025 a queda registrada nos últimos anos e chegou ao pior nível da história.

 

O Brasil, por sua vez, foi um dos poucos países no mundo a melhorar no ranking, em razão do fim do governo de Jair Bolsonaro (2019-2022). As informações constam no relatório de análise global divulgada nesta sexta-feira, 2.

 

Pela primeira vez, a pontuação média de todos os países avaliados pela RSF caiu abaixo de 55 pontos, o limite que qualifica a situação da liberdade de imprensa como "difícil". Mais de seis em cada dez países tiveram piora no ranking.

 

A ONG aponta que o ambiente econômico deteriorado, que dificulta a viabilidade financeira de veículos jornalísticos, é peça-chave para entender a queda no índice. "Embora as agressões físicas contra jornalistas sejam o aspecto mais visível dos ataques à liberdade de imprensa, pressões econômicas mais insidiosas também representam um obstáculo significativo", diz o documento.

 

Concentração da propriedade dos meios de comunicação, pressão de anunciantes ou financiadores, ausência, restrição ou atribuição opaca de auxílios públicos, dizem os pesquisadores, vem ajudando a enfraquecer o jornalismo exercido no mundo. Sem dinheiro, muitos veículos precisam decidir entre a garantia de sua independência editorial e a sobrevivência de seus negócios.

 

O indicador relativo às restrições econômicas à mídia e às condições financeiras do jornalismo é, entre os cinco indicadores que compõem o Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa (segurança, social, legislativo, político e econômico), o principal fator que arrasta para baixo a pontuação geral dos países em 2025. O único critério que registra uma melhora contínua é o da segurança.

 

"Quando um meio de comunicação está economicamente enfraquecido, ele é arrastado pela corrida por audiência, em detrimento da qualidade, e pode se tornar presa fácil de oligarcas ou de tomadores de decisão pública que o exploram. Quando os jornalistas estão empobrecidos, eles deixam de ter meios para resistir aos adversários da imprensa, que são, muitas vezes, promotores de desinformação e de propaganda", diz Anne Bocandé, diretora editorial do RSF.

 

O documento menciona diversos países que tiveram quedas, algumas delas expressivas, no ranking, em meio ao recrudescimento de censura em regimes autoritários. Já o Brasil é mencionado como um dos poucos casos positivos no mundo.

 

O relatório descreve que o País está na 63º colocação e "continua sua ascensão após a era Bolsonaro, com um salto de 47 posições desde 2022. Essa evolução reflete a percepção de um clima menos hostil ao jornalismo e o País se destaca como um dos poucos a melhorar seu indicador econômico".

 

Artur Romeu, diretor do escritório da RSF para a América Latina, diz que o Brasil é um dos destaques positivos do levantamento global ao subir 19 posições - 47 desde 2022. O País vem de três anos de progressão.

 

"Um dos fatores (que explicam a melhora) é uma mudança de paradigma na relação entre governo e imprensa que se deu com a alternância de poder", diz Romeu, em referência ao clima hostil oferecido pelo governo Bolsonaro aos profissionais de comunicação. "(Além do mais), o governo atual tem colocado no centro da sua agenda o debate sobre integridade da informação e a preocupação com o caos desinformacional".

 

O diretor da RSF afirma, no entanto, que o Brasil se encontra entre os países onde a liberdade de imprensa é considerada problemática. A segurança para a produção de reportagens sensíveis envolvendo autoridades e a ameaça à integridade física dos jornalistas são dois dos indicadores que "seguram" o contexto brasileiro em níveis insatisfatórios.

 

Em 42 países, representando mais da metade da população mundial (56,7%), a situação é considerada "muito grave" pela RSF. A Nicarágua (172º) é mencionada como o país que se tornou aquele com a pior pontuação da América Latina, atrás até mesmo de Cuba (165º). El Salvador (135º), do autoritário Nayib Bukele, mantém sua trajetória de queda: 61 posições perdidas desde 2020.

 

A Argentina (87º) de Javier Milei, por sua vez, caiu 47 posições no ranking nos últimos dois anos. No Haiti (111º), "o colapso do Estado e a violência de gangues transformaram o jornalismo em uma profissão de alto risco. O país caiu 22 posições no Ranking".

 

Bia Barbosa, coordenadora de Incidência do escritório do RSF para a América Latina e participante do painel sobre imprensa livre, do "Fórum Liberdade de Expressão - 150 anos em defesa da liberdade e da democracia", promovido pelo Estadão nesta terça-feira, 29, destacou no evento que o Brasil faz parte de um contexto sul-americano mais amplo: a região é campeão no assassinato de comunicadores no mundo, segundo ela. Ela afirmou que fora dos grandes centros urbanos existe maior vulnerabilidade às autoridades locais, o que pode colocar o jornalismo entre a independência e a sobrevivência econômica.

 

Além disso, a maior ameaça à liberdade de imprensa no Brasil e no mundo detectada pela Repórteres Sem Fronteiras, disse ela, é a ascensão da extrema direita. "Principalmente porque essa distorção e apropriação do conceito de liberdade de expressão, que é feita pela extrema direita, tem bloqueado iniciativas importantes para garantir a liberdade de imprensa", declarou ela.

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O presidente dos EUA, Donald Trump, disse nesta quarta, 6, que há uma boa chance de um encontro entre ele, o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, e o presidente russo, Vladimir Putin, "em breve".

O republicano afirmou, em coletiva no Salão Oval, que ainda não foi decidido onde ocorrerá a cúpula entre os líderes e preferiu não revelar se o fim do conflito na Ucrânia está próximo. "Já fiquei desapontado antes", pontuou.

Quando perguntado por um repórter sobre mais sanções secundárias ao petróleo russo, Trump respondeu: "você verá muito mais".

"Posso impor tarifas à China pela compra de petróleo russo", enfatizou ele.

O mandatário ainda comentou que seu governo encomendou bombardeiros B-2 novos, que está considerando levar a Guarda Nacional para Washington e que a gasolina deve ficar abaixo dos US$ 2 o galão no país.

O maior incêndio florestal da França deste verão se espalhou rapidamente nesta quarta-feira, 6, em uma região mediterrânea perto da fronteira com a Espanha, após deixar uma pessoa morta, disseram as autoridades. O incêndio queimou uma área maior que Paris.

O primeiro-ministro francês, François Bayrou, afirmou ser um "desastre em uma escala sem precedentes" na região.

Mais de 2.100 bombeiros e várias aeronaves lutaram contra o incêndio que começou na tarde de terça-feira na vila de Ribaute, na região de Aude, uma área rural e arborizada que abriga vinícolas.

O incêndio, que queimou 13.000 hectares, permaneceu "muito ativo" hoje, disse a administração local em um comunicado. O tempo estava quente, seco e ventoso, dificultando o trabalho dos bombeiros.

O ministro do Interior, Bruno Retailleau, disse que os militares reforçarão os esforços a partir de quinta-feira, com várias dezenas de soldados a serem convocados.

A vigilância e espionagem em larga escala de palestinos por Israel, praticados através de dados coletados em câmeras, checkpoints, reconhecimento facial, registro de chamadas telefônicas e outros métodos, possui apoio da maior empresa de softwares do planeta: a Microsoft. A informação foi revelada por uma investigação jornalística do jornal britânico The Guardian junto com o canal hebraico Local Call e a Revista +972, sediada em Israel, publicada nesta quarta-feira, 6.

Segundo a investigação, a unidade de vigilância do Exército israelense, chamada Unidade 8200, tem um acordo desde 2022 com a empresa para armazenar dados de vigilância e espionagem - em específico, chamadas telefônicas gravadas - em servidores da Europa. A meta seria armazenar cerca de um milhão de chamadas telefônicas por hora.

A parceria teria sido firmada durante um encontro entre o presidente da Microsoft, Satya Nadella, e o comandante da Unidade 8200, Yossi Sariel, em Seattle, nos EUA, no final de 2021 - portanto, cerca de dois anos antes do ataque terrorista do grupo Hamas em 7 de outubro de 2023. No encontro, Sariel obteve de Nadella a garantia de que teria acesso a uma área específica da Azure, o sistema de nuvens da Microsoft.

A Microsoft alegou aos jornais que Nadella desconhecia o tipo de dados que a Unidade 8200 planejava armazenar no Azure. Entretanto, uma série de documentos vazados da empresa e entrevistas com 11 fontes, tanto da empresa quanto da inteligência militar israelense, indicam como o Azure foi utilizado pela Unidade 8200 para guardar um vasto arquivo de comunicações cotidianas entre palestinos, tanto da Faixa de Gaza quanto da Cisjordânia.

De acordo com três fontes da Unidade 8200 ouvidas pelos jornalistas, a plataforma de armazenamento facilitou a preparação de ataques aéreos mortais e moldou operações nos territórios palestinos.

Israel intercepta chamadas telefônicas nos territórios palestinos ocupados há anos, por causa do controle que exerce sobre a infraestrutura de telecomunicações palestina, mas o novo sistema com a Microsoft expandiu a capacidade. Sob a parceria, um grupo muito maior de civis passou a ter as conversas capturadas.

Fontes de inteligência com conhecimento do projeto disseram aos jornalistas que Sariel, o comandante da Unidade 8200, recorreu à Microsoft após concluir que não teria espaço de armazenamento ou poder de computação suficiente nos servidores militares de Israel para suportar armazenar ligações telefônicas de toda a população.

O sistema foi criado para ficar nos servidores da Microsoft, protegido por uma segurança aprimorada, desenvolvida pelos engenheiros da empresa, de acordo com as instruções da Unidade 8200. Arquivos da Microsoft obtidos pelos jornalistas sugerem que grande parte dos dados confidenciais da unidade podem estar agora em servidores na Holanda e na Irlanda.

Fontes da Unidade 8200 afirmaram que informações obtidas em chamadas telefônicas registradas foram utilizadas para pesquisar e identificar alvos de bombardeio em Gaza. Uma das fontes informou que, ao planejar um ataque aéreo contra um indivíduo em área densamente povoada, com civis presentes, os militares usariam o sistema para examinar chamadas feitas por pessoas nas imediações.

Eles acrescentaram que o sistema passou a ser ainda mais utilizado com a campanha militar na Faixa de Gaza, que já deixou mais de 60 mil mortos no território, a maioria civis. Mais de 18 mil crianças morreram durante a campanha.

O foco inicial do sistema, no entanto, era a Cisjordânia, onde cerca de três milhões de palestinos vivem sob ocupação militar israelense. Segundo as fontes militares, muitas vezes as informações armazenadas no Azure foram utilizadas para chantagear, prender ou assassinar pessoas.

"Quando eles precisam prender alguém e não há um motivo bom o suficiente para isso, é aí que eles encontram a desculpa", afirmou uma das fontes ouvidas pelo Guardian, Local Call e Revista +972, referindo-se às informações armazenadas na nuvem.

Um porta-voz da Microsoft afirmou que não tinha "nenhuma informação" sobre o tipo de dados armazenados e que o "envolvimento da empresa com a Unidade 8200 se baseia no reforço da segurança cibernética e na proteção de Israel contra ataques cibernéticos de Estados e terroristas".

"Em nenhum momento durante esse envolvimento, a Microsoft teve conhecimento da vigilância de civis ou da coleta de suas conversas telefônicas usando os serviços da Microsoft, inclusive por meio da revisão externa que encomendou", afirmou a empresa.

Nos últimos meses, a Microsoft sofreu pressão de funcionários investidores por causa dos laços com o Exército israelense e o papel que a sua tecnologia desempenhou contra os palestinos em Gaza. Em maio deste ano, um funcionário interrompeu um discurso de Nadella em um ato de protesto para gritar: "Que tal você mostrar como os crimes de guerra israelenses são alimentados pelo Azure?"

'Rastrear todos, o tempo todo'

Segundo a reportagem do The Guardian, Yossi Sariel, que comandou a Unidade 8200 entre 2021 e 2024, foi o grande responsável do projeto de vigilância em larga escala. Ele começou a expandir a vigilância após uma onda de ataques mortais jihadistas em 2015, muitos dos quais eram feitos por adolescentes palestinos desconhecidos pelos serviços de espionagem.

A resposta de Sariel era "rastrear todos, o tempo todo". Em vez da vigilância tradicional de alvos específicos, o projeto de Sariel se baseou na vigilância em massa de palestinos na Cisjordânia e utilizou novos métodos de IA para extrair informações.

Quando se tornou comandante da Unidade 8200 no início de 2021, ele teria priorizado a formação de uma parceria com a Microsoft para dar à inteligência militar a capacidade de ir mais longe. Com base em registros internos do encontro, os jornalistas concluíram que Sariel não declarou explicitamente a Nadella o plano de registrar chamadas telefônicas. Em vez disso, teria dito que eram dados secretos "de trabalhos sensíveis".

Os documentos analisados sugerem que os engenheiros da Microsoft entenderam que os dados armazenados no Azure incluiriam inteligência bruta, incluindo arquivos de áudio, enquanto alguns funcionários da Microsoft baseados em Israel, incluindo ex-alunos da Unidade 8200, parecem ter conhecimento do que a unidade esperava com o projeto.

Arquivos sugerem que, até julho deste ano, 11.500 terabytes de dados militares israelenses - o equivalente a aproximadamente 200 milhões de horas de áudio - estavam armazenados nos servidores Azure. Não está claro se todos esses dados pertencem à Unidade 8200; alguns podem pertencer a outras unidades militares israelenses, disseram os jornalistas.

Diversas fontes insistiram que a parceria havia impedido ataques mortais contra israelenses, disse o jornal The Guardian. Uma delas teria dito que "salvar vidas" de israelenses era o principal motivo de Sariel para se aproximar da Microsoft.

Entretanto, a vigilância falhou notavelmente em impedir os ataques do Hamas em 7 de outubro de 2023, nos quais quase 1,2 mil pessoas foram mortas no sul de Israel e 240 foram sequestradas.

Após os ataques, Sariel foi criticado pela aparente priorização de tecnologias "viciantes e empolgantes" em detrimento de métodos de inteligência tradicionais. Os críticos dele afirmam que isso contribuiu para o desastre. Sariel renunciou ao cargo no ano passado, assumindo a responsabilidade pela "participação da 8200 no fracasso operacional e de inteligência".