'Compras no Brás' e 'buscar a sogra': STJ mantém condenação de vereador por usar carro oficial

Política
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O ministro Marco Aurélio Bellizze, do Superior Tribunal de Justiça, manteve a condenação do vereador David Bueno (Solidariedade), presidente da Câmara de Itatiba, interior de São Paulo, por ato de improbidade administrativa em razão do uso da frota de veículos oficiais 'para finalidades alheias ao interesse público'.

O Estadão pediu manifestação do vereador. O espaço está aberto.

Segundo ação do Ministério Público estadual, entre 2009 e 2011 - quando exercia seu primeiro mandato e se tornou o presidente mais jovem do Legislativo do município com 120 mil habitantes localizado a 85 quilômetros da capital, região de Campinas -, David Bueno teria autorizado o uso em larga escala de veículos oficiais para atividades particulares de terceiros e de si próprio.

O documento 'relatórios de viagens' da direção da Câmara indica que a frota foi usada para 'ida à farmácia', 'realização de exame de DNA', 'transporte de pacientes para hospitais', 'levar cidadão para obter passaporte', 'buscar visto relacionado ao vereador D.B.', 'emissão de passaporte para a genitora do vereador', 'emissão de passaporte para a esposa do vereador'.

Ainda: 'buscar cadeira para filha da funcionária Â', 'levar filha da funcionária  para dentista', 'visita de familiar a preso', 'levar cidadão para fazer exame psicotécnico', 'obter informações na central de intercâmbios', 'levar familiar de preso para visita na penitenciária', 'levar cidadão para entrevista', 'buscar interna com familiares para passar as festividades em Itatiba', 'ida a prédio comercial', 'buscar documento na clínica', 'levar senhora ao terminal rodoviário', 'ida ao Poupatempo para renovação de documento do funcionário W', 'fazer compras na região do Brás', 'buscar sogra do vereador', 'realização de matrícula de aluno', 'buscar familiares (L.C.S.) na rodoviária', 'realizar teste ergométrico'.

Os relatórios indicam também diversas viagens a universidades, Poupatempo, INSS, clínicas médicas, shopping center, churrascaria e bancos, 'entre outros, cujas finalidades sequer são indicadas, tampouco os passageiros'.

Em sua decisão, o ministro Bellizze negou provimento a um agravo em recurso especial impetrado pela defesa do presidente da Câmara de Itatiba e derrubou efeito suspensivo da condenação imposta ao vereador em âmbito de ação civil pública por improbidade.

Na ação, a Promotoria sustentou que David Bueno utilizou diversas vezes carros oficiais para serviços particulares em seu favor e de sua família e também para levar eleitores de sua base para resolver questões pessoais, com suposto intuito de se beneficiar politicamente.

O vereador foi condenado em primeira instância e também em segunda, no Tribunal de Justiça de São Paulo. Ele recorreu ao STJ e conseguiu uma decisão de efeito suspensivo da sanção imposta com base na Lei de Improbidade. Com o julgamento do agravo em recurso especial caiu o efeito suspensivo, ou seja, ele poderá ter de indenizar os cofres públicos e arcar com multas.Também pode perder o direito de exercer cargo público e ficar proibido de contratar por 10 anos com o poder público ou receber benefícios fiscais do governo.

Em seu voto, Bellizze transcreveu trechos do acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo. "É absolutamente reprovável que o réu, exercendo o mandato de vereador, se valha de veículos oficiais para buscar tratamento médico pessoal e para facilitar o acesso de sua genitora e de sua esposa aos serviços de emissão de passaporte e de visto para um país estrangeiro."

Em outro trecho, diz o acórdão. "Quando a utilização do veículo não lhe favorecia diretamente, o réu viabilizava que terceiros estranhos às funções oficiais se beneficiassem, incorrendo, assim, no artigo 10 da Lei 8.429/92 (Lei da Improbidade)."

Segundo os desembargadores do Tribunal paulista que confirmaram a condenação de David Bueno em primeira instância, 'é questionável o elemento volitivo na conduta do réu que, na condição de vereador do município de Itatiba, utilizou indevidamente os veículos oficiais da Câmara Municipal, bem como anuiu, direta e indiretamente, com sua utilização para fins estranhos às atividades parlamentares, em evidente ato ímprobo causador de prejuízo ao Erário'.

A Justiça concluiu que 'a partir da análise dos relatórios de viagem, bem como das demais provas produzidas nos autos', descortinou-se a 'verdadeira utilização generalizada dos veículos oficiais da Câmara Municipal de Itatiba para as mais diversas finalidades particulares de interesse exclusivos dos vereadores, seus assessores e respectivos familiares, bem como para o atendimento de interesses específicos de determinados cidadãos, em evidente desvio de finalidade'.

Para a Justiça, não restaram dúvidas da 'utilização dos veículos oficiais como instrumentos de popularidade dos vereadores do município de Itatiba, mediante a realização de favores absolutamente estranhos à atividade parlamentar destes, privilegiando cidadãos que buscavam o atendimento de necessidades particulares'.

Em primeiro grau, a Justiça de São Paulo já havia destacado. "(...) O conjunto probatório é bastante robusto e leva à inequívoca conclusão de que o réu se utilizou dos veículos oficiais da Câmara dos Vereadores de Itatiba para o uso pessoal e de seus familiares, e também para viabilizar o uso de terceiros estranhos ao quadro de servidores. Em todas as hipóteses, a utilização das viaturas oficiais ocorreu sem qualquer pertinência com a atividade de vereador. (...)."

Para o ministro Marco Aurélio Bellizze, 'verifica-se do acórdão que ficou comprovado que o agente no exercício de suas atribuições que lhe incumbia, utilizou veículos oficiais da Câmara Municipal de Itatiba, anuindo de forma direta e indiretamente, para fins estranhos às atividades parlamentares dos vereadores'.

Segundo Bellizze, ficou 'tudo evidenciado diante do quadro fático-probatório dos autos'.

"Em face dessa conclusão, mostra-se inviável, por meio do julgamento do recurso especial, que o Superior Tribunal de Justiça altere o posicionamento adotado pela instância ordinária, pois, para tanto, seria necessário o revolvimento dos fatos e das provas acostadas aos autos, o qual é vedado pela Súmula 7/STJ", assinala o ministro, em sua decisão datada de 10 de junho.

"As penas aplicadas devem ser mantidas, porquanto guardam pertinência com a atual redação do artigo 12 da Lei 8.429/1992", anotou o ministro. "Ante o exposto, conheço do agravo para conhecer parcialmente do recurso especial e, nessa extensão, negar-lhe provimento, com a consequente revogação do efeito suspensivo."

COM A PALAVRA, O VEREADOR DAVID BUENO

O vereador David Bueno ainda pode recorrer da sentença. Em juízo, ele afirmou que direcionava 'todos os pedidos de deslocamentos de munícipes ou os seus próprios à Diretoria da Câmara' e que não se recordava de nenhuma viagem realizada ao Poupatempo ou hospitais fora da cidade. Ressaltou que 'o caso do sr. S. seria isolado'.

David Bueno admitiu que 'autorizou o deslocamento de sua genitora para a Polícia Federal, na cidade de Campinas, para retirada de passaporte, não se recordando se esta também utilizou o veículo oficial para realizar visita ao Consulado Americano'.

A reportagem do Estadão pediu, sem sucesso, manifestação do vereador David Bueno, presidente da Câmara de Itatiba, via e-mail e mensagens por WhatsApp. O espaço segue aberto. (Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.)

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O Irã não vai permitir que a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) realize inspeções nas instalações nucleares de Fordow, Natanz e Isfahan, as principais unidades de enriquecimento de urânio do país, bombardeadas há cinco dias pelos Estados Unidos. O país paralisou temporariamente a colaboração com o órgão, informou nesta quinta-feira, dia 26, a Embaixada do Irã em Brasília.

Questionado pelo Estadão/Broadcast se o Irã permitiria a verificação nas plantas nucleares, o embaixador iraniano no Brasil, Abdollah Nekounam, afirmou que o Conselho de Guardiões do Irã aprovou uma resolução, que já havia passado no Parlamento do país, e obriga o governo a suspender toda a colaboração com a agência das Nações Unidas, prevista no Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares, o TNP.

O Conselho de Guardiões exerce forte influência no sistema decisório iraniano. O órgão tem 12 membros, entre clérigos e juristas, que revisam eleições, até selecionando candidatos, e a aprovação de leis para verificar a conformidade com a lei islâmica.

O período da suspensão não foi informado, mas segundo o embaixador será uma paralisação temporária. A agência iraniana Tasnim noticiou que 221 legisladores aprovaram a lei no parlamento, por unanimidade dos presentes, e que a suspensão vai durar até que haja proteção aos cientistas e centros nucleares do país.

A ONU, por meio da AIEA, pressionava o Irã por transparência e, desde os ataques da noite de sábado, dia 21, pedia um acordo que permitisse o acesso de seus técnicos mantidos em solo iraniano às instalações, a fim de determinar a extensão dos danos e eventuais riscos à retomada da operação.

O Irã, por outro lado, chegou a dizer que os ataques dos EUA foram realizados "sob a sombra da indiferença e até mesmo com o apoio da Agência Internacional de Energia Atômica". Em maio, a agência reportou que o Irã enriquecia urânio em ritmo acelerado a 60%, mais próximo dos 90% necessários para fabricação de uma bomba atômica.

Relatórios de inteligência fornecidos a governos da Europa apontam que o estoque de urânio enriquecido do Irã permanece em grande parte intacto após os ataques dos EUA. O novo indício de que o material radioativo escapou das bombas americanas foi revelado nesta quinta-feira, 26, pelo jornal britânico Financial Times, citando duas fontes de governos europeus.

Segundo o jornal, o relatório indica que 408 quilos de urânio enriquecido a 60% não estavam concentrados apenas na instalação nuclear de Fordow no momento do ataque americano e foram distribuídos para outras localidades. As novas informações voltam a questionar a afirmação do presidente dos EUA, Donald Trump, de que o bombardeio havia "acabado" com o programa nuclear do Irã.

As fontes citadas pelo Financial Times afirmam que os governos da Europa estavam esperando por um relatório de inteligência completo sobre os danos em Fordow. A avaliação parcial é de que a instalação sofreu "danos extensos, mas não destruição completa".

O Irã sinalizou que o estoque de urânio enriquecido foi movido antes dos ataques americanos. Imagens de satélite mostraram uma movimentação intensa de cerca de 20 caminhões em Fordow, dois dias antes dos ataques americanos.

Destruição

Ontem, em entrevista à Radio France Internationale, Rafael Grossi, diretor da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), ligada à ONU, afirmou que as centrífugas da usina de Fordow "não estão mais operacionais".

Os inspetores da AIEA não conseguiram ainda acessar as centrais atingidas pelos bombardeios, mas Grossi declarou que, embora seja difícil avaliar os danos apenas com imagens de satélite, o poder das bombas e as características técnicas da instalação fazem com que já seja possível dizer que "essas centrífugas não estão funcionando".

A questão vem se tornando central para Trump, que insiste na tese de que os bombardeios destruíram completamente o programa nuclear iraniano. Ontem, o presidente americano acusou os democratas de divulgarem o relatório da agência de inteligência do Pentágono (DIA), que constatou que os ataques foram ineficazes e atrasaram o programa nuclear em apenas alguns meses. "Foram os democratas que entregaram as informações. Eles deveriam ser processados", escreveu o presidente em sua rede social.

Na quarta-feira, 25, Trump pediu a demissão da correspondente da CNN Natasha Bertrand, que relatou a existência do relatório. "Ela (Natasha Bertrand) deveria ser demitida da CNN. Eu a assisti por três dias fazendo fake news. Ela deveria ser repreendida imediatamente e depois expulsa como um cachorro."

Ajuda

O secretário de Defesa dos EUA, Pete Hegseth, tentou ontem dar força à versão de Trump, oferecendo descrições mais detalhadas dos ataques aéreos, mas sem novas avaliações sobre o estado do programa nuclear iraniano ou dos danos às instalações. Ele rejeitou o relatório da DIA, que é vinculada ao seu próprio departamento, e citou uma série de outras informações de inteligência - de fontes americanas, israelenses, iranianas e da agência nuclear da ONU - para reiterar que a ação foi "historicamente bem-sucedida".

Ao dar suas declarações, Hegseth atacou a imprensa por não celebrar o trabalho do presidente, afirmando que a divulgação do relatório da DIA, e sua publicação pela CNN e pelo New York Times, teve "motivação política" com objetivo de "prejudicar a imagem do presidente". (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

O governo de Israel bloqueou a principal rota de ajuda humanitária para a Faixa de Gaza nesta quinta-feira, 26, enquanto ataques e bombardeios continuam. Segundo o primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu, a rota, localizada no norte de Gaza, foi fechada porque membros do Hamas estavam roubando a ajuda entregue. Netanyahu não apresentou provas da acusação.

A alegação do premiê acontece após vídeos mostrarem homens encapuzados em torno de caminhões de ajuda. Líderes comunitários palestinos negaram que se tratassem de membros do Hamas e disseram que faziam proteção aos caminhões. Com o aumento da miséria em Gaza, alertada pela ONU há um mês, roubos de alimentos se tornaram mais frequentes.

"Os clãs vieram para formar uma posição para impedir que agressores e ladrões roubem a comida que pertencem ao nosso povo e a leve aos comerciantes para vender a preços altos", disse um dos líderes comunitários, Abu Salman Al-Moghani, à agência de notícias Reuters.

Al-Moghani rejeitou haver alguma ligação com o Hamas, que perdeu o controle de uma parte do território palestino desde o início da guerra atual, após o ataque terrorista de 7 de outubro. O grupo também disse não ter ligação com o episódio gravado.

Segundo as autoridades israelenses, a passagem ficará fechada durante dois dias. Isso ocorre em meio à restrição feita por Israel da entrega de ajuda sob a liderança da ONU, há cerca de um mês. Um novo sistema de distribuição de alimentos, operado por uma organização privada americana, foi implementado pelos israelenses.

No sul do território, onde o grupo privado ficou responsável por distribuir alimentos, as mortes de civis por soldados israelenses são frequentes. De acordo com as autoridades de Gaza, pelo menos 549 palestinos foram mortos enquanto tentavam obter comida. A organização, chamada Fundação Humanitária de Gaza (GHF, na sigla original), começou a operar há cerca de um mês.

As autoridades de Gaza chamaram os centros operados pela organização, chamada Fundação Humanitária de Gaza (GHF, na sigla original) de "armadilhas mortais". O Exército israelense reconheceu que os soldados abriram fogo em diversas ocasiões, alegando que o fizeram depois que pessoas se aproximaram deles de uma forma que consideraram ameaçadora.

Enquanto isso, os líderes europeus reunidos em Bruxelas, na Bélgica, para a cúpula da União Europeia lamentaram "a terrível situação humanitária na Faixa de Gaza, o número inaceitável de vítimas civis e os níveis de fome". No dia 20, um relatório da UE encontrou "indícios" de que Israel viola as obrigações de direitos humanos contido nos acordos de cooperação com o bloco, que formam base para os laços comerciais.

O primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez, descreveu a situação na Faixa de Gaza como genocídio. Ele se tornou o líder europeu mais proeminente a descrever a situação com o termo, utilizado por organizações como a ONU e a Anistia Internacional com base nas ações de Israel em Gaza. A África do Sul também denunciou Israel de genocídio ante o Tribunal Penal Internacional (TPI). Outros 14 países solicitaram a entrada no caso.

As discussões de um novo cessar-fogo também se intensificaram nos últimos dias, de acordo com a declaração de um oficial do Hamas, Taher al-Nunu. O presidente dos EUA, Donald Trump, chegou a afirmar a jornalistas que há um "grande progresso sendo feito em Gaza" na direção de um cessar-fogo, mas não há nenhuma evidência de um acordo próximo a ser concluído.