TCU vai afastar auditor que produziu 'relatório paralelo' citado por Bolsonaro

Política
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O Tribunal de Contas da União (TCU) vai afastar do cargo por 60 dias o servidor que produziu um documento sobre mortes na pandemia do novo coronavírus. O pedido foi feito pelo corregedor do tribunal, ministro Bruno Dantas, que também sugere proibir o auditor Alexandre Figueiredo Costa Silva Marques de entrar no prédio do órgão e a abertura de um inquérito policial para investigar sua conduta. O Estadão apurou com integrantes do tribunal que os pedidos devem ser aceitos pela presidente da Corte de Contas, ministra Ana Arraes.

O levantamento não oficial feito por Marques aponta "supernotificação" de mortes por covid-19 no País. O relatório foi inserido no sistema do TCU sem que constasse de qualquer processo do órgão. Esse documento foi citado na segunda-feira, 7, pelo presidente Jair Bolsonaro para comprovar sua tese de que cerca de metade dos óbitos registrados como covid-19 não seriam causados pela doença. O tribunal o desmentiu no mesmo dia.

O corregedor do TCU afirma que o afastamento de Marques do cargo é necessário para que o auditor não influencie nas apurações sobre o caso. Dantas também pede que o servidor seja impedido de acessar o sistema eletrônico do tribunal. Segundo o ministro, a divulgação de informações oficiais do tribunal de maneira não autorizada representaria infração disciplinar.

"Ainda mais grave, e isso precisará ser melhor apurado, é a manipulação da atividade fiscalizatória do TCU em razão de sentimento pessoal ou orientação política ou ideológica", avaliou o ministro. Ele sugere que a Polícia Federal investigue se houve crime de prevaricação, que diz respeito a atos contra a administração pública visando interesse pessoal.

Marques é auditor do TCU desde 2008 e é próximo aos três filhos de Bolsonaro, o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ). Em 2019, ele chegou a ser indicado a comandar a diretoria de compliance do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O presidente do banco é Gustavo Montezano, também próximo da família Bolsonaro.

A nomeação, no entanto, foi barrada pelo então presidente do TCU, José Múcio Monteiro, que chamou a atenção para o fato de que um servidor do tribunal não poderia ser cedido para uma instituição que pudesse ser alvo de apuração da Corte de Contas. "O regimento não permite, é a coisa mais simples", disse Múcio ao Estadão.

De acordo com o currículo informado pelo BNDES, Marques é primeiro-tenente fuzileiro naval reserva da Marinha. Ele é formado em direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e bacharel em Ciências Navais pela Escola Naval. Em Brasília, já trabalhou nos ministérios da Justiça e do Planejamento.

O auditor tem uma página no Facebook onde divulga vídeos expondo opiniões sobre política. Na rede social, o servidor conta que nasceu e cresceu no Rio de Janeiro, mas mora desde 2015 em Jundiaí (SP). Ele é casado com Nara Stuart de Pieri, enfermeira e filha do vereador paulistano Eliseu Gabriel (PSB), filiado a um partido de oposição a Bolsonaro.

Em seu perfil pessoal, Marques endossa narrativas espalhadas pelo governo federal, como a recomendação do tratamento precoce com substâncias sem eficácia comprovada de combate à covid.

Em sessão nesta quarta-feira, 9, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid no Senado aprovou a convocação de Marques para tentar explicar o episódio. O requerimento foi apresentado pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE). "Para que seja possível esclarecer os detalhes de sua participação na elaboração de 'estudo paralelo' apontando que metade das mortes no País pelo coronavírus não teriam ocorrido, tratando-se de expediente de Governadores para obterem mais recursos do Executivo Federal, faz-se necessária a convocação do senhor Alexandre Figueiredo Costa Silva Marques, auditor do Tribunal de Contas da União", disse o senador.

Desmentido

Na segunda-feira, 7, ao conversar com apoiadores no Palácio da Alvorada, Bolsonaro atribuiu a informação sobre supernotificação de mortes ao próprio TCU, mas foi desmentido na sequência. Em nota, o tribunal disse que não "há informações em relatórios do tribunal que apontem que 'em torno de 50%' dos óbitos por covid no ano passado não foram por covid, conforme afirmação do presidente Jair Bolsonaro".

No dia seguinte, o presidente admitiu o erro ao atribuir o dado ao TCU, mas, mesmo sem apresentar qualquer prova, manteve o discurso de que metade das mortes registradas como covid-19 não foram causadas pela doença.

Alguns dos apoiadores do governo reproduziram o relatório do servidor do TCU que aponta a "supernotificação" de mortes por covid para reforçar a narrativa. Em nova nota, a corte de contas esclareceu que o levantamento não era oficial. "O TCU reforça que não é o autor de documento que circula na imprensa e nas redes sociais intitulado 'Da possível supernotificação de óbitos causados por Covid-19 no Brasil'", diz trecho da nota divulgada ontem.

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Mais de 10 pessoas morreram nesta terça-feira, 29, após confrontos em um subúrbio da capital da Síria entre combatentes drusos e grupos pró-governo, disseram um monitor de guerra e um grupo ativista. Os dados de vítimas, no entanto, ainda são imprecisos.

Homens armados drusos sírios entraram em confronto nas últimas semanas com forças de segurança do governo e homens armados pró-governo no subúrbio de Jaramana, no sul de Damasco.

O Observatório Sírio para os Direitos Humanos, sediado no Reino Unido, afirmou que pelo menos 10 pessoas foram mortas, quatro delas agressores e seis moradores de Jaramana. O coletivo de mídia ativista Suwayda24 afirmou que 11 pessoas foram mortas e 12 ficaram feridas. Outros relatos indicam até 14 mortos.

Os confrontos começaram por volta da meia-noite de segunda-feira, 28, depois que uma mensagem de áudio circulou nas redes sociais em que um homem estaria criticando o profeta Maomé.

O áudio foi atribuído ao clérigo druso Marwan Kiwan. Mas ele afirmou em um vídeo postado nas redes sociais que não era responsável pelo áudio, o que irritou muitos muçulmanos sunitas.

"Nego categoricamente que o áudio tenha sido feito por mim", disse Kiwan. "Eu não disse isso, e quem o fez é um homem perverso que quer incitar conflitos entre partes do povo sírio."

Na terça-feira à noite do horário local, representantes do governo e autoridades de Jaramana chegaram a um acordo para encerrar os conflitos, indenizar as famílias das vítimas e trabalhar para levar os perpetradores à justiça, de acordo com uma cópia do acordo que circulou em Jaramana e foi vista pela Associated Press.

Não ficou imediatamente claro se a trégua será mantida por muito tempo, já que acordos semelhantes no passado fracassaram posteriormente.

O Ministério do Interior afirmou em comunicado que estava investigando o áudio, acrescentando que a investigação inicial demonstrou que o clérigo não era responsável. O ministério pediu à população que cumpra a lei e não aja de forma a comprometer a segurança.

A liderança religiosa drusa em Jaramana condenou o áudio, mas criticou duramente o "ataque armado injustificado" no subúrbio. Instou o Estado a esclarecer publicamente o ocorrido.

"Por que isso continua acontecendo de tempos em tempos? É como se não houvesse um Estado ou governo no comando. Eles precisam estabelecer postos de controle de segurança, especialmente em áreas onde há tensões", disse Abu Tarek Zaaour, morador de Jaramana.

No final de fevereiro, um membro das forças de segurança entrou no subúrbio e começou a atirar para o alto, o que levou a uma troca de tiros com homens armados locais, resultando na sua morte. Um dia depois, homens armados vieram do subúrbio de Mleiha, em Damasco, para Jaramana, onde entraram em confronto com homens armados drusos, resultando na morte de um combatente druso e no ferimento de outras nove pessoas.

Em 1º de março, o Ministério da Defesa de Israel disse que os militares foram instruídos a se preparar para defender Jaramana, afirmando que a minoria que prometeu proteger estava "sob ataque" pelas forças sírias.

Os drusos são um grupo minoritário que surgiu como um desdobramento do ismaelismo, um ramo do islamismo xiita, no século X. Mais da metade dos cerca de 1 milhão de drusos em todo o mundo vive na Síria. A maioria dos outros drusos vive no Líbano e em Israel, incluindo as Colinas de Golã, que Israel conquistou da Síria na Guerra do Oriente Médio de 1967 e anexou em 1981.

Desde janeiro de 2025, o poder na Síria está nas mãos de um governo de transição liderado pelo presidente interino Ahmed al-Sharaa, líder da coalizão islamista que em janeiro derrubou o regime do presidente Bashar al-Assad, agora no exílio. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)

O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, afirmou nesta terça-feira, 29, que seu governo está se preparando para conversas com os Estados Unidos sobre novas sanções à Rússia, afirmando que é importante continuar a exercer pressão sobre as redes de influência de Moscou, bem como sobre todas as suas operações de fabricação e comércio.

"Estamos identificando exatamente os pontos de pressão que empurrarão Moscou de forma mais eficaz para a diplomacia. Eles precisam tomar medidas claras para acabar com a guerra, e insistimos que um cessar-fogo incondicional e total deve ser o primeiro passo. A Rússia precisa dar esse passo", escreveu o canal oficial de Zelensky no Telegram.

Além disso, o líder ucraniano enfatizou que o país está se esforçando para sincronizar suas sanções da forma mais completa possível com todas as da Europa.

Divergências apresentadas pelo Egito e pela Etiópia à reforma do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas impediram a divulgação de um comunicado conjunto após a reunião de ministros das Relações Exteriores do Brics. Em vez disso, foi divulgada nesta terça-feira, 29, uma declaração da presidência do grupo de ministros, ocupada atualmente pelo Brasil. Houve consenso nos demais temas debatidos.

O texto diz que os ministros presentes à reunião, que ocorreu nesta segunda e terça-feira no Palácio do Itamaraty, na região central do Rio de Janeiro, "apoiaram uma reforma abrangente das Nações Unidas, incluindo seu Conselho de Segurança, com vistas a torná-lo mais democrático, representativo, eficaz e eficiente, e a aumentar a representação de países em desenvolvimento nos quadros de membros do Conselho".

As mudanças teriam como objetivo uma resposta adequada "aos desafios globais prevalecentes" e apoiar "as aspirações legítimas dos países emergentes e em desenvolvimento da África, Ásia e América Latina, incluindo Brasil e Índia, de desempenhar um papel mais relevante nos assuntos internacionais, em particular nas Nações Unidas, incluindo seu Conselho de Segurança".

"Reconheceram também as aspirações legítimas dos países africanos, refletidas no Consenso de Ezulwini e na Declaração de Sirte", acrescenta o texto, que trouxe uma observação mencionando ter havido objeções dos representantes do Egito e Etiópia ao comunicado.

Ambos os países se opõem à eleição da África do Sul como país representante do continente africano. Em coletiva de imprensa, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, negou que tenha havido desacordo ou discordância.

"Não houve nenhum desacordo entre os países com relação às questões do Conselho de Segurança. O que acontece é que cada país tem posições e compromissos assumidos", argumentou Vieira a jornalistas, quando questionado sobre o impacto das divergências regionais no documento final. "Não houve nenhuma discordância, apenas cada país e países membros de grupos regionais, alguns africanos no grupo, apenas declararam suas posições e nós estamos trabalhando para compatibilizar todas as necessidades de cada um desses grupos para a declaração dos chefes de Estado."