'No Brasil, seria mais apropriado evoluir para o modelo francês', diz consultor

Política
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O professor Carlos Blanco de Morais conhece em profundidade as particularidades do sistema semipresidencialista, em vigor em Portugal há 50 anos. Para ele, que é consultor jurídico da Presidência do Conselho de Ministros português, a discussão sobre a possível mudança de modelo de governo no Brasil apresenta níveis de complexidade maiores do que a realidade observada em democracias europeias.

"Se for um semipresidencialismo à portuguesa, funcionará muito mal", afirmou Morais, em entrevista ao Estadão. Na avaliação dele, o histórico presidencialista do País permitiria mais facilmente uma mudança para um formato em que o presidente preservasse boa parte dos poderes, como na França.

O jurista destacou a alta fragmentação partidária no Brasil como um problema urgente, que precisa ser resolvido antes de os líderes do Congresso projetarem a reforma política, apoiada publicamente por três dos seis ex-presidentes que governaram o País após o fim do regime militar - José Sarney, Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer. Caso contrário, o efeito pode ser o oposto da tão almejada estabilidade política. A seguir, os principais trechos da entrevista.

A oposição ao governo do presidente Jair Bolsonaro critica o modelo semipresidencialista por supostamente esvaziar os poderes do presidente da República. É legítima essa preocupação?

É claro que um sistema semipresidencialista atribui menos poderes ao presidente da República, mas existem variantes. O sistema francês dá mais poderes ao presidente, ele é o verdadeiro chefe do Executivo, mas há de haver um primeiro-ministro. Em Portugal é diferente. O presidente não governa, mas influi nos outros órgãos de poder.

Se o semipresidencialismo for instituído no Brasil, em quais áreas e quanto poder o presidente perderia?

É uma diferença significativa, pois, enquanto no Brasil os membros do governo dependem exclusivamente do presidente para manter suas funções, em Portugal e na França o governo depende também da existência de confiança parlamentar.

Dado esse quadro, a criação do sistema semipresidencialista no País ajudaria a controlar ou a diminuir as crises políticas?

No Brasil, se for um semipresidencialismo à portuguesa funcionará muito mal, porque em Portugal o presidente é alguém que se distancia do ato de governar. O presidente é um "regulador" do sistema. E há a chamada coabitação: um presidente eventualmente eleito pela centro-direita tem que coexistir com governos de esquerda ou centro-esquerda, como acontece atualmente. Portanto, a composição do Parlamento é decisiva para a constituição do governo. Imagine que o presidente Bolsonaro é reeleito, mas quem ganha as eleições parlamentares é o PT ou uma coligação de esquerda. Seria necessário coexistir. Essas situações onde há uma grande polarização política seriam pouco desejáveis.

Por isso o senhor diz que o modelo francês é mais adequado?

O modelo francês seria mais relevante na medida em que o presidente tem maiores poderes executivos. Na França, o presidente dissolve o Parlamento muitas vezes para encontrar uma maioria parlamentar que lhe seja favorável. Há mais espaço para o primeiro-ministro governar. Assim, eu diria que, para um sistema presidencialista como o brasileiro, seria mais apropriado evoluir para o modelo francês, onde o poder do presidente da República continua forte.

A oposição no Brasil tem outra tese, a de que a criação do semipresidencialismo significaria entregar o poder ao Congresso. A tese faz sentido?

Se o Brasil evoluísse para um sistema semipresidencialista com o sistema partidário fragmentado que tem, isso seria um convite à total instabilidade e quase um governo de assembleia. É necessário reformar radicalmente o sistema partidário.

É viável e prudente substituir o atual modelo de governo antes da cláusula de barreira?

Eventualmente, seria melhor antecipar a reforma eleitoral, e depois fazer a reforma política, para não cair, digamos, numa ideia de que o semipresidencialismo é uma panaceia de todos os males e depois cair em um mal maior. O semipresidencialismo funciona, desde que com uma redução muito significativa de partidos.

O semipresidencialismo é aventado no Brasil como um sistema que seria o contencioso de crises institucionais mais agudas...

O problema brasileiro é que, como não há uma moção de censura parlamentar ao governo que o possa fazer cair, os pedidos de impeachment surgem com grande frequência. Querem que o governo caia, mas, como não é possível fazer cair apenas o governo, fazem sucessivas tentativas de impeachment. Porém, as moções de censura também podem causar certa instabilidade se forem feitas de forma sucessiva levando a quedas contínuas de governo. Se o Brasil vier a ter o semipresidencialismo, é fundamental que tenha o dispositivo das moções de censura construtivas, como na Alemanha, que impõem ao Congresso a obrigação de definir um novo primeiro-ministro ao tentar derrubar o governo, por maioria absoluta. Isso responsabiliza quem busca se mover para dissolver uma gestão.

Governos mais radicais seriam pressionados a fazer concessões em seu projeto político em busca de apoio?

O semipresidencialismo não é uma receita mágica. A chamada coabitação é um risco: um presidente radical de uma determinada tendência política deve coexistir com um Parlamento com uma orientação completamente distinta. Eventualmente, o presidente terá de aceitar criar um governo que não seja da sua mesma cor e isso pode dar origem a algum atrito institucional.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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O líder conservador do partido CDU da Alemanha, Friedrich Merz, conseguiu ser eleito o 10º chanceler da Alemanha desde a Segunda Guerra Mundial na segunda rodada de votação realizada no Parlamento alemão nesta terça-feira, 6. Merz perdeu na primeira votação e havia dúvidas sobre a capacidade do líder alemão vencer a nova votação ainda hoje, depois da derrota histórica desta manhã.

Merz recebeu 325 votos no segundo turno. Ele precisava de uma maioria de 316 dos 630 votos em votação secreta, mas recebeu apenas 310 votos no primeiro turno - bem abaixo das 328 cadeiras de sua coalizão.

Segundo a Presidente do Bundestag, Julia Klöckner, a cerimônia de nomeação do conservador deve ocorrer ainda nesta tarde, por volta das 17h (horário local).

*Com informações da Associated Press.

Os quatro aeroportos internacionais ao redor de Moscou suspenderam temporariamente os voos nesta terça-feira, 6, após forças da Rússia interceptarem mais de 100 drones da Ucrânia, que foram disparados contra quase 12 regiões russas na segunda noite consecutiva de ofensivas em que a capital russa é supostamente alvo, de acordo com o Ministério da Defesa em Moscou. Outros nove aeroportos regionais do país também interromperam brevemente suas operações.

O ataque de drones ameaçou o cessar-fogo unilateral, anunciado pelo presidente russo, Vladimir Putin, que deve durar 72 horas, para coincidir com as celebrações em Moscou do Dia da Vitória na Segunda Guerra Mundial. O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente da China, Xi Jinping, e outros líderes mundiais se reunirão na capital russa nesta quinta-feira.

O Ministério das Relações Exteriores da Ucrânia instou países estrangeiros a não enviarem representantes militares para participar do desfile. Fonte: Associated Press.

O líder conservador Friedrich Merz não conseguiu ser eleito o 10º chanceler da Alemanha desde a Segunda Guerra Mundial na primeira rodada de votação realizada no Parlamento alemão nesta terça-feira, 6. Merz, do partido União Democrata-Cristã (CDU, pela sigla em alemão), recebeu seis votos a menos que o mínimo necessário para se tornar o novo chanceler do país, frustrando expectativas de uma votação bem-sucedida.

Merz precisava de 316 de um total de 630 votos. Ele recebeu apenas 310 votos. Os partidos alemães deverão agora se reagrupar para discutir o próximo passo, mas ainda não há clareza de quanto tempo o processo poderá levar.

A câmara baixa do Parlamento, conhecida como Bundestag, tem 14 dias para eleger um candidato por maioria absoluta. Em caso de novo fracasso, a Constituição permite que o presidente alemão nomeie o candidato que obtiver mais votos para chanceler ou dissolva o Bundestag e convoque uma nova eleição nacional. Fonte: Associated Press.