Lira quer análise de urgências e debate sobre 'PL do aborto' antes de votação

Política
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O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), propôs às lideranças partidárias da Casa que a análise de urgências para a tramitação de projetos seja feita de forma mais criteriosa. A ideia é que os requerimentos apresentados na reunião do Colégio de Líderes só sejam apreciados no plenário na semana seguinte.

Dessa forma, haveria pelo menos sete dias para que os textos fossem debatidos. A sugestão ocorre após a urgência do projeto de lei que endurece a legislação do aborto no País ser aprovada de forma relâmpago e gerar repercussões que desagradaram ao presidente da Câmara.

De acordo com líderes da base governista, Lira quer uma avaliação melhor do conteúdo dos projetos antes de as urgências serem pautadas. Quando um requerimento de urgência é aprovado, o texto pula a etapa de análise em comissões e pode ter o mérito votado diretamente no plenário.

No caso do projeto do aborto, o presidente da Câmara sinalizou que haverá um "amplo debate" antes de o texto ser votado. A discussão sobre o aborto deve esfriar na Câmara, já que a "prioridade total" de Lira são os projetos de regulamentação da reforma tributária, que devem ser votados em julho.

Líderes da base do governo afirmam que Lira encontrará "uma saída para um debate mais para frente" sobre o aborto. E também dizem que a proposta analisada não necessariamente será a que é de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ). Lideranças da bancada evangélica que também se reuniram com Lira ressaltam que o debate do aborto "ganhou contornos nacionais" e que a relatora deve ser alguém de centro.

O projeto, de autoria de Sóstenes, equipara o aborto após 22 semanas de gestação ao crime de homícidio, mesmo em caso de gestação resultante de estupro. Com essa tipificação, a interrupção da gravidez poderia gerar penas de seis a 20 anos de prisão para a mulher que abortar e para quem auxiliar no procedimento.

Lideranças religiosas do Congresso consideram que a redução da pena para a mulher que fizer o aborto após 22 semanas é um ponto passível de debate. Mas não veem com bons olhos a possibilidade de a relatora ser a deputada Benedita da Silva (PT-RJ). Mesmo sendo evangélica, o que em tese agradaria à bancada, a parlamentar é de esquerda.

Lira não gostou da amplitude que o tema do aborto ganhou nos últimos dias. No sábado, 15, milhares de pessoas protestaram na Avenida Paulista, em São Paulo, contra o avanço da proposta, cuja urgência foi aprovada em votação relâmpago na semana passada. O presidente da Câmara foi um dos principais alvos da manifestação, que teve cartazes com frases como "Lira, inimigo das mulheres" e "Fora, Lira".

Nos bastidores, o deputado alagoano afirma que há uma lista enorme de projetos com requerimentos para tramitação em regime de urgência aprovados, mas sem que o mérito tenha ido para votação. É o que deve acontecer com a proposta que trata de aborto.

Interlocutores de Lira dizem que não é do interesse dele aprovar o projeto. A ideia do presidente da Câmara, segundo esses aliados, era somente fazer um aceno à bancada evangélica com o avanço do texto, de olho no apoio dos religiosos para o candidato que ele escolher para sua sucessão na Casa, na eleição que ocorrerá em fevereiro de 2025.

Na última quinta-feira, 13, antes dos protestos do fim de semana, Lira havia dito que o projeto seria relatado por uma deputada "mulher, de centro e moderada". Também afirmou, após participar de um evento em Curitiba (PR), que o tema "merece ter um debate mais aguçado".

Depois de se abster na votação do requerimento de urgência, o governo decidiu se posicionar contrário ao projeto. No sábado, 15, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que, apesar de ser contra o aborto, considera uma "insanidade" querer punir a mulher vítima de estupro com pena maior que a do estuprador.

As ministras do governo também foram às redes sociais criticar a proposta. "Ser contra o aborto não pode significar defender o PL do estupro", escreveu Simone Tebet (Planejamento e Orçamento).

O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou nesta segunda-feira, 17, que não vê "ambiente" no Congresso para que o projeto do aborto avance mais. A declaração foi dada no Palácio do Planalto, após a reunião semanal de articulação política com Lula.

Na semana passada, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), declarou que o aborto é "naturalmente diferente" de homicídio e que a proposta jamais iria diretamente ao plenário da Casa, sem passar por comissões, como ocorreu na Câmara com a aprovação da urgência.

Como mostrou a Coluna do Estadão, o Centrão e a base de Lula na Câmara já tentavam desde a semana passada empurrar a votação do projeto para depois das eleições municipais.

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta segunda-feira, dia 1º, que o debate presidencial nos Estados Unidos mostrou o atual presidente Joe Biden muito fragilizado na TV e sugeriu a substituição dele por outro candidato. Apoiador declarado de Biden, Lula afirmou que é melhor que o Partido Democrata e o presidente americano tomem uma decisão sobre a candidatura dele.

Lula disse que Biden vem demonstrando problemas e defendeu que ele seja transparente sobre sua saúde e possa opinar sobre a eventual substituição por outro candidato. Depois de reiterar apoio ao atual presidente, ele disse que somente Joe Biden tem condições de relevar seu estado de saúde e sugeriu que o Partido Democrata troque de candidato caso Biden desista.

O presidente americano sofre intensa pressão, dentro e fora do partido, para desistir e abrir caminho para uma substituição, mas não deu sinais de que o fará.

Manifestações como as de Lula são desaconselhadas na diplomacia. Conselheiros do presidente entendem que elas podem ser vistas como interferência em assuntos internos da maior potência do planeta e abrir brecha para mais divergências com o ex-presidente Donald Trump, caso ele vença e retorne ao poder.

"Uma pessoa pode mentir para si mesmo, pode mentir para todo mundo, mas não pode mentir a vida inteira para ele mesmo. Ele tem que avaliar. Se está bem, ele é candidato, se acha que está em condições, ótimo. Mas se não está, é melhor eles tomarem uma decisão. O que foi chato e desagradável foi que no debate expuresam muito a fragilidade do Biden", afirmou Lula, em entrevista à rádio Princesa, da Bahia.

"O Biden tem que contar até dez e saber: vou ou não vou, posso ou não posso, estou em condições ou não estou. Só ele pode dizer."

Lula calculava as palavras para opinar sobre a disputa nos EUA, mas voltou a dizer que torce pela reeleição do democrata. Biden enfrenta o ex-presidente Donald Trump, candidato do Partido Republicano, a quem o petista chamou de "mentiroso", enquanto comentava o debate na CNN, da última quinta-feira.

"Primeiro, do outro lado (estava) um cidadão mentiroso, porque segundo o (jornal) New York Times ele contou 101 mentiras no debate. E do outro lado o Biden com certa morosidade para responder as coisas, mas quem sabe da saúde dele é ele", disse Lula. "Eu acho que o Biden tem um problema. Ele está andando mais lentamente, está demorando mais para responder as coisas. Mas quem sabe da condição do Biden é o Biden. Ele que sabe."

Lula comparou Joe Biden a ex-presidentes nonagenários com os quais conversa sobre a situação interna do Brasil, como José Sarney e Fernando Henrique Cardoso, que continuam a refletir sobre política. Segundo Lula, são pessoas com "saúde precária", mas com a cabeça ativa politicamente.

A saúde física e mental do incumbente nos EUA, de 81 anos, é uma das principais questões da disputa pela Casa Branca. A substituição de Biden domina os debates no país depois de o presidente ter fracassado, durante o debate na CNN, em demonstrar vigor, com momentos de perda de raciocínio, travamentos e voz rouca expostos na TV. O debate era visto como um teste de fogo para Biden, que já vinha sendo questionado por quedas, dificuldades de discursar e seguir protocolos.

"Eu fico torcendo pelo Biden. Deus queira que ele esteja bem de saúde, que ele possa concorrer. Se não o Partido Democrata pode indicar outra pessoa", disse o petista, lembrando que saiu de cena em 2018 às vésperas da votação no Brasil - Lula foi impedido de concorrer em decorrência de processos por corrupção na Operação Lava Jato. "Aqui eu estava preso e indiquei o Haddad, faltavam poucos meses para a campanha."

"As eleições nos Estados Unidos são muito importantes para o resto do mundo, porque a depender de quem ganha e de que política externa querem ter os EUA a gente pode melhorar ou piorar o mundo", afirmou o pestita, defendendo uma visão mais "humanista" e "fraterna". "É muito difícil dar palpite num processo eleitoral de outro país, porque depois do resultado eleitoral a gente tem que conviver com quem ganhou as eleições então tem que tomar cuidado para não criar animosidade."

A Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu nesta segunda-feira, 1º, que o ex-presidente Donald Trump tem direito a receber imunidade parcial nos processos em que ele responde na Justiça americana.

A decisão, vista como uma vitória para Trump, deve atrasar os julgamentos dos processos a que ele responde na Justiça dos EUA. O ex-presidente é candidato nas eleições do país, que acontecem em 5 de novembro.

A decisão não concede imunidade automática para Trump, mas aponta que ex-presidentes dos EUA têm direito a pedi-la. Com isso, o caso deve voltar a tribunais de 2ª instância, que terão de julgar se Trump é imune em cada um dos três processos.

Trump postou em sua rede social logo após a decisão ser divulgada: "Grande vitória para nossa constituição e democracia. Orgulhoso de ser americano!"

A decisão de hoje remonta o julgamento do caso contra ele por acusações de conspiração para tentar subverter o resultado da eleição de 2020.

Trump entrou com o argumento que tinha direito à imunidade absoluta das acusações, baseando-se em uma ampla interpretação da separação dos poderes e um precedente da Suprema Corte de 1982 que reconheceu tal imunidade em casos civis para ações tomadas por presidentes dentro do "perímetro externo" de suas responsabilidades oficiais.

Tribunais inferiores rejeitaram a alegação de Trump, mas a decisão da Suprema Corte pode atrasar o caso o suficiente para que ele consiga anulá-lo completamente se sair vitorioso em novembro. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)

O presidente da Argentina, Javier Milei, cancelou oficialmente nesta segunda-feira, dia 1º, sua participação na Cúpula do Mercosul, na esteira de novo embate com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A Presidência argentina confirmou que Milei virá ao Brasil no próximo fim de semana, para participar de um evento liderado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. Milei não vai se encontrar com Lula durante a estada no País.

A decisão de Milei foi confirmada pelo porta-voz da Casa Rosada, Manuel Adorni. Ele negou que a desistência de comparecer à reunião de chefes de Estado do Mercosul, em Assunção no Paraguai, tenha relação com algum incômodo com Lula. Adorni, porém, disse que não haverá reunião entre eles no Brasil.

O chefe de Estado de um país pisar em solo estrangeiro e ignorar o governante no poder costuma ser visto como descortesia e até provocação diplomática. Milei vai repetir o que fez em recente viagem à Espanha, em mais um episódio da crise na relação com o país, governado pelo socialista Pedro Sánchez.

Milei irá a Balneário Camboriú, em Santa Catarina, onde o ex-presidente brasileiro e seus aliados políticos promovem uma cúpula de direita, o CPAC (Conservative Political Action Conference). A organização cabe ao Instituto Conservador Liberal, presidido no Brasil pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP).

O ex-presidente já está confirmado como palestrante. Nomes da direita latina, como o chileno José Kast, também participarão. A organização ainda fazia suspense sobre a presença de Milei, embora divulgasse sua relação com o evento, quando a Casa Rosada confirmou a viagem.

Milei esteve na edição do fórum realizada em 2022 no Brasil. E, em fevereiro deste ano, compareceu à edição nos Estados Unidos, quando conversou nos corredores com o ex-presidente Donald Trump. Eles posaram para foto, e Trump falou: "Make Argentina Great Again", uma versão de seu slogan MAGA, acrônimo de Make America Great Again, a ideia que o republicano vende de recuperar a grandeza dos EUA.

O favoritismo de Trump na campanha e seu eventual retorno à Casa Branca são vistos por esse movimento político como uma esperança de promover e fortalecer a direita no Brasil e na América Latina.

Uma postagem do CPAC com a pergunta "Será que ele vem?" mostrava Milei dizendo que se deu conta de que "o inimigo número um é o socialismo". No vídeo, o argentino comentava a importância do "alinhamento internacional" da direita, por meio de fóruns como o CPAC, e de contato com lideranças como Bolsonaro e a premiê da Itália, Giorgia Meloni.

Milei esteve na Itália para a cúpula do G7, a convite dela, em junho. Na ocasião, apenas cumprimentou Lula protocolarmente, já que o petista era também convidado para uma das sessões de debate ampliado do G7. Eles dividiram a mesma mesa numa plenária, mas não interagiram.

Na semana passada, Milei voltou a chamar Lula de "corrupto" e "comunista", em resposta a uma cobrança, por parte do petista, de um pedido de desculpas por declarações anteriores, ao longo da campanha eleitoral argentina, consideradas pelo petista como "ofensas e provocações".

A mudança de planos indica que Milei abandonou um período de busca de pragmatismo na relação com o governo Lula - quando chegou a indicar o desejo de uma reunião conjunta em duas cartas. A diplomacia brasileira também não respondeu as cartas enviadas por Milei.

Milei preferiu ser uma das estrelas da cúpula conservadora promovida no País por bolsonaristas a seguir buscando um ponto de contato com o presidente brasileiro.

A decisão também revela pouco interesse em fortalecer as relações internas no bloco regional. Em vez fazer sua estreia no Mercosul, no dia 8 em Assunção, Milei vai cumprir agendas internas na Argentina e enviar sua chanceler Diana Mondino. Segundo a Casa Rosada, ele tinha uma viagem planejada a Tucumán, e o governo não deseja que ele passe por uma "agenda sobrecarregada".

Durante a campanha para a Casa Rosada, Milei ameaçou retirar a Argentina do Mercosul, dizendo que era um bloco de "má qualidade" e que prejudicava os países membros. Depois, o governo argentino deu sinais de que permaneceria no bloco, mas com defesa de uma modernização interna.