Como governo Lula e Congresso driblam lei eleitoral por R$ 7,7 bi em emendas Pix

Política
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O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) autorizou a liberação de R$ 7,7 bilhões por meio das chamadas emendas Pix. Mais da metade desse valor (R$ 4,25 bilhões) deve ser paga antes das eleições municipais sem nenhuma informação sobre o que será feito com o dinheiro, driblando a legislação eleitoral e uma decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que exige transparência sobre esses recursos.

A emenda Pix, revelada pelo Estadão, é um recurso sem transparência pago pelo governo federal a Estados e municípios a pedido de deputados e senadores. O dinheiro cai nos cofres estaduais e municipais sem nenhuma finalidade definida e antes de qualquer projeto, licitação ou obra, diferentemente de outros tipos de transferências. O vácuo na transparência dificulta a fiscalização. É possível saber qual parlamentar indicou e qual município recebeu, mas não o que foi feito com o dinheiro.

As liberações (empenhos, no jargão técnico) foram feitas na quarta-feira, 26. O governo se comprometeu com deputados e senadores a repassar mais da metade do dinheiro (R$ 4,25 bilhões) até o dia 5 de julho. O valor pode aumentar porque algumas emendas ainda não foram empenhadas. De todo o montante, R$ 232,5 milhões foram pagos de forma antecipada para municípios gaúchos e outras cidades que decretaram calamidade pública.

O Congresso mudou as regras dos três mecanismos de repasse de emendas. A manobra faz com que a lei eleitoral, que proíbe repasses três meses antes da disputa, seja tecnicamente cumprida, mas desvirtua o princípio da regra ao antecipar as transferências e permitir que o dinheiro seja gasto no meio da campanha, o que antes era impossível, tornado a vedação inócua.

As mudanças cercam as três formas de repasse das emendas, antecipam o pagamento dos recursos e driblam uma regra estabelecida na legislação desde 1997. A lei proíbe a transferência de recursos, incluindo as emendas, nos três meses anteriores à eleição. A única exceção é se o serviço já foi feito e tudo esteja pronto para o pagamento. A norma serve para evitar, por exemplo, que um prefeito gaste um valor excessivo de recursos perto da eleição para ser o vencedor nas urnas, desfavorecendo um adversário e desequilibrando a disputa.

As novas formas de repasse aprovadas pelo Congresso cumprem tecnicamente a lei eleitoral ao antecipar as transferências até junho, período que começa a proibição, mas desvirtuam o princípio da regra e permitem o que antes era impossível: começar e executar uma obra no meio da campanha já com o dinheiro em caixa. Além disso, a distribuição do dinheiro ocorre sem ninguém - nem o governo, nem o Congresso - ter a obrigação de avaliar quais cidades mais precisam de um recurso ou de outro.

Antes, funcionava assim: o prefeito só recebia o dinheiro se apresentasse um projeto para aquela obra, tivesse a concordância do ministério da área e ainda um aval prévio de um órgão de controle que fiscalizaria e acompanharia o caminho do recurso. Além disso, o valor só caía na conta conforme o andamento da obra e ficava travado durante a campanha eleitoral. A situação gerava reclamações de prefeitos, parlamentares e pressão no governo federal. Agora, com as mudanças em todos esses instrumentos, o dinheiro será transferido antes do período de proibição, escapando da lei eleitoral, e as prefeituras ficarão livres para gastar o recurso no meio da campanha, sem se preocupar com o "defeso".

O presidente Lula vetou parte das propostas aprovadas pelo Congresso, mas, em acordo com o Legislativo, assinou um decreto com um calendário de pagamento de emendas em 2024. O Ministério Público pediu que o Tribunal de Contas da União (TCU) investigue a liberação de emendas parlamentares antes das eleições municipais deste ano e um potencial drible de R$ 24 bilhões na legislação.

Conforme o Estadão revelou, o pacote de emendas negociado entre o governo do presidente Lula e o Congresso pode resultar em um drible de até R$ 24 bilhões na Lei das Eleições, ao antecipar o pagamento e diminuir o controle sobre a liberação desses recursos em 2024. Para o procurador Lucas Furtado, que assina a representação junto ao TCU, o repasse antecipado desequilibra a disputa municipal ao favorecer quem está no poder e vai usar o dinheiro.

"Por meio da criação de um calendário mensal de pagamento, o Governo é forçado a antecipar as transferências até junho, período que começa a proibição da lei eleitoral, mas desvirtua o princípio fundamental da garantia que permite um mínimo de paridade de armas entre os concorrentes dos pleitos municipais, com a mudança de regra para permitir o que antes não poderia ocorrer: começar e executar uma obra no meio da campanha já com o dinheiro em caixa", diz a representação.

De acordo com o procurador, o calendário resulta na fragilização - ou mesmo inviabilização - dos mecanismos de controle que antes existiam. "A bem da verdade, quão menos suscetíveis de controle, mais atraentes se tornam as emendas parlamentares para os que almejam apenas atender às necessidades paroquiais de seus colégios eleitorais e perpetuarem nos mandatos os mesmos agentes que atualmente já os ocupam."

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O presidente da Argentina, Javier Milei, notificou nesta quinta-feira, dia 4, o governo Luiz Inácio Lula da Silva sobre sua viagem ao Brasil, no próximo fim de semana. Milei irá a Balneário Camboriú (SC), a fim de participar de um evento da direita promovido por opositores do petista e de se reunir com o ex-presidente Jair Bolsonaro. Ele não fará qualquer contato com o presidente Lula.

A Embaixada da Argentina enviou ao Itamaraty formalmente, no início da tarde, uma nota verbal com informações sobre o plano da viagem de Milei. Até então, o Ministério das Relações Exteriores dizia que o governo brasileiro não havia sido nem sequer comunicado da visita.

Por decisão de Milei, ele não pediu uma reunião com Lula e autoridades do Palácio do Planalto. Milei havia indicado em duas cartas interesse em se reunir com o petista, mas ficou sem resposta. Os presidentes se encontraram na Itália, durante uma sessão plenária do G-7, mas apenas se cumprimentaram de forma protocolar.

O argentino pretende desembarcar em Santa Catarina no sábado, dia 6, à noite, e regressar a Buenos Aires no domingo, dia 7, também no período noturno.

Milei repete no Brasil o que fez quando visitou a Espanha, em maio, e ignorou o premiê socialista Pedro Sánchez, em um episódio da crise política entre os países, que continua aberta. Ele disse recentemente que o premiê é "motivo de chacota" e o chamou de "incompetente" e "covarde".

No país, Milei também participou de um comício que reúne lideranças mundiais de direita e extrema direita, a convite de Santiago Abascal, do partido Vox. Ele acusou a mulher de Pedro Sánchez de ser corrupta. A Espanha retirou sua embaixadora de Buenos Aires.

O governo Lula vai observar o tom do discurso de Milei em relação ao petista. Medidas de reprimenda diplomática estão sempre sobre a mesa, mas o Itamaraty tem evitado o confronto. A vinda ao Brasil sem qualquer referência ao presidente Lula foi interpretada como descortesia e provocação.

"Não me compete comentar declarações do presidente de outro país, nem do meu presidente", disse a embaixadora Gisela Padovan, secretária de América Latina e Caribe no Itamaraty, nesta terça-feira. "Trabalhamos para que as relações com a Argentina continuem sendo o que sempre foram, de dois países parceiros, com interesses enormes, as duas economias, as duas populações, com integração em múltiplos setores estratégicos, nuclear, espacial, defesa. É isso que a gente busca preservar."

Moleque e Vagabundo

Mas as atitudes do argentino repercutiram no Congresso Nacional. O senador Omar Aziz (PSD-AM), aliado de Lula, disse que Milei é um "vagabundo", em resposta à nova ofensiva contra o petista. No entendimento do parlamentar, os ataques contra o presidente atingem o País.

"Quem é o Milei para sacar contra a maior autoridade do Brasil? Não é mais o Lula, ele é o Brasil nesse momento, gostando ou não dele. Não dá para aplaudir o Milei que está dando uma de moleque, que vai para a internet falar mal do presidente da República. Isso é coisa de moleque, de vagabundo. O Milei é um vagabundo. A Argentina tem um presidente que é vagabundo", afirmou o senador nesta quinta-feira.

Nos últimos dias, em uma inflexão da postura cautelosa que vinha adotando e dos sinais de interesse em contato pragmático, o libertário passou a criticar Lula, voltou a chamá-lo de "corrupto", "comunista" e outros termos ofensivos e rejeitou um pedido de desculpas exigido pelo petista.

Em pouco tempo no cargo, o presidente da Argentina acumula crises diplomáticas, motivadas por razões ideológicas e declarações ofensivas, com México, Colômbia, Venezuela e Bolívia.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, admitiu que teve uma "noite ruim" no debate contra o ex-presidente e candidato republicano, Donald Trump, na semana passada. O democrata, no entanto, garantiu que seguirá na campanha pela reeleição, apesar da crescente pressão para que desista da disputa.

Em entrevista ao radialista Earl Ingram, do Wisconsin, Biden disse que "cometeu um erro" durante o embate com o republicano, mas afirmou que os 90 minutos do evento não definem o tom da sua presidência. "Eu vou vencer essa eleição", reiterou.

Os comentários foram feitos em meio a especulações de que Biden estaria avaliando se seguirá no páreo. Ontem, o democrata teve uma reunião com governadores democratas na Casa Branca, em um esforço para tranquilizá-los sobre sua capacidade de continuar no cargo. Publicamente, alguns dos governadores reforçaram apoio a ele depois do encontro.

O líder do Partido Trabalhista, Keir Starmer, será o próximo primeiro-ministro do Reino Unido com uma maioria esmagadora do Parlamento britânico, indica pesquisa de boca de urna do instituto Ipsos e divulgada em conjunto pelas emissoras BBC, Sky e ITV. Se confirmado, o resultado retira o atual premiê, Rishi Sunak, do cargo e encerra um período de 14 anos de governo do Partido Conservador.

Segundo a sondagem, os Trabalhistas teriam conquistado 410 assentos, bem acima dos 326 necessários para formar maioria. Bem atrás, os conservadores teriam obtido 131 vagas, seguidos do Liberal-Democrata (61) e o Reforma (13). O Partido Nacionalista Escocês aparece com 10, o Plaid Cymru com 4 e o Verde com 2.

Os números representam uma significativa guinada à centro-esquerda em relação à última eleição, de 2019. Naquele pleito, os conservadores, à época liderados por Boris Johnson, elegeram 365 parlamentares. Por outro lado, os trabalhistas, de Jeremy Corbyn, amargaram o pior resultado eleitoral desde a década de 1930, com apenas 203 cadeiras.

Nas últimas duas eleições, em 2017 e 2019, a pesquisa de boca de urna se provou relativamente precisa, com uma diferença de poucos assentos para o resultado final. Em 2015, no entanto, o levantamento indicou que nenhum partido alcançaria maioria absoluta, mas a abertura das urnas mostrou apoio majoritário aos conservadores.