Longevo e controverso, Kissinger ganha biografia

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"Você fala espanhol?", perguntou Richard Nixon. "Não, português, mas é tudo a mesma coisa", respondeu Pelé. O insólito diálogo foi trocado no Salão Oval da Casa Branca em maio de 1973, quando o então presidente dos Estados Unidos estava preocupado com o escândalo Watergate, que o levaria a renunciar no ano seguinte. Abrir espaço em sua atribulada agenda, portanto, ao principal representante de um esporte ainda desconhecido pelos americanos foi obra de um hábil político: Henry Kissinger, o mais influente diplomata da segunda metade do século 20, que morreu em 29 de novembro aos 100 anos.

 

"Kissinger era apaixonado pelo futebol - gostava de chamar o esporte de 'football', como os ingleses, e não de 'soccer', como os americanos - e Pelé foi certamente um dos brasileiros que ele mais admirava. Ele nunca perdeu seu amor pelo futebol e sempre falava comigo a respeito até o fim de sua vida", comenta Niall Ferguson, historiador escocês que há 20 anos pesquisa a trajetória do ex-secretário de Estado dos EUA.

 

Uma parte do portentoso trabalho está em Kissinger 1923-1968: O Idealista, primeiro de dois volumes sobre os passos de um político que foi reverenciado e insultado com a mesma intensidade, e que chega agora ao Brasil, lançado pelo selo Crítica da Editora Planeta. O segundo livro, avisa Ferguson, deverá sair no fim de 2024 ou início de 2025.

 

A história de Pelé deverá constar desse novo volume, assim como o encontro do jogador com outro presidente americano, Gerald Ford, em junho de 1975, também costurado por Kissinger. Ele preparou um detalhado dossiê sobre o brasileiro e a importância do futebol em nosso país para o prévio conhecimento do mandatário.

 

'PEH-LAY'

 

Lá, além de detalhar a importância de Pelé no esporte mundial (ele acabara de ser contratado pelo Cosmos, de Nova York), Kissinger ensina ainda a como pronunciar o apelido do brasileiro: PEH-LAY. Ford, no entanto, não teve tempo de ler o documento e o que ficou para a posteridade foi a imagem de Pelé ensinando Ford a dominar uma bola.

 

"São as origens de Kissinger que explicam essa paixão pelo esporte", continua Ferguson, enumerando as diversas fases da vida do diplomata: nascido em uma família judia que fugiu da Alemanha nazista, pobre imigrante em Nova York, soldado na Batalha das Ardenas (confronto militar mais sangrento que as forças americanas enfrentaram na Segunda Guerra Mundial), interrogador de nazistas e estudante de História em Harvard.

 

"Logo ele se tornou conselheiro do empresário Nelson Rockefeller e dos presidentes John Kennedy e Richard Nixon, para o qual trabalhou como conselheiro de segurança nacional. Essas transições fizeram parte da metamorfose americana e, na verdade, da vida global, alterando as estruturas hierárquicas de meados do século 20 para algo mais flexível."

 

Foi essa constante mutabilidade que lhe garantia cada vez mais poder que convenceu o historiador a analisá-lo sob um olhar cubista, o que já inspira a concepção do novo livro. "Como o quadro Demoiselles d'Avignon, de Picasso, é preciso vê-lo de vários ângulos ao mesmo tempo para compreendê-lo completamente. E, tal como só o século 20 poderia ter produzido Picasso e tornado a sua visão não apenas inteligível, mas extremamente popular, nenhum outro século poderia ter produzido um homem como Kissinger. Eu tinha de mostrar todos seus lados de uma só vez."

 

POLÊMICAS

 

Figura controversa, ele foi acusado de omissão que resultou em mortes de inocentes em países como Bangladesh, Camboja, Chile e Timor Leste. "Havia uma hierarquia de prioridades estratégicas e o próprio Kissinger dizia que política externa exigia quase sempre decidir entre escolhas maléficas", observa Ferguson, que já trata da relação do diplomata com o Brasil neste primeiro volume.

 

Em maio de 1962, Kissinger fez sua primeira visita ao País e logo concluiu que o então presidente João Goulart, assim como seu antecessor Jânio Quadros, pretendia dar uma guinada para esquerda. "As perspectivas do Brasil no curto prazo eram bastante desanimadoras", observou Kissinger.

 

O golpe militar em 1964, portanto, foi visto com bons olhos. "Para um homem que combatia a Guerra Fria, todo radical aparentava ser uma ferramenta soviética, toda revolução um golpe da KGB", escreve o historiador.

 

Além de Pelé, ele menciona outro brasileiro estimado pelo diplomata americano: Azeredo da Silveira, ministro das Relações Exteriores no governo do general Ernesto Geisel (1974-1979). "Não se tratava de uma amizade próxima, mas sim uma decisão estratégica para dar prioridade ao Brasil. E Azeredo também entendia perfeitamente isso."

 

ZELIG

 

Tal polivalência no trato com diferentes tipos de líderes fez com que Ferguson comparasse Kissinger a Zelig, personagem de um filme de 1983 de Woody Allen cujo talento único para o mimetismo permite que ele agrade a pessoas de todos os setores da sociedade.

 

O historiador, porém, nega a análise de críticos que viam Kissinger como inspiração para o general alemão do filme Dr. Fantástico (1964), clássica sátira de guerra de Stanley Kubrick. Para ele, não há proximidade. "Kissinger não se encaixa no papel porque o personagem é obviamente um ex-nazista. Havia um grande número de alemães envolvidos na política nuclear, portanto, existiam outros candidatos mais inspiradores ao papel."

 

A longevidade do ex-secretário de Estado é creditada pelo biógrafo ao seu histórico familiar, pois os pais, além de ultrapassar os 90 anos de idade, nunca sofreram qualquer deterioração mental grave. "Kissinger também nunca parou de se envolver, de ler, pensar, viajar, fazer conexões, negociar. Após seu aniversário de 100 anos, em maio deste ano, ele foi para a China, onde foi recebido com tapete vermelho e se encontrou com Xi Jinping. Com isso, terminou como a própria personificação do século 20."

 

TRECHO

 

Inspiração para sinistras personagens

 

No verão de 1954, Henry Kissinger tinha um doutorado sobre a história do início do século 19, mas não muito mais que isso (...) Em 1964, ele era mencionado como a inspiração para as sinistras personagens do professor Groeteschele, o frio cientista político representado por Walter Matthau no filme de Sidney Lumet Limite de Segurança, e (de modo menos plausível) o Dr. Fantástico, o estrategista nuclear francamente insano representado por Peter Sellers na comédia de mesmo nome de Stanley Kubrick. A inspiração para o Dr. Fantástico foi na verdade Herman Kahn, e várias de suas ideias são mencionadas no roteiro de Kubrick. Assim como Kissinger, entretanto, Kahn era de origem judaica e, ao contrário de Kissinger, ele havia nascido nos EUA.

 

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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A Andreani Logística anunciou nesta terça-feira, 29, a suspensão dos serviços prestados à Fundação Butantan, incluindo o armazenamento de insumos utilizados na produção de vacinas. O centro de pesquisa, por sua vez, afirma que o contrato com a empresa foi encerrado dentro do prazo previsto e nega qualquer interrupção inesperada.

A versão da Andreani, no entanto, é diferente. Segundo a empresa, o contrato original teve vigência de abril de 2023 a abril de 2024, com solicitação da fundação para que a operação fosse mantida por mais seis meses, enquanto uma nova licitação era elaborada. A previsão era de que a prorrogação se encerrasse em 30 de setembro. Em agosto, porém, o Butantan já havia selecionado a empresa Simas Logística como vencedora da concorrência.

Em 30 de setembro, a fundação teria enviado à Andreani uma prorrogação unilateral do contrato até abril de 2025 - decisão que a empresa afirma que não aceitou nem assinou. "Estamos prestando serviço sem contrato. Não existe negócio unilateral, e o Butantan agiu de forma arbitrária. Isso está sendo discutido em juízo", afirma a Andreani.

A disputa pela gestão logística, armazenamento e distribuição de vacinas já foi levada ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) e ao Tribunal de Contas do Estado (TCE-SP), após a Andreani, segunda colocada no certame, contestar a legalidade da contratação da Simas. Um dos principais pontos de questionamento é a transparência do processo. Segundo a Andreani, o edital exigia a apresentação de uma licença que comprovasse a atuação da empresa em São Paulo - o que facilitaria a logística -, mas o documento da Simas não foi disponibilizado, mesmo após solicitação formal.

Outro ponto de crítica da Andreani é o que considera "falta de preparo da nova operadora". De acordo com a empresa, nas últimas 48 horas, equipamentos do Butantan que estavam sob sua guarda foram transferidos para uma fazenda da fundação e não para instalações da Simas, em um movimento que comprovaria a ausência de estrutura adequada.

A Andreani afirma que a única movimentação solicitada até o momento foi essa. A denúncia foi levada ao Ministério Público.

Embora o início oficial das atividades da Simas estivesse previsto para 17 de abril, a Andreani afirma que continuou recebendo cargas. "De 1º até 28 de abril, recebemos 340 paletes de insumos, sendo 40 apenas na segunda-feira, 28", afirma. A empresa também alega que nenhum desses materiais foi retirado até agora - versão contestada pelo Butantan, que informa já ter transferido 900 paletes para a nova operadora.

Segundo a Andreani, os serviços vêm sendo mantidos sem contrato e com valores determinados de forma unilateral pelo Butantan. A empresa afirma que, a partir desta quarta-feira, 30, deixará de receber novos insumos e de transportar cargas já armazenadas - função que também está sob sua responsabilidade - caso não seja apresentado um cronograma detalhado de transferência, amparado legalmente, com respeito aos valores comerciais anteriormente pactuados e acesso completo à documentação do processo licitatório.

A empresa afirma ainda que o imbróglio coloca em risco a integridade dos insumos. Ela assegura que as cargas sob seus cuidados seguirão armazenadas e refrigeradas, mas se recusa a receber novos insumos para armazenamento ou a realizar o transporte dos que já estão armazenados.

O que diz o Butantan?

A Fundação Butantan afirma que a Simas Logística, vencedora da licitação, dispõe de um galpão já qualificado e começou a receber insumos desde 3 de abril - informação que, assegura, foi previamente comunicada à Andreani.

Inicialmente, a fundação afirma que foram encaminhados materiais não refrigerados e, a partir de 30 de abril, a nova operadora também passará a receber insumos refrigerados. "Mais de 900 paletes já foram transferidos para as instalações da Simas, e a previsão é de que toda a migração seja concluída até o fim de maio", diz o Butantan.

O centro de pesquisa também destaca que o contrato com a Andreani foi firmado por inexigibilidade de licitação - modalidade diferente de uma contratação emergencial - e foi prorrogado unilateralmente com base na Lei 14.133/2021. "A empresa segue prestando serviços até o encerramento do contrato, em 30 de abril. Após essa data, caberá à Andreani permitir a retirada do restante dos materiais, já que a Simas está plenamente capacitada para armazenar e operar com os insumos", afirma.

A fundação assegura que não há risco de interrupção na produção de vacinas, especialmente considerando que a entrega das doses contra gripe ao Ministério da Saúde já foi concluída e que essa produção, a de maior volume do Butantan, só será retomada no segundo semestre, como ocorre regularmente.

A instituição também defende a regularidade do processo licitatório. Afirma que todo o procedimento foi conduzido com transparência e dentro da legislação, sendo reiteradamente validado por decisões judiciais favoráveis, e acrescenta que a Simas teria apresentado uma proposta com preço 45% inferior ao da segunda colocada, gerando uma economia estimada em R$ 72 milhões. "O que ocorreu, portanto e simplesmente, foi que a Andreani perdeu uma licitação", afirma o Butantan.

Segundo a fundação, a Andreani apresentou diversos recursos, todos sem sucesso. Além do recurso administrativo indeferido no âmbito do próprio Butantan, a empresa teve três pedidos de liminar negados pela Justiça - dois já em segunda instância - e teve indeferido também, pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-SP), o pedido de suspensão do certame. O processo ainda está em fase de instrução para julgamento do mérito, mas relatório técnico da fiscalização do TCE concluiu pela regularidade da licitação e improcedência da representação feita pela empresa.

Um metalúrgico de 22 anos morreu baleado durante discussão no trânsito em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, na madrugada do domingo, 27. O autor do tiro fugiu e não havia sido identificado até a publicação desta reportagem, segundo a polícia.

Patrick da Silva Brito morava em Diadema e na noite de sábado, 26, foi à festa de aniversário de um amigo em São Bernardo do Campo. Ao fim do evento, na madrugada de domingo, pegou carona com um amigo que também mora em Diadema. Durante o trajeto, enquanto passavam por uma rua próxima do Corredor ABD, se depararam com um carro parado na via, impedindo a passagem. Fora do veículo, um casal discutia.

O amigo de Patrick, que dirigia um Citroen C4 Cactus branco, buzinou pedindo passagem. O homem responsável pelo outro veículo sacou um revólver e disparou dois tiros na direção do motorista, segundo foi registrado na Polícia Civil.

Quando o amigo de Patrick percebeu a reação do rapaz, manobrou e tentou fugir, mas um dos tiros atingiu a nuca de Patrick. O amigo saiu com o veículo rumo a um hospital e, no caminho, encontrou guardas-civis municipais e pediu ajuda. Patrick chegou vivo ao hospital, mas não resistiu.

O caso está sendo investigado pelo Setor de Homicídios e Proteção à Pessoa da Polícia Civil em São Bernardo do Campo, segundo a Secretaria da Segurança Pública do Estado. Até a noite de terça-feira, 29, o autor dos tiros não havia sido identificado.

Ainda hoje, muitos órgãos para transplante são transportados em embalagens que usam o gelo para manter refrigeração, sem controle preciso da temperatura. Pensando nisso e em outras demandas baseadas na realidade brasileira, pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) desenvolveram uma embalagem inteligente que promete mudar esse cenário.

O produto é equipado com um sistema de monitoramento em tempo real, via internet, que permite rastrear o órgão e detectar qualquer queda ou alteração de temperatura durante o transporte. A embalagem, além disso, possui uma autonomia de até 6 horas e conexão de backup para garantir a continuidade do processo em situações adversas.

"Ela tem várias funcionalidades para dar um suporte em tempo real e garantir que esses órgãos e tecidos sejam transportados na temperatura adequada, diferentemente do gelo, em que não temos controle algum", detalha Bartira de Aguiar Roza, coordenadora do projeto e professora da Escola Paulista de Enfermagem da Unifesp. "O objetivo é reduzir perdas e otimizar o trabalho."

De acordo com a professora, existe uma perda estimada de 5% dos órgãos que são transportados a uma longa distância. As caixas, ela explica, precisam passar por diferentes ambientes, como aeroportos e táxis, onde muitas vezes a temperatura do ar-condicionado não é suficiente para manter a refrigeração adequada.

"Além disso, existem os requisitos de segurança, de rastreabilidade. Existem produtos que são transportados com alta tecnologia, mas, quando falamos de órgãos humanos, estamos transportando com iglu de gelo. Precisamos responder várias demandas, não só a demanda de perdas, mas também assegurar a rastreabilidade", diz.

A inovação é mais cara do que as embalagens padrão. A estimativa é de que chegue ao mercado por um valor entre R$ 10 mil e R$ 15 mil. "Mas, comparando com caixas desenvolvidas em outros países, é mais barata", assegura a pesquisadora. "Caixas (estrangeiras) que ainda usam gelox, mas são rastreadas são vendidas por R$ 80 mil no Brasil. Desenvolvemos o produto para ter uma caixa nossa, da qual possamos nos orgulhar e que, sobretudo, seja mais barata."

Recentemente, foi concluída a etapa de validação pré-clínica da nova embalagem por meio de um estudo de caso-controle. Nessa fase, foi feita uma comparação entre o modelo atualmente utilizado no Brasil e a proposta desenvolvida pelos pesquisadores. Segundo Bartira, os resultados demonstraram que a nova embalagem é segura para o transporte de órgãos e tecidos destinados a transplantes.

O produto ainda deve passar por outros testes com órgãos humanos e a expectativa é que esteja disponível no mercado no início de 2026. A embalagem começou a ser desenvolvida em 2017, sem nenhum tipo de apoio financeiro, e em 2020 recebeu um aporte da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).

A tecnologia foi desenvolvida pela Unifesp, por meio da Escola Paulista de Enfermagem e da Escola Paulista de Medicina, em parceria com a São Rafael Câmaras Frigoríficas, Instituto Mauá de Tecnologia (IMT) e o Centro de Tecnologia em Embalagem para Alimentos do Instituto de Tecnologia de Alimentos (ITAL).