Amigas e rivais: 'A Casa do Dragão' volta com sangue, luto e traições - não nesta ordem

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Em sua primeira temporada, A Casa do Dragão precisava fazer muitas coisas: apresentar personagens, seus relacionamentos e divergências políticas ao longo de décadas de história, incluir cenas de batalha e de dragões e, principalmente, reconquistar fãs de Game of Thrones decepcionados com seu final. Deu certo.

 

Na segunda temporada da série baseada em Fogo & Sangue, de George R.R. Martin, que estreia neste domingo (16), às 22h, na HBO e Max, com episódios semanais, o showrunner Ryan Condal abre suas asas - o Estadão assistiu aos quatro primeiros capítulos de oito e pode dizer que ele aprofunda os personagens e seus relacionamentos antes de despedaçá-los na guerra civil entre os Targaryen pelo Trono de Ferro.

 

De um lado, está o Conselho Preto, ou os Pretos, liderados por Rhaenyra Targaryen (Emma D'Arcy), filha mais velha do rei Viserys (Paddy Considine) e declarada por ele sua herdeira.

 

Do outro, está o Conselho Verde, ou os Verdes, que em uma manobra da rainha Alicent (Olivia Cooke), segunda mulher de Viserys, e de seu pai, a Mão do Rei Otto Hightower (Rhys Ifans), colocaram Aegon (Tom Glynn-Carney), filho mais velho de Alicent e Viserys, no trono.

 

Quem são os Pretos e quem são os Verdes?

 

Os fãs de A Casa do Dragão se dividem como seguidores de divas pop ou torcidas de futebol entre os Pretos e os Verdes. Mas quem são eles?

 

Conselho Preto: Rhaenyra Targaryen, seu marido Daemon Targaryen (Matt Smith), Corlys Velaryon (Steve Toussaint), Rhaenys Targaryen (Eve Best), Jacaerys Velaryon (Harry Collett), Joffrey Velaryon (Oscar Eskinazi), Baela Targaryen (Bethany Antonia) e Rhaena Targaryen (Phoebe Campbell).

 

Conselho Verde: Alicent Hightower, Otto Hightower, Aegon II Targaryen, Aemond Targaryen (Ewan Mitchell), Helaena Targaryen (Phia Saban), Criston Cole (Fabien Frankel), Tyland Lannister (Jefferson Hall) e Larys Strong (Matthew Needham).

 

George R.R. Martin participou da segunda temporada?

 

Ryan Condal disse em entrevista coletiva com a participação do Estadão que sua preocupação, na primeira temporada, era se alguém ia assistir. "Porque você está vindo na sequência da série de maior sucesso de todos os tempos. Como suceder a Game of Thrones? Não dá. Você apenas tenta fazer algo bom que se sustente sozinho."

 

Condal criou a série junto com George R.R. Martin e teve Miguel Sapochnik, que dirigiu alguns dos maiores episódios de Game of Thrones, como Hardhomme e Battle of the Bastards, dividindo a posição de showrunner (o produtor que dá a direção criativa para a série e comanda a sala de roteiristas).

 

George R.R. Martin, criador não só desse universo como desta série, não está diretamente envolvido na segunda temporada de A Casa do Dragão. "Ele escreveu o livro, então de certa forma está sempre conosco", disse o showrunner em entrevista coletiva. "Mas está ocupado demais. Ele tem consciência do que estamos fazendo, estamos em contato. Mas, agora que já transpusemos bem Fogo & Sangue para a tela, estamos operando sozinhos."

 

Sapochnik saiu da posição de showrunner e não dirige nenhum episódio nesta temporada - na anterior, ele comandou três dos dez. Em compensação, Alan Taylor, diretor de sete episódios de Game of Thrones, é responsável por dois episódios, o primeiro e o quarto.

 

O que você precisa saber antes de começar a segunda temporada de 'A Casa do Dragão'

(ATENÇÃO PARA OS SPOILERS DA PRIMEIRA TEMPORADA)

 

A Casa do Dragão se passa 200 anos antes dos eventos de Game of Thrones. Viserys Targaryen, Viserys 1º, ascendeu ao Trono de Ferro depois de uma disputa sucessória.

 

Ele era o filho mais velho do segundo filho do rei Jaehaerys, enquanto sua prima Rhaenys (Eve Best) era a única filha do filho mais velho de Jaehaerys.

 

Como a dinastia Targaryen ainda era recente, e as regras de sucessão não eram claras, os lordes de Westeros se reuniram para decidir quem deveria ser o herdeiro.

 

E, temendo colocar uma mulher na posição, elegeram Viserys.

 

O drama se repetiu com Viserys, cuja mulher, Aemma (Sian Brooke), morre no parto tentando dar a ele um herdeiro homem. Viserys só tem uma filha, Rhaenyra (Milly Alcock na adolescência).

 

Por causa do precedente, o trono deveria ir, então, para o irmão de Viserys, Daemon (Matt Smith), mas ele é considerado violento e instável para ser o rei.

 

Viserys acaba escolhendo Rhaenyra e consegue a aprovação de boa parte dos lordes de Westeros.

 

Enquanto isso, a Mão do Rei, Otto Hightower, manipula a filha Alicent (Emily Carey), obrigando-a a confortar o rei em seu luto. Não demora, e Viserys decide se casar com Alicent, provocando uma ruptura entre ela e Rhaenyra, que eram melhores amigas.

 

Alicent (vivida na fase adulta por Olivia Cooke) dá à luz a quatro crianças: Aegon (Ty Tennant/Tom Glynn-Carney), Helaena (Evie Allen/Phia Saban), Aemond (Leo Ashton/Ewan Mitchell) e Daeron.

 

Em seus últimos momentos, Viserys delira sobre a Canção do Gelo e Fogo, a profecia que ele tinha revelado a Rhaenyra quando a escolheu como herdeira. A profecia faz ligação com Game of Thrones e fala como Aegon, o Conquistador, o primeiro Targaryen a reinar em Westeros, tinha sonhado com o final dos tempos, com uma ameaça vinda do Norte. Segundo Aegon, para impedir o fim da humanidade, um Targaryen, o Príncipe (ou Princesa) que foi Prometido/a, teria de estar sentado no Trono de Ferro.

 

Alicent entende os murmúrios de Viserys como uma mudança de posição do rei, desejando que seu filho Aegon ocupe o trono em seu lugar - essa é a inconveniência de repetir nome na família.

 

Alicent e Otto correm para coroar Aegon publicamente, enquanto Rhaenyra está no castelo da família em Pedra do Dragão, ao lado do marido, Daemon (sim, o tio). Verdes e Pretos correm pelo reino em busca de apoio para suas causas.

 

Aemond, que tinha perdido um olho na adolescência por culpa de Lucerys Velaryon (Elliot Grihault), filho de Rhaenyra, nunca se conformou pela falta de punição ao sobrinho. Ele ataca o Lucerys no ar, com seu dragão Vhagar, matando o dragão do sobrinho e o rapaz.

 

Tomada de ódio, Rhaenyra quer vingança.

 

Luto e sede de sangue

 

A segunda temporada - que, aliás, tem nova abertura - começa com esse espírito. Mas não parte para a batalha logo de cara, o que não significa marasmo, palavra inexistente em Westeros. "Não dá para encher oito episódios com dragões lutando", disse o showrunner Ryan Condal em entrevista coletiva. "É preciso engajar as pessoas com os personagens e as histórias entre eles, para, quando o espetáculo vier, elas se preocupem com as pessoas envolvidas e saiam emocionadas dessas cenas de ação."

 

A primeira sequência não tem nada de espetacular e, no entanto, toca fundo o coração do fã. O canto de um corvo anuncia que o espectador está em território para lá de conhecido: Winterfell, onde Jacaerys (Harry Collett), filho mais velho de Rhaenyra, chega para conquistar o apoio do Lorde Cregan Stark (Tom Taylor, que na série Legends curiosamente fez uma versão mais jovem de Sean Bean, intérprete de Ned Stark em Game of Thrones).

 

Winterfell não é a única parte visitada por A Casa do Dragão na segunda temporada, que mostra como a confusão pela coroa afeta os sete reinos.

 

A guerra entre Verdes e Pretos é inevitável. "Os dois lados compartilham muita história e se detestam. Esse ódio vai piorando conforme as tragédias se acumulam", disse Condal.

 

Como diz Rhaenys em dado momento, no fim das contas ninguém vai se lembrar de quando a guerra começou. Foi quando o Trono foi usurpado pelos Verdes? Ou quando Aemond matou Lucerys? Ou lá atrás, quando Lucerys cegou Aemond?

 

"Mas a morte de Lucerys é um marco", disse Condal. "Qual vai ser o contragolpe? Aqui era muito importante mostrar quais as motivações de cada personagem e o que os torna fracos e fortes, o que eles querem e amam."

 

O problema é que dos dois lados há vozes moderadas e outras dispostas a agir no calor do momento, e um luto triplo - por Viserys, por Lucerys e pelo bebê que Rhaenyra esperava - é capaz de cegar. A resposta vem rápida, e é uma tragédia daquelas praticamente impossíveis de perdoar.

 

O luto que permeia toda a temporada vai terminar em mais luto e banhos de sangue. "Daemon perdeu tudo", disse Matt Smith. "O luto é o catalisador desta temporada, começando pela morte do irmão. Daemon sente sua falta, mas não sabe falar disso. Ele fica maluco, o que é ótimo de interpretar."

 

Olivia Cooke concordou. "Meu maior desafio foi o que fazer com minha cara ao interpretar diferentes tipos de luto, trauma e tristeza", disse, com bom humor, a atriz que interpreta Alicent.

 

Ryan Condal disse que Olivia Cooke estava sendo modesta demais. "Alicent precisa deparar com o fato de ter conseguido o que foi criada para fazer, que era elevar a posição de sua família. Agora ela tem um filho sentado no Trono de Ferro. Mas, por isso, seu próprio poder foi reduzido."

 

Alicent é filha de seu pai e, como ele, tenta ser uma voz de moderação junto ao impulsivo Aegon. Do outro lado, Rhaenyra procura fazer jus aos 80 anos sem guerras que herdou do bisavô, Jaehaerys, e do pai, Viserys. Mas talvez seja tarde demais para a paz.

 

O que achamos dos primeiros quatro episódios de 'A Casa do Dragão'

 

O grande diferencial do universo Game of Thrones são suas grandiosas cenas de ação, seja as batalhas, os dragões, ou as batalhas com dragões. Quem conhece Fogo & Sangue talvez espere sangue e vísceras a cada episódio. Mas a segunda temporada de A Casa do Dragão diminuiu as cenas muito brutais, como aquelas dos partos de Aemma e Rhaenyra na primeira temporada.

 

E Ryan Condal realmente leva um tempo para escalar o conflito entre os Pretos e os Verdes - ainda bem.

 

Para quem gosta de estar com os personagens, por mais odiosos que sejam - olhando para você, Criston Cole -, a metade inicial desta segunda temporada é um deleite. Há muitos embates vocais, com diálogos cortantes, em quartos e salas de conselho.

 

Também há muita política. Tanto Alicent quanto Rhaenyra precisam se impor, cada uma à sua maneira, para serem ouvidas, mesmo tendo muito a dizer.

 

Alicent tem de moderar os dois filhos, Aegon e Aemond, além de Criston Cole, o Senhor Comandante da Guarda Real, todos cabeça-quente. Rhaenyra precisa segurar o marido Daemon e o filho mais velho, Jacaerys. Ela ganha aliadas poderosas em Rhaenys e Baela, sua enteada.

 

Alicent e Rhaenyra são personagens femininas raras em sua complexidade, e elas são honradas com interpretações fortes de Olivia Cooke e Emma D'Arcy. Outros também brilham, no entanto. Mesmo que Paddy Considine faça falta, Matt Smith, Eve Best, Steve Toussaint, Rhys Ifans e Ewan Mitchell formam um elenco sólido.

 

Alicent e Rhaenyra são mães e entendem as repercussões das guerras. As duas compreendem que os homens têm desejos de glória que passam pelo sangue, como viram no torneio brutal lá no primeiro episódio da primeira temporada. Pode soar como clichê, mas a violência gera mais violência. A guerra deveria ser o último recurso, e não o primeiro, mesmo quando há sede de vingança.

 

A Casa do Dragão não trata os dragões como seres fofinhos que obedecem à sua mãe. As pessoas podem ficar fascinadas por eles, mas têm pavor deles, com razão. Em um mundo em que eles ainda eram comuns, um avistamento distante é motivo de pânico, porque não dá para saber se o dragão é amigo ou inimigo e se vai realmente ser controlado por seu montador. Um poder desses não pode ser utilizado de maneira leviana, e Alicent, Rhaenyra e a própria série sabem disso.

 

A guerra também afeta a população comum, as pessoas pobres que já sobrevivem com pouco. Se algumas vezes em Game of Thrones elas eram tratadas apenas como massas a serem salvas, conquistadas ou destruídas, nesta segunda temporada há a chance de ver seu drama um pouco mais de perto.

 

Todos esses passos fazem com que, quando massacres acontecem, o espectador sinta. Não há glorificação da guerra e da violência.

 

Quando finalmente dragões entram na batalha, o público entende as consequências para o mundo e para os personagens, queridos ou não, Pretos ou Verdes.

 

Aquelas cenas têm impacto porque sabemos tudo o que aconteceu até chegar ali, por que aquelas pessoas são como são e agem como agem. São poucas as séries que conseguem deixar quem assiste literalmente de boca aberta. A Casa do Dragão, como Game of Thrones, é uma delas.

 

'A Casa do Dragão' vai ter terceira temporada?

 

Sim. Antes mesmo da estreia da segunda, a HBO já confirmou a terceira temporada da série.

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A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), rejeitou uma ação movida pelo governador de Alagoas, Paulo Dantas (MDB), para tentar derrubar trechos dos acordos firmados pela mineradora Braskem com órgãos públicos para reparar danos ambientais causados em Maceió.

O processo foi rejeitado por questões processuais. Cármen Lúcia considerou que a modalidade de ação usada pelo governador para contestar os acordos era inadequada.

"O que se busca, na presente arguição, é a revisão judicial daquela decisão homologatória judicial sem observância das normas processuais específicas", escreveu a ministra.

Em sua decisão, Cármen Lúcia fez a ressalva de que, "pela relevância do tema", novos pedidos de reparação de danos podem ser apresentados, considerando que os acordos foram firmados em um momento em que não havia dimensão exata dos danos causados pela Braskem.

"Cumpre ressaltar que a superveniência de situações fáticas não contempladas nos acordos, autoriza a reabertura de discussões e novos pedidos de reparação de danos, conforme se preveem em cláusulas dos acordos firmados que contemplam a realização de diagnóstico ambiental periódico destinado a atualizar os danos causados e apontar novas medidas a serem adotada", acrescentou.

O governador de Alagoas alega que os acordos perdoaram indevidamente sanções que deveriam ter sido impostas à empresa e abriram caminho para a Braskem "se tornar proprietária e explorar economicamente a região por ela devastada". Isso porque há cláusulas que preveem que a mineradora compre dos moradores imóveis nas áreas afetadas como forma de ressarcimento.

Bairros de Maceió sofrem desde 2018 com o afundamento do solo causado pela extração de sal-gema, usado na indústria química. Alguns deles precisaram ser totalmente desocupados.

Os acordos questionados foram firmados com o Ministério Público Federal, Ministério Público do Estado de Alagoas, Defensoria Pública de Alagoas, Defensoria Pública da União e Prefeitura de Maceió.

Em manifestação no processo, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, defendeu que, em sua avaliação, mesmo que assuma a propriedade dos imóveis em bairros devastados, a mineradora não está autorizada a explorar economicamente essas regiões.

O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu nesta terça-feira, 25, que o porte de maconha para consumo próprio não é crime. Os ministros ainda debatem critérios objetivos para diferenciar usuários e traficantes, inclusive quantidade de droga. O julgamento deve ser concluído amanhã.

A decisão só passa ter efeitos práticos quando o julgamento for encerrado e o acórdão publicado.

A Lei de Drogas, aprovada em 2006, não pune o porte com pena de prisão. Com isso, os ministros declararam que esse não é um delito criminal, mas um ilícito administrativo. Prevaleceu a posição de que a dependência é um problema de saúde pública.

"Ninguém partiu da premissa de que a droga é positiva. Pelo contrário, estamos afirmando que se trata de uma infração. Mas é necessário que haja tratamento às pessoas viciadas", defendeu Gilmar Mendes, decano do STF e relator do processo.

Votaram a favor da descriminalização os ministros Gilmar Mendes, Rosa Weber (aposentada), Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Cármen Lúcia.

Cristiano Zanin, Kassio Nunes Marques e André Mendonça foram contra a descriminalização.

O consumo de maconha não foi legalizado, ou seja, continua proibido na legislação. A diferença na prática é que quem for enquadrado como usuário não terá antecedentes criminais. "O que acho mais nefasto é a pecha de criminoso que se coloca no usuário e que o inibe de buscar ajuda nos casos de dependência", defendeu Dias Toffoli.

A pena para os usuários permanece a mesma prevista na legislação - advertência sobre os efeitos das drogas, prestação de serviços comunitários e participação em programas ou cursos educativos.

Os ministros também definiram que os recursos contingenciados do Fundo Nacional Antidrogas devem ser liberados e que parte deles deve ser usada em campanhas educativas sobre os malefícios das drogas.

Ao final do julgamento, houve dúvidas no STF sobre como enquadrar o voto do ministro Luix Fux. Ele defendeu que a Lei de Drogas constitucional, porque não pune o porte com prisão. O ministro também disse que não considera o porte de maconha crime.

"Todas as premissas que eu assentei aqui, considerando constitucional o artigo 28, são no sentido de que aquelas sanções são constitucionais, entretanto eu não considero crime o artigo 28. Eu considero que o artigo é constitucional, porque o legislador não impôs penas inerentes à criminalização do uso, de sorte que eu considero constitucional por isso", explicou ao final da sessão.

A tendência é que sua posição fique alinhada ao voto de Toffoli, que também já havia provocado confusão. Independente da interpretação final sobre o voto de Fux, o placar já está definido a favor da descriminalização.

Toffoli complementa voto

Na semana passada, o STF divulgou o posicionamento do ministro Dias Toffoli como uma divergência parcial - um voto para manter a legislação como está, com a ressalva de que, na avaliação dele, ela já não criminaliza o usuário.

Nesta terça, ao retomar o julgamento, ele pediu a palavra e esclareceu que a posição foi a favor da descriminalização do consumo, não apenas de maconha, mas de todas as drogas, o que consolidou a maioria.

"A descriminalização já conta com seis votos. O meu voto se soma ao voto da descriminalização. Hoje pela manhã Vossa Excelência (Barroso, presidente do STF) me perguntou como meu voto era para ser proclamado. Por isso, entendi por bem fazer essa complementação. Se eu não fui claro o suficiente, o erro é meu, de comunicador", afirmou Toffoli.

Como diferenciar usuários de traficantes

A segunda etapa do julgamento gira em torno da quantidade de droga que deve ser usada como parâmetro para distinguir o consumidor do traficante. As propostas apresentadas até o momento vão de 25 a 60 gramas. Os ministros vêm conversando para aprovar uma quantidade intermediária, de 40 gramas.

Esse é um ponto central porque, na avaliação dos ministros, vai ajudar a uniformizar sentenças e evitar abordagens preconceituosas. Estudos citados no plenário mostram que negros são condenados como traficantes com quantidades menores do que brancos. O grau de escolaridade também gera distorções nas condenações - a tolerância é maior com os mais escolarizados.

"A quantidade vem sendo utilizada, lamentavelmente, como uma forma de discriminação social", criticou Alexandre de Moraes.

A quantidade, no entanto, não será um parâmetro soberano, mas circunstancial. Outros elementos podem ser usados para analisar cada caso. Se uma pessoa for flagrada com uma balança de precisão, por exemplo, ela pode ser denunciada como traficante, mesmo que tenha consigo uma quantidade de droga abaixo do limite.

Crise com o Congresso

O julgamento aprofundou a animosidade entre o STF e o Congresso. A bancada evangélica reagiu em peso. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), também chegou a se manifestar publicamente contra a interferência do Judiciário. Ele defende que a regulação das drogas cabe ao Legislativo e não deveria estar sendo discutida pelo Supremo.

Deputados e senadores debatem uma proposta de Rodrigo Pacheco para driblar o STF e incluir na Constituição a criminalização do porte de drogas, independente da quantidade. Uma comissão especial será criada para debater o texto.

"Nós estamos assumindo para nós problemas que não são nossos, por falência dos outros órgãos de deliberação da sociedade. E depois nos chamam de ativistas", criticou Toffoli nesta terça.

Veja como votou cada ministro:

A favor da descriminalização

Gilmar Mendes (relator)

"Despenalizar sim, mas mais do que isso: emprestar o tratamento da questão no âmbito da saúde pública e não no âmbito da segurança pública."

Rosa Weber (aposentada)

"A dependência química e o uso de drogas são questões que se inserem no âmbito das políticas públicas de saúde e de reinserção social. Delimitada a questão como problema de saúde pública, tenho por desproporcional e utilização do aparato penal do Estado para a prevenção do consumo dos entorpecentes."

Alexandre de Moraes

"Quem conhece o Direito Penal, sabe que só é crime o que é apenado com reclusão e detenção e só é contravenção o que é apenado com prisão simples."

Luís Roberto Barroso

"O que nós queremos é evitar a discriminação entre ricos e pobres, entre brancos e negros. Nós queremos uma regra que seja a mesma para todos. E fixar uma qualidade impede esse tipo de tratamento discriminatório. Ninguém está legalizando droga."

Edson Fachin

"O dependente é vitima e não criminoso germinal. O usuário em situação de dependência deve ser tratado como doente."

Dias Toffoli

"Estou convicto de que tratar o usuário como um tóxico delinquente não é a melhor política pública."

Cármen Lúcia

"Neste quadro, há uma anomia definidora de critérios, que leva a uma desigualdade no tratamento pelo próprio Estado, que é obrigado pela Constituição a promover a igualdade, e além disso uma insegurança."

Contra a descriminalização

Cristiano Zanin

"Não tenho dúvida de que os usuários de drogas são vítimas do tráfico e das organizações criminosas, mas se o Estado tem o dever de zelar pela saúde de todos, tal como previsto na Constituição, a descriminalização, ainda que parcial das drogas, poderá contribuir ainda mais para o agravamento desse problema de saúde."

André Mendonça

"O legislador definiu que portar drogas é crime. Transformar isso em ilícito administrativo é ultrapassar a vontade do legislador. Nenhum país do mundo fez isso por decisão judicial."

Kassio Nunes Marques

"A grande preocupação da maioria das famílias brasileiras não é se o filho vai preso ou não. A preocupação é que a droga não entre na sua residência. Para isso, a lei tem hoje um fator inibitório. A sociedade brasileira precisa de instrumentos para se defender."

Descriminalização, despenalização e legalização

- Descriminalizar: uma ação deixa de ser considerada crime, ou seja, a atitude deixa de ter efeitos na esfera penal, mas ainda pode ser considerada como ilícito civil ou administrativo.

- Despenalizar: a pena de prisão é substituída por punições de outra natureza.

- Legalizar: um ato ou conduta passa a ser permitido por meio de legislação específica, que pode regulamentar a prática e determinar suas restrições e condições.

O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para reconhecer que o porte de maconha não é crime no País, se for para consumo próprio. Os ministros continuam debatendo critérios objetivos para diferenciar usuários e traficantes, como, por exemplo, quantidade de droga.

Isso não quer dizer que a maconha foi liberada no País, nem que haverá comércio legalizado da planta ou das flores prontas para consumo. A decisão do Supremo abarca somente o porte da substância, em quantidades que ainda serão decididas. A decisão só passará a ter efeitos práticos quando o julgamento for encerrado e o acórdão publicado.

A Lei de Drogas, aprovada em 2006, não pune o porte da substância com pena de prisão. Com isso, os ministros declararam que esse não é um delito criminal, mas um ilícito administrativo. Assim, quem for pego com maconha para uso pessoal não passaria a ter antecedentes criminais.

Na tarde desta terça-feira, 25, o ministro Dias Toffoli complementou seu voto da semana passada, que havia causado confusão de entendimento. Ele admitiu que não foi claro em seu voto e fez a retificação no julgamento, que foi retomado nesta terça.

Votaram a favor da descriminalização os ministros Gilmar Mendes, Rosa Weber (aposentada), Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Dias Toffoli. Já os ministros Cristiano Zanin, Kassio Nunes Marques e André Mendonça foram contra a descriminalização.