Como as nomeações de Trump para a diplomacia pioram a relação entre China e EUA?

Internacional
Tipografia
  • Pequenina Pequena Media Grande Gigante
  • Padrão Helvetica Segoe Georgia Times
As escolhas do presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, para os cargos de secretário de Estado dos EUA e de conselheiro de segurança nacional em sua volta à Casa Branca têm em comum a posição crítica à China. Marco Rubio, o escolhido para chefiar a diplomacia, foi alvo de sanções de Pequim duas vezes por apoiar boicotes contra o país; e Michael Waltz, o próximo nome da segurança, defende que os americanos devem se preparar para um conflito militar com os chineses.

Ambas autoridades devem atuar com políticas para distanciar os EUA da China cada vez mais. Os dois países construíram uma relação comercial profunda no início deste século, mas a ascensão da China à segunda maior economia do mundo em 2008, a chegada de Xi Jinping ao poder em 2013 e a eleição de Trump em 2016 deram início a uma distensão gradual.

Hoje, os dois países vivem uma competição comercial e tecnológica que começou em 2018, no primeiro governo do republicano, e teve continuidade no governo Biden. Ambos também enfrentaram crises diplomáticas causadas pela visita de autoridades dos EUA à Taiwan, a ilha autônoma reivindicada por Pequim, e por acusações de espionagem que incluiu um balão chinês sobrevoando os EUA em 2023.

Com o retorno de Trump, os canais de diálogo diplomáticos entre China e EUA, vistos como essenciais para evitar conflitos, devem diminuir ainda mais sob Rubio e Waltz. O primeiro está proibido de entrar em Pequim depois de defender no Senado que empresas chinesas se retirassem da bolsa de valores dos EUA e auxiliar na imposição de sanções contra Pequim. O segundo escreveu para a revista britânica The Economist que os EUA deveriam trabalhar para pôr fim ao conflito na Ucrânia e no Oriente Médio para redirecionar recursos em defesa de Taiwan.

Em entrevista ao jornal americano Washington Post, a analista sênior do Asia Society Policy Institute, Lyle Morris, afirmou que uma das maiores dificuldades será a confiança dos chineses com os nomes escolhidos, em especial Rubio. "(Marco Rubio) terá dificuldade em argumentar para a China que os Estados Unidos querem cooperar com eles e não buscam a derrubada do Partido Comunista Chinês", disse.

A diplomata americana Susan Thorton, que atuou durante 30 anos na Eurásia e no Leste Asiático e hoje é professora da Universidade de Yale, concorda que a relação dos dois países deve piorar nos próximos anos, mas não necessariamente pelas nomeações. O principal motor disso seria o próprio Trump. "Trump não acredita no diálogo, ele prefere negociações e pode querer aumentar a pressão sobre a China antes de se envolver com eles", declarou ao Estadão.

A defesa de Taiwan e os limites da China

Embora os Estados Unidos e a China enfrentem uma competição comercial e tecnológica iniciada no primeiro governo Trump, o ponto mais sensível da relação diplomática entre os dois países é Taiwan. Reivindicada por Pequim, a ilha autônoma pode atrair os EUA para um conflito com os chineses por causa de uma lei americana que obriga o país a fornecer equipamentos militares de defesa.

Segundo Susan Thorton, a legislação dos EUA é ambígua para que o país não seja arrastado para o conflito de forma automática, mas é o cenário mais provável de uma guerra direta. Pequim diz que quer reunificar a ilha de forma pacífica, mas não descarta o uso de força se necessário. Autoridades americanas chegaram a afirmar que o país prepara um cenário de invasão para 2027.

Em uma reunião com Joe Biden no último dia 16, o líder chinês Xi Jinping disse que a questão de Taiwan é um limite para a China. Os chineses não estão dispostos a negociar o status da ilha, nem a essência do governo do Partido Comunista da China.

Nos últimos anos, tanto Rubio quanto Waltz pediram a Taiwan que aumente seus gastos com defesa e defenderam uma mudança na política dos EUA para desengajar na Ucrânia e focar na Ásia, com ênfase na potencial invasão chinesa. "Dado essas escolhas, é provável que o apoio a Taiwan aumente", disse o analista associado do Centro de Relações Exteriores (CFR, na sigla em inglês), Josh Kurlantzick.

Rubio, em particular, pressionou repetidamente uma mudança na lei dos EUA para dar uma prontidão maior à Taiwan. Em 2022, ele apresentou um projeto de lei no Senado para dar prioridade ao governo da ilha na venda de armas, em detrimento de outros países. Já Waltz é defensor de uma atenção maior no Pacífico para conter a influência chinesa.

De acordo com os analistas, mesmo com a política "América First", Trump não deve abandonar o arco de parcerias e alianças construídas por Biden no Pacífico nos últimos anos se seguir as ideias de Waltz. "Trump prefere o envolvimento bilateral aos esforços multilaterais, mas não o vejo se afastando dessas relações aliadas ou parceiras. Ele certamente deixará os aliados saberem, no entanto, que ele não está preenchendo cheques em branco e espera que eles comecem a gastar mais (em defesa)", disse Susan Thorton.

Competição comercial: as tarifas americanas e o contra-ataque chinês

Embora Taiwan seja a questão mais sensível pelo potencial de um conflito, a competição comercial e tecnológica entre EUA e China deve ter implicações profundas para americanos e chineses em um segundo mandato de Trump.

No primeiro mandato, o republicano foi o responsável por iniciar a guerra comercial ao impor tarifas a importações chinesas com a alegação de que os chineses roubavam tecnologia americana. Ele voltou a prometer tarifas durante a campanha eleitoral deste ano, desta vez de 60%, e, uma vez eleito, disse que implementaria tarifas de 10% contra Pequim no primeiro dia de governo.

Na administração americana, essas políticas são de responsabilidade dos secretários do Tesouro e do Comércio, mas Rubio e Waltz devem exercer um papel influente quando o tema for a China - assim como Jack Sullivan, conselheiro de segurança do governo Biden, respectivamente, desempenhou na política de restrição de acesso a tecnologia de semicondutores criada por Biden.

Ciente das ameaças que Trump e a equipe escolhida por ele representam ao comércio chinês, Pequim estuda como responder às medidas. As possibilidades mais óbvias são respostas semelhantes, com a imposição de tarifas a produtos americanos e controle de exportação, mas economistas afirmam que isso tende a prejudicar mais a China do que os EUA, devido à maior dependência econômica que a economia chinesa tem dos EUA.

Apesar disso, as autoridades chinesas têm respondido às sanções e tarifas americanas com as mesmas medidas. Nesta terça-feira, por exemplo, Pequim anunciou o controle de exportação de minerais raros que são utilizados na produção de chips semicondutores em resposta a novas sanções de Joe Biden para restringir a China de ter acesso à tecnologia de chips.

Sanções a empresas americanas com negócios na China também podem estar entre as respostas de Pequim. Essa possibilidade afeta membros que devem estar no próximo governo Trump, a exemplo de Elon Musk, proprietário da Tesla, que fabrica metade dos carros no país asiático. A empresa pode ser adicionada à "lista de entidades não confiáveis", formada por companhias que Pequim considera prejudiciais aos interesses nacionais.

Em setembro, por exemplo, Pequim ameaçou incluir na lista a empresa PVH, cujas marcas incluem Calvin Klein e Tommy Hilfiger, por ter aderido a Lei de Prevenção do Trabalho Forçado Uigur dos Estados Unidos, que exige que as empresas parem de usar algodão de Xinjiang por causa das denúncias de violações de direitos humanos na região. O projeto original, aliás, foi patrocinado por Marco Rubio no Senado. Com ele chefiando o Departamento de Estado, é fácil ver onde a relação pode piorar.

Em outra categoria

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) disse que o pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) para que Débora Rodrigues migrasse ao regime de prisão domiciliar foi um "recuo tático". A avaliação da PGR foi recebida por Alexandre de Moraes, no Supremo Tribunal Federal (STF), que concedeu o benefício à cabeleireira de Paulínia, no interior paulista.

"Não estamos comemorando um avanço. Estamos testemunhando um recuo tático. E ainda coberto de cinismo jurídico", afirmou Bolsonaro no X (antigo Twitter). "A vergonha ficou grande demais para sustentar". Débora tornou-se um símbolo da campanha do ex-presidente por anistia aos presos do 8 de Janeiro. Segundo o Placar da Anistia do Estadão, há 191 votos a favor da proposta.

Débora foi detida em março de 2023 por participar dos atos de vandalismo de 8 de Janeiro. Durante a invasão aos prédios públicos, ela usou um batom para pichar a frase "Perdeu, mané" na estátua "A Justiça", localizada na frente do Supremo Tribunal Federal (STF). Neste mês, a Primeira Turma da Corte iniciou o julgamento da cabeleireira. Alexandre de Moraes, relator da ação penal, pediu 14 anos de prisão em regime fechado e foi seguido por Flávio Dino.

O tempo de pena pedido pelo relator considera que, além da depredação de patrimônio público, Débora se juntou a centenas de invasores que tinham como propósito a deposição do Estado de Direito. Por ter se juntado ao bando "de maneira livre, consciente e voluntária", Débora respondeu pelos crimes de associação criminosa armada, tentativa de abolição do Estado de Direito e tentativa de golpe de Estado. Somados, esses delitos correspondem a 10 anos e seis meses - a maior parte da pena calculada por Moraes.

O ministro Luiz Fux pediu vista, pausando o julgamento sobre Débora, e durante a sessão da Primeira Turma que avaliou o recebimento da denúncia da PGR contra Jair Bolsonaro e mais sete aliados próximos, Fux mencionou o caso e afirmou que considerava a pena de Débora "exacerbada".

Em depoimento, a cabeleireira confirmou que vandalizou a escultura, mas disse que agiu no "calor do momento". Ela afirmou que não sabia o valor simbólico da estátua. A frase pichada por Débora remete a uma declaração do ministro da Corte Luís Roberto Barroso em novembro de 2022.

O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e as Forças Armadas vão ignorar o aniversário do golpe militar de 1964, no próximo dia 31 de março. A orientação, segundo apurou o Estadão, é tratar a data como um outro dia qualquer. A decisão tem sido alvo de críticas de aliados de Lula, que consideram o silêncio "constrangedor", especialmente após o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) se tornar réu por tentativa de golpe.

A Ordem do dia alusiva ao 31 de março, feita pelas Forças Armadas, deixou de existir desde os primeiros anos da década de 2010. O ministério da Defesa só retomou a leitura do documento seguindo ordens do então presidente Jair Bolsonaro, em 2019. Como mostrou o Estadão, em 2023, primeiro ano do governo Lula, a decisão de Bolsonaro foi extinta. Essa prática já havia sido interrompida durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).

Desde o início do atual governo, que foi marcado pelos atos golpistas de 8 de janeiro, Lula optou por evitar qualquer menção à data, dado o momento de ânimos acirrados entre o Planalto e os militares. A decisão é defendida sobretudo pelo ministro da Defesa, José Múcio, que, em meio às acusações sobre o envolvimento das Forças Armadas na tentativa de golpe, se tornou a principal voz em defesa da instituição dentro do governo. Múcio é considerado um dos responsáveis pela distensão entre os comandantes e Lula.

Em entrevista ao Roda Viva no início do ano, Múcio afirmou que o País deve aos militares o fato de não ter sofrido o golpe de 8 de janeiro, declaração criticada por correligionários do presidente Lula, que argumentam uma possível participação das Forças Armadas nos ataques em Brasília. Na ocasião, o titular da Defesa também defendeu penas mais brandas a parte dos envolvidos na invasão.

O silêncio sobre o 31 de março é visto como constrangedor por alguns petistas, que consideram importante o resgate da memória e do que se sucedeu nos anos da ditadura militar.

Para lembrar das atrocidades, censura e violência do período, integrantes do PT participarão de dois atos públicos em repúdio ao golpe de 1964: uma manifestação na Avenida Paulista, no domingo, e um encontro na PUC-SP organizado pelo Grupo Prerrogativas na segunda-feira. A universidade, que foi invadida por policiais durante a ditadura, recebe o evento que também tem como um dos motes a oposição à anistia dos responsáveis pela depredação da sede dos Três Poderes.

Entre os presentes na PUC-SP, estarão Marco Aurélio Carvalho, organizador do evento e coordenador do Grupo Prerrogativas, e figuras da velha guarda do PT, como o ex-ministro José Dirceu e o ex-deputado José Genoino, que foi assessor do ministério da Defesa.

Ao Estadão, o presidente estadual do PT paulista, deputado federal Kiko Celeguim, minimizou a decisão de Lula, dizendo que o governo tem a sua agenda e deve ter outras prioridades. "Nós, enquanto partido, estamos nos mobilizando para relembrar esses tempos nefastos da política nacional e repudiar qualquer tentativa de atraso ao estado democrático de direito. Por isso, vamos nos somar aos movimentos sociais e outros partidos no ato de domingo na Paulista", afirmou.

Sobre o silêncio do governo, Marco Aurélio, que coordena o evento na PUC-SP, contemporiza e reitera que não tem dúvida de que o governo tem um compromisso sincero e indiscutível com a defesa da democracia e das instituições. Ele cita a escolha do dia 8 de janeiro como a data da vitória da democracia e a criação do Observatório da Democracia pela Advocacia-Geral da União.

O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania disse, em nota, que a ministra Macaé Evaristo participará de uma reunião da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais no dia 31.

"O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania baliza suas ações na defesa da democracia, compromisso sinalizado fortemente no mês de março, data que relembramos o Golpe Militar de 1964. A pasta demonstra, por meio de ações, seu compromisso com a democracia, verdade e memória da história política do Brasil", afirmou a assessoria de imprensa da pasta ao ser questionada sobre a programação para a data.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a criticar a busca do ex-chefe do executivo, Jair Bolsonaro (PL), por anistia pelos ataques do 8 de janeiro de 2023 em Brasília. Durante coletiva no Vietnã, ao fim de sua viagem pela Ásia, Lula disse ser impressionante a defesa pedir anistia para Bolsonaro em vez de tentar absolvê-lo. "Ele não está querendo nem se defender porque sabe, no subconsciente dele, que fez todas as bobagens de que está sendo acusado", afirmou Lula.

Durante o julgamento desta semana no Supremo Tribunal Federal (STF) que tornou réus o ex-presidente e mais sete aliados, a defesa de Bolsonaro argumentou que o ex-presidente não assinou nenhuma minuta de caráter golpista nem teve participação nos atos de 8 de janeiro.

No Vietnã, Lula afirmou que a "anistia" não é prioridade no meio político e que não conversou com os líderes do Congresso, Hugo Motta, da Câmara, e Davi Alcolumbre, do Senado, sobre o tema. "Eu acho que anistia não é o tema principal neste instante. Tem muita coisa importante no Congresso Nacional que pretendo discutir. E é isso que quando eu voltar para o Brasil vou conversar com o Hugo e com o Alcolumbre", disse. "Eu tenho certeza que a anistia não é um tema principal para ninguém, a não ser para quem está se culpabilizando".

Além de Bolsonaro, são réus no STF por tentativa de golpe o general Walter Braga Netto (ex-ministro da Defesa e Casa Civil), general Augusto Heleno (ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional), deputado Alexandre Ramagem (ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência), Anderson Torres (ex-ministro da Justiça), almirante Almir Garnier (ex-comandante da Marinha), general Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa) e tenente-coronel Mauro Cid (ex-ajudante de ordens da Presidência).

Com o recebimento da denúncia nesta quarta-feira, 26, eles passaram a responder às acusações da PGR na Justiça. Até o início de maio, STF ainda avaliará a abertura de ações penais contra mais 26 pessoas denunciadas pela Procuradoria.

Bolsonaro discursa em favor de um projeto de lei que anistia os presos pelos atos de vandalismo de 8 de Janeiro. Segundo o Placar da Anistia do Estadão, há 191 votos a favor da anistia. Dos 513 deputados federais procurados para o levantamento, 421 responderam. Há 126 parlamentares contrários ao projeto, enquanto 104 não quiseram responder. Há ainda os deputados federais que são favoráveis ao perdão aos presos ou a penas mais brandas aos envolvidos nos atos de vandalismo, mas que passam a ser contrários à proposta se ela contemplar Jair Bolsonaro.

Lula encerrou sua viagem ao Vietnã ao discursar no encerramento do Fórum Econômico Brasil-Vietnã. O petista afirmou que, além da meta de dobrar o intercâmbio comercial entre os países, há potencial de triplicar o valor atual do fluxo. Além disso, fez uma crítica velada a Donald Trump, citando a ameaça do protecionismo ao comércio global.